1. São fontes imediatas do direito as leis.
2. Consideram-se leis todas as disposições genéricas provindas dos órgãos competentes do território de Macau e dos órgãos estaduais nos limites da sua competência legislativa relativa a Macau.
3. As convenções internacionais aplicáveis em Macau prevalecem sobre as leis ordinárias.
Os usos que não forem contrários aos princípios da boa fé são juridicamente atendíveis quando a lei o determine.
Os tribunais só podem resolver segundo a equidade:
a) Quando haja disposição legal que o permita;
b) Quando haja acordo das partes e a relação jurídica não seja indisponível; ou
c) Quando as partes tenham previamente convencionado o recurso à equidade, nos termos aplicáveis à cláusula compromissória.
1. A lei, independentemente da sua fonte, só se torna obrigatória depois de publicada no Boletim Oficial de Macau.
2. Entre a publicação e a vigência da lei decorrerá o tempo que a própria lei fixar; na falta de fixação, a lei entra em vigor no sexto dia posterior ao da publicação.
A ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas.
1. Quando se não destine a ter vigência temporária, a lei só deixa de vigorar se for revogada por outra lei.
2. A revogação pode resultar de declaração expressa, da incompatibilidade entre as novas disposições e as regras precedentes ou da circunstância de a nova lei regular toda a matéria da lei anterior.
3. A lei geral não revoga a lei especial, excepto se outra for a intenção inequívoca do legislador.
4. A revogação da lei revogatória não importa o renascimento da lei que esta revogara.
1. Os tribunais e os juízes são independentes e apenas estão sujeitos à lei.
2. O tribunal não pode abster-se de julgar, invocando a falta ou obscuridade da lei ou alegando dúvida insanável acerca dos factos em litígio.
3. Nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito.
4. As decisões dos tribunais são obrigatórias para quaisquer entidades públicas ou privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades.
1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
1. Os casos que a lei não preveja são regulados segundo a norma aplicável aos casos análogos.
2. Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei.
3. Na falta de caso análogo, a situação é resolvida segundo a norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema.
As normas excepcionais não comportam aplicação analógica, mas admitem interpretação extensiva.
1. A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
2. Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.
1. A lei interpretativa integra-se na lei interpretada, ficando salvos, porém, os efeitos já produzidos pelo cumprimento da obrigação, por sentença transitada em julgado, por transacção, ainda que não homologada, ou por actos de natureza análoga.
2. A desistência e a confissão não homologadas pelo tribunal podem ser revogadas pelo desistente ou confitente a quem a lei interpretativa for favorável.
Os não-residentes são equiparados aos residentes em Macau quanto ao gozo de direitos civis, salvo disposição legal em contrário.
A competência atribuída a uma lei abrange somente as normas que, pelo seu conteúdo e pela função que têm nessa lei, integram o regime do instituto visado na regra de conflitos.
1. A referência das normas de conflitos a qualquer lei exterior a Macau determina apenas, na falta de preceito em contrário, a aplicação do direito interno dessa lei.
2. Para efeitos do presente capítulo, entende-se por direito interno o direito material, com exclusão das normas de conflitos.
1. Se, porém, o direito de conflitos da lei referida pela norma de conflitos de Macau remeter para outra legislação e esta se considerar competente para regular o caso, é o direito interno desta legislação que deve ser aplicado.
2. Se o direito de conflitos da lei designada pela norma de conflitos devolver para o direito interno de Macau, é este o direito aplicável.
1. Cessa o disposto no artigo anterior, quando da sua aplicação resulte a invalidade ou ineficácia de um negócio jurídico que seria válido ou eficaz segundo a regra fixada no artigo 15.º, ou a ilegitimidade de um estado que de outro modo seria legítimo.
2. Cessa igualmente o disposto no artigo anterior, se a lei tiver sido designada pelos interessados, nos casos em que a designação é permitida.
1. Se for declarado competente um ordenamento em que coexistam vários sistemas normativos, de base territorial ou pessoal, sem que seja designado o sistema normativo aplicável, a lei competente determina-se de acordo com os critérios utilizados naquele ordenamento.
2. Se tais critérios não puderem ser individualizados, aplica-se o sistema normativo com o qual a situação se achar mais estreitamente conexa.
Na aplicação das normas de conflitos são irrelevantes as situações de facto ou de direito criadas com o intuito fraudulento de evitar a aplicabilidade da lei que, noutras circunstâncias, seria competente.
1. Não são aplicáveis os preceitos da lei exterior a Macau indicados pela norma de conflitos, quando essa aplicação for manifestamente incompatível com a ordem pública.
2. São aplicáveis, neste caso, as normas mais apropriadas da legislação externa competente ou, subsidiariamente, as regras do direito interno de Macau.
As normas da lei de Macau que pelo seu objecto e fim específicos devam ser imperativamente aplicadas prevalecem sobre os preceitos da lei exterior designada nos termos da Secção seguinte.
1. A lei exterior a Macau declarada aplicável é interpretada dentro do sistema a que pertence e de acordo com as regras interpretativas nele fixadas.
2. Na impossibilidade de averiguar o conteúdo dessa lei, recorrer-se-á à lei que for subsidiariamente competente, devendo adoptar-se igual procedimento sempre que não for possível determinar os elementos de facto ou de direito de que dependa a designação da lei aplicável.
1. Aos actos realizados a bordo de navios ou aeronaves, fora dos portos ou aeródromos, é aplicável a lei do lugar da respectiva matrícula, sempre que for competente a lei territorial.
2. Os navios e aeronaves militares consideram-se como parte do território do país ou Território a que pertencem.
O estado dos indivíduos, a capacidade das pessoas, as relações de família e as sucessões por morte são regulados pela lei pessoal dos respectivos sujeitos, salvas as restrições estabelecidas na presente secção.
1. O início e termo da personalidade jurídica são fixados igualmente pela lei pessoal de cada indivíduo.
2. Quando certo efeito jurídico depender da sobrevivência de uma a outra pessoa e estas tiverem leis pessoais diferentes, se as presunções de sobrevivência dessas leis forem inconciliáveis, é aplicável o disposto no n.º 2 do artigo 65.º
1. Aos direitos de personalidade, no que respeita à sua existência e tutela e às restrições impostas ao seu exercício, é também aplicável a lei pessoal.
2. Em Macau, o não-residente não goza, porém, de qualquer forma de tutela jurídica que não seja reconhecida na lei local.
1. O negócio jurídico celebrado em Macau por pessoa que seja incapaz segundo a lei pessoal competente não pode ser anulado com fundamento na incapacidade, no caso de a lei interna de Macau, se fosse aplicável, considerar essa pessoa como capaz.
2. Esta excepção cessa, quando a outra parte tinha conhecimento da incapacidade, ou quando o negócio jurídico for unilateral, pertencer ao domínio do direito da família ou das sucessões ou respeitar à disposição de imóveis situados fora do território de Macau.
3. Se o negócio jurídico for celebrado pelo incapaz fora de Macau, será observada a lei vigente no lugar da celebração que consagrar regras idênticas às fixadas nos números anteriores.
A mudança da lei pessoal não prejudica a maioridade ou emancipação adquirida segundo a lei pessoal anterior.
À tutela e institutos análogos de protecção aos incapazes é aplicável a lei pessoal do incapaz.
1. A lei pessoal é a da residência habitual do indivíduo.
2. Considera-se residência habitual o lugar onde o indivíduo tem o centro efectivo e estável da sua vida pessoal.
3. Para efeitos dos números anteriores, a residência habitual em Macau não depende de qualquer formalidade administrativa, mas presume-se residente habitual no território de Macau aquele que tenha direito à titulariedade do bilhete de identidade de residente de Macau.
4. Na hipótese de o indivíduo ter mais de uma residência habitual, sendo uma delas em Macau, a lei pessoal é a do território de Macau.
5. Na falta de residência habitual, a lei pessoal do indivíduo é a lei do lugar com o qual a sua vida pessoal se ache mais estreitamente conexa.
6. São, porém, reconhecidos em Macau os negócios jurídicos celebrados no país da nacionalidade do declarante, em conformidade com a lei desse país, desde que esta se considere competente.
7. Cessa o disposto no número anterior, se o declarante for nacional de país em que coexistam diferentes sistemas legislativos e nesse país tiver a sua residência habitual, contanto que a lei da sua residência habitual se considere competente para regular a relação.
1. A pessoa colectiva tem como lei pessoal a lei do lugar onde se encontra situada a sede principal e efectiva da sua administração.
2. À lei pessoal compete especialmente regular: a capacidade da pessoa colectiva; a constituição, funcionamento e competência dos seus órgãos; os modos de aquisição e perda da qualidade de associado e os correspondentes direitos e deveres; a responsabilidade da pessoa colectiva, bem como a dos respectivos órgãos e titulares, perante terceiros; a transformação, dissolução e extinção da pessoa colectiva.
3. A transferência da sede da pessoa colectiva para um lugar sujeito a um ordenamento jurídico distinto não extingue a personalidade jurídica desta, se nisso convierem as leis de uma e outra sede.
4. A fusão de entidades com lei pessoal diferente é apreciada em face de ambas as leis pessoais.
A lei pessoal das pessoas colectivas constituídas por convenção internacional é a designada na convenção que as criou ou nos respectivos estatutos e, na falta de designação, a do lugar onde estiver a sede principal.
É aplicável às pessoas colectivas, quando a analogia o justifique, o disposto no artigo 27.º
1. A perfeição, interpretação e integração da declaração negocial são reguladas pela lei aplicável à substância do negócio, a qual é igualmente aplicável à falta e vícios da vontade.
2. O valor de um comportamento como declaração negocial é determinado pela lei da residência habitual comum do declarante e do destinatário e, na falta desta, pela lei do lugar onde o comportamento se verificou.
3. O valor do silêncio como meio declaratório é igualmente determinado pela lei da residência habitual comum e, na falta desta, pela lei do lugar onde a proposta foi recebida.
1. A forma da declaração negocial é regulada pela lei aplicável à substância do negócio; é, porém, suficiente a observância da lei em vigor no lugar em que é feita a declaração, salvo se a lei reguladora da substância do negócio exigir, sob pena de nulidade ou ineficácia, a observância de determinada forma, ainda que o negócio seja celebrado no exterior.
2. A declaração negocial é ainda formalmente válida se, em vez da forma prescrita na lei local, tiver sido observada a forma prescrita pelo ordenamento jurídico para que remete a norma de conflitos daquela lei, sem prejuízo do disposto na última parte do número anterior.
A representação legal está sujeita à lei reguladora da relação jurídica de que nasce o poder representativo.
A representação da pessoa colectiva por intermédio dos seus órgãos é regulada pela respectiva lei pessoal.
1. A representação voluntária é regulada, quanto à existência, extensão, modificação, efeitos e extinção dos poderes representativos, pela lei do lugar onde os poderes são exercidos.
2. Porém, se o representante exercer os poderes representativos em país ou Território diferente daquele que o representado indicou e o facto for conhecido do terceiro com quem contrate, é aplicável a lei da residência habitual do representado.
3. Se o representante exercer profissionalmente a representação e o facto for conhecido do terceiro contratante, é aplicável a lei do domicílio profissional.
4. Quando a representação se refira à disposição ou administração de bens imóveis, é aplicável a lei do lugar da situação desses bens.
A prescrição e a caducidade são reguladas pela lei aplicável ao direito a que uma ou outra se refere.
1. As obrigações provenientes de negócio jurídico, assim como a própria substância dele, são reguladas pela lei que os respectivos sujeitos tiverem designado ou houverem tido em vista.
2. A designação ou referência das partes só pode, todavia, recair sobre lei cuja aplicabilidade corresponda a um interesse sério dos declarantes ou esteja em conexão com algum dos elementos do negócio jurídico atendíveis no domínio do direito de conflitos.
Na falta de determinação da lei competente, aplica-se a lei do lugar com o qual o negócio jurídico se ache mais estreitamente conexo.
À gestão de negócios é aplicável a lei do lugar em que decorre a principal actividade do gestor.
O enriquecimento sem causa é regulado pela lei com base na qual se verificou a transferência do valor patrimonial a favor do enriquecido.
1. A responsabilidade extracontratual fundada, quer em acto ilícito, quer no risco ou em qualquer conduta lícita, é regulada pela lei do lugar onde decorreu a principal actividade causadora do prejuízo; em caso de responsabilidade por omissão, é aplicável a lei do lugar onde o responsável deveria ter agido.
2. Se a lei do lugar onde se produziu o efeito lesivo considerar responsável o agente, mas não o considerar como tal a lei do lugar onde decorreu a sua actividade, é aplicável a primeira lei, desde que o agente devesse prever a produção de um dano, em lugar sujeito àquela lei, como consequência do seu acto ou omissão.
3. Se, porém, o agente e o lesado tiverem a mesma residência habitual e se encontrarem ocasionalmente no exterior, a lei aplicável será a da residência comum, sem prejuízo das disposições do ordenamento jurídico designado nos termos dos números anteriores que devam ser aplicadas indistintamente a todas as pessoas.
1. O regime da posse, propriedade e demais direitos reais é definido pela lei do lugar em cujo território as coisas se encontrem situadas.
2. Em tudo quanto respeita à constituição ou transferência de direitos reais sobre coisas em trânsito, são estas havidas como situadas no lugar do destino.
3. A constituição e transferência de direitos sobre os meios de transporte submetidos a um regime de matrícula são reguladas pela lei do lugar onde a matrícula tiver sido efectuada.
É igualmente definida pela lei da situação da coisa a capacidade para constituir direitos reais sobre coisas imóveis ou para dispor deles, desde que essa lei assim o determine; de contrário, é aplicável a lei pessoal.
Sem prejuízo do disposto em legislação especial, os direitos de autor e os direitos conexos, bem como a propriedade industrial, são regulados pela lei do lugar onde se reclama a sua protecção.
A capacidade para contrair casamento ou celebrar convenção matrimonial é regulada, em relação a cada nubente, pela respectiva lei pessoal, à qual compete ainda definir o regime da falta e dos vícios da vontade dos contraentes.
1. A forma do casamento é regulada pela lei do lugar em que o acto é celebrado, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
2. O casamento de dois estrangeiros em Macau pode ser celebrado segundo a forma prescrita na lei nacional de qualquer dos contraentes, perante os respectivos agentes consulares.
1. Salvo o disposto no artigo seguinte, as relações entre os cônjuges são reguladas pela lei da sua residência habitual comum.
2. Não tendo os cônjuges a mesma residência habitual, é aplicável a lei do lugar com o qual a vida familiar se ache mais estreitamente conexa.
1. A substância e efeitos das convenções antenupciais e do regime de bens, legal ou convencional, são definidos pela lei da residência habitual dos nubentes ao tempo da celebração do casamento.
2. Não tendo os nubentes a mesma residência habitual, é aplicável a lei da primeira residência conjugal.
3. Se a lei aplicável for outra que não a de Macau e um dos nubentes tiver a sua residência habitual no território de Macau, pode ser convencionado um dos regimes admitidos neste Código.
1. A admissibilidade, substância e efeitos das convenções pós-nupciais e das modificações feitas pelos cônjuges ao regime de bens, legal ou convencional, são reguladas pela lei competente nos termos do artigo 50.º
2. A nova convenção em caso nenhum terá efeito retroactivo em prejuízo de terceiro.
Ao divórcio é aplicável o disposto no artigo 50.º
À constituição da filiação é aplicável a lei pessoal do progenitor à data do estabelecimento da relação.
1. As relações entre pais e filhos são reguladas pela lei da residência habitual comum dos pais e, na falta desta, pela lei pessoal do filho.
2. Se a filiação apenas se achar estabelecida relativamente a um dos progenitores, aplica-se a lei pessoal deste; se um dos progenitores tiver falecido, é competente a lei pessoal do sobrevivo.
1. À constituição da filiação adoptiva é aplicável a lei pessoal do adoptante, sem prejuízo do disposto nos n.os 2 e 3.
2. Se a adopção for realizada por marido e mulher ou o adoptando for filho do cônjuge do adoptante, é competente a lei da residência habitual comum dos cônjuges e, na falta desta, a lei do lugar com o qual a vida familiar dos adoptantes se ache mais estreitamente conexa.
3. Se a adopção for realizada por duas pessoas que vivam em união de facto ou o adoptando for filho do unido de facto do adoptante, é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no número anterior.
4. As relações entre adoptante e adoptado, e entre este e a família de origem, estão sujeitas à lei pessoal do adoptante; nos casos previstos nos n.os 2 e 3 é aplicável o disposto no artigo anterior.
Se, como requisito da perfilhação ou adopção, a lei pessoal do perfilhando ou adoptando exigir o consentimento deste, será a exigência respeitada.
1. Os pressupostos e os efeitos da união de facto são regulados pela lei da residência habitual comum dos unidos de facto.
2. Na falta de residência habitual comum, é aplicável a lei do lugar com o qual a situação se ache mais estreitamente conexa.
A sucessão por morte é regulada pela lei pessoal do autor da sucessão ao tempo do falecimento deste, competindo-lhe também definir os poderes do administrador da herança e do executor testamentário.
1. A capacidade para fazer, modificar ou revogar uma disposição por morte, bem como as exigências de forma especial das disposições por virtude da idade do disponente, são reguladas pela lei pessoal do autor ao tempo da declaração.
2. Aquele que, depois de ter feito a disposição, adquirir nova lei pessoal conserva a capacidade necessária para revogar a disposição nos termos da lei anterior.
É a lei pessoal do autor da herança ao tempo da declaração que regula:
a) A interpretação das respectivas cláusulas e disposições, salvo se houver referência expressa ou implícita a outra lei;
b) A falta e vícios da vontade;
c) A admissibilidade de testamentos de mão comum ou de pactos sucessórios, sem prejuízo, quanto a estes, do disposto nos artigos 51.º e 52.º
1. As disposições por morte, bem como a sua revogação ou modificação, são válidas, quanto à forma, se corresponderem às prescrições da lei do lugar onde o acto for celebrado, ou às da lei pessoal do autor da herança, quer no momento da declaração, quer no momento da morte, ou ainda às prescrições da lei para que remeta a norma de conflitos da lei local.
2. Se, porém, a lei pessoal do autor da herança no momento da declaração exigir, sob pena de nulidade ou ineficácia, a observância de determinada forma, ainda que o acto seja praticado no exterior, será a exigência respeitada.
1. A personalidade adquire-se no momento do nascimento completo e com vida.
2. Os direitos que a lei reconhece aos nascituros dependem do seu nascimento.
3. A tutela da personalidade, desde que preenchida a condição do número anterior, abrange as lesões provocadas no feto.
4. No entanto, os progenitores não são responsáveis pelas malformações causadas aos filhos ou pelas doenças a eles transmitidas, no momento da concepção, nem, salvo quando tenham sido intencionalmente provocadas, pelas lesões produzidas posteriormente no feto.
As pessoas podem ser sujeitos de quaisquer relações jurídicas, salvo disposição legal em contrário: nisto consiste a sua capacidade jurídica.
1. A personalidade cessa com a morte.
2. Quando certo efeito jurídico depender da sobrevivência de uma a outra pessoa, presume-se, em caso de dúvida, que uma e outra faleceram ao mesmo tempo.
3. Tem-se por falecida a pessoa cujo cadáver não foi encontrado ou reconhecido, quando o desaparecimento se tiver dado em circunstâncias que não permitam duvidar da morte dela.
4. No caso referido no número anterior e na eventualidade de posteriormente à declaração de óbito se provar que este ocorreu em data diversa ou a pessoa aparecer, aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto no instituto da morte presumida para casos paralelos.
Ninguém pode renunciar, no todo ou em parte, à sua capacidade jurídica.
1. Os direitos de personalidade são reconhecidos a todas as pessoas e devem ser protegidos sem qualquer discriminação injustificada, nomeadamente por motivos de nacionalidade, local de residência, ascendência, raça, etnia, cor, sexo, língua, religião, opinião ou convicção política ou ideológica, instrução e situação económica ou condição social.
2. Todas as pessoas têm direito à protecção contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral.
3. Independentemente da responsabilidade civil a que haja lugar, a pessoa ameaçada ou ofendida pode requerer as providências adequadas às circunstâncias do caso, com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já cometida.
4. As medidas referidas no número anterior poderão também ser requeridas como providências cautelares, nos termos da lei de processo.
1. Os direitos de personalidade gozam igualmente de protecção depois da morte do respectivo titular.
2. Tem legitimidade, neste caso, para requerer as providências previstas no n.º 3 do artigo anterior o cônjuge ou unido de facto sobrevivos ou qualquer descendente, ascendente, irmão, sobrinho ou herdeiro do falecido.
3. Qualquer das pessoas referidas no número anterior tem igualmente legitimidade para continuar a acção já intentada pelo titular dos direitos de personalidade.
4. Se a ilicitude da ofensa resultar de falta de consentimento, só as pessoas que o deveriam prestar têm legitimidade, conjunta ou separadamente, para requerer as providências a que o n.º 2 se refere.
1. Toda a limitação voluntária ao exercício dos direitos de personalidade é nula, se disser respeito a interesses indisponíveis, se for contrária aos princípios da ordem pública ou se for contrária aos bons costumes.
2. Ressalvados os casos previstos no número anterior, e sem prejuízo de disposição em contrário, a limitação voluntária dos direitos de personalidade é eficaz se nela consentir maior de 14 anos que possua o discernimento necessário para avaliar o seu sentido e alcance no momento em que o presta.
3. Ainda que o menor não tenha 14 anos, o consentimento do representante legal não é eficaz se for prestado com a oposição do menor, contanto que este possua o discernimento referido no número anterior.
4. Salvo norma especial, o consentimento pode ser expresso por qualquer meio que traduza uma vontade séria, livre e esclarecida do titular do interesse juridicamente protegido, ou, se for o caso, do representante legal.
5. A limitação voluntária dos direitos de personalidade, quando legal, é sempre revogável, ainda que com obrigação de indemnizar os prejuízos causados às legítimas expectativas da outra parte.
1. Toda a pessoa tem o direito à vida.
2. O direito à vida é irrenunciável e inalienável e não pode ser limitado legal ou voluntariamente.
1. Toda a pessoa tem direito ao respeito pela sua integridade física e psíquica.
2. Ninguém pode ser submetido, sem o seu consentimento, a intervenções ou experiências médicas ou científicas que possam afectar a sua integridade física ou psíquica.
3. É proibido o comércio de órgãos e outros elementos do corpo humano, ainda que dele destacados e com o consentimento do respectivo titular.
4. A limitação voluntária ao direito à integridade física e psíquica é nula quando, segundo for possível prever, existam sérios riscos de vida ou, salvo justificação ponderosa, dela resultem provavelmente consequências graves e irreversíveis para a saúde do titular.
1. Toda a pessoa tem direito à liberdade.
2. Ninguém pode ser mantido em escravidão ou servidão, ainda que com o seu consentimento.
3. Toda a pessoa tem direito à protecção contra a propaganda ou o apelo ao ódio nacional, racial, étnico, religioso, ou contra outros apelos de outro modo ilicitamente discriminatórios.
4. Ninguém pode ser detido ou aprisionado pela única razão de não ter cumprido ou de não estar em situação de cumprir uma obrigação contratual.
5. Salvo norma especial, ninguém pode ser coagido pela força a adoptar pessoalmente um comportamento, ainda que a ele se tenha obrigado e independentemente das sanções a que haja lugar.
6. As pessoas vinculadas por contrato de duração indeterminada que lhes imponha obrigações pessoais, bem como os trabalhadores vinculados por contrato de trabalho, podem denunciá-los a todo o tempo livremente mediante pré-aviso adequado às circunstâncias do caso ou estabelecido em lei especial.
7. Ninguém pode ser sujeito, sem consentimento, a meios de perquisição da sua personalidade ou a outros meios destinados a cercear-lhe a consciência ou a liberdade das suas afirmações.
8. Todo o indivíduo ilegalmente privado da liberdade tem direito a ser ressarcido dos danos sofridos.
9. O direito à liberdade apenas pode ser limitado voluntariamente por períodos restritos de tempo, em conformidade com o motivo que determinou a limitação.
1. Toda a pessoa tem direito à protecção contra imputações de factos ou juízos ofensivos da sua honra e consideração, bom nome e reputação, crédito pessoal e decoro.
2. A ilicitude da ofensa apenas é afastada pela prova da verdade do facto ou do juízo quando a imputação tiver sido feita para realizar interesses legítimos e não viole a intimidade da vida privada ou familiar do ofendido.
3. À prova da verdade referida no número anterior equipara-se a prova de existência de fundamento sério para o autor da imputação crer, em boa fé, na verdade do facto ou do juízo; mas a boa fé exclui-se quando não tiver sido cumprido o dever de averiguação, que as circunstâncias do caso impunham, sobre a verdade da imputação.
4. O direito à honra é irrenunciável e inalienável e a sua limitação voluntária não pode atingir a dignidade humana, profissional ou económica do titular.
1. Todos devem guardar reserva quanto à intimidade da vida privada de outrem.
2. A extensão da reserva é definida conforme a natureza do caso e a condição das pessoas; designadamente, a reserva será delimitada pelo âmbito que, por seus próprios actos, a pessoa mantenha reservado e, para as figuras públicas, pela relação existente entre os factos e o motivo de notoriedade.
1. O destinatário de carta-missiva de natureza confidencial deve guardar reserva sobre o seu conteúdo, não lhe sendo lícito aproveitar os elementos de informação que ela tenha levado ao seu conhecimento.
2. Morto o destinatário, pode a restituição da carta confidencial ser ordenada pelo tribunal, a requerimento do autor dela ou, se este já tiver falecido, das pessoas indicadas no n.º 2 do artigo 68.º; pode também ser ordenada a destruição da carta, o seu depósito em mão de pessoa idónea ou qualquer outra medida apropriada.
3. As cartas-missivas confidenciais só podem ser publicadas com o consentimento do seu autor ou com o suprimento judicial desse consentimento; mas não há lugar ao suprimento quando se trate de utilizar as cartas como documento literário, histórico ou biográfico.
4. Depois da morte do autor, a autorização compete às pessoas designadas no n.º 2 do artigo 68.º, segundo a ordem nele indicada.
5. O disposto nos números anteriores é aplicável, com as necessárias adaptações, a outras missivas de natureza confidencial.
O disposto nos n.os 3 e 4 do artigo anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, às memórias familiares e pessoais e a outros escritos que tenham carácter confidencial ou se refiram à intimidade da vida privada.
O destinatário de missiva de carácter não confidencial só pode usar dela em termos que não contrariem a expectativa do autor.
1. A biografia de uma pessoa identificada só pode ser divulgada ou utilizada por outrem, total ou parcialmente, com o seu consentimento.
2. Exceptua-se do disposto no número anterior a divulgação ou utilização justificada por exigências de segurança ou de justiça, por finalidades científicas, culturais ou didácticas ou por outro interesse relevante relativamente a figura pública.
1. Toda a pessoa tem direito a tomar conhecimento dos dados constantes de ficheiros ou registos informáticos a seu respeito e do fim a que se destinam, podendo exigir a sua rectificação ou actualização, salvo o disposto em normas especiais sobre segredo de justiça.
2. A recolha de dados pessoais para tratamento informático deve ser feita com vinculação estrita às finalidades a que se destinam esses dados, as quais devem ser dadas a conhecer ao seu titular.
3. O acesso a ficheiros e registos informáticos para conhecimento de dados pessoais relativos a terceiros e respectiva interconexão carecem de autorização, para cada caso, da autoridade pública encarregada de fiscalizar a recolha, armazenamento e utilização dos dados pessoais informatizados.
1. O retrato ou qualquer outro sinal visualmente identificador de uma pessoa não pode ser captado, exposto, reproduzido, divulgado ou lançado no comércio sem o consentimento dela; depois da morte da pessoa retratada, a autorização compete às pessoas designadas no n.º 2 do artigo 68.º, segundo a ordem nele indicada.
2. Não é necessário o consentimento da pessoa retratada quando assim o justifiquem a sua notoriedade, o cargo que desempenhe, exigências de segurança ou de justiça, finalidades científicas, didácticas ou culturais, ou quando a imagem estiver enquadrada na de lugares públicos, ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente.
3. O retrato não pode, porém, ser reproduzido, exposto ou lançado no comércio, se do facto puder resultar ofensa do direito à honra, nos termos do artigo 73.°
4. As imagens de lugares públicos captadas para finalidades de segurança ou de justiça apenas podem ser utilizadas para estes fins, devendo ser destruídas logo que se tornem desnecessárias.
5. O disposto nos números anteriores é aplicável, com as necessárias adaptações, à captação, reprodução e divulgação da palavra de uma pessoa.
Toda a pessoa tem direito à protecção contra imputações de factos falsos sobre si ou a sua vida, ainda que não ofensivos da sua honra e consideração ou não relativos à sua vida privada.
1. Toda a pessoa tem direito a ter um nome, a usar esse nome, completo ou abreviado, e a opor-se a que outrem o use ilicitamente para sua identificação ou outros fins.
2. O titular do nome não pode, todavia, especialmente no exercício de uma actividade profissional, usá-lo de modo a prejudicar os interesses de quem tiver nome total ou parcialmente idêntico; nestes casos, o tribunal decretará as providências que, segundo juízos de equidade, melhor conciliem os interesses em conflito.
3. As acções relativas à defesa do nome podem ser exercidas não só pelo respectivo titular, como, depois da morte dele, pelas pessoas referidas no n.º 2 do artigo 68.º
4. O pseudónimo, bem assim como outros meios de identificação da pessoa, quando tenham notoriedade, gozam da protecção conferida ao próprio nome.
1. A pessoa tem domicílio no lugar da sua residência habitual; se tiver residência habitual alternadamente em diversos lugares, tem-se por domiciliada em qualquer deles.
2. Na falta de residência habitual, considera-se domiciliada no lugar da sua residência ocasional ou, se esta não puder ser determinada, no lugar onde se encontrar.
1. A pessoa que exerce uma profissão tem, quanto às relações que a esta se referem, domicílio profissional no lugar onde a profissão é exercida.
2. Se exercer a profissão em lugares diversos, cada um deles constitui domicílio para as relações que lhe correspondem.
É permitido estipular domicílio particular para determinados negócios, contanto que a estipulação seja reduzida a escrito.
1. O menor tem domicílio no lugar da residência da família.
2. Na falta de residência da família, o menor tem por domicílio o do progenitor a cuja guarda estiver confiado ou, nos casos em que o exercício do poder paternal couber a ambos os progenitores, o domicílio de qualquer destes.
3. O domicílio do menor que em virtude de decisão judicial foi confiado a terceira pessoa ou a instituição é o do progenitor que exerce o poder paternal.
4. O domicílio do menor sujeito a tutela e o do interdito é o do respectivo tutor.
5. Quando tenha sido instituído o regime de administração de bens, o domicílio do menor ou do interdito é o do administrador, nas relações a que essa administração se refere.
6. Não são aplicáveis as regras dos números anteriores se delas resultar que o menor ou interdito não tem domicílio em Macau, contanto que ele aí resida; neste caso, aplicam-se-lhes as regras relativas ao domicílio das pessoas capazes.
1. Os trabalhadores da Administração Pública do território de Macau, quando haja lugar certo para o exercício dos seus empregos, têm nele domicílio necessário, sem prejuízo do seu domicílio voluntário no lugar da residência habitual.
2. O domicílio necessário é determinado pela posse do cargo ou pelo exercício das respectivas funções.
Os representantes de Macau em organizações ou conferências internacionais que gozem de estatuto diplomático ou equivalente, quando invoquem a extraterritorialidade, consideram-se domiciliados em Macau.
1. O tribunal deve nomear um curador quando haja necessidade de prover acerca da administração dos bens ou outros interesses:
a) De quem desapareceu sem que dele se saiba parte e sem ter deixado representante legal ou procurador bastante; ou
b) De quem, sem ter representante legal ou procurador bastante, se encontre manifestamente impossibilitado, por doença ou outras causas semelhantes de carácter duradouro, de actuar por si e de designar procurador.
2. A existência de procurador não obsta à nomeação de um curador, se o procurador não quiser ou não puder exercer as suas funções ou, salvo estipulação em contrário na procuração, quando se tiver mantido por 3 anos a situação justificativa da curadoria; nestes casos, com a nomeação do curador caducam os poderes de representação conferidos anteriormente pelas pessoas sujeitas à curadoria.
3. Pode ser designado para certos negócios, sempre que as circunstâncias o exijam, um curador especial.
A possibilidade de nomeação do curador não obsta às providências cautelares que se mostrem indispensáveis em relação a quaisquer bens do curatelado.
A curadoria e as providências a que se refere o artigo anterior podem ser requeridas pelo Ministério Público ou por qualquer interessado.
1. O curador será escolhido de entre os herdeiros presumidos ou outros interessados na conservação dos bens do curatelado.
2. O curador tem de ser uma pessoa capaz.
3. Havendo conflito de interesses entre o curatelado e o curador ou entre o curatelado e o cônjuge, unido de facto, ascendentes ou descendentes do curador, deve ser designado um curador especial, nos termos do n.º 3 do artigo 89.º
1. Os bens do curatelado serão relacionados e só depois entregues ao curador, ao qual será fixada caução pelo tribunal.
2. Em caso de urgência, pode ser autorizada a entrega dos bens antes de estes serem relacionados ou de o curador prestar a caução exigida.
3. Se o curador não prestar a caução, será nomeado outro em lugar dele.
1. O curador fica sujeito ao regime do mandato geral em tudo o que não contrariar as disposições desta secção.
2. Compete ao curador requerer os procedimentos cautelares necessários e intentar as acções que não possam ser retardadas sem prejuízo dos interesses do curatelado; cabe-lhe ainda representar o curatelado em todas as acções contra este propostas.
3. Só com autorização judicial pode o curador alienar ou onerar bens imóveis, objectos preciosos, títulos de crédito, empresas comerciais e quaisquer outros bens cuja alienação ou oneração não constitua acto de administração.
4. A autorização judicial só será concedida quando o acto se justifique para evitar a deterioração ou ruína dos bens, solver dívidas do curatelado, custear benfeitorias necessárias ou úteis ou ocorrer a outra necessidade urgente.
1. O curador deve prestar contas do seu mandato perante o tribunal, anualmente ou quando este o exigir.
2. Na eventualidade de ser declarada a morte presumida do ausente nos termos da secção seguinte, as contas do curador são prestadas aos adquirentes de direitos sobre os bens do ausente pela morte deste.
O curador haverá dez por cento da receita líquida que realizar.
O curador pode ser substituído, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer interessado, logo que se mostre inconveniente a sua permanência no cargo.
1. A curadoria do ausente termina:
a) Pelo seu regresso;
b) Se ele providenciar acerca da administração dos seus bens ou interesses;
c) Pela notícia da sua existência e do lugar onde reside;
d) Pela declaração da sua morte presumida; ou
e) Pela certeza da sua morte.
2. Nos casos referidos na alínea b) do n.º 1 do artigo 89.º, a curadoria termina com o termo do estado causador da mesma.
1. Nos casos previstos nas alíneas a) a c) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo anterior, os bens do curatelado ser-lhe-ão entregues logo que este o requeira.
2. Enquanto não for requerida e decretada a entrega, mantém-se o regime da curadoria nos termos desta secção.
1. A declaração de morte presumida de pessoa ausente pode ser requerida pelo cônjuge, pelos herdeiros do ausente e por todos os que tiverem sobre os bens do ausente direito dependente da condição da sua morte.
2. O requerimento referido no número anterior só pode ser efectuado decorridos 7 anos sobre a data das últimas notícias.
3. Pode igualmente requerer-se a declaração de morte presumida do ausente que, se fosse vivo, já houvesse completado 80 anos, contanto que, sobre a data das últimas notícias, já hajam decorrido 5 anos.
4. A declaração de morte presumida do ausente não depende de prévia instalação da curadoria e referir-se-á ao fim do dia das últimas notícias que dele houve.
A declaração de morte presumida produz os mesmos efeitos que a morte, mas não dissolve o casamento nem extingue as restantes relações familiares, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte e do direito de exigir inventário e partilha.
1. O cônjuge do ausente pode contrair novo casamento; ocorrendo o regresso do ausente ou verificando-se que este era vivo ao tempo da celebração do novo casamento, considera-se o matrimónio anterior dissolvido por divórcio à data da declaração de morte presumida.
2. O filho do ausente pode ser adoptado; ocorrendo o regresso do ausente ou verificando-se que este era vivo ao tempo da adopção, considera-se a relação de filiação anterior extinta à data da declaração de morte presumida.
3. Nos casos previstos na segunda parte do número anterior, poderá o juiz, a requerimento do adoptado ou do ausente, decidir pela manutenção da relação de filiação anterior e pela extinção da actual, contanto que ocorram motivos ponderosos; a acção deve ser proposta dentro do ano seguinte ao regresso do ausente ou seu conhecimento pelo adoptado.
1. A exigibilidade das obrigações que se extinguiriam pela morte do ausente considera-se extinta.
2. No entanto, e sem prejuízo das regras da prescrição, caso o ausente regresse ou haja notícia da sua existência e do lugar onde reside, as obrigações a vencer desde esta data tornam-se de novo exigíveis, assim como as obrigações vencidas contanto que caibam nos limites do património reentregue ao ausente.
Declarada a morte presumida, o tribunal requisitará certidões dos testamentos públicos e mandará proceder à abertura dos testamentos cerrados que existirem, a fim de serem tomados em conta na partilha.
Os legatários, como todos aqueles que por morte do ausente teriam direito a bens determinados, podem requerer, logo que a morte presumida esteja declarada, independentemente da partilha, que esses bens lhes sejam entregues.
1. A entrega dos bens aos herdeiros do ausente à data das últimas notícias, ou aos herdeiros dos que depois tiverem falecido, só tem lugar depois da partilha.
2. Enquanto não forem entregues os bens, a administração deles pertence ao cabeça-de-casal, designado nos termos dos artigos 1918.° e seguintes.
Os herdeiros e os restantes beneficiários pela morte do ausente a quem tenham sido entregues os bens do ausente são havidos como titulares definitivos dos mesmos.
1. Quando se prove que o ausente morreu em data diversa da fixada na sentença de declaração de morte presumida, o direito à herança compete aos que naquela data lhe deveriam suceder, sem prejuízo das regras da usucapião.
2. Os sucessores de novo designados gozam apenas, em relação aos antigos, dos direitos que no artigo seguinte são atribuídos ao ausente.
1. Se o ausente regressar ou dele houver notícias, ser-lhe-á devolvido o património no estado em que se encontrar, com o preço dos bens alienados ou com os bens directamente sub-rogados, e bem assim com os bens adquiridos mediante o preço dos alienados.
2. Havendo má fé dos sucessores, o ausente tem direito a ser indemnizado do prejuízo sofrido.
3. A má fé, neste caso, consiste no conhecimento de que o ausente sobreviveu à data da morte presumida.
1. Os direitos que eventualmente sobrevierem ao ausente desde que desapareceu sem dele haver notícias e que sejam dependentes da condição da sua existência passam, declarada a morte presumida, às pessoas que seriam chamadas à titularidade deles se o ausente fosse falecido desde o fim do dia das últimas notícias que dele houve.
2. O disposto no número anterior não afasta, no entanto, a sujeição dos direitos referidos no número anterior ao regime da curadoria do ausente previsto na secção precedente, enquanto se mantiver a curadoria.
É menor quem não tiver ainda completado 18 anos de idade.
Salvo disposição em contrário, os menores carecem de capacidade para o exercício de direitos.
1. A incapacidade dos menores é suprida pelo poder paternal e, subsidiariamente, pela tutela, conforme se dispõe nos lugares respectivos.
2. Como meio complementar do poder paternal ou da tutela, a incapacidade dos menores pode, em certos casos, ser igualmente suprida pela administração de bens, conforme se dispõe no lugar respectivo.
1. Sem prejuízo do disposto n.º 2 do artigo 280.º, os negócios jurídicos celebrados pelo menor podem ser anulados:
a) A requerimento, conforme os casos, de quem exerça o poder paternal, do tutor ou do administrador de bens, desde que seja proposta no prazo de 1 ano a contar do conhecimento que o requerente haja tido do negócio impugnado, mas nunca depois de o menor atingir a maioridade ou ser emancipado, salvo o disposto no artigo 119.º;
b) A requerimento do próprio menor, no prazo de 1 ano a contar da sua maioridade ou emancipação;
c) A requerimento de qualquer herdeiro do menor, no prazo de 1 ano a contar da morte deste, ocorrida antes de expirar o prazo referido na alínea anterior.
2. A anulabilidade é sanável mediante confirmação do menor depois de atingir a maioridade ou ser emancipado, ou por confirmação de quem exerça o poder paternal, tutor ou administrador de bens, tratando-se de acto que algum deles pudesse celebrar livremente como representante do menor; tratando-se de acto para o qual o representante legal necessitasse de autorização do tribunal, pode o mesmo solicitar ao tribunal a sua confirmação, que a dará ou não atendendo aos interesses do menor.
Não é anulável o acto para cuja prática o menor tenha usado de meios fraudulentos com o fim de se fazer passar por maior ou emancipado, contanto que a contraparte tenha justificadamente acreditado na sua capacidade; para tanto não basta que o menor se tenha arrogado o estado de maior ou emancipado.
1. São excepcionalmente válidos, além de outros previstos na lei:
a) Os actos de administração ou disposição de bens que o maior de 16 anos haja adquirido por seu trabalho;
b) Os negócios jurídicos próprios da vida corrente do menor que, estando ao alcance da sua capacidade natural, só impliquem despesas, ou disposições de bens, de pequena importância;
c) Os negócios jurídicos relativos à profissão, arte ou ofício que o menor tenha sido autorizado pelo seu representante legal a exercer, ou os praticados no exercício dessa profissão, arte ou ofício.
2. Pelos actos relativos à profissão, arte ou ofício do menor e pelos actos praticados no exercício dessa profissão, arte ou ofício só respondem os bens de que o menor tiver a livre disposição.
A incapacidade dos menores termina quando eles atingem a maioridade ou são emancipados, salvas as restrições da lei.
Aquele que perfizer 18 anos de idade adquire plena capacidade de exercício de direitos, ficando habilitado a reger a sua pessoa e a dispor dos seus bens.
1. Estando, porém, pendente contra o menor, ao atingir a maioridade, acção de interdição ou inabilitação, manter-se-á o poder paternal ou a tutela até ao trânsito em julgado da respectiva sentença.
2. Os actos praticados pelo menor depois de atingir a maioridade, e antes do trânsito em julgado da sentença que ponha termo ao processo de interdição ou inabilitação, estão sujeitos ao regime do artigo 132.º
O menor é, de pleno direito, emancipado pelo casamento.
A emancipação atribui ao menor plena capacidade de exercício de direitos, habilitando-o a reger a sua pessoa e a dispor livremente dos seus bens como se fosse maior, salvo o disposto no artigo 1521.º
1. Podem ser interditos do exercício dos seus direitos todos aqueles que por anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira se mostrem incapazes de governar as suas pessoas e bens.
2. As interdições são aplicáveis a maiores ou emancipados; mas, no caso dos menores não emancipados, podem ser requeridas e decretadas dentro do ano anterior à maioridade, para produzirem os seus efeitos a partir do dia em que o menor se torne maior.
Sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes, o interdito é equiparado ao menor, sendo-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições que regulam a incapacidade por menoridade e fixam os meios de suprir o poder paternal.
1. A interdição pode ser requerida pelo cônjuge ou unido de facto do interditando, pelo tutor ou curador deste, por qualquer parente sucessível ou pelo Ministério Público.
2. Se o interditando estiver sob o poder paternal, só têm legitimidade para requerer a interdição os progenitores que exercerem aquele poder e o Ministério Público.
1. Em qualquer altura do processo pode ser nomeado um tutor provisório que celebre em nome do interditando, com autorização do tribunal, os actos cujo adiamento possa causar-lhe prejuízo.
2. Pode também ser decretada a interdição provisória, se houver necessidade urgente de providenciar quanto à pessoa e bens do interditando.
1. A tutela é deferida pela ordem seguinte:
a) Ao cônjuge do interdito, salvo se estiver separado de facto por culpa sua ou se for por outra causa legalmente incapaz;
b) À pessoa designada pelos pais ou pelo progenitor que exercer o poder paternal, em testamento ou documento autêntico ou autenticado;
c) Aos progenitores do interdito;
d) A qualquer dos filhos maiores do interdito que, de acordo com o interesse deste, o tribunal designar;
e) Ao unido de facto do interdito.
2. Quando não seja possível ou razões ponderosas desaconselhem o deferimento da tutela nos termos do número anterior, cabe ao tribunal designar o tutor, ouvido o conselho de família.
Recaindo a tutela sobre os progenitores, ou algum deles, estes exercem o poder paternal como se dispõe nos artigos 1733.º e seguintes da Secção correspondente.
O tutor deve cuidar especialmente da saúde do interdito, podendo para esse efeito alienar os bens deste, obtida, quando necessária, a autorização judicial.
1. O cônjuge do interdito, bem como os ascendentes ou descendentes deste, não podem escusar-se da tutela, nem ser dela exonerados, salvo se tiver havido violação do disposto no artigo 126.º
2. Os descendentes do interdito podem, contudo, ser exonerados a seu pedido ao fim de 5 anos, se existirem outros descendentes igualmente idóneos para o exercício do cargo.
À sentença de interdição definitiva é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1776.º e 1777.º
São anuláveis os negócios jurídicos celebrados pelo interdito depois do registo da sentença de interdição definitiva.
1. São igualmente anuláveis os negócios jurídicos celebrados pelo incapaz depois de anunciada a proposição da acção nos termos da lei de processo, contanto que a interdição venha a ser definitivamente decretada e se mostre que o negócio causou prejuízo ao interdito.
2. Para efeitos do número anterior a apreciação do prejuízo reporta-se ao momento da prática do acto.
3. O prazo dentro do qual a acção de anulação deve ser proposta só começa a contar-se a partir do registo da sentença.
Os negócios celebrados pelo incapaz antes de anunciada a proposição da acção são anuláveis se, à data da sua prática, se verificarem os pressupostos indicados no artigo 250.º
Cessando a causa que determinou a interdição, pode esta ser levantada a requerimento do próprio interdito ou das pessoas mencionadas no n.º 1 do artigo 124.º
Podem ser inabilitados os indivíduos cuja anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira, embora de carácter permanente, não seja de tal modo grave que justifique a sua interdição, assim como aqueles que, pela sua habitual prodigalidade ou pelo abuso de bebidas alcoólicas ou de estupefacientes, se mostrem incapazes de reger convenientemente o seu património.
1. Os inabilitados são assistidos por um curador, a cuja autorização estão sujeitos os actos de disposição de bens entre vivos e todos os que, em atenção às circunstâncias de cada caso, forem especificados na sentença.
2. A autorização do curador pode ser judicialmente suprida.
1. A administração do património do inabilitado pode ser entregue pelo tribunal, no todo ou em parte, ao curador.
2. Neste caso, haverá lugar à constituição do conselho de família e designação do vogal que, como subcurador, exerça as funções que na tutela cabem ao protutor.
3. O curador deve prestar contas da sua administração.
Quando a inabilitação tiver por causa a prodigalidade ou o abuso de bebidas alcoólicas ou de estupefacientes, o seu levantamento não será deferido sem que haja decorrido um período mínimo de prova, considerado adequado de acordo com as leges artis, de reabilitação do inabilitado.
Em tudo quanto se não ache especialmente regulado nesta subsecção é aplicável à inabilitação, com as necessárias adaptações, o regime das interdições.
As disposições da presente secção são aplicáveis às associações, às fundações, e ainda às sociedades, quando a analogia das situações o justifique.
1. As associações constituídas pela forma legal, com as especificações referidas no n.º 1 do artigo 156.º, gozam de personalidade jurídica.
2. As fundações adquirem personalidade jurídica pelo reconhecimento, o qual é individual e da competência da autoridade administrativa designada pela lei.
É aplicável à constituição de pessoas colectivas o disposto no artigo 273.º, devendo o Ministério Público promover a declaração judicial da nulidade.
A sede da pessoa colectiva é a que os respectivos estatutos fixarem ou, na falta de designação estatutária, o lugar em que funciona normalmente a administração principal.
1. A capacidade das pessoas colectivas abrange todos os direitos e obrigações necessários ou convenientes à prossecução dos seus fins.
2. Exceptuam-se os direitos e obrigações vedados por lei ou que sejam inseparáveis da personalidade singular.
1. Os estatutos da pessoa colectiva designarão os respectivos órgãos, entre os quais haverá um órgão colegial de administração e um conselho fiscal, ambos eles constituídos por um número ímpar de titulares, dos quais um será o presidente.
2. Compete ao órgão de administração:
a) Gerir a pessoa colectiva;
b) Apresentar um relatório anual da administração;
c) Representar a pessoa colectiva, em juízo e fora dele, ou designar quem por ele o faça, salvo quando os estatutos determinem de modo distinto; e
d) Cumprir as demais obrigações constantes da lei e dos estatutos.
3. A designação de representantes por parte do órgão de administração só é oponível a terceiros quando se prove que estes a conheciam.
4. Compete ao conselho fiscal:
a) Fiscalizar a actuação do órgão de administração da pessoa colectiva;
b) Verificar o património da pessoa colectiva;
c) Elaborar um relatório anual sobre a sua acção fiscalizadora; e
d) Cumprir as demais obrigações constantes da lei e dos estatutos.
5. O conselho fiscal pode exigir do órgão de administração os meios necessários ou convenientes ao cumprimento das suas funções.
1. As deliberações dos órgãos das pessoas colectivas deverão constar de livros de actas próprios de cada órgão, os quais deverão estar disponíveis para consulta.
2. As deliberações, quando invocadas pelo órgão que as tomou ou pela pessoa colectiva, só podem ser provadas pelas actas respectivas.
3. As actas devem conter:
a) O local, dia, hora e ordem de trabalhos da reunião;
b) O nome de quem presidiu à reunião;
c) O teor das deliberações propostas e o resultado das respectivas votações;
d) A menção do sentido de voto de algum titular do órgão que assim o requeira; e
e) A assinatura dos vários titulares presentes do órgão ou, tratando-se de assembleia geral de associação, a assinatura de quem presida à reunião ou à reunião seguinte.
1. O órgão de administração e o conselho fiscal são convocados pelos respectivos presidentes e só podem deliberar com a presença da maioria dos seus titulares.
2. Salvo disposição legal ou estatutária em contrário, as deliberações são tomadas por maioria de votos dos titulares presentes, tendo o presidente, além do seu voto, direito a voto de desempate.
1. Os estatutos podem prever a possibilidade de as reuniões dos órgãos da pessoa colectiva decorrerem em simultâneo em diferentes locais, através de videoconferência ou outro meio análogo.
2. As reuniões efectuadas através desses meios têm de garantir uma correcta participação e imediação aos membros presentes nos diferentes locais em que a reunião decorre.
3. Na falta de indicação nos estatutos dos termos e condições em que as reuniões podem ser realizadas em simultâneo ou do órgão com competência para essa indicação, cabe à assembleia geral da associação e ao órgão de administração da fundação a competência para definir esses critérios.
1. As obrigações dos titulares dos órgãos das pessoas colectivas para com estas são definidas nos respectivos estatutos, aplicando-se, na falta de disposições estatutárias, as regras do mandato com as necessárias adaptações.
2. Os titulares dos órgãos das pessoas colectivas respondem perante estas pelos danos que lhes causarem por actos ou omissões praticados com preterição de deveres legais ou estatutários, salvo se provarem que agiram sem culpa; nas associações os titulares dos corpos gerentes não são responsáveis para com a associação, se o acto ou omissão assentar em deliberação dos associados, ainda que anulável, ou se a deliberação tiver sido feita sob proposta dos associados.
3. Os titulares do órgão de administração e do conselho fiscal não podem abster-se de votar nas deliberações tomadas em reuniões a que estejam presentes, e são responsáveis pelos prejuízos delas decorrentes, salvo se houverem manifestado a sua discordância ou se se verificar uma das causas excludentes enunciadas no número anterior.
Os titulares dos órgãos das pessoas colectivas respondem, nos termos gerais, para com terceiros pelos danos que causem no exercício das suas funções.
O disposto nos dois artigos anteriores é aplicável, com as necessárias adaptações, aos mandatários e procuradores da pessoa colectiva.
As pessoas colectivas respondem civilmente pelos actos ou omissões dos titulares dos seus órgãos e dos seus agentes, procuradores ou mandatários nos mesmos termos em que os comitentes respondem pelos actos ou omissões dos seus comissários.
1. Extinta a pessoa colectiva, se existirem bens que lhe tenham sido doados ou deixados com qualquer encargo ou que estejam afectados a um certo fim, o tribunal, a requerimento do Ministério Público, dos liquidatários, de qualquer associado ou interessado, ou ainda de herdeiros do doador ou do autor da deixa testamentária, atribuí-los-á, com o mesmo encargo ou afectação, a outra pessoa colectiva.
2. Os bens não abrangidos pelo número anterior têm o destino que lhes for fixado pelos estatutos ou por deliberação dos associados, sem prejuízo do disposto em leis especiais; na falta de fixação ou de lei especial, o tribunal, a requerimento do Ministério Público, dos liquidatários ou de qualquer associado ou interessado, determinará que sejam atribuídos a outra pessoa colectiva ou ao território de Macau, assegurando, tanto quanto possível, a realização dos fins da pessoa extinta.
As associações são pessoas jurídicas de substrato pessoal que não têm por fim o lucro económico dos associados.
1. A todas as pessoas é reconhecido o direito de livremente se associarem.
2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação, nem ser obrigado por qualquer modo a permanecer na associação.
3. Os estatutos da associação podem exigir para a saída dos associados um pré-aviso, que, no entanto, nunca poderá ser superior a 3 meses.
1. O acto de constituição da associação especificará os bens ou serviços com que os associados concorrem para o património social, a denominação, fim e sede da pessoa colectiva.
2. Os estatutos podem especificar ainda, nos limites da lei, os direitos e obrigações dos associados, as condições da sua admissão, saída e exclusão, a forma do seu funcionamento, os termos da extinção da pessoa colectiva e consequente devolução do seu património, assim como a sua duração, quando a associação se não constitua por tempo indeterminado.
1. O acto de constituição da associação, os estatutos e as suas alterações devem constar de documento autenticado.
2. Porém, caso a transmissão dos bens afectados à associação no acto de constituição exija forma mais solene, a constituição da associação fica dependente da observância desta forma.
3. O acto de constituição, os estatutos e as suas alterações não produzem efeitos em relação a terceiros, enquanto não forem publicados por extracto no Boletim Oficial de Macau.
1. É a assembleia geral que elege os titulares dos órgãos da associação, sempre que os estatutos não estabeleçam outro processo de escolha.
2. As funções dos titulares eleitos ou designados são revogáveis, mas a revogação não prejudica os direitos fundados no acto de constituição.
3. O direito de revogação pode ser condicionado pelos estatutos à existência de justa causa.
1. Competem à assembleia geral todas as deliberações não compreendidas nas atribuições legais ou estatutárias de outros órgãos da associação.
2. São, necessariamente, da competência da assembleia geral a destituição dos titulares dos órgãos da associação, a aprovação do balanço, a alteração dos estatutos, a extinção da associação e a autorização para esta demandar os administradores por factos praticados no exercício do cargo.
1. A assembleia geral deve ser convocada pelo órgão de administração nas circunstâncias fixadas pelos estatutos e, em qualquer caso, uma vez em cada ano para aprovação do balanço.
2. A assembleia será ainda convocada sempre que a convocação seja requerida, com um fim legítimo, por um conjunto de associados não inferior à quinta parte da sua totalidade, se outro número não for estabelecido nos estatutos.
3. Se o órgão de administração não convocar a assembleia nos casos em que deve fazê-lo, a qualquer associado é lícito efectuar a convocação.
A assembleia geral é convocada por meio de carta registada, enviada com a antecedência mínima de 8 dias, ou mediante protocolo efectuado com a mesma antecedência; na convocatória indicar-se-á o dia, hora e local da reunião e a respectiva ordem de trabalhos.
1. As presenças dos associados às reuniões da assembleia geral devem constar de um livro de presenças, no qual devem ser incorporadas as listas de presença, de onde conste o nome dos associados presentes ou representados, bem como dos representantes destes.
2. As listas de presença, referidas no número anterior, devem ser assinadas pelos associados presentes e pelos representantes dos associados no início das reuniões.
1. A assembleia não pode deliberar, em primeira convocação, sem a presença de, pelo menos, metade dos seus associados.
2. Salvo o disposto nos números seguintes, as deliberações são tomadas por maioria absoluta de votos dos associados presentes.
3. As deliberações sobre alterações dos estatutos exigem o voto favorável de três quartos do número dos associados presentes.
4. As deliberações sobre a dissolução ou prorrogação da pessoa colectiva requerem o voto favorável de três quartos do número de todos os associados.
5. Os estatutos podem exigir um número de votos superior ao fixado nas regras anteriores.
1. O associado não pode votar, nem por si nem por meio de representante, nem representar outro associado numa votação, nas matérias em que haja conflito de interesses entre a associação e ele, seu cônjuge ou unido de facto, ascendentes ou descendentes.
2. As deliberações tomadas com infracção do disposto no número anterior são anuláveis se o voto do associado impedido for essencial à existência da maioria necessária.
1. São nulas as deliberações da assembleia geral:
a) Que sejam contrárias à ordem pública ou aos bons costumes ou a normas legais destinadas principal ou exclusivamente à tutela do interesse público;
b) Sobre matéria que não esteja, por lei ou por natureza, sujeita a deliberação dos associados;
c) Que não tenham sido aprovadas pelo número de votos exigido na lei ou estatutos; ou
d) Tomadas em assembleia geral não convocada, salvo o disposto no n.º 3.
2. Exceptuados os casos previstos no número anterior, as deliberações da assembleia geral contrárias à lei ou que violem os estatutos, seja pelo seu objecto, seja por virtude de irregularidades havidas na convocação dos associados ou no funcionamento da assembleia, são anuláveis.
3. A comparência de todos os associados na reunião sanciona quaisquer irregularidades da convocação, bem como a invalidade da deliberação tomada sobre matéria estranha à ordem de trabalhos, desde que nenhum deles se oponha à realização da assembleia ou ao aditamento.
1. Têm legitimidade para requerer a invalidade de uma deliberação da assembleia geral:
a) Qualquer associado que não tenha votado favoravelmente a deliberação;
b) Qualquer outro titular de interesse pessoal, directo e legítimo;
c) O órgão de administração;
d) O conselho fiscal;
e) Os titulares do órgão de administração e do conselho fiscal, se a execução da deliberação os puder fazer incorrer em responsabilidade penal ou civil;
f) O Ministério Público, nos casos da alínea a) do n.º 1 do artigo anterior.
2. As irregularidades da convocação e em geral as irregularidades procedimentais não podem ser invocadas senão pelos associados.
3. Sem prejuízo da aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 280.º relativamente às deliberações que careçam de execução:
a) A nulidade resultante da alínea d) do n.º 1 do artigo anterior só pode ser arguida dentro do prazo de 2 anos a contar da data em que a deliberação foi tomada;
b) A anulabilidade só pode ser arguida dentro do prazo de 6 meses a contar da data em que a deliberação foi tomada.
4. Tratando-se de associado que não foi convocado regularmente para a reunião da assembleia, o prazo só começa a correr a partir da data em que ele teve conhecimento da deliberação.
1. A declaração de nulidade ou a anulação das deliberações da assembleia não prejudica os direitos adquiridos de boa fé por terceiro, com fundamento em actos praticados em execução das deliberações.
2. Não há boa fé se os terceiros, à data da aquisição, conheciam ou deviam conhecer a causa da nulidade ou da anulabilidade.
1. Salvo disposição estatutária em contrário, a qualidade de associado não é transmissível, quer por acto entre vivos, quer por sucessão.
2. O associado não pode incumbir outrem de exercer os seus direitos pessoais.
3. Porém, salvo disposição estatutária que o proíba ou que alargue a faculdade de representação a não associados, o associado pode incumbir outro associado de o representar no exercício do direito de voto, através de documento escrito por ele assinado, donde conste a referência especificada à reunião ou ao tipo de assuntos sobre que a representação pode incidir.
4. O representante, nessa qualidade, não poderá nunca representar mais do que um décimo dos associados da associação.
O associado que por qualquer forma deixar de pertencer à associação não tem o direito de repetir as quotizações que haja pago e perde o direito ao património social, sem prejuízo da sua responsabilidade por todas as prestações relativas ao tempo em que foi membro da associação.
1. As associações extinguem-se:
a) Por deliberação da assembleia geral;
b) Pelo decurso do prazo, se tiverem sido constituídas temporariamente;
c) Pela verificação de qualquer outra causa extintiva prevista no acto de constituição ou nos estatutos;
d) Pelo falecimento ou desaparecimento de todos os associados; ou
e) Por decisão judicial que declare a sua insolvência.
2. As associações extinguem-se ainda por decisão judicial:
a) Quando o seu fim se tenha esgotado ou se haja tornado impossível;
b) Quando o seu fim real não coincida com o fim expresso no acto de constituição ou nos estatutos;
c) Quando o seu fim seja sistematicamente prosseguido por meios ilícitos; ou
d) Quando a sua existência se torne contrária à ordem pública.
1. Nos casos previstos nas alíneas b) e c) do n.° 1 do artigo anterior, a extinção só se produzirá se, nos 30 dias seguintes à data em que devia operar-se, a assembleia geral não decidir a prorrogação da associação ou a modificação dos estatutos.
2. Nos casos previstos no n.º 2 do artigo anterior, a declaração da extinção pode ser pedida em juízo pelo Ministério Público, ou por qualquer interessado.
3. A extinção por virtude da declaração de insolvência dá-se em consequência da própria declaração.
4. A extinção da associação deve ser oficiosamente comunicada à entidade administrativa competente para organizar o registo das associações, pelo tribunal ou pelo órgão de administração, conforme a extinção seja ou não determinada por decisão judicial.
1. Extinta a associação, os poderes dos seus órgãos ficam limitados à prática dos actos meramente conservatórios e dos necessários, quer à liquidação do património social, quer à ultimação dos negócios pendentes; pelos actos restantes e pelos danos que deles advenham à associação respondem solidariamente os administradores que os praticarem.
2. Pelas obrigações que os administradores contraírem, a associação só responde perante terceiros se estes estavam de boa fé e à extinção não tiver sido dada a devida publicidade.
As fundações são pessoas jurídicas de substrato patrimonial com fins de interesse social.
1. As fundações podem ser instituídas por acto entre vivos ou por testamento, valendo como aceitação dos bens a elas destinados, num caso ou noutro, o reconhecimento respectivo.
2. O reconhecimento pode ser requerido pelo instituidor, seus herdeiros ou executores testamentários, ou ser oficiosamente promovido pela autoridade competente.
3. A instituição por acto entre vivos deve constar de documento autenticado subscrito pelo instituidor e torna-se irrevogável logo que seja requerido o reconhecimento ou principie o respectivo processo oficioso; porém, caso a transmissão dos bens afectados à fundação no acto de instituição exija forma mais solene, a instituição entre vivos da fundação fica dependente da observância desta forma.
4. Aos herdeiros do instituidor não é permitido revogar a instituição, sem prejuízo do disposto acerca da sucessão legitimária.
5. Os estatutos da fundação e suas alterações estão sujeitos à forma prevista na primeira parte do n.º 3.
6. O acto de instituição da fundação, os estatutos e as suas alterações não produzem efeitos em relação a terceiros, enquanto não forem publicados no Boletim Oficial de Macau; a publicação só é passível de ser efectuada após o acto de reconhecimento ou da homologação estatutária.
1. No acto de instituição deve o instituidor indicar o fim da fundação e especificar os bens que lhe são destinados.
2. No acto de instituição ou nos estatutos pode o instituidor providenciar ainda sobre a sede, organização e funcionamento da fundação, regular os termos da sua transformação ou extinção e fixar o destino dos respectivos bens.
1. Na falta de estatutos lavrados pelo instituidor ou na insuficiência deles, constando a instituição de testamento, é aos executores deste que compete elaborá-los ou completá-los.
2. A elaboração total ou parcial dos estatutos incumbe à autoridade competente para o reconhecimento da fundação, quando:
a) Tratando-se de instituição não constante de testamento, o instituidor os não tenha feito ou, tendo embora previsto no acto de instituição o processo para a sua elaboração, haja decorrido mais de 1 ano sem que os estatutos estejam lavrados;
b) Tratando-se de instituição efectuada por testamento, os executores testamentários os não lavrem dentro do ano posterior à abertura da sucessão.
3. Na elaboração dos estatutos ter-se-á em conta, na medida do possível, a vontade real ou presumível do fundador.
1. Não será reconhecida a fundação cujo fim não for considerado de interesse social pela entidade competente.
2. Será igualmente negado o reconhecimento, quando os bens afectados à fundação se mostrem insuficientes para a prossecução do fim visado e não haja fundadas expectativas de suprimento da insuficiência.
3. Negado o reconhecimento por insuficiência do património, fica a instituição sem efeito, se o instituidor for vivo; mas, se já houver falecido, serão os bens entregues a uma associação ou fundação de fins análogos, que a entidade competente para o reconhecimento designar, salvo disposição do instituidor em sentido distinto.
1. Os estatutos estão sujeitos a homologação por parte da entidade competente para o reconhecimento.
2. Se, decorridos 30 dias sobre o pedido de homologação, a entidade competente não se pronunciar, considera-se o pedido tacitamente aceite, contanto que a fundação já tenha sido reconhecida.
3. Os estatutos da fundação podem a todo o tempo ser modificados pelo órgão de administração, ou através de outro órgão indicado nos mesmos, contanto que não haja alteração essencial do fim da instituição e se não contrarie a vontade do fundador.
4. Aplica-se às modificações estatutárias o disposto nos n.os 1 e 2, devidamente adaptados.
1. Mediante proposta escrita do órgão com competência para proceder a alterações dos estatutos, e depois de ouvido o fundador, se for vivo, a entidade competente para o reconhecimento pode atribuir à fundação um fim diferente:
a) Quando tiver sido inteiramente preenchido o fim para que foi instituída ou este se tiver tornado impossível;
b) Quando o fim da instituição deixar de revestir interesse social; ou
c) Quando o património se tornar insuficiente para a realização do fim previsto.
2. A mudança do fim da fundação está sujeita a publicação no Boletim Oficial de Macau, sob pena de não produção de efeitos em relação a terceiros.
3. O novo fim deve aproximar-se, no que for possível, do fim fixado pelo fundador.
4. Não há lugar à mudança de fim, se o acto de instituição prescrever a extinção da fundação.
1. Estando o património da fundação onerado com encargos cujo cumprimento impossibilite ou dificulte gravemente o preenchimento do fim institucional, pode o órgão de administração da fundação, depois de obtido o acordo da entidade competente para o reconhecimento, suprimir, reduzir ou comutar esses encargos, ouvido o fundador, se for vivo.
2. Se, porém, o encargo tiver sido motivo essencial da instituição, pode-se, mediante o mesmo processo, considerar o seu cumprimento como fim da fundação, ou incorporar a fundação noutra pessoa colectiva capaz de satisfazer o encargo à custa do património incorporado, sem prejuízo dos seus próprios fins.
1. As fundações extinguem-se:
a) Pelo decurso do prazo, se tiverem sido constituídas temporariamente;
b) Pela verificação de qualquer outra causa extintiva prevista no acto de instituição; ou
c) Por decisão judicial que declare a sua insolvência.
2. As fundações extinguem-se ainda por decisão judicial:
a) Quando o seu fim se tenha esgotado ou se haja tornado impossível;
b) Quando o seu fim real não coincida com o fim expresso no acto de instituição;
c) Quando o seu fim seja sistematicamente prosseguido por meios ilícitos; ou
d) Quando a sua existência se torne contrária à ordem pública.
1. Nos casos previstos no n.º 2 do artigo anterior, a declaração da extinção pode ser pedida em juízo pelo Ministério Público, ou por qualquer interessado.
2. A extinção por virtude da declaração de insolvência dá-se em consequência da própria declaração.
3. Quando ocorra alguma das causas extintivas previstas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo anterior, o órgão de administração da fundação comunicará o facto à entidade administrativa competente para organizar o registo das fundações, bem como à autoridade competente para o reconhecimento, a fim de esta tomar as providências que julgue convenientes para a liquidação do património.
4. A decisão judicial que implique a extinção da fundação será oficiosamente comunicada pelo tribunal às entidades referidas no número anterior.
Extinta a fundação, na falta de providências especiais em contrário tomadas pela autoridade competente para o seu reconhecimento, é aplicável o disposto no artigo 172.º
1. As sociedades são pessoas jurídicas de substrato pessoal, cujos membros se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em comum de certa actividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa actividade ou de proporcionarem uma economia.
2. As sociedades são civis ou comerciais.
3. São civis as sociedades que não tenham por objecto o exercício de uma empresa comercial, nem adoptem expressamente um dos tipos de sociedades comerciais; são comerciais todas as outras.
4. A lei especial pode prever a possibilidade de constituição de sociedades unipessoais.
1. O regime das sociedades comerciais consta de lei especial.
2. As sociedades civis ficam sujeitas ao regime estabelecido para as sociedades em nome colectivo, salvo no que for incompatível com a natureza não comercial do seu objecto ou pressuponha a qualidade de empresário comercial.
1. À organização interna e à administração das associações sem personalidade jurídica são aplicáveis as regras estabelecidas pelos associados e, na sua falta, as disposições legais relativas às associações, exceptuadas as que pressupõem a personalidade destas.
2. As limitações impostas aos poderes normais dos administradores só são oponíveis a terceiro quando este as conhecia ou devia conhecer.
3. À saída dos associados é aplicável o disposto no artigo 169.º
1. As contribuições dos associados e os bens com elas adquiridos constituem o fundo comum da associação.
2. Enquanto a associação subsistir, nenhum associado pode exigir a divisão do fundo comum e nenhum credor dos associados tem o direito de o fazer excutir.
1. As liberalidades em favor de associações sem personalidade jurídica consideram-se feitas aos respectivos associados, nessa qualidade, salvo se o autor tiver condicionado a deixa ou doação à aquisição da personalidade jurídica; neste caso, se tal aquisição se não verificar dentro do prazo de 1 ano, fica a disposição sem efeito.
2. Os bens deixados ou doados à associação sem personalidade jurídica acrescem ao fundo comum independentemente de outro acto de transmissão.
1. Pelas obrigações validamente assumidas em nome da associação responde o fundo comum e, na falta ou insuficiência deste, o património daquele que as tiver contraído; sendo o acto praticado por mais de uma pessoa, respondem todas solidariamente.
2. Na falta ou insuficiência do fundo comum e do património dos associados directamente responsáveis, têm os credores acção contra os restantes associados, que respondem proporcionalmente à sua entrada para o fundo comum.
3. A representação em juízo do fundo comum cabe àqueles que tiverem assumido a obrigação.
As comissões constituídas para realizar qualquer plano de socorro ou beneficência, ou promover a execução de obras públicas, monumentos, festivais, exposições, festejos e actos semelhantes, se não se constituírem como associações dotadas de personalidade jurídica, ficam sujeitas, na falta de lei em contrário, às disposições dos artigos seguintes.
1. Os membros da comissão e os encarregados de administrar os seus fundos são pessoal e solidariamente responsáveis pela conservação dos fundos recolhidos e pela sua afectação ao fim anunciado.
2. Os membros da comissão respondem ainda, pessoal e solidariamente, pelas obrigações contraídas em nome dela.
3. Os subscritores só podem exigir o valor que tiverem subscrito quando se não cumpra, por qualquer motivo, o fim para que a comissão foi constituída.
1. Se os fundos angariados forem insuficientes para o fim anunciado, ou se este se mostrar impossível, ou restar algum saldo depois de satisfeito o fim da comissão, os bens terão a aplicação prevista no acto constitutivo da comissão ou no programa anunciado.
2. Se nenhuma aplicação tiver sido prevista e a comissão não quiser aplicar os bens a um fim análogo, cabe à autoridade administrativa competente prover sobre o seu destino, respeitando na medida do possível a intenção dos subscritores.
1. Diz-se coisa toda a realidade autónoma, externa à pessoa, dotada de utilidade e susceptível de ser objecto de relações jurídicas a título de domínio.
2. Consideram-se, porém, fora do comércio todas as coisas que não podem ser objecto de direitos privados, tais como as que se encontram no domínio público.
3. São bens do domínio público:
a) As estradas e praias;
b) Os canais, lagoas e cursos de água navegáveis ou flutuáveis, com os respectivos leitos;
c) As camadas aéreas superiores ao território acima do limite reconhecido ao proprietário ou superficiário;
d) Os jazigos minerais, as nascentes de água mineromedicionais, as cavidades naturais subterrâneas existentes no subsolo, com excepção das rochas, terras comuns e outros materiais habitualmente usados na construção;
e) Os terrenos e outros bens, como tais classificados em legislação especial.
4. O regime dos bens do domínio público está sujeito a legislação especial.
As coisas classificam-se, nomeadamente, em coisas imóveis ou móveis, fungíveis ou não fungíveis, consumíveis ou não consumíveis, divisíveis ou indivisíveis, principais ou acessórias, presentes ou futuras.
1. São coisas imóveis:
a) Os prédios rústicos e urbanos;
b) As águas;
c) As árvores, os arbustos e os frutos naturais, enquanto estiverem ligados ao solo;
d) As partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos.
2. Entende-se por prédio rústico uma parte delimitada do solo e as construções nele existentes que não tenham autonomia económica, e por prédio urbano qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe sirvam de logradouro.
3. Os direitos reais inerentes às coisas imóveis estão sujeitos, salvo disposição em contrário, ao regime dos imóveis.
4. Os negócios jurídicos que tenham por fim a aquisição de coisas consideradas imóveis apenas enquanto se encontrem ligadas a outras coisas imóveis estão sujeitos às regras dos negócios sobre móveis quando as partes as considerem nesta qualidade.
1. São móveis todas as coisas não compreendidas no artigo anterior.
2. Às coisas móveis sujeitas a registo público é aplicável o regime das coisas móveis em tudo o que não seja especialmente regulado.
São fungíveis as coisas que se determinam pelo seu género, qualidade e quantidade, quando constituam objecto de relações jurídicas.
São consumíveis as coisas cujo uso regular importa a sua destruição ou a sua alienação.
São divisíveis as coisas que podem ser fraccionadas sem alteração da sua substância, diminuição de valor ou prejuízo para o uso a que se destinam.
1. Partes componentes de uma coisa são aquelas que formam a coisa e sem as quais esta não existe ou é imperfeita.
2. Partes integrantes de uma coisa são todas as coisas móveis por natureza, ligadas materialmente a uma coisa com carácter de permanência, que não sejam partes componentes.
1. São coisas acessórias, ou pertenças, as coisas móveis que, não constituindo partes componentes ou integrantes, estão afectadas por forma duradoura ao serviço ou ornamentação de uma outra coisa.
2. Os negócios jurídicos que têm por objecto a coisa principal não abrangem, salvo declaração em contrário, as coisas acessórias.
1. As coisas futuras dividem-se em absolutamente futuras e relativamente futuras.
2. São coisas absolutamente futuras as que ainda não existem ao tempo da declaração negocial.
3. São coisas relativamente futuras as que, embora já tenham existência, não estão em poder do disponente, ou a que este não tem direito, ao tempo da declaração negocial.
4. O negócio considera-se sobre coisa futura quando as partes a tomem nessa qualidade.
1. É havida como uma universalidade de facto a pluralidade de coisas móveis dotadas de autonomia física que, pertencendo à mesma pessoa, têm um destino unitário.
2. As coisas singulares que constituem a universalidade podem ser objecto de relações jurídicas próprias.
1. Diz-se fruto de uma coisa tudo o que ela produz periodicamente, sem prejuízo da sua substância.
2. Os frutos são naturais ou civis; dizem-se naturais os que provêm directamente da coisa, e civis as rendas ou interesses que a coisa produz em consequência de uma relação jurídica.
3. Consideram-se frutos das universalidades de animais as crias não destinadas à substituição das cabeças que por qualquer causa vierem a faltar, os despojos, e todos os proventos auferidos, ainda que a título eventual.
1. Os que têm direito aos frutos naturais até um momento determinado, ou a partir de certo momento, fazem seus todos os frutos percebidos durante a vigência do seu direito.
2. Quanto a frutos civis, a partilha faz-se proporcionalmente à duração do direito.
Quem colher prematuramente frutos naturais é obrigado a restituí-los, se vier a extinguir-se o seu direito antes da época normal das colheitas.
1. Quem for obrigado por lei à restituição de frutos percebidos tem direito a ser indemnizado das despesas de cultura, sementes e matérias-primas e dos restantes encargos de produção e colheita, desde que não sejam superiores ao valor desses frutos.
2. Quando se trate de frutos pendentes, o que é obrigado à entrega da coisa não tem direito a qualquer indemnização, salvo nos casos especialmente previstos na lei.
1. Consideram-se benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa.
2. As benfeitorias são necessárias, úteis ou voluptuárias.
3. São benfeitorias necessárias as que têm por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa; úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe aumentam, todavia, o valor; voluptuárias as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação nem lhe aumentando o valor, servem apenas para recreio do benfeitorizante.
1. A declaração negocial pode ser expressa ou tácita: é expressa, quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro modo directo de manifestação da vontade, e tácita, quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam.
2. O carácter formal da declaração não impede que ela seja emitida tacitamente, desde que a forma tenha sido observada quanto aos factos de que a declaração se deduz.
O silêncio só vale como declaração negocial quando esse valor lhe seja atribuído por lei, uso ou convenção.
A validade da declaração negocial não depende da observância de forma especial, salvo quando a lei a exigir.
A declaração negocial que careça da forma legalmente prescrita é nula, quando outra não seja a sanção especialmente prevista na lei.
1. As estipulações verbais acessórias anteriores ao documento legalmente exigido para a declaração negocial, ou contemporâneas dele, são nulas, salvo quando a razão determinante da forma lhes não seja aplicável e se prove que correspondem à vontade do autor da declaração.
2. As estipulações posteriores ao documento só estão sujeitas à forma legal prescrita para a declaração se as razões da exigência especial da lei lhes forem aplicáveis.
1. Se a forma escrita não for exigida por lei, mas tiver sido adoptada pelo autor da declaração, as estipulações verbais acessórias anteriores ao escrito, ou contemporâneas dele, são válidas, quando se mostre que correspondem à vontade do declarante e a lei as não sujeite à forma escrita.
2. As estipulações verbais posteriores ao documento são válidas, excepto se, para o efeito, a lei exigir a forma escrita.
1. Podem as partes estipular uma forma especial para a declaração; presume-se, neste caso, que as partes se não querem vincular senão pela forma convencionada.
2. Se, porém, a forma só for convencionada depois de o negócio estar concluído ou no momento da sua conclusão, e houver fundamento para admitir que as partes se quiseram vincular desde logo, presume-se que a convenção teve em vista a consolidação do negócio, ou qualquer outro efeito, mas não a sua substituição.
1. A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada.
2. É também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida.
3. A declaração recebida pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida é ineficaz.
1. A declaração pode ser feita mediante anúncio publicado num dos jornais da residência do declarante, quando se dirija a pessoa desconhecida ou cujo paradeiro seja por aquele ignorado.
2. Para tanto, essa publicação, quando for realizada em Macau, deverá ser efectuada em jornal publicado na língua oficial do território de Macau mais utilizada pelo destinatário; sendo esta desconhecida, deverá ser feita em dois jornais, um em cada uma das duas línguas oficiais.
3. Se o destinatário não compreender qualquer destas línguas, e esse facto for do conhecimento do declarante, a declaração só poderá ser efectuada em jornal publicado em língua conhecida do declaratário.
1. A morte ou incapacidade do declarante, posterior à emissão da declaração, não prejudica a eficácia desta, salvo se o contrário resultar da própria declaração.
2. A declaração é ineficaz, se o declarante, enquanto o destinatário não a receber ou dela não tiver conhecimento, perder o poder de disposição do direito a que ela se refere.
1. Quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte.
2. A responsabilidade prescreve nos termos do artigo 491.º
1. A proposta de contrato obriga o proponente nos termos seguintes:
a) Se for fixado pelo proponente ou convencionado pelas partes um prazo para aceitação, a proposta mantém-se até o prazo findar;
b) Se não for fixado prazo, mas o proponente pedir resposta imediata, a proposta mantém-se até que, em condições normais, esta e a aceitação cheguem ao seu destino;
c) Se não for fixado prazo e a oferta for efectuada oralmente a pessoa presente, a proposta caduca se a aceitação não for feita de seguida;
d) Se não for fixado prazo e a proposta for feita a pessoa ausente ou, por escrito, a pessoa presente, manter-se-á até 5 dias depois do prazo que resulta do preceituado na alínea b).
2. O disposto no número anterior não prejudica o direito de revogação da proposta nos termos em que a revogação é admitida no artigo 222.º
3. Os contratos efectuados ao telefone, ou através de outro meio similar de comunicação directa à distância, são considerados feitos entre presentes, se as partes ou os seus representantes comunicaram pessoalmente.
1. Se o proponente receber a aceitação tardiamente, pode ainda assim considerar eficaz a resposta tardia, desde que não haja razões para admitir que ela foi expedida fora de tempo.
2. Nos casos do número anterior o proponente deve avisar imediatamente o aceitante sobre se considera o contrato concluído, sob pena de este se ter por não concluído e de responder pelo prejuízo havido.
3. Fora os casos em que a resposta tardia haja sido correctamente considerada eficaz, a formação do contrato depende de nova proposta e nova aceitação.
1. Salvo declaração em contrário, a proposta de contrato é irrevogável depois de ser recebida pelo destinatário ou de ser dele conhecida.
2. Se, porém, ao mesmo tempo que a proposta, ou antes dela, o destinatário receber a retractação do proponente ou tiver por outro meio conhecimento dele, fica a proposta sem efeito.
3. A revogação da proposta, quando dirigida ao público, é eficaz, desde que seja feita na forma da oferta ou em forma equivalente.
1. Não obsta à conclusão do contrato a morte ou incapacidade do proponente, excepto se houver fundamento para presumir que outra teria sido a sua vontade.
2. A morte do destinatário determina a ineficácia da proposta, excepto se houver fundamento para presumir que outra teria sido a vontade do declarante.
3. A incapacidade do destinatário, quando desconhecida do proponente aquando do envio da proposta, determina igualmente a ineficácia da mesma, desde que haja fundamento objectivo para presumir, face ao teor do negócio, que essa teria sido a vontade do declarante.
1. O contrato não fica concluído enquanto as partes não houverem acordado em todas as cláusulas sobre as quais qualquer delas tenha julgado necessário o acordo.
2. Se as partes tiverem deixado pendente a negociação de determinados pontos secundários, mas tiverem revelado, por meio do começo de execução ou por outra qualquer forma, uma vontade inequívoca de se vincularem ao contrato nos termos negociados, este considera-se concluído, aplicando-se as regras de integração quanto aos pontos omissos.
A aceitação com aditamentos, limitações ou outras modificações importa rejeição da proposta; mas, se a modificação for suficientemente precisa, equivale a nova proposta, contanto que outro sentido não resulte da declaração.
Quando a proposta, a própria natureza ou circunstância do negócio, ou os usos tornem dispensável a comunicação da aceitação, tem-se o contrato por concluído logo que a conduta da outra parte mostre a intenção de aceitar a proposta.
1. Se o destinatário rejeitar a proposta, mas depois a aceitar, prevalece a aceitação, desde que esta chegue ao poder do proponente, ou seja dele conhecida, ao mesmo tempo que a rejeição, ou antes dela.
2. A aceitação pode ser revogada mediante declaração que ao mesmo tempo, ou antes dela, chegue ao poder do proponente ou seja dele conhecida.
1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.
2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida.
Em caso de dúvida sobre o sentido da declaração, prevalece, nos negócios gratuitos, o menos gravoso para o disponente e, nos onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das prestações.
1. Nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso.
2. Esse sentido pode, todavia, valer se corresponder à vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem a essa validade.
1. Na falta de norma supletiva, e não estando estabelecido pelas partes o processo de preenchimento das lacunas da declaração negocial, esta deve ser integrada de harmonia com a vontade que as partes teriam tido se houvessem previsto o ponto omisso, ou de acordo com os ditames da boa fé, quando outra seja a solução por eles imposta.
2. Em casos excepcionais a norma supletiva poderá ceder perante a vontade que as partes teriam tido se houvessem previsto o ponto omisso, quando seja essa a solução imposta pelos ditames da boa fé.
1. Se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado.
2. O negócio simulado é nulo.
1. Quando sob o negócio simulado exista um outro que as partes quiseram realizar, é aplicável a este o regime que lhe corresponderia se fosse concluído sem dissimulação, não sendo a sua validade prejudicada pela nulidade do negócio simulado.
2. Se, porém, o negócio dissimulado for de natureza formal, só é válido se tiver sido observada a forma exigida por lei.
3. Para efeitos do número anterior, considera-se suficiente a observância no negócio simulado da forma exigida para o dissimulado, contanto que as razões determinantes da forma do negócio dissimulado não se oponham a essa validade.
1. Sem prejuízo do disposto no artigo 279.°, a nulidade do negócio simulado pode ser arguida pelos próprios simuladores entre si, ainda que a simulação seja fraudulenta.
2. A nulidade pode também ser invocada pelos herdeiros legitimários que pretendam agir em vida do autor da sucessão contra os negócios por ele simuladamente feitos com o intuito de os prejudicar.
1. A nulidade proveniente da simulação não pode ser arguida contra terceiro de boa fé que do titular aparente adquiriu direitos sobre o bem que foi objecto do negócio simulado.
2. A boa fé consiste na ignorância da simulação ao tempo em que foram constituídos os respectivos direitos.
3. Considera-se sempre de má fé o terceiro que adquiriu o direito posteriormente ao registo da acção de simulação, quando a este haja lugar.
1. A nulidade proveniente da simulação não pode ser arguida pelos simuladores contra os credores do titular aparente que de boa fé hajam procedido a actos de execução ou similares sobre os bens que foram objecto do negócio simulado.
2. Os credores do simulado alienante prevalecem na arguição da simulação sobre os credores comuns do simulado adquirente, contanto que o seu crédito seja anterior à simulação e estes últimos ainda não tenham procedido, de boa fé, a actos de execução ou similares.
1. Há reserva mental, sempre que é emitida uma declaração contrária à vontade real com o intuito de enganar o declaratário.
2. A reserva não prejudica a validade da declaração, excepto se for conhecida do declaratário; neste caso, a reserva tem os efeitos da simulação.
1. A declaração não séria, feita na expectativa de que a falta de seriedade não seja desconhecida, carece de qualquer efeito.
2. Se, porém, a declaração for feita em circunstâncias que induzam o declaratário a aceitar justificadamente a sua seriedade, ele tem o direito de ser indemnizado pelo prejuízo que sofrer.
1. A declaração não produz qualquer efeito, se o declarante:
a) Não tiver qualquer vontade de acção;
b) Agindo sem culpa, não tiver a consciência de fazer uma declaração negocial; ou
c) For coagido por força física ou psíquica irresistível a emiti-la, de tal modo que à declaração não corresponda qualquer vontade.
2. Para efeitos da alínea b) do número anterior, considera-se que a falta de consciência da declaração foi devida a culpa do declarante, quando seja razoável supor que este, se tivesse usado da diligência exigível no comércio jurídico, se teria apercebido de estar a emitir uma declaração com valor negocial.
3. Se a falta de vontade de acção for devida a culpa do declarante, este fica obrigado a indemnizar o declaratário, nos termos do n.º 1 do artigo 219.º
1. A declaração negocial é anulável por erro essencial do declarante, desde que o erro fosse cognoscível pelo declaratário ou tenha sido causado por informações prestadas por este.
2. O erro é essencial quando:
a) Tenha recaído sobre os motivos determinantes da vontade do errante, de tal modo que este, caso tivesse tido conhecimento da verdade, não teria celebrado o negócio ou, a celebrá-lo, só o teria feito em termos substancialmente distintos; e
b) Uma pessoa razoável colocada na posição do errante, caso tivesse tido conhecimento da verdade, não teria celebrado o negócio ou, a celebrá-lo, só o teria feito em termos substancialmente distintos.
3. O erro considera-se cognoscível quando, face ao conteúdo e circunstâncias do negócio e à situação das partes, uma pessoa de normal diligência colocada na posição do declaratário se podia ter apercebido dele.
4. Contudo, o negócio não pode ser invalidado se o risco da verificação do erro foi aceite pelo declarante ou, em face das circunstâncias, o deveria ter sido, ou ainda quando o erro tenha sido devido a culpa grosseira do declarante.
Ainda que o erro não preencha as condições da alínea b) do n.º 2 do artigo anterior, o mesmo é ainda causa de anulação do negócio:
a) Se as partes houverem reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo; ou
b) Se, verificando-se os demais pressupostos constantes do artigo anterior, o declaratário conhecia ou não devia ignorar a essencialidade para o declarante do elemento sobre que incidiu o erro.
A anulabilidade fundada em erro não procede, se o declaratário aceitar o negócio como o declarante o teria querido caso não tivesse incorrido em erro.
O disposto nos artigos 240.º a 242.º é igualmente aplicável, com as necessárias adaptações, quando, em virtude de erro na declaração ou na sua transmissão, a vontade declarada ou transmitida não corresponda à vontade real do autor da declaração.
O simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá direito à rectificação desta.
Quando o erro recair sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio, o negócio pode ser anulado ou modificado de acordo com o disposto no artigo 431.º, aplicável com as necessárias adaptações.
1. Entende-se por dolo qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante.
2. Não constituem dolo relevante as sugestões ou artifícios usuais, considerados legítimos segundo as concepções dominantes no comércio jurídico, desde que não contrários à boa fé, nem a dissimulação do erro, quando nenhum dever de elucidar o declarante resulte da lei, de estipulação negocial ou daquelas concepções.
1. O declarante cuja vontade tenha sido determinada por dolo pode anular a declaração; a anulabilidade não é excluída pelo facto de o dolo ser bilateral.
2. Quando o dolo provier de terceiro, a declaração só é anulável se o destinatário tinha ou devia ter conhecimento dele; mas, se alguém tiver adquirido directamente algum direito por virtude da declaração, esta é anulável em relação ao beneficiário, se tiver sido ele o autor do dolo ou se o conhecia ou devia ter conhecido.
1. Diz-se feita sob coacção moral a declaração negocial determinada pelo receio de um mal de que o declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração.
2. A ameaça tanto pode respeitar à pessoa como à honra ou património do declarante ou de terceiro.
3. Não constitui coacção a ameaça do exercício normal de um direito nem o simples temor reverencial.
A declaração negocial extorquida por coacção é anulável, ainda que esta provenha de terceiro; neste caso, porém, é necessário que seja grave o mal e justificado o receio da sua consumação.
1. A declaração negocial feita por quem, devido a qualquer causa, se encontrava acidentalmente incapacitado de entender o sentido dela ou não tinha o livre exercício da sua vontade é anulável, desde que o facto seja notório ou conhecido do declaratário.
2. O facto é notório, quando uma pessoa de normal diligência o teria podido notar.
O negócio jurídico realizado pelo representante em nome do representado, nos limites dos poderes que lhe competem, produz os seus efeitos na esfera jurídica deste último.
1. À excepção dos elementos em que tenha sido decisiva a vontade do representado, é na pessoa do representante que deve verificar-se, para efeitos de nulidade ou anulabilidade da declaração, a falta ou vício da vontade, bem como o conhecimento ou ignorância dos factos que podem influir nos efeitos do negócio.
2. Ao representado de má fé não aproveita a boa fé do representante.
1. Se uma pessoa dirigir em nome de outrem uma declaração a terceiro, pode este exigir que o representante, dentro de prazo razoável, faça prova dos seus poderes, sob pena de a declaração não produzir efeitos.
2. Se os poderes de representação constarem de documento, pode o terceiro exigir uma cópia dele assinada pelo representante.
1. É anulável o negócio celebrado pelo representante consigo mesmo, seja em nome próprio, seja em representação de terceiro, a não ser que o representado tenha especificadamente consentido na celebração, ou que o negócio exclua por sua natureza a possibilidade de um conflito de interesses.
2. Considera-se celebrado pelo representante, para o efeito do número anterior, o negócio realizado por aquele em quem tiverem sido substabelecidos os poderes de representação.
1. Diz-se procuração o acto pelo qual alguém atribui a outrem, voluntariamente, poderes representativos.
2. Salvo disposição legal em contrário, a procuração revestirá a forma exigida para o negócio que o procurador deva realizar.
3. As procurações que exijam intervenção notarial são formalizadas nos termos da legislação respectiva.
O procurador não necessita de ter mais do que a capacidade de entender e querer exigida pela natureza do negócio que haja de efectuar.
1. O procurador só pode fazer-se substituir por outrem se o representado o permitir ou se a faculdade de substituição resultar do conteúdo da procuração ou da relação jurídica que a determina.
2. A substituição não envolve exclusão do procurador primitivo, salvo declaração em contrário.
3. Sendo autorizada a substituição, o procurador só é responsável para com o representado se tiver agido com culpa na escolha do substituto ou nas instruções que lhe deu.
4. O procurador pode servir-se de auxiliares na execução da procuração, se outra coisa não resultar do negócio ou da natureza do acto que haja de praticar.
1. A procuração extingue-se quando o procurador a ela renuncia, ou quando cessa a relação jurídica que lhe serve de base, excepto se outra for, neste caso, a vontade do representado.
2. A procuração é livremente revogável pelo representado, não obstante convenção em contrário ou renúncia ao direito de revogação.
3. Mas, se a procuração tiver sido conferida também no interesse do procurador ou de terceiro, não pode ser revogada sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa.
4. A apreciação da questão de saber se a procuração foi conferida no interesse do procurador ou de terceiro é feita com base em critérios objectivos, mas a declaração desse facto na procuração cria uma presunção nesse sentido, embora ilidível mediante simples contraprova.
1. As modificações e a revogação da procuração devem ser levadas ao conhecimento de terceiros por meios idóneos, sob pena de lhes não serem oponíveis senão quando se mostre que delas tinham conhecimento no momento da conclusão do negócio.
2. As restantes causas extintivas da procuração não podem ser opostas a terceiro que, sem culpa, as tenha ignorado.
1. O representante deve restituir o documento de onde constem os seus poderes, logo que a procuração tiver caducado.
2. O representante não goza do direito de retenção do documento.
1. O negócio que uma pessoa, sem poderes de representação, celebre em nome de outrem é ineficaz em relação a este, se não for por ele ratificado.
2. Contudo, o negócio celebrado por representante sem poderes é eficaz em relação ao representado, independentemente de ratificação, se tiverem existido razões ponderosas, objectivamente apreciadas, tendo em conta as circunstâncias do caso, que justificassem a confiança do terceiro de boa fé na legitimidade do representante, desde que o representado tenha conscientemente contribuído para fundar a confiança do terceiro.
3. A ratificação está sujeita à forma exigida para a procuração e tem eficácia retroactiva, sem prejuízo dos direitos de terceiro.
4. Considera-se negada a ratificação, se não for feita dentro do prazo que a outra parte fixar para o efeito.
5. Enquanto o negócio não for ratificado, tem a outra parte a faculdade de o revogar ou rejeitar, salvo se, no momento da conclusão, conhecia a falta de poderes do representante.
O disposto no artigo anterior é aplicável ao caso de o representante ter abusado dos seus poderes, se a outra parte conhecia ou devia conhecer o abuso.
As partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução: no primeiro caso, diz-se suspensiva a condição; no segundo, resolutiva.
1. É nulo o negócio jurídico subordinado a uma condição contrária à lei ou à ordem pública, ou ofensiva dos bons costumes.
2. É igualmente nulo o negócio sujeito a uma condição suspensiva que seja física ou legalmente impossível; se for resolutiva, tem-se a condição por não escrita.
Aquele que contrair uma obrigação ou alienar um direito sob condição suspensiva, ou adquirir um direito sob condição resolutiva, deve agir, na pendência da condição, segundo os ditames da boa fé, por forma que não comprometa a integridade do direito da outra parte.
Na pendência da condição suspensiva, o adquirente do direito pode praticar actos conservatórios, e igualmente os pode realizar, na pendência da condição resolutiva, o devedor ou o alienante condicional.
1. A eficácia ou ineficácia dos actos de disposição dos bens ou direitos que constituem objecto do negócio condicional, realizados na pendência da condição, fica dependente da eficácia ou ineficácia do próprio negócio, salvo estipulação em contrário.
2. Se houver lugar à restituição do que tiver sido alienado, é aplicável, directamente ou por analogia, o disposto nos artigos 1194.º e seguintes em relação ao possuidor de boa fé.
1. A certeza de que a condição se não pode verificar equivale à sua não verificação.
2. Se a verificação da condição for impedida, contra as regras da boa fé, por aquele a quem prejudica, tem-se por verificada; se for provocada, nos mesmos termos, por aquele a quem aproveita, considera-se como não verificada.
Os efeitos do preenchimento da condição retrotraem-se à data da conclusão do negócio, a não ser que, pela vontade das partes ou pela natureza do acto, hajam de ser reportados a outro momento.
1. Sendo a condição resolutiva aposta a um contrato de execução continuada ou periódica, é aplicável o disposto no n.º 2 do artigo 428.º
2. O preenchimento da condição não prejudica a validade dos actos de administração ordinária realizados, enquanto a condição estiver pendente, pela parte a quem incumbir o exercício do direito.
3. À aquisição de frutos pela parte a que se refere o número anterior são aplicáveis as disposições relativas à aquisição de frutos pelo possuidor de boa fé.
Se for estipulado que os efeitos do negócio jurídico comecem ou cessem a partir de certo momento, é aplicável à estipulação, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 265.º e 266.º
À fixação do termo são aplicáveis, em caso de dúvidas, as seguintes regras:
a) Se o termo se referir ao princípio, meio ou fim do mês, entende-se como tal, respectivamente, o primeiro dia, o dia 15 e o último dia do mês; se for fixado no princípio, meio ou fim do ano, entende-se, respectivamente, o primeiro dia do ano, o dia 30 de Junho e o 31 de Dezembro;
b) Na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr, e este termina às 24 horas do dia correspondente ao termo, ou no final dos 60 minutos da última hora, caso seja fixado em horas;
c) O prazo fixado em semanas, meses ou anos, a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data; mas, se no último mês não existir dia correspondente, o prazo finda no último dia do mês;
d) É havido, respectivamente, como prazo de 1 ou 2 dias o designado por 24 ou 48 horas;
e) O prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias de feriados são equiparadas as férias judiciais, bem como os dias em que as secretarias dos tribunais se encontrem fechadas, se o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo.
1. É nulo o negócio jurídico cujo objecto seja física ou legalmente impossível, contrário à lei ou indeterminável.
2. É nulo o negócio contrário à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes.
Se apenas o fim do negócio jurídico for contrário à lei ou à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes, o negócio só é nulo quando o fim for comum a ambas as partes.
1. É anulável, por usura, o negócio jurídico, quando alguém, aproveitando conscientemente a situação de necessidade, inépcia, inexperiência, ligeireza, relação de dependência, estado mental ou fraqueza de carácter de outrem, obtiver deste, para si ou para terceiro, a promessa ou a concessão de benefícios que, atendendo às circunstâncias do caso, sejam manifestamente excessivos ou injustificados.
2. Fica ressalvado o regime especial estabelecido nos artigos 553.º e 1073.º
1. Em lugar da anulação, o lesado pode requerer a modificação do negócio segundo juízos de equidade.
2. Requerida a anulação, a parte contrária tem a faculdade de opor-se ao pedido, declarando aceitar a modificação do negócio nos termos do número anterior.
Quando o negócio usurário constituir crime, o prazo para o exercício do direito de anulação ou modificação não termina enquanto o crime não prescrever; e, se a responsabilidade criminal se extinguir por causa diferente da prescrição ou na acção penal for proferida sentença que transite em julgado, aquele prazo conta-se da data da extinção da responsabilidade criminal ou daquela em que a sentença transitar em julgado, salvo se se contar a partir de momento posterior, por força do disposto no n.º 1 do artigo 280.º
Na falta de regime especial, são aplicáveis à nulidade e à anulabilidade do negócio jurídico as disposições dos artigos seguintes.
A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal.
1. Só têm legitimidade para arguir a anulabilidade as pessoas em cujo interesse a lei a estabelece, e só dentro do ano seguinte à cessação do vício que lhe serve de fundamento.
2. Enquanto, porém, o negócio não estiver cumprido, pode a anulabilidade ser arguida, sem dependência de prazo, tanto por via de acção como por via de excepção.
1. A anulabilidade é sanável mediante confirmação.
2. A confirmação compete à pessoa a quem pertencer o direito de anulação, e só é eficaz quando for posterior à cessação do vício que serve de fundamento à anulabilidade e o seu autor tiver conhecimento do vício e do direito à anulação.
3. A confirmação pode ser expressa ou tácita e não depende de forma especial.
4. A confirmação tem eficácia retroactiva, mesmo em relação a terceiro.
1. Tanto a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.
2. Tendo alguma das partes alienado gratuitamente coisa que devesse restituir, e não podendo exigir-se ou tornar-se efectiva essa restituição contra o adquirente, nem se podendo tornar efectiva contra o alienante a restituição do valor dela, fica o adquirente obrigado em lugar daquele, mas só na medida do seu enriquecimento.
3. É aplicável em qualquer dos casos previstos nos números anteriores, directamente ou por analogia, o disposto nos artigos 1194.º e seguintes.
As obrigações recíprocas de restituição que incumbem às partes por força da nulidade ou anulação do negócio devem ser cumpridas simultaneamente, sendo extensivas ao caso, na parte aplicável, as normas relativas à excepção de não cumprimento do contrato.
1. A declaração de nulidade ou a anulação do negócio jurídico que respeite a bens imóveis, ou a móveis sujeitos a registo, não prejudica os direitos adquiridos sobre os mesmos bens, a título oneroso, por terceiro de boa fé, se o registo da aquisição do terceiro for anterior ao registo da acção de nulidade ou anulação ou ao registo do acordo entre as partes acerca da invalidade do negócio.
2. Preenchidos os pressupostos do número anterior, os terceiros que tenham adquirido direitos de quem, nos termos constantes do registo, tivesse legitimidade para a sua disposição só vêm os seus direitos reconhecidos se a acção de nulidade ou anulação não for proposta e registada dentro do ano posterior à conclusão do negócio inválido.
3. Caso à data da aquisição do terceiro não existisse qualquer registo relativamente ao bem em causa, os direitos do terceiro só são reconhecidos se a acção de nulidade ou anulação não for proposta e registada dentro dos 3 anos posteriores à conclusão do negócio inválido.
4. É considerado de boa fé o terceiro adquirente que no momento da aquisição desconhecia, sem culpa, o vício do negócio nulo ou anulável.
A nulidade ou anulação parcial não determina a invalidade de todo o negócio, salvo quando se mostre que este não teria sido concluído sem a parte viciada.
O negócio nulo ou anulado pode converter-se num negócio de tipo ou conteúdo diferente, do qual contenha os requisitos essenciais de substância e de forma, quando o fim prosseguido pelas partes permita supor que elas o teriam querido, se tivessem previsto a invalidade.
Os negócios jurídicos celebrados contra disposição legal de carácter imperativo são nulos, salvo nos casos em que outra solução resulte da lei.
Aos actos jurídicos que não sejam negócios jurídicos são aplicáveis, na medida em que a analogia das situações o justifique, as disposições do capítulo anterior.
As regras constantes do artigo 272.º são aplicáveis, na falta de disposição especial em contrário, aos prazos e termos fixados por lei, pelos tribunais ou por qualquer outra autoridade.
1. A lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar.
2. A lei que fixar um prazo mais longo é igualmente aplicável aos prazos que já estejam em curso, mas computar-se-á neles todo o tempo decorrido desde o seu momento inicial.
3. O disposto nos números anteriores é extensivo, na parte aplicável, aos prazos fixados pelos tribunais ou por qualquer autoridade.
1. Estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição.
2. Quando, por força da lei ou por vontade das partes, se estabeleça que um direito deve ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição.
3. Os direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, superfície e servidão não prescrevem, mas podem extinguir-se pelo não uso nos casos especialmente previstos na lei, sendo aplicáveis nesses casos, na falta de disposição em contrário, as regras da caducidade.
1. Se a lei considerar de caducidade um prazo que a lei anterior tratava como prescricional, ou se, ao contrário, considerar como prazo de prescrição o que a lei antiga tratava como caso de caducidade, a nova qualificação é também aplicável aos prazos em curso.
2. No primeiro caso, porém, se a prescrição estiver suspensa ou tiver sido interrompida no domínio da lei antiga, nem a suspensão nem a interrupção serão atingidas pela aplicação da nova lei; no segundo, o prazo passa a ser susceptível de suspensão e interrupção nos termos gerais da prescrição.
São nulos os negócios jurídicos destinados a modificar os prazos legais da prescrição ou a facilitar ou dificultar por outro modo as condições em que a prescrição opera os seus efeitos.
A prescrição aproveita a todos os que dela possam tirar benefício, sem excepção dos incapazes.
1. A renúncia da prescrição só é admitida depois de haver decorrido o prazo prescricional.
2. A renúncia pode ser tácita e não necessita de ser aceite pelo beneficiário.
3. Só tem legitimidade para renunciar à prescrição quem puder dispor do benefício que a prescrição tenha criado.
1. O tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita ou pelo seu representante.
2. Tratando-se de incapaz, a prescrição também pode ser invocada pelo Ministério Público.
1. Completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito.
2. A prescrição do direito principal implica igualmente a prescrição do direito a juros e outros direitos acessórios.
3. Não pode, contudo, ser repetida a prestação realizada espontaneamente em cumprimento de uma obrigação prescrita, ainda quando feita com ignorância da prescrição; este regime é aplicável a quaisquer formas de satisfação do direito prescrito, bem como ao seu reconhecimento ou à prestação de garantias.
4. No caso de venda com reserva de propriedade até ao pagamento do preço, se prescrever o crédito do preço, pode o vendedor, não obstante a prescrição, exigir a restituição da coisa quando o preço não seja pago.
1. A prescrição é invocável pelos credores e por terceiros com legítimo interesse na sua declaração, ainda que o devedor a ela tenha renunciado.
2. Se, porém, o devedor tiver renunciado, a prescrição só pode ser invocada pelos credores desde que se verifiquem os requisitos exigidos para a impugnação pauliana.
3. Se, demandado o devedor, este não alegar a prescrição e for condenado, o caso julgado não afecta o direito reconhecido aos seus credores.
1. O prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido; se, porém, o beneficiário da prescrição só estiver obrigado a cumprir decorrido certo tempo sobre a interpelação, só findo esse tempo se inicia o prazo da prescrição.
2. A prescrição de direitos sujeitos a condição suspensiva ou termo inicial só começa depois de a condição se verificar ou o termo se vencer.
3. Se for estipulado que o devedor cumprirá quando puder, ou o prazo for deixado ao arbítrio do devedor, a prescrição só começa a correr depois da morte dele ou, caso se trate de pessoa colectiva, da sua extinção.
4. Se a dívida for ilíquida, a prescrição começa a correr desde que ao credor seja lícito promover a liquidação; promovida a liquidação, a prescrição do resultado líquido começa a correr desde que seja feito o seu apuramento por acordo ou sentença transitada em julgado.
1. Tratando-se de renda perpétua ou vitalícia ou de outras prestações periódicas análogas, a prescrição do direito unitário do credor corre desde a exigibilidade da primeira prestação que não for paga.
2. Prescrito o direito unitário, considera-se também prescrita cada uma das prestações, ainda que o prazo de prescrição relativamente a alguma ou algumas das prestações individuais ainda não haja decorrido.
1. Depois de iniciada, a prescrição continua a correr, ainda que o direito passe para novo titular.
2. Se a dívida for assumida por terceiro, a prescrição continua a correr em benefício dele, a não ser que a assunção importe reconhecimento interruptivo da prescrição.
O prazo ordinário da prescrição é de 15 anos.
Prescrevem no prazo de 5 anos:
a) As anuidades de rendas perpétuas ou vitalícias;
b) As rendas e alugueres devidos pelo locatário, ainda que pagos por uma só vez;
c) Os juros convencionais ou legais, ainda que ilíquidos, e os dividendos das sociedades;
d) As quotas de amortização do capital pagáveis com os juros;
e) As pensões alimentícias vencidas;
f) Quaisquer outras prestações periodicamente renováveis.
1. O direito para cuja prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença transitada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo.
2. Quando, porém, a sentença ou o outro título se referir a prestações ainda não devidas, a prescrição continua a ser, em relação a elas, a de curto prazo.
As prescrições de que trata a presente subsecção fundam-se na presunção de cumprimento.
1. A presunção de cumprimento pelo decurso do prazo só pode ser ilidida por confissão do devedor originário ou daquele a quem a dívida tiver sido transmitida por sucessão.
2. A confissão extrajudicial só releva quando for realizada por escrito.
Considera-se confessada a dívida se o devedor se recusar a depor ou a prestar juramento no tribunal, ou praticar em juízo actos incompatíveis com a presunção de cumprimento.
As obrigações sujeitas a prescrição presuntiva estão subordinadas, nos termos gerais, às regras da prescrição ordinária.
Prescrevem no prazo de 6 meses os créditos de estabelecimentos de alojamento, comidas ou bebidas, pelo alojamento, comidas ou bebidas que forneçam, sem prejuízo do disposto na alínea a) do artigo seguinte.
Prescrevem no prazo de 2 anos:
a) Os créditos dos estabelecimentos que forneçam alojamento, ou alojamento e alimentação, a estudantes, bem como os créditos dos estabelecimentos de ensino, educação, assistência ou tratamento, relativamente aos serviços prestados;
b) Os créditos dos comerciantes pelos objectos vendidos a quem não seja comerciante ou os não destine ao seu comércio, e bem assim os créditos daqueles que exerçam profissionalmente uma indústria, pelo fornecimento de mercadorias ou produtos, execução de trabalhos ou gestão de negócios alheios, incluindo as despesas que hajam efectuado, a menos que a prestação se destine ao exercício industrial do devedor;
c) Os créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões liberais e pelo reembolso das despesas correspondentes.
1. A prescrição não se completa:
a) Entre os cônjuges ou unidos de facto, antes de 2 anos após o termo da relação de casamento ou da união de facto;
b) Entre quem exerça o poder paternal e as pessoas a ele sujeitas, entre o tutor e o tutelado ou entre o curador e o curatelado, antes de 2 anos após o termo das respectivas relações que dão causa à suspensão; esse prazo é ampliado para 4 anos para os créditos do menor e do tutelado sobre quem exerça o poder paternal e sobre o tutor;
c) Entre quem presta o trabalho doméstico e o respectivo empregador, por todos os créditos, bem como entre as partes de quaisquer outros tipos de relações laborais, relativamente aos créditos destas emergentes, antes de 2 anos corridos sobre o termo do contrato de trabalho;
d) Entre as pessoas cujos bens estejam sujeitos, por lei ou por determinação judicial ou de terceiro, à administração de outrem e aquelas que exercem a administração, antes de 2 anos após terem sido aprovadas as contas finais;
e) Entre as pessoas colectivas e os respectivos administradores, relativamente à responsabilidade destes pelo exercício dos seus cargos, antes de 2 anos após o termo do exercício do cargo de administrador;
f) Entre o credor e o devedor, sendo este usufrutuário do crédito ou tendo direito de penhor sobre ele, antes de 2 anos após a extinção do usufruto ou do penhor.
2. Porém, os prazos de suspensão indicados no número anterior consideram-se reduzidos aos prazos normais de prescrição das relações jurídicas em causa, sempre que sejam superiores a estes.
1. Salvo se respeitar a actos para os quais o menor tenha capacidade, a prescrição contra menores não se completa sem terem decorrido 2 anos sobre a data em que o menor passou a ter representante legal ou administrador dos seus bens, ou adquiriu plena capacidade.
2. É igualmente aplicável o disposto no n.º 2 do artigo anterior.
3. Fica sempre ressalvado o direito de o menor reclamar a responsabilidade civil contra o representante legal ou administrador de bens, cuja negligência haja dado causa à prescrição.
4. O disposto nos números anteriores é aplicável aos interditos e inabilitados que não tenham capacidade para exercer o seu direito, com a diferença de que a incapacidade se considera finda, caso não tenha cessado antes, passados 3 anos sobre o termo do prazo que seria aplicável se a suspensão se não houvesse verificado.
1. A prescrição suspende-se durante o tempo em que o titular estiver impedido de fazer valer o seu direito, por motivo de força maior, no decurso dos últimos 3 meses do prazo, não se completando nunca antes de decorrido 1 mês após o termo da causa de suspensão.
2. Se o titular não tiver exercido o seu direito em consequência de dolo do obrigado, é aplicável o disposto no número anterior.
A prescrição de direitos da herança ou contra ela não se completa antes de decorridos 6 meses depois de haver pessoa por quem ou contra quem os direitos possam ser invocados.
1. A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.
2. Se a citação ou notificação se não fizer dentro de 5 dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os 5 dias.
3. A anulação da citação ou notificação não impede o efeito interruptivo previsto nos números anteriores.
4. É equiparado à citação ou notificação, para efeitos deste artigo, qualquer outro meio judicial, com excepção do mencionado no número seguinte, pelo qual se dê conhecimento do acto àquele contra quem o direito pode ser exercido.
5. A notificação judicial avulsa em que se exprima a intenção de vir a exercer o direito não interrompe o prazo de prescrição, mas impede que o prazo se complete antes de decorridos 2 meses sobre a notificação; se, por causa não imputável ao requerente, a notificação não se fizer dentro de 5 dias após ser requerida, tem-se por efectuada decorrido esse prazo.
6. A uma notificação judicial avulsa que alargue o prazo da prescrição não se pode seguir uma nova notificação com os mesmos efeitos.
1. O compromisso arbitral interrompe a prescrição relativamente ao direito que se pretende tornar efectivo.
2. Havendo cláusula compromissória ou sendo o julgamento arbitral determinado por lei, a prescrição considera-se interrompida quando se verifique algum dos casos previstos no artigo anterior.
1. A prescrição é ainda interrompida pelo reconhecimento do direito, efectuado perante o respectivo titular por aquele contra quem o direito pode ser exercido.
2. O reconhecimento tácito só é relevante quando resulte de factos que inequivocamente o exprimam.
1. A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.os 1 e 3 do artigo seguinte.
2. A nova prescrição está sujeita ao prazo da prescrição primitiva, salvo o disposto no artigo 304.º
1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo.
2. Quando, porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada deserta, ou fique sem efeito o compromisso arbitral, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo.
3. Se, por motivo processual não imputável ao titular do direito, o réu for absolvido da instância ou ficar sem efeito o compromisso arbitral, e o prazo da prescrição tiver entretanto terminado ou terminar nos 2 meses imediatos ao trânsito em julgado da decisão ou da verificação do facto que torna ineficaz o compromisso, não se considera completada a prescrição antes de findarem estes 2 meses.
O prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine.
O prazo de caducidade, se a lei não fixar outra data, começa a correr no momento em que o direito puder legalmente ser exercido.
1. São válidos os negócios pelos quais se criem casos especiais de caducidade, se modifique o regime legal desta ou se renuncie a ela, contanto que não se trate de matéria subtraída à disponibilidade das partes ou de fraude às regras legais da prescrição.
2. São aplicáveis aos casos convencionais de caducidade, na dúvida acerca da vontade dos contraentes, as disposições relativas à suspensão da prescrição.
1. Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo.
2. Quando, porém, se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direito disponível, impede também a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido.
1. Quando a caducidade se referir ao direito de propor certa acção em juízo e esta tiver sido tempestivamente proposta, é aplicável o disposto no n.º 3 do artigo 319.º; mas, se o prazo fixado para a caducidade for inferior a 2 meses, é substituído por ele o designado nesse preceito.
2. Nos casos previstos na primeira parte do número anterior, se a instância se tiver interrompido, não se conta para efeitos de caducidade o prazo decorrido entre a proposição da acção e a interrupção da instância.
1. A caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em qualquer fase do processo, se for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes.
2. Se for estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes, é aplicável à caducidade o disposto no artigo 296.º
É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.
1. Havendo colisão de direitos iguais ou da mesma espécie, devem os titulares ceder na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior detrimento para qualquer das partes.
2. Se os direitos forem desiguais ou de espécie diferente, prevalece o que deva em concreto considerar-se superior.
1. É lícito o recurso à força com o fim de realizar ou assegurar o próprio direito, quando a acção directa for indispensável, pela impossibilidade de recorrer em tempo útil aos meios coercivos normais, para evitar a inutilização prática desse direito, contanto que o agente não exceda o que for necessário para evitar o prejuízo.
2. A acção directa pode consistir na apropriação, destruição ou deterioração de uma coisa, na eliminação da resistência irregularmente oposta ao exercício do direito, ou noutro acto análogo.
3. A acção directa não é lícita, quando sacrifique interesses superiores aos que o agente visa realizar ou assegurar.
1. Considera-se justificado o acto destinado a afastar qualquer agressão actual e contrária à lei contra a pessoa ou património do agente ou de terceiro, desde que não seja possível fazê-lo pelos meios normais e o prejuízo causado pelo acto não seja manifestamente superior ao que pode resultar da agressão.
2. O acto considera-se igualmente justificado, ainda que haja excesso de legítima defesa, se o excesso for devido a perturbação, medo ou susto não culposo do agente.
Se o titular do direito agir na suposição errónea de se verificarem os pressupostos que justificam a acção directa ou a legítima defesa, é obrigado a indemnizar o prejuízo causado, salvo se o erro for desculpável.
1. É lícito o acto praticado como meio adequado para afastar um perigo actual que ameace interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiro, quando:
a) A situação de perigo não tenha sido voluntariamente criada pelo agente, salvo quando se trate de proteger o interesse de terceiro;
b) Haja sensível superioridade do interesse a salvaguardar relativamente ao interesse sacrificado; e
c) Seja razoável impor ao lesado o sacrifício do seu interesse em atenção à natureza ou ao valor do interesse ameaçado.
2. O autor é, todavia, obrigado a indemnizar o lesado pelo prejuízo sofrido, se o perigo for provocado por sua culpa exclusiva; em qualquer outro caso, o tribunal pode fixar uma indemnização equitativa e condenar nela não só o agente, como aqueles que tiraram proveito do acto ou contribuíram para o estado de necessidade.
1. O acto lesivo dos direitos de outrem é lícito, desde que este tenha consentido na lesão.
2. O consentimento do lesado não exclui, porém, a ilicitude do acto, quando este for contrário a uma proibição legal ou aos bons costumes.
3. Tem-se por consentida a lesão, quando esta se deu no interesse do lesado e de acordo com a sua vontade presumível.
1. O tribunal, em acréscimo à condenação do devedor no cumprimento da prestação a que o credor tenha contratualmente direito, à cominação de pôr termo à violação de direitos absolutos ou à condenação na obrigação de indemnizar, pode, a requerimento do titular do direito violado, condenar o devedor a pagar ao ofendido uma quantia pecuniária por cada dia, semana ou mês de atraso culposo no cumprimento da decisão ou por cada infracção culposa, conforme se mostre mais conveniente às circunstâncias do caso; a culpa no atraso do cumprimento presume-se.
2. A sanção pecuniária compulsória não pode ser estabelecida para o período anterior ao trânsito em julgado da sentença que a ordene, nem para o período anterior à liquidação da indemnização, salvo se o devedor for condenado por ter interposto recurso com fins meramente dilatórios, caso em que a aplicação da sanção é reportada à data da notificação da decisão que a tenha cominado.
3. A sanção pecuniária compulsória só será cominada quando o tribunal a considere justificada e será fixada segundo a equidade, atendendo à condição económica do devedor, à gravidade da infracção e à sua adequação às finalidades de compulsão ao cumprimento.
4. Não é aplicável a sanção pecuniária compulsória nos casos em que tenha sido estabelecida uma cláusula penal compulsória com os mesmos fins, ou nas decisões em que se condene o devedor no cumprimento de uma prestação de facto infungível, positivo ou negativo, que exija especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, a que o credor tenha contratualmente direito.
As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos.
1. Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
2. A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita.
3. Em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos do direito.
1. Nas acções de simples apreciação negativa, compete ao réu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga.
2. Nas acções que devam ser propostas dentro de certo prazo a contar da data em que o autor teve conhecimento de determinado facto, cabe ao réu a prova de o prazo ter já decorrido, salvo se outra for a solução especialmente consignada na lei.
3. Se o direito invocado pelo autor estiver sujeito a condição suspensiva ou a termo inicial, cabe-lhe a prova de que a condição se verificou ou o termo se venceu; se o direito estiver sujeito a condição resolutiva ou a termo final, cabe ao réu provar a verificação da condição ou o vencimento do prazo.
1. As regras dos artigos anteriores invertem-se, quando haja presunção legal, dispensa ou liberação do ónus da prova, ou convenção válida nesse sentido, e, de um modo geral, sempre que a lei o determine.
2. Há também inversão do ónus da prova, quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado, sem prejuízo das sanções que a lei de processo mande especialmente aplicar à desobediência ou às falsas declarações.
1. É nula a convenção que inverta o ónus da prova, quando se trate de direito indisponível ou a inversão torne excessivamente difícil a uma das partes o exercício do direito.
2. É nula, nas mesmas condições, a convenção que excluir algum meio legal de prova ou admitir um meio de prova diverso dos legais; mas, se as determinações legais quanto à prova tiverem por fundamento razões de ordem pública, a convenção é nula em quaisquer circunstâncias.
Salvo o disposto no artigo seguinte, à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torná-los duvidosos; se o conseguir, é a questão decidida contra a parte onerada com a prova.
A prova legal plena só pode ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela for objecto, sem prejuízo de outras restrições especialmente determinadas na lei.
1. Àquele que invocar direito consuetudinário ou direito exterior ao território de Macau compete fazer a prova da sua existência e conteúdo; mas o tribunal deve procurar, oficiosamente, obter o respectivo conhecimento.
2. O conhecimento oficioso incumbe também ao tribunal, sempre que este tenha de decidir com base no direito consuetudinário ou no direito exterior ao território de Macau e nenhuma das partes o tenha invocado, ou a parte contrária tenha reconhecido a sua existência e conteúdo ou não haja deduzido oposição.
3. Na impossibilidade de determinar o conteúdo do direito aplicável, o tribunal recorrerá às regras do direito comum de Macau.
Presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.
1. Quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz.
2. As presunções legais podem, todavia, ser ilididas mediante prova em contrário, excepto nos casos em que a lei o proibir.
As presunções judiciais só são admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal.
Confissão é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária.
1. A confissão só é eficaz quando feita por pessoa com capacidade e poder para dispor do direito a que o facto confessado se refira.
2. A confissão feita pelo litisconsorte é eficaz, se o litisconsórcio for voluntário, embora o seu efeito se restrinja ao interesse do confitente; mas não o é, se o litisconsórcio for necessário.
3. A confissão feita por um substituto processual não é eficaz contra o substituído.
A confissão não faz prova contra o confitente:
a) Se for declarada insuficiente por lei ou recair sobre facto cujo reconhecimento ou investigação a lei proíba;
b) Se recair sobre factos relativos a direitos indisponíveis; ou
c) Se o facto confessado for impossível ou notoriamente inexistente.
1. A confissão pode ser judicial ou extrajudicial.
2. Confissão judicial é a feita em juízo, competente ou não, mesmo quando arbitral, e ainda que o processo seja de jurisdição voluntária.
3. A confissão feita num processo só vale como judicial nesse processo; a realizada em qualquer procedimento preliminar ou incidental só vale como confissão judicial na acção correspondente.
4. Confissão extrajudicial é a feita por algum modo diferente da confissão judicial.
1. A confissão judicial espontânea pode ser feita nos articulados, segundo as prescrições da lei processual, ou em qualquer outro acto do processo, firmado pela parte pessoalmente ou por procurador especialmente autorizado.
2. A confissão judicial provocada pode ser feita em depoimento de parte ou em prestações de informações ou esclarecimentos ao tribunal.
1. A declaração confessória deve ser inequívoca, salvo se a lei o dispensar.
2. Se for ordenado o depoimento de parte ou comparecimento desta para prestação de informações ou esclarecimentos, mas ela não comparecer ou se recusar a depor ou a prestar as informações ou esclarecimentos, sem provar justo impedimento, ou responder que não se recorda ou nada sabe, o tribunal apreciará livremente o valor da conduta da parte para efeitos probatórios.
1. A confissão judicial escrita tem força probatória plena contra o confitente.
2. A confissão extrajudicial, em documento autêntico ou particular, considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária ou a quem a represente, tem força probatória plena.
3. A confissão extrajudicial não constante de documento não pode ser provada por testemunhas nos casos em que não é admitida a prova testemunhal; quando esta seja admitida, a força probatória da confissão é livremente apreciada pelo tribunal.
4. A confissão judicial que não seja escrita e a confissão extrajudicial feita a terceiro ou contida em testamento são apreciadas livremente pelo tribunal.
1. A confissão, judicial ou extrajudicial, pode ser declarada nula ou anulada, nos termos gerais, por falta ou vícios da vontade, mesmo depois do trânsito em julgado da decisão, se ainda não tiver caducado o direito de pedir a sua anulação.
2. O erro, desde que seja essencial, não tem de satisfazer os requisitos exigidos para a anulação dos negócios jurídicos.
Se a declaração confessória, judicial ou extrajudicial, for acompanhada da narração de outros factos ou circunstâncias tendentes a infirmar a eficácia do facto confessado ou a modificar ou extinguir os seus efeitos, a parte que dela quiser aproveitar-se como prova plena tem de aceitar também como verdadeiros os outros factos ou circunstâncias, salvo se provar a sua inexactidão.
O reconhecimento de factos desfavoráveis, que não possa valer como confissão, vale como elemento probatório que o tribunal apreciará livremente.
Prova documental é a que resulta de documento; diz-se documento qualquer objecto elaborado pelo homem com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto.
1. Os documentos escritos podem ser autênticos ou particulares.
2. Autênticos são os documentos exarados, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos limites da sua competência ou, dentro do círculo de actividade que lhe é atribuído, por notário ou por oficial público provido de fé pública; todos os outros documentos são particulares.
3. Os documentos particulares são havidos por autenticados, quando confirmados pelas partes, perante notário, nos termos prescritos nas leis notariais.
1. Quando a lei exigir, como forma da declaração negocial, documento autêntico, autenticado ou particular, não pode este ser substituído por outro meio de prova ou por outro documento que não seja de força probatória superior.
2. Se, porém, resultar claramente da lei que o documento é exigido apenas para prova da declaração, pode ser substituído por confissão expressa, judicial ou extrajudicial, contanto que, neste último caso, a confissão conste de documento de igual ou superior valor probatório.
1. Os documentos autênticos ou particulares passados fora do território de Macau, na conformidade da lei do local onde foram passados, fazem prova como o fariam os documentos da mesma natureza exarados em Macau.
2. Contudo, e salvo disposição em contrário, quando o tribunal tenha fundadas dúvidas acerca da autenticidade do documento ou da autenticidade do seu reconhecimento, a força probatória do documento é apreciada livremente pelo tribunal.
A força probatória do documento escrito a que falte algum dos requisitos exigidos na lei é apreciada livremente pelo tribunal.
Podem ser reformados judicialmente os documentos escritos que por qualquer modo tiverem desaparecido.
As reproduções fotográficas ou cinematográficas, os registos fonográficos e, de um modo geral, quaisquer outras reproduções mecânicas de factos ou de coisas fazem prova plena dos factos e das coisas que representam, se a parte contra quem os documentos são apresentados não impugnar a sua exactidão.
O disposto nesta secção não prejudica a aplicação da legislação especial relacionada com o comércio electrónico.
1. O documento só é autêntico quando a autoridade pública, o oficial público ou notário que o exara for competente, em razão da matéria e do lugar, e não estiver legalmente impedido de o lavrar.
2. Considera-se, porém, exarado por autoridade pública, notário público ou outro oficial público competente o documento lavrado por quem exerça publicamente as respectivas funções, a não ser que os intervenientes ou beneficiários conhecessem, no momento da sua feitura, a falsa qualidade da autoridade ou oficial público, a sua incompetência ou a irregularidade da sua investidura.
1. Presume-se que o documento provém da autoridade ou oficial público a quem é atribuído, quando estiver subscrito pelo autor com assinatura reconhecida por notário ou com o selo do respectivo serviço; de igual presunção gozam os documentos exarados por notário.
2. A presunção de autenticidade pode ser ilidida mediante prova em contrário, e pode ser excluída oficiosamente pelo tribunal quando seja manifesta pelos sinais exteriores do documento a sua falta de autenticidade; em caso de dúvida, pode ser ouvida a autoridade pública, oficial público ou notário a quem o documento é atribuído.
3. Quando o documento for anterior ao século XVIII, a sua autenticidade será estabelecida por meio de exame feito por entidade com competência para tanto nos termos da lei especial ou por outra entidade de reconhecida idoneidade indicada pelo tribunal, desde que seja contestada ou posta em dúvida por alguma das partes ou pela entidade a quem o documento for apresentado.
1. Os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade, oficial público ou notário respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora; os meros juízos pessoais do documentador só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do julgador.
2. Se o documento contiver palavras emendadas, truncadas ou escritas sobre rasuras ou entrelinhas, sem a devida ressalva, determinará o julgador livremente a medida em que os vícios externos do documento excluem ou reduzem a sua força probatória.
1. A força probatória dos documentos autênticos só pode ser ilidida com base na sua falsidade.
2. O documento é falso, quando nele se atesta como tendo sido objecto da percepção da autoridade pública, oficial público ou notário qualquer facto que na realidade se não verificou, ou como tendo sido praticado pela entidade responsável qualquer acto que na realidade o não foi.
3. Se a falsidade for evidente em face dos sinais exteriores do documento, pode o tribunal, oficiosamente, declará-lo falso.
1. Os documentos particulares devem ser assinados pelo seu autor, ou por outrem a seu rogo, se o rogante não souber ou não puder assinar.
2. Nos títulos emitidos em grande número ou nos demais casos em que o uso o admita, pode a assinatura ser substituída por simples reprodução mecânica.
3. Se o documento for subscrito por pessoa que não saiba ou não possa ler, a subscrição só obriga quando feita ou confirmada perante notário, depois de lido o documento ao subscritor.
4. O rogo deve igualmente ser dado ou confirmado perante notário, depois de lido o documento ao rogante.
1. A letra e a assinatura, ou só a assinatura, de um documento particular consideram-se verdadeiras, quando reconhecidas ou não impugnadas pela parte contra quem o documento é apresentado, ou quando esta declare não saber se lhe pertencem, apesar de lhe serem atribuídas, ou quando sejam havidas legal ou judicialmente como verdadeiras.
2. Se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade.
1. Se estiverem reconhecidas presencialmente, nos termos das leis notariais, a letra e a assinatura do documento, ou só a assinatura, têm-se por verdadeiras.
2. Se a parte contra quem o documento é apresentado arguir a falsidade do reconhecimento presencial da letra e da assinatura, ou só da assinatura, a ela incumbe a prova dessa falsidade.
3. Salvo disposição legal em contrário, o reconhecimento por semelhança vale como mero juízo pericial.
1. O documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento.
2. Os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante; mas a declaração é indivisível, nos termos prescritos para a prova por confissão.
3. Se o documento contiver notas marginais, palavras entrelinhadas, rasuras, emendas ou outros vícios externos, sem a devida ressalva, cabe ao julgador fixar livremente a medida em que esses vícios excluem ou reduzem a força probatória do documento.
Os documentos particulares autenticados nos termos da lei notarial têm a força probatória dos documentos autênticos, mas não os substituem quando a lei exija documento desta natureza para a validade do acto.
Se o documento tiver sido assinado em branco, total ou parcialmente, o seu valor probatório pode ser ilidido, mostrando-se que nele se inseriram declarações divergentes do ajustado com o signatário ou que o documento lhe foi subtraído.
Os telegramas cujos originais tenham sido escritos e assinados, ou somente assinados, pela pessoa em nome de quem são expedidos, ou por outrem a seu rogo, nos termos do n.º 4 do artigo 367.º, são considerados para todos os efeitos como documentos particulares e estão sujeitos, como tais, ao disposto nos artigos anteriores.
1. Os registos e outros escritos onde habitualmente alguém tome nota dos pagamentos que lhe são efectuados fazem prova contra o seu autor, se indicarem inequivocamente, posto que mediante um simples sinal, a recepção de algum pagamento; mas o autor do escrito pode provar, por qualquer meio, que a nota não corresponde à realidade.
2. Têm igual força probatória os mesmos escritos, quando feitos e assinados por outrem, segundo instruções do credor.
3. É aplicável nestes casos a regra da indivisibilidade, nos termos prescritos para a prova por confissão.
1. A nota escrita pelo credor, ou por outrem segundo instruções dele, em seguimento, à margem ou no verso do documento que ficou em poder do credor, ainda que não esteja datada nem firmada, faz prova do facto anotado, se favorecer a exoneração do devedor.
2. Idêntico valor é atribuído à nota escrita pelo credor, ou segundo instruções dele, em seguimento, à margem ou no verso de documento de quitação ou de título de dívida em poder do devedor.
3. A força probatória das notas pode ser contrariada por qualquer meio de prova; mas, quando se trate de quitação no documento ou título em poder do devedor, se a nota estiver assinada pelo credor, são aplicáveis as regras legais acerca dos documentos particulares assinados pelo seu autor.
Se forem cancelados pelo credor, os escritos a que se referem os dois artigos anteriores perdem a força probatória que neles lhes é atribuída, ainda que o cancelamento não prejudique a sua leitura, salvo quando forem feitos por exigência do devedor ou de terceiro, nos termos do artigo 777.º
1. As certidões de teor extraídas de documentos arquivados nos cartórios notariais ou em repartições públicas, quando expedidas por notário ou por depositário público autorizado, têm a força probatória dos originais.
2. A prova resultante da certidão de teor parcial pode ser invalidada ou modificada por meio da certidão de teor integral.
3. Qualquer interessado, e bem assim a autoridade pública a quem for exibida, para efeito de prova, uma certidão parcial, podem exigir do apresentante a exibição da certidão integral correspondente.
As certidões de certidões, expedidas na conformidade da lei, têm a força probatória das certidões de que forem extraídas.
1. A força probatória das certidões pode ser invalidada ou modificada por confronto com o original ou com a certidão de que foram extraídas.
2. A pessoa contra quem for apresentada a certidão pode exigir que o confronto seja feito na sua presença.
1. As cópias de teor, total ou parcial, expedidas por notário ou por oficial público autorizado e extraídas de documentos avulsos que lhe sejam apresentados para esse efeito têm a força probatória do respectivo original, se a parte contra a qual forem apresentadas não requerer a exibição desse original.
2. Requerida a exibição, a pública-forma não tem a força probatória do original, se este não for apresentado ou, sendo-o, se não mostrar conforme com ela.
1. As cópias fotográficas de documentos arquivados nos cartórios notariais ou em repartições públicas têm a força probatória das certidões de teor, se a conformidade delas com o original for atestada pela entidade competente para expedir estas últimas.
2. Do mesmo valor gozam as cópias fotográficas de certidões de teor de documentos arquivados nos cartórios notariais ou em repartições públicas, se a conformidade delas com a certidão de teor for atestada pela entidade competente para expedir estas últimas, contanto que a conformidade da certidão de teor com o original também tenha sido correctamente atestada.
3. É aplicável aos casos previstos nos números anteriores o disposto no artigo 379.º
4. As cópias fotográficas de documentos estranhos aos arquivos mencionados nos números anteriores têm o valor da pública-forma, se a sua conformidade com o original for atestada por notário; é aplicável, neste caso, o disposto no artigo anterior.
A prova pericial tem por fim a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial.
A força probatória da perícia é fixada livremente pelo tribunal.
A prova por inspecção tem por fim a percepção directa de factos pelo tribunal.
O resultado da inspecção é livremente apreciado pelo tribunal.
A prova por testemunhas é admitida em todos os casos em que não seja directa ou indirectamente afastada.
1. Se a declaração negocial, por disposição da lei ou estipulação das partes, houver de ser reduzida a escrito ou necessitar de ser provada por escrito, não é admitida prova testemunhal.
2. Também não é admitida prova por testemunhas, quando o facto estiver plenamente provado por documento ou por outro meio com força probatória plena.
3. As regras dos números anteriores não são aplicáveis à simples interpretação do contexto do documento.
1. É inadmissível a prova por testemunhas, se tiver por objecto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou dos documentos particulares mencionados nos artigos 367.º a 373.º, quer as convenções sejam anteriores à formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores.
2. A proibição do número anterior aplica-se ao acordo simulatório e ao negócio dissimulado, quando invocados pelos simuladores.
3. O disposto nos números anteriores não é aplicável a terceiros.
As disposições dos artigos precedentes são aplicáveis ao cumprimento, remissão, novação, compensação e, de um modo geral, aos contratos extintivos da relação obrigacional, mas não aos factos extintivos da obrigação, quando invocados por terceiro.
A força probatória dos depoimentos das testemunhas é apreciada livremente pelo tribunal.
Obrigação é o vínculo jurídico por virtude do qual uma pessoa fica adstrita para com outra à realização de uma prestação.
1. As partes podem fixar livremente, dentro dos limites da lei, o conteúdo positivo ou negativo da prestação.
2. A prestação não necessita de ter valor pecuniário; mas deve corresponder a um interesse do credor, digno de protecção legal.
É admitida a prestação de coisa futura sempre que a lei não a proíba.
1. A determinação da prestação pode ser confiada a uma ou outra das partes ou a terceiro; em qualquer dos casos deve ser feita segundo juízos de equidade, se outros critérios não tiverem sido estipulados.
2. Se a determinação não puder ser feita ou não tiver sido feita no tempo devido, sê-lo-á pelo tribunal, sem prejuízo do disposto acerca das obrigações genéricas e alternativas.
1. A impossibilidade originária da prestação produz a nulidade do negócio jurídico.
2. O negócio é, porém, válido, se a obrigação for assumida para o caso de a prestação se tornar possível, ou se, estando o negócio dependente de condição suspensiva ou de termo inicial, a prestação se tornar possível até à verificação da condição ou até ao vencimento do termo.
3. Só se considera impossível a prestação que o seja relativamente ao objecto, e não apenas em relação à pessoa do devedor.
A obrigação diz-se natural, quando se funda num mero dever de ordem moral ou social, cujo cumprimento não é judicialmente exigível, mas corresponde a um dever de justiça.
1. Não pode ser repetido o que for prestado espontaneamente em cumprimento de obrigação natural, excepto se o devedor não tiver capacidade para efectuar a prestação.
2. A prestação considera-se espontânea, quando é livre de toda a coacção.
As obrigações naturais estão sujeitas ao regime das obrigações civis em tudo o que não se relacione com a realização coactiva da prestação, salvas as disposições especiais da lei.
1. Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste Código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver.
2. As partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei.
1. O contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.
2. Em relação a terceiros, o contrato só produz efeitos nos casos e termos especialmente previstos na lei.
Quando, por contratos sucessivos, se constituírem, a favor de pessoas diferentes, mas sobre a mesma coisa, direitos pessoais de gozo incompatíveis entre si, prevalece o direito mais antigo em data, sem prejuízo das regras próprias do registo.
1. A constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato, salvas as excepções previstas na lei.
2. Se a transferência respeitar a coisa futura ou indeterminada, o direito transfere-se quando a coisa for adquirida pelo alienante ou determinada com conhecimento de ambas as partes, sem prejuízo do disposto em matéria de obrigações genéricas e do contrato de empreitada; se, porém, respeitar a frutos naturais ou a partes componentes ou integrantes, a transferência só se verifica no momento da colheita ou separação.
1. Nos contratos de alienação é lícito ao alienante reservar para si a propriedade da coisa até ao cumprimento total ou parcial das obrigações da outra parte ou até à verificação de qualquer outro evento.
2. Tratando-se de coisa imóvel, ou de coisa móvel sujeita a registo, só a cláusula constante do registo é oponível a terceiros.
1. À convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato são aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato prometido, exceptuadas as relativas à forma e as que, por sua razão de ser, não se devam considerar extensivas ao contrato-promessa.
2. Porém, a promessa relativa à celebração de contrato para o qual a lei exija documento, quer autêntico, quer particular, só vale se constar de documento assinado pela parte que se vincula ou por ambas, consoante o contrato-promessa seja unilateral ou bilateral.
Se o contrato-promessa vincular apenas uma das partes e não se fixar o prazo dentro do qual o vínculo é eficaz, pode o tribunal, a requerimento do promitente, fixar à outra parte um prazo para o exercício do direito, findo o qual este caducará.
1. Os direitos e obrigações resultantes do contrato-promessa, que não sejam exclusivamente pessoais, transmitem-se aos sucessores das partes.
2. A transmissão por acto entre vivos está sujeita às regras gerais.
1. À promessa de alienação ou oneração de bens imóveis, ou de móveis sujeitos a registo, podem as partes atribuir eficácia real mediante declaração expressa e inscrição no registo.
2. A promessa a que as partes atribuam eficácia real deve constar de documento autenticado; porém, quando a lei não exija uma forma tão solene para o contrato prometido, é bastante o cumprimento da forma escrita.
O pacto de preferência consiste na convenção pela qual alguém assume a obrigação de dar preferência a outrem na venda de determinada coisa.
A obrigação de dar preferência em venda para a qual a lei exija documento, quer autêntico, quer particular, só vale se constar de documento assinado pela parte que se vincula.
1. Querendo vender a coisa que é objecto do pacto, o obrigado deve comunicar ao titular do direito o projecto de venda e as cláusulas do respectivo contrato.
2. Recebida a comunicação, deve o titular exercer o seu direito dentro do prazo de 8 dias, sob pena de caducidade, salvo se estiver vinculado a prazo mais curto ou o obrigado lhe assinar prazo mais longo.
1. Se o obrigado quiser vender a coisa juntamente com outra ou outras, por um preço global, pode o direito ser exercido em relação àquela pelo preço que proporcionalmente lhe for atribuído, sendo lícito, porém, ao obrigado exigir que a preferência abranja toda as restantes, se estas não forem separáveis sem prejuízo apreciável.
2. O disposto no número anterior é aplicável ao caso de o direito de preferência ter eficácia real e a coisa ter sido vendida a terceiro juntamente com outra ou outras.
1. Se o obrigado receber de terceiro a promessa de uma prestação acessória que o titular do direito de preferência não possa satisfazer, deve ser essa prestação compensada em dinheiro; não sendo avaliável em dinheiro, é excluída a preferência, salvo se for lícito presumir que, mesmo sem a prestação estipulada, a venda não deixaria de ser efectuada, ou que a prestação foi convencionada para afastar a preferência.
2. Se a prestação acessória tiver sido convencionada para afastar a preferência, o preferente não é obrigado a satisfazê-la, mesmo que ela seja avaliável em dinheiro.
1. Pertencendo simultaneamente a vários titulares, o direito de preferência só pode ser exercido por todos em conjunto; mas, se o direito se extinguir em relação a algum deles, ou algum declarar que não o quer exercer, acresce o seu direito aos restantes.
2. Se o direito pertencer a mais de um titular, mas houver de ser exercido apenas por um deles, na falta de designação abrir-se-á licitação entre todos, revertendo o excesso para o alienante.
O direito e a obrigação de preferência não são transmissíveis em vida nem por morte, salvo estipulação em contrário.
1. O direito de preferência pode, por convenção das partes, gozar de eficácia real se, respeitando a bens imóveis, ou a móveis sujeitos a registo, forem observados os requisitos de forma e de publicidade exigidos no artigo 407.º
2. É aplicável neste caso, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 1309.º
O direito convencional de preferência não prevalece contra os direitos legais de preferência; e, se não gozar de eficácia real, também não procede relativamente à alienação efectuada em execução, falência, insolvência ou casos análogos.
As disposições dos artigos anteriores relativas à compra e venda são extensivas, na parte aplicável, à obrigação de preferência que tiver por objecto outros contratos com ela compatíveis.
1. No contrato com prestações recíprocas, qualquer das partes tem a faculdade de transmitir a terceiro a sua posição contratual, desde que o outro contraente, antes ou depois da celebração do contrato, consinta na transmissão.
2. Se o consentimento do outro contraente for anterior à cessão, esta só produz efeitos a partir da sua notificação ou reconhecimento.
A forma da transmissão, a capacidade de dispor e de receber, a falta e vícios da vontade e as relações entre as partes definem-se em função do tipo de negócio que serve de base à cessão.
1. O cedente garante ao cessionário, no momento da cessão, a existência da posição contratual transmitida, nos termos aplicáveis ao negócio, gratuito ou oneroso, em que a cessão se integra.
2. A garantia do cumprimento das obrigações só existe se for convencionada nos termos gerais.
A outra parte no contrato tem o direito de opor ao cessionário os meios de defesa provenientes desse contrato, mas não os que provenham de outras relações com o cedente, a não ser que os tenha reservado ao consentir na cessão.
1. Se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo.
2. A excepção não pode ser afastada mediante a prestação de garantias.
Ainda que esteja obrigado a cumprir em primeiro lugar, tem o contraente a faculdade de recusar a respectiva prestação enquanto o outro não cumprir ou não der garantias de cumprimento, se, posteriormente ao contrato, se verificar alguma das circunstâncias que importam a perda do benefício do prazo.
Prescrito um dos direitos, o respectivo titular continua a gozar da excepção de não cumprimento, excepto quando se trate de prescrição presuntiva.
A excepção de não cumprimento é oponível aos que no contrato vierem a substituir qualquer dos contraentes nos seus direitos e obrigações.
1. É admitida a resolução do contrato fundada na lei ou em convenção.
2. A parte, porém, que, por circunstâncias não imputáveis ao outro contraente, não estiver em condições de restituir o que houver recebido não tem o direito de resolver o contrato.
Na falta de disposição especial, a resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico, com ressalva do disposto nos artigos seguintes.
1. A resolução tem efeito retroactivo, salvo se a retroactividade contrariar a vontade das partes ou a finalidade da resolução.
2. Nos contratos de execução continuada ou periódica, a resolução não abrange as prestações já efectuadas, excepto se entre estas e a causa da resolução existir um vínculo que legitime a resolução de todas elas.
1. A resolução, ainda que expressamente convencionada, não prejudica os direitos adquiridos por terceiro.
2. Porém, o registo da acção de resolução que respeite a bens imóveis, ou a móveis sujeitos a registo, torna o direito de resolução oponível a terceiro que não tenha registado o seu direito antes do registo da acção.
1. A resolução do contrato pode fazer-se mediante declaração à outra parte.
2. Não havendo prazo convencionado para a resolução do contrato, pode a outra parte fixar ao titular do direito de resolução um prazo razoável para que o exerça, sob pena de caducidade.
1. Se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato.
2. Requerida a resolução, a parte contrária pode opor-se ao pedido, declarando aceitar a modificação do contrato nos termos do número anterior.
A parte lesada não goza do direito de resolução ou modificação do contrato, se estava em mora no momento em que a alteração das circunstâncias se verificou.
Resolvido o contrato, são aplicáveis à resolução as disposições da subsecção anterior.
Se, ao celebrar-se o contrato ou em momento posterior, um dos contraentes entregar ao outro coisa que coincida, no todo ou em parte, com a prestação a que fica adstrito, é a entrega havida como antecipação total ou parcial do cumprimento, salvo se as partes quiserem atribuir à coisa entregue o carácter de sinal.
No contrato-promessa de compra e venda presume-se que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço.
1. Quando haja sinal, a coisa entregue deve ser imputada na prestação devida, ou restituída quando a imputação não for possível.
2. Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele o direito de exigir o dobro do que houver prestado.
3. A parte que não tenha dado causa ao incumprimento poderá, em alternativa, requerer a execução específica do contrato, quando esse poder lhe seja atribuído nos termos gerais.
4. Na ausência de estipulação em contrário, e salvo o direito a indemnização pelo dano excedente quando este for consideravelmente superior, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste.
5. É igualmente aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 801.º
1. Por meio de contrato, pode uma das partes assumir perante outra, que tenha na promessa um interesse digno de protecção legal, a obrigação de efectuar uma prestação a favor de terceiro, estranho ao negócio; diz-se promitente a parte que assume a obrigação e promissário o contraente a quem a promessa é feita.
2. Por contrato a favor de terceiro, têm as partes ainda a possibilidade de remitir dívidas ou ceder créditos, e bem assim de constituir, modificar, transmitir ou extinguir direitos reais.
1. O terceiro a favor de quem for convencionada a promessa adquire direito à prestação, independentemente de aceitação.
2. O promissário tem igualmente o direito de exigir do promitente o cumprimento da promessa, a não ser que outra tenha sido a vontade dos contraentes.
3. Quando se trate da promessa de exonerar o promissário de uma dívida para com terceiro, só àquele é lícito exigir o cumprimento da promessa.
Se a prestação for estipulada em benefício de um conjunto indeterminado de pessoas ou no interesse público, o direito de a reclamar pertence não só ao promissário ou seus herdeiros, como às entidades competentes para defender os interesses em causa.
1. Nem os herdeiros do promissário, nem as entidades a que o artigo anterior se refere, podem dispor do direito à prestação ou autorizar qualquer modificação do seu objecto.
2. Quando a prestação se torne impossível por causa imputável ao promitente, têm os herdeiros do promissário, bem como as entidades competentes para reclamar o cumprimento da prestação, o direito de exigir a correspondente indemnização, para os fins convencionados.
1. O terceiro pode rejeitar a promessa ou aceitá-la.
2. A rejeição faz-se mediante declaração ao promitente, o qual deve comunicá-la ao promissário; se culposamente deixar de o fazer, é responsável em face deste.
3. A aceitação faz-se mediante declaração, tanto ao promitente como ao promissário.
1. Salvo estipulação em contrário, a promessa é revogável enquanto o terceiro não a aceitar, ou enquanto o promissário for vivo, quando se trate de promessa que haja de ser cumprida depois da morte deste.
2. O direito de revogação pertence ao promissário; se, porém, a promessa foi feita no interesse de ambos os outorgantes, a revogação depende do consentimento do promitente.
São oponíveis ao terceiro, por parte do promitente, todos os meios de defesa derivados do contrato, mas não aqueles que advenham de outra relação entre promitente e promissário.
1. Só no que respeita à contribuição do promissário para a prestação a terceiro são aplicáveis as disposições relativas à colação, imputação e redução das doações e à impugnação pauliana.
2. Se a designação de terceiro for feita a título de liberalidade, são aplicáveis, com as necessárias adaptações, as normas relativas à revogação das doações por ingratidão do donatário.
1. Se a prestação a terceiro houver de ser efectuada após a morte do promissário, presume-se que só depois do falecimento deste o terceiro adquire direito a ela.
2. Se, porém, o terceiro morrer antes do promissário, os seus herdeiros são chamados em lugar dele à titularidade da promessa.
1. Ao celebrar o contrato, pode uma das partes reservar o direito de nomear um terceiro que adquira os direitos e assuma as obrigações provenientes desse contrato.
2. A reserva de nomeação não é possível nos casos em que não é admitida a representação ou é indispensável a determinação dos contraentes.
1. A nomeação deve ser feita mediante declaração por escrito ao outro contraente, dentro do prazo convencionado ou, na falta de convenção, dentro dos 5 dias posteriores à celebração do contrato.
2. A declaração de nomeação deve ser acompanhada, sob pena de ineficácia, do instrumento de ratificação do contrato ou de procuração anterior à celebração deste.
1. A ratificação deve constar de documento escrito.
2. Se, porém, o contrato tiver sido celebrado por meio de documento de maior força probatória, necessita a ratificação de revestir igual forma.
1. Sendo a declaração de nomeação feita nos termos do artigo 447.º, a pessoa nomeada adquire os direitos e assume as obrigações provenientes do contrato a partir da celebração dele.
2. Não sendo feita a declaração de nomeação nos termos legais, o contrato produz os seus efeitos relativamente ao contraente originário, desde que não haja estipulação em contrário.
1. Se o contrato estiver sujeito a registo, pode este ser feito em nome do contraente originário, com indicação da cláusula para pessoa a nomear, fazendo-se posteriormente os necessários averbamentos.
2. O disposto no número anterior é extensivo a qualquer outra forma de publicidade a que o contrato esteja sujeito.
A promessa unilateral de uma prestação só obriga nos casos previstos na lei.
1. Se alguém, por simples declaração unilateral, prometer uma prestação ou reconhecer uma dívida, sem indicação da respectiva causa, fica o credor dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência se presume até prova em contrário.
2. A promessa ou reconhecimento deve, porém, constar de documento escrito, se outras formalidades não forem exigidas para a prova da relação fundamental.
1. Aquele que, mediante anúncio público, prometer uma prestação a quem se encontre em determinada situação ou pratique certo facto, positivo ou negativo, fica vinculado desde logo à promessa.
2. Na falta de declaração em contrário, o promitente fica obrigado mesmo em relação àqueles que se encontrem na situação prevista ou tenham praticado o facto sem atender à promessa ou na ignorância dela.
A promessa pública sem prazo de validade fixado pelo promitente ou imposto pela natureza ou fim da promessa mantém-se enquanto não for revogada.
1. Não tendo prazo de validade, a promessa pública é revogável a todo o tempo pelo promitente; se houver prazo, só é revogável ocorrendo justa causa.
2. Em qualquer dos casos, a revogação não é eficaz, se não for feita na forma da promessa ou em forma equivalente, ou se a situação prevista já se tiver verificado ou o facto já tiver sido praticado.
Se na produção do resultado previsto tiverem cooperado várias pessoas, conjunta ou separadamente, e todas tiverem direito à prestação, esta é dividida equitativamente, atendendo-se à parte que cada uma delas teve nesse resultado.
1. A oferta da prestação como prémio de um concurso só é válida quando se fixar no anúncio público o prazo para a apresentação dos concorrentes.
2. A decisão sobre a admissão dos concorrentes ou a concessão do prémio a qualquer deles pertence exclusivamente às pessoas designadas no anúncio ou, se não houver designação, ao promitente.
Dá-se a gestão de negócios, quando uma pessoa assume a direcção de negócio alheio no interesse e por conta do respectivo dono, sem para tal estar autorizada.
O gestor deve:
a) Conformar-se com o interesse e a vontade, real ou presumível, do dono do negócio, sempre que esta não seja contrária à lei ou à ordem pública, ou ofensiva dos bons costumes;
b) Avisar o dono do negócio, logo que seja possível, de que assumiu a gestão;
c) Prestar contas, findo o negócio ou interrompida a gestão, ou quando o dono as exigir;
d) Prestar a este todas as informações relativas à gestão;
e) Entregar-lhe tudo o que tenha recebido de terceiros no exercício da gestão ou o saldo das respectivas contas, com os juros legais, relativamente às quantias em dinheiro, a partir do momento em que a entrega haja de ser efectuada.
1. O gestor responde perante o dono do negócio, tanto pelos danos a que der causa, por culpa sua, no exercício da gestão, como por aqueles que causar com a injustificada interrupção dela.
2. Considera-se culposa a actuação do gestor, quando ele agir em desconformidade com o interesse ou a vontade, real ou presumível, do dono do negócio.
Havendo dois ou mais gestores que tenham agido conjuntamente, são solidárias as obrigações deles para com o dono do negócio.
1. Se a gestão tiver sido exercida em conformidade com o interesse e a vontade, real ou presumível, do dono do negócio, é este obrigado a reembolsar o gestor das despesas que ele fundadamente tenha considerado indispensáveis, com juros legais a contar do momento em que foram feitas, e a indemnizá-lo do prejuízo que haja sofrido.
2. Se a gestão não foi exercida nos termos do número anterior, o dono do negócio responde apenas segundo as regras do enriquecimento sem causa, com ressalva do disposto no artigo seguinte.
A aprovação da gestão implica a renúncia ao direito de indemnização pelos danos devidos a culpa do gestor e vale como reconhecimento dos direitos que a este são conferidos no n.° 1 do artigo anterior.
1. A gestão não dá direito a qualquer remuneração, salvo se corresponder ao exercício da actividade profissional do gestor.
2. À fixação da remuneração é aplicável, neste caso, o disposto no n.º 2 do artigo 1084.º
Sem prejuízo do que preceituam os artigos anteriores quanto às relações entre o gestor e o dono do negócio, é aplicável aos negócios jurídicos celebrados por aquele em nome deste o disposto no artigo 261.º; se o gestor os realizar em seu próprio nome, são extensivas a esses negócios, na parte aplicável, as disposições relativas ao mandato sem representação.
1. Se alguém gerir negócio alheio, convencido de que ele lhe pertence, só é aplicável o disposto nesta secção se houver aprovação da gestão; em quaisquer outras circunstâncias, são aplicáveis à gestão as regras do enriquecimento sem causa, sem prejuízo de outras que ao caso couberem.
2. Se houver culpa do gestor na violação do direito alheio, são aplicáveis ao caso as regras da responsabilidade civil.
1. Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou.
2. A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.
Não há lugar à restituição por enriquecimento, quando a lei facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído, negar o direito à restituição ou atribuir outros efeitos ao enriquecimento.
Também não há lugar à restituição se, ao efectuar a prestação, o autor sabia que o efeito com ela previsto era impossível, ou se, agindo contra a boa fé, impediu a sua verificação.
1. Sem prejuízo do disposto acerca das obrigações naturais, o que for prestado com a intenção de cumprir uma obrigação pode ser repetido, se esta não existia no momento da prestação.
2. A prestação feita a terceiro pode ser repetida pelo devedor enquanto não se tornar liberatória nos termos do artigo 760.°
3. A prestação feita por erro desculpável antes do vencimento da obrigação só dá lugar à repetição daquilo com que o credor se enriqueceu por efeito do cumprimento antecipado.
1. Aquele que, por erro desculpável, cumprir uma obrigação alheia, julgando-a própria, goza do direito de repetição, excepto se o credor, desconhecendo o erro do autor da prestação, se tiver privado do título ou das garantias do crédito, tiver deixado prescrever ou caducar o seu direito, ou não o tiver exercido contra o devedor ou contra o fiador enquanto solventes.
2. Quando não existe o direito de repetição, fica o autor da prestação sub-rogado nos direitos do credor.
Aquele que cumprir obrigação alheia, na convicção errónea de estar obrigado para com o devedor a cumpri-la, não tem o direito de repetição contra o credor, mas apenas o direito de exigir do devedor exonerado aquilo com que este injustamente se locupletou, excepto se o credor conhecia o erro ao receber a prestação.
1. A obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa compreende tudo quanto se tenha obtido à custa do empobrecido ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.
2. A obrigação de restituir não pode exceder a medida do locupletamento à data da verificação de algum dos factos referidos nas duas alíneas do artigo seguinte.
O enriquecido passa a responder também pelo perecimento ou deterioração culposa da coisa, pelos frutos que por sua culpa deixem de ser percebidos e pelos juros legais das quantias a que o empobrecido tiver direito, depois de se verificar algumas das seguintes circunstâncias:
a) Ter sido o enriquecido citado judicialmente para a restituição;
b) Ter ele conhecimento da falta de causa do seu enriquecimento ou da falta do efeito que se pretendia obter com a prestação.
1. Tendo o enriquecido alienado gratuitamente coisa que devesse restituir, fica o adquirente obrigado em lugar dele, mas só na medida do seu próprio enriquecimento.
2. Se, porém, a transmissão teve lugar depois da verificação de algum dos factos referidos no artigo anterior, o alienante é responsável nos termos desse artigo, e o adquirente, se estiver de má fé, é responsável nos mesmos termos.
O direito à restituição por enriquecimento prescreve no prazo de 3 anos, a contar da data em que o credor teve ou deveria ter tido conhecimento do direito que lhe compete e da pessoa do responsável, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do enriquecimento.
1. Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.
2. Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei.
1. Os simples conselhos, recomendações ou informações não responsabilizam quem os dá, ainda que haja negligência da sua parte.
2. A obrigação de indemnizar existe, porém, quando se tenha assumido a responsabilidade pelos danos, quando havia o dever jurídico de dar o conselho, recomendação ou informação e se tenha procedido com negligência ou intenção de prejudicar, ou quando o procedimento do agente constitua facto punível.
As simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando, independentemente dos outros requisitos legais, havia, por força da lei ou de negócio jurídico, o dever de praticar o acto omitido.
1. É ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa.
2. A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso.
1. Não responde pelas consequências do facto danoso quem, no momento em que o facto ocorreu, estava, por qualquer causa, incapacitado de entender ou querer, salvo se o agente se colocou culposamente nesse estado, sendo este transitório.
2. Presume-se falta de imputabilidade nos menores de 7 anos e nos interditos por anomalia psíquica.
1. Se o acto causador dos danos tiver sido praticado por pessoa não imputável, pode esta, por motivo de equidade, ser condenada a repará-los, total ou parcialmente, desde que não seja possível obter a devida reparação das pessoas a quem incumbe a sua vigilância.
2. A indemnização é, todavia, calculada por forma a não privar a pessoa não imputável dos alimentos necessários, conforme o seu estado e condição, nem dos meios indispensáveis para cumprir os seus deveres legais de alimentos.
Se forem vários os autores, instigadores ou auxiliares do acto ilícito, todos eles respondem pelos danos que hajam causado.
As pessoas que, por lei ou negócio jurídico, forem obrigadas a vigiar outras, por virtude da incapacidade natural destas, são responsáveis pelos danos que elas causem a terceiro, salvo se mostrarem que cumpriram o seu dever de vigilância ou que os danos se teriam produzido ainda que o tivessem cumprido.
1. O proprietário ou possuidor de edifício ou outra obra que ruir, no todo ou em parte, por vício de construção ou defeito de conservação, responde pelos danos causados, salvo se provar que não houve culpa da sua parte ou que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado os danos.
2. A pessoa obrigada, por lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício ou obra responde, em lugar do proprietário ou possuidor, quando os danos forem devidos exclusivamente a defeito de conservação.
1. Quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar, e bem assim quem tiver assumido o encargo da vigilância de quaisquer animais, responde pelos danos que a coisa ou os animais causarem, salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua.
2. Quem causar danos a outrem no exercício de uma actividade, perigosa por sua própria natureza ou pela natureza dos meios utilizados, é obrigado a repará-los, excepto se mostrar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de os prevenir.
3. Não é aplicável o disposto no número anterior à responsabilidade civil emergente de acidentes de viação terrestre, salvo quando haja especial e acrescida perigosidade da actividade ou dos meios utilizados em face dos riscos normais implicados pela circulação viária.
Quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, pode a indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem.
1. No caso de lesão de que proveio a morte, é o responsável obrigado a indemnizar as despesas feitas para salvar o lesado e todas as demais, sem exceptuar as do funeral.
2. Neste caso, como em todos os outros de lesão corporal, têm direito a indemnização aqueles que socorreram o lesado, bem como os estabelecimentos hospitalares, médicos ou outras pessoas ou entidades que tenham contribuído para o tratamento ou assistência da vítima.
3. Têm igualmente direito a indemnização os que podiam exigir alimentos ao lesado ou aqueles a quem o lesado os prestava no cumprimento de uma obrigação natural.
1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
2. Por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado de facto e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, ao unido de facto e aos pais ou outros ascendentes; e, por último, aos irmãos ou sobrinhos que os representem.
3. O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 487.º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos do número anterior.
1. Se forem várias as pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade.
2. O direito de regresso entre os responsáveis existe na medida das respectivas culpas e das consequências que delas advieram, presumindo-se iguais as culpas das pessoas responsáveis.
1. O direito de indemnização prescreve no prazo de 3 anos, a contar da data em que o lesado teve ou deveria ter tido conhecimento do direito que lhe compete e da pessoa do responsável, embora com desconhecimento da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso.
2. Prescreve igualmente no prazo de 3 anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis.
3. Se o facto ilícito constituir crime para cujo procedimento a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável; contudo, se a responsabilidade criminal ficar prejudicada por outra causa que não a prescrição do procedimento penal, o direito à indemnização prescreve no prazo de 1 ano a contar da verificação dessa causa, mas não antes de decorrido o prazo referido na primeira parte do n.º 1.
4. A prescrição do direito de indemnização não importa prescrição da acção de reivindicação nem da acção de restituição por enriquecimento sem causa, se houver lugar a uma ou a outra.
São extensivas aos casos de responsabilidade pelo risco, na parte aplicável e na falta de preceitos legais em contrário, as disposições que regulam a responsabilidade por factos ilícitos.
1. Aquele que encarrega outrem de qualquer comissão responde, independentemente de culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaia também a obrigação de indemnizar.
2. A responsabilidade do comitente só existe se o facto danoso for praticado pelo comissário, ainda que intencionalmente ou contra as instruções daquele, no exercício da função que lhe foi confiada.
3. O comitente que satisfizer a indemnização tem o direito de exigir do comissário o reembolso de tudo quanto haja pago, excepto se houver também culpa da sua parte; neste caso é aplicável o disposto no n.º 2 do artigo 490.º
Quaisquer pessoas colectivas públicas, quando haja danos causados a terceiro pelos seus órgãos, agentes ou representantes no exercício de actividades de gestão privada, respondem civilmente por esses danos nos termos em que os comitentes respondem pelos danos causados pelos seus comissários.
Quem no seu próprio interesse utilizar quaisquer animais responde pelos danos que eles causarem, desde que os danos resultem do perigo especial que envolve a sua utilização.
1. Aquele que tiver a direcção efectiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo, mesmo que este não se encontre em circulação.
2. As pessoas não imputáveis respondem nos termos do artigo 482.º
3. Aquele que conduzir o veículo por conta de outrem responde pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo, excepto quando, estando aquele no exercício das suas funções, o veículo não se encontre em circulação.
1. A responsabilidade pelos danos causados por veículos aproveita a terceiros, bem como às pessoas transportadas.
2. No caso de transporte por virtude de contrato, a responsabilidade abrange só os danos que atinjam a própria pessoa e as coisas por ela transportadas.
3. No caso de transporte gratuito, a responsabilidade abrange apenas os danos pessoais da pessoa transportada.
4. São nulas as cláusulas que excluam ou limitem a responsabilidade do transportador pelos acidentes que atinjam a pessoa transportada.
Sem prejuízo do disposto no artigo 500.º, a responsabilidade fixada pelos n.os 1 e 3 do artigo 496.º só é excluída quando o acidente for imputável ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando resulte de causa de força maior estranha ao funcionamento do veículo.
1. Se da colisão entre dois veículos resultarem danos em relação aos dois ou em relação a um deles, e nenhum dos condutores tiver culpa no acidente, a responsabilidade é repartida na proporção em que o risco de cada um dos veículos houver contribuído para os danos; se os danos forem causados somente por um dos veículos, sem culpa de nenhum dos condutores, só a pessoa por eles responsável é obrigada a indemnizar.
2. Em caso de dúvida, considera-se igual a medida da contribuição de cada um dos veículos para os danos, bem como a contribuição da culpa de cada um dos condutores.
1. Se a responsabilidade pelo risco recair sobre várias pessoas, todas respondem solidariamente pelos danos, mesmo que haja culpa de alguma ou algumas.
2. Nas relações entre os diferentes responsáveis, a obrigação de indemnizar reparte-se de harmonia com o interesse de cada um na utilização do veículo; mas, se houver culpa de algum ou de alguns, apenas os culpados respondem, sendo aplicável quanto ao direito de regresso, entre eles, ou em relação a eles, o disposto no n.º 2 do artigo 490.º
1. A indemnização fundada em acidente de viação, quando não haja culpa do responsável, tem, para cada acidente, como limites máximos: no caso de morte ou lesão de uma ou mais pessoas, o montante correspondente ao valor mínimo do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel previsto na lei para a categoria do veículo causador do acidente; no caso de danos causados em coisas, ainda que pertencentes a diferentes proprietários, metade do referido valor.
2. As prioridades de reparação, bem como os critérios para a determinação da renda anual, quando a indemnização seja fixada desta forma, são os estabelecidos na lei do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.
1. Aquele que tiver a direcção efectiva de instalação destinada à condução ou entrega da energia eléctrica ou do gás, e utilizar essa instalação no seu interesse, responde tanto pelo prejuízo que derive da condução ou entrega da electricidade ou do gás, como pelos danos resultantes da própria instalação, excepto se ao tempo do acidente esta estiver de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação.
2. Não obrigam a reparação os danos devidos a causa de força maior; considera-se de força maior toda a causa exterior independente do funcionamento e utilização da coisa.
3. Os danos causados por utensílios de uso de energia não são reparáveis nos termos desta disposição.
1. A responsabilidade a que se refere o artigo precedente, quando não haja culpa do responsável, tem para cada acidente, como limite máximo, por cada pessoa, no caso de morte ou lesão, um quinto do valor mínimo do respectivo seguro obrigatório ou, caso este não esteja estabelecido, o valor mínimo do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel para veículos automóveis ligeiros, até ao máximo total de 5 vezes esses valores.
2. Aplicam-se os mesmos limites quando se trate de danos em coisas, ainda que pertencentes a diversos proprietários.
3. Quando se trate de danos em prédios, o limite máximo da responsabilidade pelo risco é igual, para cada prédio, ao dobro dos valores máximos globais previstos nos números anteriores até ao máximo total de 5 vezes este último valor.
A pessoa do credor pode não ficar determinada no momento em que a obrigação é constituída; mas deve ser determinável, sob pena de ser nulo o negócio jurídico do qual a obrigação resultaria.
1. A obrigação é solidária, quando cada um dos devedores responde pela prestação integral e esta a todos libera, ou quando cada um dos credores tem a faculdade de exigir, por si só, a prestação integral e esta libera o devedor para com todos eles.
2. A obrigação não deixa de ser solidária pelo facto de os devedores estarem obrigados em termos diversos ou com diversas garantias, ou de ser diferente o conteúdo das prestações de cada um deles; igual diversidade se pode verificar quanto à obrigação do devedor relativamente a cada um dos credores solidários.
A solidariedade de devedores ou credores só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes.
1. O devedor solidário demandado pode defender-se por todos os meios que pessoalmente lhe competem ou que são comuns a todos os condevedores.
2. Ao credor solidário são oponíveis igualmente não só os meios de defesa comum, como os que pessoalmente lhe respeitem.
1. Os herdeiros do devedor solidário respondem colectivamente pela totalidade da dívida; efectuada a partilha, cada co-herdeiro responde nos termos do artigo 1936.º
2. Os herdeiros do credor solidário só conjuntamente podem exonerar o devedor; efectuada a partilha, se o crédito tiver sido adjudicado a dois ou mais herdeiros, também só em conjunto estes podem exonerar o devedor.
Nas relações entre si, presume-se que os devedores ou credores solidários comparticipam em partes iguais na dívida ou no crédito, sempre que da relação jurídica entre eles existente não resulte que são diferentes as suas partes, ou que um só deles deve suportar o encargo da dívida ou obter o benefício do crédito.
1. A solidariedade não impede que os devedores solidários demandem conjuntamente o credor ou sejam por ele conjuntamente demandados.
2. De igual direito gozam os credores solidários relativamente ao devedor e este em relação àqueles.
Ao devedor solidário demandado não é lícito opor o benefício da divisão; e, ainda que chame os outros devedores à demanda, nem por isso se libera da obrigação de efectuar a prestação por inteiro.
1. O credor tem o direito de exigir de qualquer dos devedores toda a prestação, ou parte dela, proporcional ou não à quota do interpelado; mas, se exigir judicialmente a um deles a totalidade ou parte da prestação, fica inibido de proceder judicialmente contra os outros pelo que ao primeiro tenha exigido, salvo se houver razão atendível, como a insolvência ou risco de insolvência do demandado, ou dificuldade, por outra causa, em obter dele a prestação.
2. Se um dos devedores tiver qualquer meio de defesa pessoal contra o credor, não fica este inibido de reclamar dos outros a prestação integral, ainda que esse meio já lhe tenha sido oposto.
Se a prestação se tornar impossível por facto imputável a um dos devedores, todos eles são solidariamente responsáveis pelo seu valor; mas só o devedor a quem o facto é imputável responde pela reparação dos danos que excedam esse valor, e, sendo vários, é solidária a sua responsabilidade.
1. Se, por efeito da suspensão ou interrupção da prescrição, ou de outra causa, a obrigação de um dos devedores se mantiver, apesar de prescritas as obrigações dos outros, e aquele for obrigado a cumprir, cabe-lhe o direito de regresso contra os seus condevedores.
2. O devedor que não haja invocado a prescrição não goza do direito de regresso contra os condevedores cujas obrigações tenham prescrito, desde que estes aleguem a prescrição.
O caso julgado entre o credor e um dos devedores não é oponível aos restantes devedores, mas pode ser oposto por estes, desde que não se baseie em fundamento que respeite pessoalmente àquele devedor.
A satisfação do direito do credor, por cumprimento, dação em cumprimento, novação, consignação em depósito ou compensação, produz a extinção, relativamente a ele, das obrigações de todos os devedores.
1. O devedor que satisfazer o direito do credor além da parte que lhe competir tem direito de regresso contra cada um dos condevedores, na parte que a estes compete.
2. Se a obrigação solidária tiver sido assumida exclusivamente no interesse de um dos devedores, é este responsável em via de regresso por toda a prestação.
1. Os condevedores podem opor ao que satisfez o direito do credor a falta de decurso do prazo que lhes tenha sido concedido para o cumprimento da obrigação, bem como qualquer outro meio de defesa, quer este seja comum, quer respeite pessoalmente aos condevedores demandados em via de regresso.
2. A faculdade concedida no número anterior tem lugar, ainda que o condevedor que satisfez o direito do credor tenha deixado, sem culpa sua, de opor ao credor o meio comum de defesa, salvo se a falta de oposição for imputável ao devedor que pretende valer-se do mesmo meio.
1. Se um dos devedores estiver insolvente ou não puder por outro motivo cumprir a prestação a que está adstrito, é a sua quota-parte repartida proporcionalmente entre todos os demais, incluindo o credor de regresso e os devedores que pelo credor hajam sido exonerados da obrigação ou apenas do vínculo da solidariedade.
2. Ao credor de regresso não aproveita o benefício da repartição na medida em que só por negligência sua lhe não tenha sido possível cobrar a parte do seu condevedor na obrigação solidária.
A renúncia à solidariedade a favor de um ou alguns dos devedores não prejudica o direito do credor relativamente aos restantes, contra os quais conserva o direito à prestação por inteiro.
1. É permitido ao devedor escolher o credor solidário a quem satisfaça a prestação, enquanto não tiver sido judicialmente citado para a respectiva acção por outro credor cujo crédito se ache vencido.
2. Se o devedor cumprir perante credor diferente daquele que judicialmente exigiu a prestação, não fica dispensado de realizar a favor deste a prestação integral; mas, quando a solidariedade entre os credores tiver sido estabelecida em favor do devedor, este pode, renunciando total ou parcialmente ao benefício, prestar a cada um dos credores a parte que lhe cabe no crédito comum ou satisfazer a algum dos outros a prestação com dedução da parte do demandante.
1. Se a prestação se tornar impossível por facto imputável ao devedor, subsiste a solidariedade relativamente ao crédito da indemnização.
2. Se a prestação se tornar impossível por facto imputável a um dos credores, fica este obrigado a indemnizar os outros.
1. Se o direito de um dos credores se mantiver devido a suspensão ou interrupção da prescrição ou a outra causa, apesar de haverem prescrito os direitos dos restantes credores, pode o devedor opor àquele credor a prescrição do crédito na parte relativa a estes últimos.
2. A renúncia à prescrição, feita pelo devedor em benefício de um dos credores, não produz efeito relativamente aos restantes.
O caso julgado entre um dos credores e o devedor não é oponível aos outros credores; mas pode ser oposto por estes ao devedor, sem prejuízo das excepções pessoais que o devedor tenha o direito de invocar em relação a cada um deles.
A satisfação do direito de um dos credores, por cumprimento, dação em cumprimento, novação, consignação em depósito ou compensação, produz a extinção, relativamente a todos os credores, da obrigação do devedor.
O credor cujo direito foi satisfeito além da parte que lhe competia na relação interna entre os credores tem de satisfazer aos outros a parte que lhes cabe no crédito comum.
São iguais as partes que têm na obrigação divisível os vários credores ou devedores, se outra proporção não resultar da lei ou do negócio jurídico; mas entre os herdeiros do devedor, depois da partilha, são essas partes fixadas proporcionalmente às suas quotas hereditárias, sem prejuízo do disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 1936.º
1. Se a prestação for indivisível e vários os devedores, só de todos os obrigados pode o credor exigir o cumprimento da prestação, salvo se tiver sido estipulada a solidariedade ou esta resultar da lei.
2. Quando ao primitivo devedor da prestação indivisível sucedam vários herdeiros, também só de todos eles tem o credor a possibilidade de exigir o cumprimento da prestação.
Se a obrigação indivisível se extinguir apenas em relação a algum ou alguns dos devedores, não fica o credor inibido de exigir a prestação dos restantes obrigados, contanto que lhes entregue o valor da parte que cabia ao devedor ou devedores exonerados.
Se a prestação indivisível se tornar impossível por facto imputável a algum ou alguns dos devedores, ficam os outros exonerados.
1. Sendo vários os credores da prestação indivisível, qualquer deles tem o direito de exigi-la por inteiro; mas o devedor, enquanto não for judicialmente citado, só relativamente a todos, em conjunto, se pode exonerar.
2. O caso julgado favorável a um dos credores aproveita aos outros, se o devedor não tiver, contra estes, meios especiais de defesa.
Se o objecto da prestação for determinado apenas quanto ao género, compete a sua escolha ao devedor, na falta de estipulação em contrário.
Enquanto a prestação for possível com coisas do género estipulado, não fica o devedor exonerado pelo facto de perecerem aquelas com que se dispunha a cumprir.
A obrigação concentra-se, antes do cumprimento, quando isso resultar de acordo das partes, quando o género se extinguir a ponto de restar apenas uma das coisas nele compreendidas, quando o credor incorrer em mora, ou ainda nos termos do artigo 786.º
1. Se couber ao credor ou a terceiro, a escolha só é eficaz se for declarada, respectivamente, ao devedor ou a ambas as partes, e é irrevogável.
2. Se couber a escolha ao credor e este a não fizer dentro do prazo estabelecido ou daquele que para o efeito lhe for fixado pelo devedor, é a este que a escolha passa a competir.
1. É alternativa a obrigação que compreende duas ou mais prestações, mas em que o devedor se exonera efectuando aquela que, por escolha, vier a ser designada.
2. Na falta de determinação em contrário, a escolha pertence ao devedor.
O devedor não pode escolher parte de uma prestação e parte de outra ou outras, nem ao credor ou a terceiro é lícito fazê-lo quando a escolha lhes pertencer.
Se uma ou algumas das prestações se tornarem impossíveis por causa não imputável às partes, a obrigação considera-se limitada às prestações que forem possíveis.
Se a impossibilidade de alguma das prestações for imputável ao devedor e a escolha lhe pertencer, deve efectuar uma das prestações possíveis; se a escolha pertencer ao credor, este pode exigir uma das prestações possíveis, ou pedir a indemnização pelos danos provenientes de não ter sido efectuada a prestação que se tornou impossível, ou resolver o contrato nos termos gerais.
Se a impossibilidade de alguma das prestações for imputável ao credor e a escolha lhe pertencer, considera-se cumprida a obrigação; se a escolha pertencer ao devedor, também a obrigação se tem por cumprida, a menos que este prefira efectuar outra prestação e ser indemnizado dos danos que houver sofrido.
O credor, na execução, pode exigir que o devedor, dentro do prazo que lhe for fixado pelo tribunal, declare por qual das prestações quer optar, sob pena de se devolver ao credor o direito de escolha.
À escolha que o credor ou terceiro deva efectuar é aplicável o disposto no artigo 535.º
O cumprimento das obrigações pecuniárias faz-se em moeda que tenha curso legal em Macau à data em que for efectuado e pelo valor nominal que a moeda nesse momento tiver, salvo estipulação em contrário.
Quando a lei permitir a actualização das prestações pecuniárias, por virtude das flutuações do valor da moeda, deve atender-se, na falta de outro critério legal, aos índices dos preços, de modo a restabelecer, entre a prestação e a quantidade de mercadorias a que ela equivale, a relação existente na data em que a obrigação se constituiu.
O curso legal ou forçado da nota de banco não prejudica a validade do acto pelo qual alguém se comprometa a pagar em moeda metálica ou em valor dessa moeda.
Quando for estipulado o pagamento em certa espécie monetária, o pagamento deve ser feito na espécie estipulada, existindo ela legalmente, embora tenha variado de valor após a data em que a obrigação foi constituída.
Quando o quantitativo da obrigação é expresso em dinheiro corrente, mas se estipula que o cumprimento é efectuado em certa espécie monetária ou em moedas de certo metal, presume-se que as partes querem vincular-se ao valor corrente que a moeda ou as moedas do metal escolhido tinham à data da estipulação.
1. Quando se tiver estipulado o cumprimento em determinada espécie monetária, em certo metal ou em moedas de certo metal, e se não encontrem as espécies ou as moedas estipuladas em quantidade bastante, pode o pagamento ser feito, quanto à parte da dívida que não for possível cumprir nos termos acordados, em moeda corrente que perfaça o valor dela, segundo o valor corrente que a moeda escolhida ou as moedas do metal indicado tiverem no dia do cumprimento, ou, na falta deste, segundo o valor corrente que o metal tiver na mesma data.
2. Ao último dos valores indicados no número anterior se deve atender quando a moeda, devido à sua raridade, tenha atingido um preço corrente anormal, com que as partes não hajam contado no momento em que a obrigação se constituiu.
1. Sempre que a espécie monetária estipulada ou as moedas do metal estipulado não tenham já curso legal na data do cumprimento, deve a prestação ser feita em moeda que tenha curso legal nessa data, de harmonia com a norma de redução que a lei tiver estabelecido ou, na falta de determinação legal, segundo a relação de valores correntes na data em que a nova moeda for introduzida.
2. Quando o quantitativo da obrigação tiver sido expresso em moeda corrente, estipulando-se o pagamento em espécies monetárias, em certo metal ou em moedas de certo metal, e essas moedas carecerem de curso legal na data do cumprimento, deve observar-se a doutrina do número anterior, uma vez determinada a quantidade dessas moedas que constituía o montante da prestação em dívida.
1. No caso de se ter convencionado o cumprimento em moedas de um entre dois ou mais metais, a determinação da pessoa a quem a escolha pertence é feita de acordo com as regras das obrigações alternativas.
2. Quando se estipular o cumprimento da obrigação em moedas de dois ou mais metais, sem se fixar a proporção de umas e outras, o devedor cumpre entregando em partes iguais moedas dos metais especificados.
1. A estipulação do cumprimento em moeda sem curso legal em Macau não impede o devedor de pagar em moeda de Macau, segundo o câmbio do dia do cumprimento e do lugar para este estabelecido, salvo se essa faculdade houver sido afastada pelos interessados.
2. Se, porém, o credor estiver em mora, pode o devedor cumprir de acordo com o câmbio da data em que a mora se deu.
1. Os juros legais e os estipulados sem determinação de taxa ou quantitativo são fixados por portaria do Governador.
2. A estipulação de juros a taxa superior à fixada nos termos do número anterior deve ser feita por escrito, sob pena de apenas serem devidos na medida dos juros legais.
É aplicável o disposto no artigo 1073.º a toda a estipulação de juros ou quaisquer outras vantagens em negócios ou actos de concessão, outorga, renovação, desconto ou prorrogação do prazo de pagamento de um crédito e em outros análogos.
1. As partes podem convencionar por escrito, a todo o tempo, a capitalização de juros e os períodos por que deva efectuar-se, observando-se o disposto no número seguinte.
2. O período de capitalização de juros não pode ser inferior a 30 dias, excepto quando for estabelecida para a renovação do contrato que dê causa aos juros.
Desde que se constitui, o crédito de juros não fica necessariamente dependente do crédito principal, podendo qualquer deles ser cedido ou extinguir-se sem o outro.
Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.
A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.
1. O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão.
2. Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente é remetida para decisão ulterior.
Devendo a indemnização ser fixada em execução de sentença, pode o tribunal condenar desde logo o devedor no pagamento de uma indemnização, dentro do quantitativo que considere já provado.
1. A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível.
2. Quando a reconstituição natural seja possível mas não repare integralmente os danos, é fixada em dinheiro a indemnização correspondente à parte dos danos por ela não cobertos.
3. A indemnização é igualmente fixada em dinheiro quando a reconstituição natural seja excessivamente onerosa para o devedor.
4. Quando, todavia, o evento causador do dano não haja cessado, o lesado tem sempre o direito a exigir a sua cessação, sem as limitações constantes do número anterior, salvo se os interesses lesados se revelarem de diminuta importância.
5. Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos.
6. Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julga equitativamente dentro dos limites que tiver por provados.
1. Atendendo à natureza continuada dos danos, pode o tribunal, a requerimento do lesado, dar à indemnização, no todo ou em parte, a forma de renda vitalícia ou temporária, determinando as providências necessárias para garantir o seu pagamento.
2. Quando sofram alteração sensível as circunstâncias em que assentou, quer o estabelecimento da renda, quer o seu montante ou duração, quer a dispensa ou imposição de garantias, a qualquer das partes é permitido exigir a correspondente modificação da sentença ou acordo.
Quando a indemnização resulte da perda de qualquer coisa ou direito, o responsável pode exigir, no acto do pagamento ou em momento posterior, que o lesado lhe ceda os seus direitos contra terceiros.
Quem exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exacta em que avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o impede, no decurso da acção, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos.
1. Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.
2. Se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar.
Ao facto culposo do lesado é equiparado o facto culposo dos seus representantes legais e das pessoas de quem ele se tenha utilizado.
Àquele que alega a culpa do lesado incumbe a prova da sua verificação; mas o tribunal pode conhecer dela, ainda que não seja alegada.
A obrigação de informação existe, sempre que o titular de um direito tenha dúvida fundada acerca da sua existência ou do seu conteúdo e outrem esteja em condições de prestar as informações necessárias.
1. Ao que invoca um direito, pessoal ou real, ainda que condicional ou a prazo, relativo a certa coisa, móvel ou imóvel, é lícito exigir do possuidor ou detentor a apresentação da coisa, desde que o exame seja necessário para apurar a existência ou o conteúdo do direito e o demandado não tenha motivos para fundadamente se opor à diligência.
2. Quando aquele de quem se exige a apresentação da coisa a detiver em nome de outrem, deve avisar a pessoa em cujo nome a detém, logo que seja exigida a apresentação, a fim de ela, se quiser, usar os meios de defesa que no caso couberem.
As disposições do artigo anterior são, com as necessárias adaptações, extensivas aos documentos, desde que o requerente tenha um interesse jurídico atendível no exame deles.
Feita a apresentação, o requerente tem a faculdade de tirar cópias ou fotografias, ou usar de outros meios destinados a obter a reprodução da coisa ou documento, desde que a reprodução se mostre necessária e se lhe não oponha motivo grave alegado pelo requerido.
1. O credor pode ceder a terceiro uma parte ou a totalidade do crédito, independentemente do consentimento do devedor, contanto que a cessão não seja interdita por determinação da lei ou convenção das partes e o crédito não esteja, pela própria natureza da prestação, ligado à pessoa do credor.
2. A convenção pela qual se proíba ou restrinja a possibilidade da cessão não é oponível ao cessionário, salvo se este a conhecia no momento da cessão.
1. Os requisitos e efeitos da cessão entre as partes definem-se em função do tipo de negócio que lhe serve de base.
2. A cessão de créditos hipotecários, quando não seja feita em testamento e a hipoteca recaia sobre bens cuja alienação onerosa esteja sujeita a escritura pública, deve necessariamente constar de escritura pública.
1. É nula a cessão de créditos ou outros direitos litigiosos feita, directamente ou por interposta pessoa, a juízes ou magistrados do Ministério Público, funcionários de justiça ou mandatários judiciais, bem como a cessão desses créditos ou direitos feita a peritos ou outros auxiliares da justiça que tenham intervenção no respectivo processo.
2. Entende-se que a cessão é efectuada por interposta pessoa, quando é feita ao cônjuge ou unido de facto do inibido ou a pessoa de quem este seja herdeiro presumido, ou quando é feita a terceiro, de acordo com o inibido, para o cessionário transmitir a este a coisa ou direito cedido.
3. Diz-se litigioso o direito que tiver sido contestado em juízo contencioso, ainda que arbitral, por qualquer interessado.
1. A cessão feita com quebra do disposto no artigo anterior, além de nula, sujeita o cessionário à obrigação de reparar os danos causados, nos termos gerais.
2. A nulidade da cessão não pode ser invocada pelo cessionário.
A proibição da cessão dos créditos ou direitos litigiosos não tem lugar nos casos seguintes:
a) Quando a cessão for feita ao titular de um direito de preferência ou de remição relativo ao direito cedido;
b) Quando a cessão se realizar para defesa de bens possuídos pelo cessionário;
c) Quando a cessão se fizer ao credor em cumprimento do que lhe é devido.
1. Na falta de convenção em contrário, a cessão do crédito importa a transmissão, para o cessionário, das garantias e outros acessórios do direito transmitido, que não sejam inseparáveis da pessoa do cedente.
2. A coisa empenhada que estiver na posse do cedente é entregue ao cessionário, mas não a que estiver na posse de terceiro.
1. A cessão produz efeitos em relação ao devedor desde que lhe seja notificada, ainda que extrajudicialmente, ou desde que ele a aceite.
2. Se, porém, antes da notificação ou aceitação, o devedor pagar ao cedente ou celebrar com ele algum negócio jurídico relativo ao crédito, nem o pagamento nem o negócio é oponível ao cessionário, se este provar que o devedor tinha conhecimento da cessão.
Se o mesmo crédito for cedido a várias pessoas, prevalece a cessão que primeiro for notificada ao devedor ou que por este tiver sido aceite.
O devedor pode opor ao cessionário, ainda que este os ignorasse, todos os meios de defesa que lhe seria lícito invocar contra o cedente, com ressalva dos que provenham de facto posterior ao conhecimento da cessão.
O cedente é obrigado a entregar ao cessionário os documentos e outros meios probatórios do crédito, que estejam na sua posse e em cuja conservação não tenha interesse legítimo.
1. O cedente garante ao cessionário a existência e a exigibilidade do crédito ao tempo da cessão, nos termos aplicáveis ao negócio, gratuito ou oneroso, em que a cessão se integra.
2. O cedente só garante a solvência do devedor se a tanto expressamente se tiver obrigado.
As regras da cessão de créditos são extensivas, na parte aplicável, à cessão de quaisquer outros direitos não exceptuados por lei, bem como à transferência legal ou judicial de créditos.
O credor que recebe a prestação de terceiro pode sub-rogá-lo nos seus direitos, desde que o faça expressamente até ao momento do cumprimento da obrigação.
1. O terceiro que cumpre a obrigação pode ser igualmente sub-rogado pelo devedor nos direitos do credor até ao momento do cumprimento, sem necessidade do consentimento deste.
2. A vontade de sub-rogar deve ser expressamente manifestada.
1. O devedor que cumpre a obrigação com dinheiro ou outra coisa fungível emprestada por terceiro pode sub-rogar este nos direitos do credor.
2. A sub-rogação não necessita do consentimento do credor, mas só se verifica quando haja declaração expressa, no documento do empréstimo, de que a coisa se destina ao cumprimento da obrigação e de que o mutuante fica sub-rogado nos direitos do credor.
Fora dos casos previstos nos artigos anteriores ou noutras disposições da lei, o terceiro que cumpre a obrigação só fica sub-rogado nos direitos do credor quando tiver garantido o cumprimento, ou quando, por outra causa, estiver directamente interessado na satisfação do crédito.
1. O sub-rogado adquire, na medida da satisfação dada ao direito do credor, os poderes que a este competiam.
2. No caso de satisfação parcial, a sub-rogação não prejudica os direitos do credor ou do seu cessionário, quando outra coisa não for estipulada.
3. Havendo vários sub-rogados, ainda que em momentos sucessivos, por satisfações parciais do crédito, nenhum deles tem preferência sobre os demais.
Ao cumprimento é equiparada, para efeitos de sub-rogação, a dação em cumprimento, a consignação em depósito, a compensação, quando esta possa ser efectuada por terceiro, ou outra causa de satisfação do crédito compatível com a sub-rogação.
É aplicável à sub-rogação, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 576.º a 578.º
1. A transmissão a título singular de uma dívida pode verificar-se:
a) Por contrato entre o antigo e o novo devedor, ratificado pelo credor; ou
b) Por contrato entre o novo devedor e o credor, com ou sem consentimento do antigo devedor.
2. Em qualquer dos casos a transmissão só exonera o antigo devedor havendo declaração expressa do credor; de contrário, o antigo devedor responde solidariamente com o novo obrigado.
1. Enquanto não for ratificado pelo credor, podem as partes revogar o contrato a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo anterior.
2. Qualquer das partes tem o direito de fixar ao credor um prazo para a ratificação, findo o qual esta se considera recusada.
Se o contrato de transmissão da dívida for declarado nulo ou anulado e o credor tiver exonerado o anterior obrigado, renasce a obrigação deste, mas consideram-se extintas as garantias prestadas por terceiro, excepto se este conhecia o vício na altura em que teve notícia da transmissão.
Na falta de convenção em contrário, o novo devedor não tem o direito de opor ao credor os meios de defesa baseados nas relações entre ele e o antigo devedor, mas pode opor-lhe os meios de defesa derivados das relações entre o antigo devedor e o credor, desde que o seu fundamento seja anterior à assunção da dívida e se não trate de meios de defesa pessoais do antigo devedor.
1. Com a dívida transmitem-se para o novo devedor, salvo convenção em contrário, as obrigações acessórias do antigo devedor que não sejam inseparáveis da pessoa deste.
2. Mantêm-se nos mesmos termos as garantias do crédito, com excepção das que tiverem sido constituídas por terceiro ou pelo antigo devedor, que não haja consentido na transmissão da dívida.
O credor que tiver exonerado o antigo devedor fica impedido de exercer contra ele o seu direito de crédito ou qualquer direito de garantia, se o novo devedor se mostrar insolvente, a não ser que expressamente haja ressalvado a responsabilidade do primitivo obrigado.
Pelo cumprimento da obrigação respondem todos os bens do devedor susceptíveis de penhora, sem prejuízo dos regimes especialmente estabelecidos em consequência da separação de patrimónios.
Salvo quando se trate de matéria subtraída à disponibilidade das partes, é possível, por convenção entre elas, limitar a responsabilidade do devedor a alguns dos seus bens no caso de a obrigação não ser voluntariamente cumprida.
1. Os bens deixados ou doados com a cláusula de exclusão da responsabilidade por dívidas do beneficiário respondem pelas obrigações posteriores à liberalidade, e também pelas anteriores se for registada a penhora antes do registo daquela cláusula.
2. Se a liberalidade tiver por objecto bens não sujeitos a registo, a cláusula só é oponível aos credores cujo direito seja anterior à liberalidade; contudo, esses credores poderão, em caso de insuficiência do património remanescente, afectar os bens objecto da liberalidade, se provarem que desconheciam sem culpa a cláusula de exclusão e que a confiança que nesses bens razoavelmente depositaram para a satisfação dos seus créditos lhes acarretou prejuízos.
1. Não existindo causas legítimas de preferência, os credores têm o direito de ser pagos proporcionalmente pelo preço dos bens do devedor, quando ele não chegue para integral satisfação dos débitos.
2. São causas legítimas de preferência, além de outras admitidas na lei, a consignação de rendimentos, o penhor, a hipoteca, o privilégio e o direito de retenção.
1. Os credores têm legitimidade para invocar a nulidade dos actos praticados pelo devedor, quer estes sejam anteriores, quer posteriores à constituição do crédito, desde que tenham interesse na declaração da nulidade, não sendo necessário que o acto produza ou agrave a insolvência do devedor.
2. A nulidade aproveita não só ao credor que a tenha invocado, como a todos os demais.
1. Sempre que o devedor o não faça, tem o credor a faculdade de exercer, contra terceiro, os direitos de conteúdo patrimonial que competem àquele, excepto se, por sua própria natureza ou disposição da lei, só puderem ser exercidos pelo respectivo titular.
2. A sub-rogação, porém, só é permitida quando seja essencial à satisfação ou garantia do direito do credor.
O credor sob condição suspensiva e o credor a prazo apenas são admitidos a exercer a sub-rogação quando mostrem ter interesse em não aguardar a verificação da condição ou o vencimento do crédito.
Sendo exercida judicialmente a sub-rogação, é necessária a citação do devedor.
A sub-rogação exercida por um dos credores aproveita a todos os demais.
Os actos que envolvam diminuição da garantia patrimonial do crédito e não sejam de natureza pessoal podem ser impugnados pelo credor, se concorrerem as circunstâncias seguintes:
a) Ser o crédito anterior ao acto ou, sendo posterior, ter sido o acto realizado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor;
b) Resultar do acto a impossibilidade, para o credor, de obter a satisfação integral do seu crédito, ou agravamento dessa impossibilidade.
Incumbe ao credor a prova do montante das dívidas, e ao devedor ou a terceiro interessado na manutenção do acto a prova de que o obrigado possui bens penhoráveis de igual ou maior valor.
1. O acto oneroso só está sujeito à impugnação pauliana se o devedor e o terceiro tiverem agido de má fé; se o acto for gratuito, a impugnação procede, ainda que um e outro agissem de boa fé.
2. Entende-se por má fé a consciência do prejuízo que o acto causa ao credor.
Presume-se que o contrato de compra e venda entre os cônjuges que envolva diminuição da garantia patrimonial do crédito de terceiro e que tenha sido celebrado posteriormente à constituição do crédito foi celebrado de má fé.
1. Para que a impugnação proceda contra as transmissões posteriores, é necessário:
a) Que, relativamente à primeira transmissão, se verifiquem os requisitos da impugnabilidade referidos nos artigos anteriores; e
b) Que haja má fé tanto do alienante como do posterior adquirente, no caso de a nova transmissão ser a título oneroso.
2. O disposto no número anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, à constituição de direitos sobre os bens transmitidos em benefício de terceiro.
1. Não obsta ao exercício da impugnação o facto de o direito do credor não ser ainda exigível.
2. O credor sob condição suspensiva pode, durante a pendência da condição, verificados os requisitos da impugnabilidade, exigir a prestação de caução.
1. Não obsta à impugnação a nulidade do acto realizado pelo devedor.
2. O cumprimento de obrigação vencida não está sujeito a impugnação; mas é impugnável o cumprimento tanto da obrigação ainda não exigível como da obrigação natural.
1. Julgada procedente a impugnação, o credor tem direito à restituição dos bens na medida do seu interesse, podendo executá-los no património do obrigado à restituição e praticar os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei.
2. O adquirente de má fé é responsável pelo valor dos bens que tenha alienado, bem como dos que tenham perecido ou se hajam deteriorado por caso fortuito, salvo se provar que a perda ou deterioração se teriam igualmente verificado no caso de os bens se encontrarem no poder do devedor.
3. O adquirente de boa fé responde só na medida do seu enriquecimento.
4. Os efeitos da impugnação aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido.
1. Julgada procedente a impugnação, se o acto impugnado for de natureza gratuita, o devedor só é responsável perante o adquirente nos termos do disposto em matéria de doações; sendo o acto oneroso, o adquirente tem somente o direito de exigir do devedor aquilo com que este se enriqueceu.
2. Os direitos que terceiro adquira contra o devedor não prejudicam a satisfação dos direitos do credor sobre os bens que são objecto da restituição.
O direito de impugnação caduca ao fim de 5 anos, contados da data do acto impugnável.
1. O credor que tenha justo receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor, nos termos da lei de processo.
2. O credor tem o direito de requerer o arresto contra o adquirente dos bens do devedor, se tiver sido judicialmente impugnada a transmissão.
O requerente do arresto é obrigado a prestar caução, se esta lhe for exigida pelo tribunal.
Se o arresto for julgado injustificado ou caducar, o requerente é responsável pelos danos causados ao arrestado, quando não tenha agido com a prudência normal.
1. Os actos de disposição dos bens arrestados são ineficazes em relação ao requerente do arresto, de acordo com as regras próprias da penhora.
2. Ao arresto são extensivos, na parte aplicável, os demais efeitos da penhora.
1. Se alguém for obrigado ou autorizado por lei a prestar caução, sem se designar a espécie que ela deve revestir, pode a garantia ser prestada por meio de depósito de dinheiro, títulos de crédito, pedras ou metais preciosos, ou por penhor, hipoteca ou fiança bancária.
2. Se a caução não puder ser prestada por nenhum dos meios referidos, é lícita a prestação de outra espécie de fiança, desde que o fiador renuncie ao benefício da excussão.
3. Cabe ao tribunal apreciar a idoneidade da caução, sempre que não haja acordo dos interessados.
1. Se alguém for obrigado ou autorizado por negócio jurídico a prestar caução, ou esta for imposta pelo tribunal, é permitido prestá-la por meio de qualquer garantia, real ou pessoal.
2. É aplicável, nestes casos, o disposto no n.º 3 do artigo anterior.
1. Se a pessoa obrigada à caução a não prestar, o credor tem o direito de requerer o registo de hipoteca sobre os bens do devedor, ou outra cautela idónea, salvo se for diferente a solução especialmente fixada na lei.
2. A garantia limita-se aos bens suficientes para assegurar o direito do credor.
Quando a caução prestada se torne insuficiente ou imprópria, por causa não imputável ao credor, tem este o direito de exigir que ela seja reforçada ou que seja prestada outra forma de caução.
1. O fiador garante a satisfação do direito de crédito, ficando pessoalmente obrigado perante o credor.
2. A obrigação do fiador é acessória da que recai sobre o principal devedor.
1. A vontade de prestar fiança deve ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal.
2. A fiança pode ser prestada sem conhecimento do devedor ou contra a vontade dele, e à sua prestação não obsta o facto de a obrigação ser futura ou condicional.
1. Aquele que encarrega outrem de dar crédito a terceiro, em nome e por conta do encarregado, responde como fiador, se o encargo for aceite.
2. O autor do encargo tem a faculdade de revogar o mandato enquanto o crédito não for concedido, assim como a todo o momento o pode denunciar, sem prejuízo da responsabilidade pelos danos que haja causado.
3. É lícito ao encarregado recusar o cumprimento do encargo, sempre que a situação patrimonial dos outros contraentes ponha em risco o seu futuro direito.
Subfiador é aquele que afiança o fiador perante o credor.
1. A fiança não pode exceder a dívida principal nem ser contraída em condições mais onerosas, mas pode ser contraída por quantidade menor ou em condições menos onerosas.
2. Se exceder a dívida principal ou for contraída em condições mais onerosas, a fiança não é nula, mas apenas redutível aos precisos termos da dívida afiançada.
1. A fiança não é válida se o não for a obrigação principal.
2. Sendo, porém, anulada a obrigação principal, por incapacidade ou por falta ou vício da vontade do devedor, nem por isso a fiança deixa de ser válida, se o fiador conhecia a causa da anulabilidade ao tempo em que a fiança foi prestada.
1. Se algum devedor estiver obrigado a dar fiador, não é o credor forçado a aceitar quem não tiver capacidade para se obrigar ou não tiver bens suficientes para garantir a obrigação.
2. Se o fiador nomeado mudar de fortuna, de modo que haja risco de insolvência, tem o credor a faculdade de exigir o reforço da fiança.
3. Se o devedor não reforçar a fiança ou não oferecer outra garantia idónea dentro do prazo que lhe for fixado pelo tribunal, tem o credor o direito de exigir o imediato cumprimento da obrigação.
A fiança tem o conteúdo da obrigação principal e cobre as consequências legais e contratuais da mora ou culpa do devedor.
1. O caso julgado entre credor e devedor não é oponível ao fiador, mas a este é lícito invocá-lo em seu benefício, salvo se respeitar a circunstâncias pessoais do devedor que não excluam a responsabilidade do fiador.
2. O caso julgado entre credor e fiador aproveita ao devedor, desde que respeite à obrigação principal, mas não o prejudica o caso julgado desfavorável.
1. A interrupção da prescrição relativamente ao devedor não produz efeito contra o fiador, nem a interrupção relativa a este tem eficácia contra aquele; mas, se o credor interromper a prescrição contra o devedor e der conhecimento do facto ao fiador, considera-se a prescrição interrompida contra este na data da comunicação.
2. A suspensão da prescrição relativamente ao devedor não produz efeito em relação ao fiador, nem a suspensão relativa a este se repercute naquele.
3. A renúncia à prescrição por parte de um dos obrigados também não produz efeito relativamente ao outro.
1. Além dos meios de defesa que lhe são próprios, o fiador tem o direito de opor ao credor aqueles que competem ao devedor, salvo se forem incompatíveis com a obrigação do fiador.
2. A renúncia do devedor a qualquer meio de defesa não produz efeito em relação ao fiador.
1. Ao fiador é lícito recusar o cumprimento enquanto o credor não tiver excutido todos os bens do devedor sem obter a satisfação do seu crédito.
2. É lícita ainda a recusa, não obstante a excussão de todos os bens do devedor, se o fiador provar que o crédito não foi satisfeito por culpa do credor.
1. Se, para segurança da mesma dívida, houver garantia real constituída por terceiro, contemporânea da fiança ou anterior a ela, tem o fiador o direito de exigir a execução prévia das coisas sobre que recai a garantia real.
2. Quando as coisas oneradas garantam outros créditos do mesmo credor, cujas garantias tenham sido constituídas anteriormente ou contemporaneamente à fiança, o disposto no número anterior só é aplicável se o valor delas for suficiente para satisfazer a todos.
3. O autor da garantia real, depois de executado, não fica sub-rogado nos direitos do credor contra o fiador.
O fiador não pode invocar os benefícios constantes dos artigos anteriores:
a) Se houver renunciado ao benefício da excussão e, em especial, se tiver assumido a obrigação de principal pagador; ou
b) Se o devedor ou o dono dos bens onerados com a garantia não puder, em virtude de facto posterior à constituição da fiança, ser demandado ou executado em Macau.
1. O credor, ainda que o fiador goze do benefício da excussão, pode demandá-lo só ou juntamente com o devedor; se for demandado só, ainda que não goze do benefício da excussão, o fiador tem a faculdade de chamar o devedor à demanda, para com ele se defender ou ser conjuntamente condenado.
2. Salvo declaração expressa em contrário no processo, a falta de chamamento do devedor à demanda importa renúncia ao benefício da excussão.
1. Ao fiador é lícito recusar o cumprimento enquanto o direito do credor puder ser satisfeito por compensação com um crédito do devedor ou este tiver a possibilidade de se valer da compensação com uma dívida do credor.
2. Enquanto o devedor tiver o direito de impugnar o negócio donde provém a sua obrigação, pode igualmente o fiador recusar o cumprimento.
O subfiador goza do benefício da excussão, tanto em relação ao fiador como em relação ao devedor.
O fiador que cumprir a obrigação fica sub-rogado nos direitos do credor, na medida em que estes foram por ele satisfeitos.
1. O fiador que cumprir a obrigação deve avisar do cumprimento o devedor, sob pena de perder o seu direito contra este no caso de o devedor, por erro, efectuar de novo a prestação.
2. O fiador que, nos termos do número anterior, perder o seu direito contra o devedor pode repetir do credor a prestação feita, como se fosse indevida.
O devedor que cumprir a obrigação deve avisar o fiador, sob pena de responder pelo prejuízo que causar se culposamente o não fizer.
O devedor que consentir no cumprimento pelo fiador ou que, avisado por este, lhe não der conhecimento, injustificadamente, dos meios de defesa que poderia opor ao credor fica impedido de opor esses meios contra o fiador.
É permitido ao fiador exigir a sua liberação, ou a prestação de caução para garantia do seu direito eventual contra o devedor, nos casos seguintes:
a) Se o credor obtiver contra o fiador sentença exequível;
b) Se os riscos da fiança se agravarem sensivelmente;
c) Se, após a assunção da fiança, o devedor se houver colocado na situação prevista na alínea b) do artigo 636.º;
d) Se o devedor se houver comprometido a desonerar o fiador dentro de certo prazo ou verificado certo evento e já tiver decorrido o prazo ou se tiver verificado o evento previsto;
e) Se houverem decorrido 5 anos, não tendo a obrigação principal um termo, ou se, tendo-o, houver prorrogação legal imposta a qualquer das partes.
1. Se várias pessoas tiverem, isoladamente, afiançado o devedor pela mesma dívida, responde cada uma delas pela satisfação integral do crédito, excepto se foi convencionado o benefício da divisão; são aplicáveis, naquele caso, com as ressalvas necessárias, as regras das obrigações solidárias.
2. Se os fiadores se houverem obrigado conjuntamente, ainda que em momentos diferentes, é lícito a qualquer deles invocar o benefício da divisão, respondendo, porém, cada um deles, proporcionalmente, pela quota do confiador que se encontre insolvente.
3. É equiparado ao fiador insolvente aquele que não puder ser demandado, nos termos da alínea b) do artigo 636.º
1. Havendo vários fiadores, e respondendo cada um deles pela totalidade da prestação, o que tiver cumprido fica sub-rogado nos direitos do credor contra o devedor e, de harmonia com as regras das obrigações solidárias, contra os outros fiadores.
2. Se o fiador, judicialmente demandado, cumprir integralmente a obrigação ou uma parte superior à sua quota, apesar de lhe ser lícito invocar o benefício da divisão, tem o direito de reclamar dos outros as quotas deles no que haja pago a mais, ainda que o devedor não esteja insolvente.
3. Se o fiador, podendo embora invocar o benefício da divisão, cumprir voluntariamente a obrigação nas condições previstas no número anterior, o seu regresso contra os outros fiadores só é admitido depois de excutidos todos os bens do devedor.
4. Se algum dos fiadores tiver um subfiador, este não responde, perante os outros fiadores, pela quota do seu afiançado que se mostre insolvente, salvo se o contrário resultar do acto da subfiança.
A extinção da obrigação principal determina a extinção da fiança.
1. Se a obrigação principal for a prazo, o fiador que gozar do benefício da excussão pode exigir, vencida a obrigação, que o credor proceda contra o devedor dentro de 2 meses, a contar do vencimento, sob pena de a fiança caducar; este prazo não termina sem decorrer 1 mês sobre a notificação feita ao credor.
2. O fiador que goze do benefício da excussão pode exigir ao credor, sob igual cominação, a interpelação do devedor, quando dela depender o vencimento da obrigação e houver decorrido mais de 1 ano sobre a assunção da fiança.
Os fiadores, ainda que solidários, ficam desonerados da obrigação que contraíram, na medida em que, por facto positivo ou negativo do credor, não puderem ficar sub-rogados nos direitos que a este competem.
Sendo a fiança prestada para garantia de obrigação futura, tem o fiador, enquanto a obrigação se não constituir, a possibilidade de liberar-se da garantia, se a situação patrimonial do devedor se agravar em termos de pôr em risco os seus direitos eventuais contra este, ou se tiverem decorrido 5 anos sobre a prestação da fiança, quando outro prazo não resulte da convenção.
1. A fiança pelas obrigações do locatário abrange apenas, salvo estipulação em contrário, o período inicial de duração do contrato.
2. Obrigando-se o fiador relativamente aos períodos de renovação, sem se limitar o número destes, a fiança extingue-se, na falta de nova convenção, logo que haja alteração da renda ou decorra o prazo de 5 anos sobre o início da primeira prorrogação.
1. O cumprimento da obrigação, ainda que condicional ou futura, pode ser garantido mediante a consignação dos rendimentos de certos bens imóveis, ou de certos bens móveis sujeitos a registo.
2. A consignação de rendimentos pode garantir o cumprimento da obrigação e o pagamentos dos juros, ou apenas o cumprimento da obrigação ou só o pagamento dos juros.
1. Só tem legitimidade para constituir a consignação quem puder dispor dos rendimentos consignados.
2. É aplicável à consignação constituída por terceiro o disposto no artigo 712.º
1. A consignação é voluntária ou judicial.
2. É voluntária a consignação constituída pelo devedor ou por terceiro, quer mediante negócio entre vivos, quer por meio de testamento, e judicial a que resulta de decisão do tribunal.
1. A consignação de rendimentos pode fazer-se por determinado período de tempo ou até ao pagamento da dívida garantida.
2. Quando incida sobre os rendimentos de bens imóveis, a consignação nunca pode exceder o prazo de 15 anos.
1. O acto constitutivo da consignação voluntária deve constar de escritura pública ou testamento, se respeitar a coisas cuja alienação onerosa esteja sujeita a escritura pública, e de escrito particular, quando recaia sobre as demais coisas.
2. A consignação está sujeita a registo, salvo se tiver por objecto os rendimentos de títulos de crédito nominativos, devendo neste caso ser mencionada nos títulos e averbada, nos termos da respectiva legislação.
1. Na consignação é possível estipular:
a) Que continuem em poder do concedente os bens cujos rendimentos são consignados;
b) Que os bens passem para o poder do credor, o qual fica, na parte aplicável, equiparado ao locatário, sem prejuízo da faculdade de por seu turno os locar;
c) Que os bens passem para o poder de terceiro, por título de locação ou por outro, ficando o credor com o direito de receber os respectivos frutos.
2. Os frutos da coisa são imputados primeiro nos juros, e só depois no capital, se a consignação garantir tanto o capital como os juros.
1. Continuando os bens no poder do concedente, tem o credor o direito de exigir dele a prestação anual de contas, se não houver de receber em cada período uma importância fixa.
2. De igual direito goza o concedente, em relação ao credor, nos demais casos previstos no n.º 1 do artigo anterior.
1. Se os bens cujos rendimentos são consignados passarem para o poder do credor, deve este administrá-los como um proprietário diligente e pagar as contribuições e demais encargos das coisas.
2. O credor só pode liberar-se das obrigações referidas no número anterior renunciando à garantia.
3. À renúncia é aplicado o disposto no artigo 726.º
A consignação extingue-se pelo decurso do prazo estipulado, e ainda pelas mesmas causas por que cessa o direito de hipoteca, com excepção da indicada na alínea b) do artigo 725.º
São aplicáveis à consignação, com as necessárias adaptações, os artigos 688.º, 690.º a 692.º, 697.º e 698.º
1. O penhor confere ao credor o direito à satisfação do seu crédito, bem como dos juros, se os houver, com preferência sobre os demais credores, pelo valor de certa coisa móvel ou de créditos ou outros direitos, pertencentes ao devedor ou a terceiro, desde que não susceptíveis de hipoteca.
2. É havido como penhor o depósito a que se refere o n.º 1 do artigo 619.º
3. A obrigação garantida pelo penhor pode ser futura ou condicional.
1. Só tem legitimidade para dar bens em penhor quem os puder alienar.
2. É aplicável ao penhor constituído por terceiro o disposto no artigo 712.º
As disposições desta secção não prejudicam os regimes especiais estabelecidos por lei para certas modalidades de penhor.
1. O penhor só produz os seus efeitos pela entrega da coisa empenhada, ou de documento que confira a exclusiva disponibilidade dela, ao credor ou a terceiro.
2. A entrega pode consistir na simples atribuição da composse ao credor, se essa atribuição privar o autor do penhor da possibilidade de dispor materialmente da coisa.
Mediante o penhor, o credor pignoratício adquire o direito:
a) De usar, em relação à coisa empenhada, das acções destinadas à defesa da posse, ainda que seja contra o próprio dono;
b) De ser indemnizado das benfeitorias necessárias e úteis e de levantar estas últimas, nos termos do artigo 1198.º;
c) De exigir a substituição ou o reforço do penhor ou o cumprimento imediato da obrigação, se a coisa empenhada perecer ou se tornar insuficiente para segurança da dívida, nos termos fixados para a garantia hipotecária.
O credor pignoratício é obrigado:
a) A guardar e administrar como um proprietário diligente a coisa empenhada, respondendo pela sua existência e conservação;
b) A não usar dela sem consentimento do autor do penhor, excepto se o uso for indispensável à conservação da coisa; e
c) A restituir a coisa, extinta a obrigação a que serve de garantia.
1. Os frutos da coisa empenhada destinam-se ao pagamento dos juros vencidos e das despesas feitas com a coisa, devendo o excesso, na falta de convenção em contrário, ser abatido no capital que for devido.
2. Havendo lugar à restituição de frutos, não se consideram estes, salvo convenção em contrário, abrangidos pelo penhor.
Se o credor usar da coisa empenhada contra o disposto na alínea b) do artigo 667.º, ou proceder de forma que a coisa corra o risco de perder-se ou deteriorar-se, tem o autor do penhor o direito de exigir que ele preste caução idónea ou que a coisa seja depositada em poder de terceiro.
1. Sempre que haja receio fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore, tem o credor, bem como o autor do penhor, a faculdade de proceder à venda antecipada da coisa, mediante prévia autorização judicial.
2. Sobre o produto da venda fica o credor com os direitos que lhe cabiam em relação à coisa vendida, podendo o tribunal, no entanto, ordenar que o preço seja depositado.
3. O autor do penhor tem faculdade de impedir a venda antecipada da coisa, oferecendo outra garantia real idónea.
1. Vencida a obrigação, adquire o credor o direito de se pagar pelo produto da venda judicial da coisa empenhada, podendo a venda ser feita extrajudicialmente, se as partes assim o tiverem convencionado.
2. É lícito aos interessados convencionar que a coisa empenhada seja adjudicada ao credor pelo valor que o tribunal fixar.
1. O direito de penhor pode ser transmitido independentemente da cessão do crédito, sendo aplicável neste caso, com as necessárias adaptações, o disposto sobre a transmissão da hipoteca.
2. À entrega da coisa empenhada ao cessionário é aplicável o disposto no n.º 2 do artigo 576.º
O penhor extingue-se pela restituição da coisa empenhada, ou do documento a que se refere o n.º 1 do artigo 665.º, e ainda pelas mesmas causas por que cessa o direito da hipoteca, com excepção da indicada na alínea b) do artigo 725.º
São aplicáveis ao penhor, com as necessárias adaptações, os artigos 688.º, 690.º a 695.º, 697.º e 698.º
São extensivas ao penhor de direitos, com as necessárias adaptações, as disposições da subsecção anterior, em tudo o que não seja contrariado pela natureza especial desse penhor ou pelo preceituado nos artigos subsequentes.
Só é admitido o penhor de direitos quando estes tenham por objecto coisas móveis e sejam susceptíveis de transmissão.
1. A constituição do penhor de direitos está sujeita à forma e publicidade exigidas para a transmissão dos direitos empenhados.
2. Se, porém, tiver por objecto um crédito, o penhor só produz os seus efeitos desde que seja notificado ao respectivo devedor, ou desde que este o aceite, salvo tratando-se de penhor sujeito a registo, pois neste caso produz os seus efeitos a partir do registo.
3. A ineficácia do penhor por falta de notificação ou registo não impede a aplicação, com as necessárias correcções, do disposto no n.º 2 do artigo 577.º
O titular do direito empenhado deve entregar ao credor pignoratício os documentos comprovativos desse direito que estiverem na sua posse e em cuja conservação não tenha interesse legítimo.
O credor pignoratício é obrigado a praticar os actos indispensáveis à conservação do direito empenhado e a cobrar os juros e demais prestações acessórias compreendidas na garantia.
Dado em penhor um direito por virtude do qual se possa exigir uma prestação, as relações entre o obrigado e o credor pignoratício estão sujeitas às disposições aplicáveis, na cessão de créditos, às relações entre o devedor e o cessionário.
1. O credor pignoratício deve cobrar o crédito empenhado logo que este se torne exigível, passando o penhor a incidir sobre a coisa prestada em satisfação desse crédito.
2. Se, porém, o crédito tiver por objecto a prestação de dinheiro ou de outra coisa fungível, o devedor não pode fazê-la senão aos dois credores conjuntamente; na falta de acordo entre os interessados, tem o devedor a faculdade de usar da consignação em depósito.
3. Se o mesmo crédito for objecto de vários penhores, só o credor cujo direito prefira aos demais tem legitimidade para cobrar o crédito empenhado; mas os outros têm a faculdade de compelir o devedor a satisfazer a prestação ao credor preferente.
4. O titular do crédito empenhado só pode receber a respectiva prestação com o consentimento do credor pignoratício, extinguindo-se neste caso o penhor.
1. A hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo.
2. A obrigação garantida pela hipoteca pode ser futura ou condicional.
3. As hipotecas são legais, judiciais ou voluntárias.
A hipoteca deve ser registada, sob pena de não produzir efeitos, mesmo em relação às partes.
1. Só podem ser hipotecados:
a) Os prédios rústicos e urbanos;
b) O direito de superfície;
c) O direito resultante de concessões em bens do domínio do território de Macau, nos casos previstos por lei especial ou uma vez observadas as disposições legais relativas à transmissão dos direitos concedidos;
d) O usufruto das coisas e direitos constantes das alíneas anteriores;
e) As coisas móveis que, para este efeito, sejam por lei equiparadas às imóveis.
2. As partes de um prédio susceptíveis de propriedade autónoma sem perda da sua natureza imobiliária podem ser hipotecadas separadamente.
1. É também susceptível de hipoteca a quota de coisa ou direito comum.
2. A divisão da coisa ou direito comum, feita com o consentimento do credor, limita a hipoteca à parte que for atribuída ao devedor.
Não pode ser hipotecada a meação dos bens comuns do casal, nem tão-pouco a quota de herança indivisa.
A hipoteca abrange:
a) As coisas imóveis referidas nas alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 195.º, bem como os direitos referidos no n.º 3 do mesmo artigo;
b) As acessões naturais;
c) As benfeitorias, salvo o direito de terceiros.
1. Se a coisa ou direito hipotecado se perder, deteriorar ou diminuir de valor, e o dono tiver direito a ser indemnizado, os titulares da garantia conservam, sobre o crédito respectivo ou as quantias pagas a título de indemnização, as preferências que lhes competiam em relação à coisa onerada.
2. Depois de notificado da existência da hipoteca, o devedor da indemnização não se libera pelo cumprimento da sua obrigação com prejuízo dos direitos conferidos no número anterior.
3. O disposto nos números anteriores é aplicável às indemnizações devidas por expropriação ou requisição, bem como por extinção do direito de superfície e aos casos análogos.
1. A hipoteca assegura os acessórios do crédito que constem do registo.
2. Tratando-se de juros, a hipoteca só abrange, salvo convenção em contrário, os juros relativos a 3 anos.
3. O disposto no número anterior não impede o registo de nova hipoteca em relação a juros em dívida.
É nula, mesmo que seja anterior ou posterior à constituição da hipoteca, a convenção pela qual o credor faz sua a coisa onerada no caso de o devedor não cumprir.
É igualmente nula a convenção que proíba o respectivo dono de alienar ou onerar os bens hipotecados, embora seja lícito convencionar que o crédito hipotecário se vença logo que esses bens sejam alienados ou onerados.
1. Salvo convenção em contrário, a hipoteca é indivisível, subsistindo por inteiro sobre cada uma das coisas oneradas e sobre cada uma das partes que as constituam, ainda que a coisa ou o crédito seja dividido ou este se encontre parcialmente satisfeito.
2. Porém, a hipoteca sobre imóvel, que venha a ficar sujeito ao regime da propriedade horizontal, é susceptível de ser dividida em tantas hipotecas quantas as fracções autónomas em que o prédio se venha a dividir, para os estritos efeitos da alínea a) do artigo 716.º
3. Cada uma das hipotecas referidas no número anterior garantirá um valor proporcional àquele que, nos termos do título constitutivo da propriedade horizontal, a fracção autónoma represente no valor global do prédio.
O devedor que for dono da coisa hipotecada tem o direito de se opor não só a que outros bens sejam penhorados na execução enquanto se não reconhecer a insuficiência da garantia, mas ainda a que, relativamente aos bens onerados, a execução se estenda além do necessário à satisfação do direito do credor.
1. Sempre que o dono da coisa ou o titular do direito hipotecado seja pessoa diferente do devedor, é-lhe lícito opor ao credor, ainda que o devedor a eles tenha renunciado, os meios de defesa que o devedor tiver contra o crédito, com exclusão das excepções que são recusadas ao fiador.
2. O dono ou titular a que o número anterior se refere tem a faculdade de se opor à execução enquanto o devedor puder impugnar o negócio donde provém a sua obrigação, ou o credor puder ser satisfeito por compensação com um crédito do devedor, ou este tiver a possibilidade de se valer da compensação com uma dívida do credor.
1. Extinguindo-se o usufruto constituído sobre a coisa hipotecada, o direito do credor hipotecário passa a exercer-se sobre a coisa, como se o usufruto nunca tivesse sido constituído.
2. Se a hipoteca tiver por objecto o direito de usufruto, considera-se extinta com a extinção deste direito.
3. Porém, se a extinção do usufruto resultar de renúncia, ou da transferência dos direitos do usufrutuário para o proprietário, ou da aquisição da propriedade por parte daquele, a hipoteca subsiste até ao termo normal do usufruto, como se a extinção do direito se não tivesse verificado.
O corte de árvores ou arbustos, a colheita de frutos naturais e a alienação de partes componentes ou integrantes ou coisas acessórias abrangidas pela hipoteca só são eficazes em relação ao credor hipotecário se forem anteriores ao registo da penhora e couberem nos poderes de administração ordinária.
1. Quando, por causa não imputável ao credor, a coisa hipotecada perecer ou a hipoteca se tornar insuficiente para segurança da obrigação, tem o credor o direito de exigir que o devedor a substitua ou reforce; e, não o fazendo este nos termos declarados na lei de processo, pode aquele exigir o imediato cumprimento da obrigação ou, tratando-se de obrigação futura, registar hipoteca sobre outros bens do devedor.
2. Não obsta ao direito do credor o facto de a hipoteca ter sido constituída por terceiro, salvo se o devedor for estranho à sua constituição; porém, mesmo neste caso, se a diminuição da garantia for devida a culpa do terceiro, o credor tem o direito de exigir deste a substituição ou o reforço, ficando o mesmo sujeito à cominação do número anterior em lugar do devedor.
1. Quando o devedor se comprometa a segurar a coisa hipotecada e não a segure no prazo devido ou deixe rescindir o contrato por falta de pagamento dos respectivos prémios, tem o credor a faculdade de segurá-la à custa do devedor; mas, se o fizer por um valor excessivo, pode o devedor exigir a redução do contrato aos limites convenientes.
2. Nos casos previstos no número anterior, pode o credor reclamar, em lugar do seguro, o imediato cumprimento da obrigação.
As hipotecas legais resultam imediatamente da lei, sem dependência da vontade das partes, e podem constituir-se desde que exista a obrigação a que servem de segurança.
Os credores que têm hipoteca legal são:
a) O território de Macau, sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos à contribuição predial, para garantia do pagamento desta contribuição, contanto que os bens permaneçam no património do devedor à data do registo da hipoteca;
b) O território de Macau, sobre os bens transmitidos susceptíveis de hipoteca, para garantia do pagamento da sisa ou imposto sobre as sucessões e doações, contanto que os bens permaneçam no património do devedor à data do registo da hipoteca;
c) O território de Macau e as demais pessoas colectivas públicas, sobre os bens dos encarregados da gestão de fundos públicos, para garantia do cumprimento das obrigações por que se tornem responsáveis;
d) O menor, o interdito e o inabilitado, sobre os bens do tutor, curador e administrador legal, para assegurar a responsabilidade que nestas qualidades vierem a assumir;
e) O credor por alimentos;
f) O co-herdeiro, sobre os bens adjudicados ao devedor de tornas, para garantir o pagamento destas;
g) O legatário de dinheiro ou outra coisa fungível, sobre os bens sujeitos ao encargo do legado ou, na sua falta, sobre os bens que os herdeiros responsáveis houveram do testador.
1. A determinação do valor da hipoteca estabelecida a favor do menor, interdito ou inabilitado, para efeito do registo, e a designação dos bens sobre que há-se ser registada cabem ao conselho de família.
2. Têm legitimidade para requerer o registo o tutor, curador ou administrador legal, os vogais do conselho de família, o cônjuge e qualquer dos parentes do incapaz.
1. O tribunal pode autorizar, a requerimento do devedor, a substituição da hipoteca legal por outra caução.
2. Não tendo o devedor bens susceptíveis de hipoteca, suficientes para garantir o crédito, pode o credor exigir outra caução, nos termos do artigo 621.º, salvo nos casos das hipotecas destinadas a garantir o pagamento das tornas ou do legado de dinheiro ou outra coisa fungível.
Sem prejuízo do direito de redução, as hipotecas legais podem ser registadas em relação a quaisquer bens do devedor, quando não forem especificados por lei ou no título respectivo os bens sujeitos à garantia.
O credor só goza do direito de reforçar as hipotecas previstas nas alíneas f) e g) do artigo 700.º se a garantia puder continuar a incidir sobre os bens aí especificados.
1. A sentença que condenar o devedor à realização de uma prestação em dinheiro ou outra coisa fungível é título bastante para o registo de hipoteca sobre quaisquer bens do obrigado, mesmo que não haja transitado em julgado.
2. Se a prestação for ilíquida, pode a hipoteca ser registada pelo quantitativo provável do crédito.
3. Se o devedor for condenado a entregar uma coisa ou a prestar um facto, só pode ser registada a hipoteca havendo conversão da prestação numa indemnização pecuniária.
As sentenças de tribunais do exterior de Macau podem igualmente titular o registo da hipoteca judicial, desde que se encontrem revistas e confirmadas quando tal seja condição da sua eficácia em Macau.
Hipoteca voluntária é a que nasce de contrato ou declaração unilateral.
A hipoteca não impede o dono dos bens de os hipotecar de novo; neste caso, extinta uma das hipotecas, ficam os bens a garantir, na sua totalidade, as restantes dívidas hipotecárias.
O acto de constituição ou modificação da hipoteca voluntária, quando recaia sobre bens cuja alienação esteja sujeita a escritura pública, deve constar de escritura pública ou de testamento.
Só tem legitimidade para hipotecar quem puder alienar os respectivos bens.
1. São nulas as hipotecas voluntárias que incidam sobre todos os bens do devedor ou de terceiro sem os especificar.
2. A especificação deve constar do título constitutivo da hipoteca.
1. A hipoteca constituída por terceiro extingue-se na medida em que, por facto positivo ou negativo do credor, não possa dar-se a sub-rogação daquele nos direitos deste.
2. O caso julgado proferido em relação ao devedor produz efeitos relativamente a terceiro que haja constituído a hipoteca, nos termos em que os produz em relação ao fiador.
A hipoteca pode ser reduzida voluntária ou judicialmente.
A redução voluntária só pode ser consentida por quem puder dispor da hipoteca, sendo aplicável à redução o regime estabelecido para a renúncia à garantia.
1. A redução judicial tem lugar, nas hipotecas legais e judiciais, a requerimento de qualquer interessado, quer no que concerne aos bens, quer no que respeita à quantia designada como montante do crédito, excepto se, por convenção ou sentença, a coisa onerada ou a quantia assegurada tiver sido especialmente indicada.
2. No caso previsto na parte final do número anterior, ou no de hipoteca voluntária, a redução judicial só é admitida:
a) Se, em consequência do cumprimento parcial ou outra causa de extinção, a dívida se encontrar reduzida a menos de dois terços do seu montante inicial; ou
b) Se, por virtude de acessões naturais ou benfeitorias, a coisa ou o direito hipotecado se tiver valorizado em mais de um terço do seu valor à data da constituição da hipoteca e desde que a hipoteca não tenha sido constituída na expectativa da verificação dessas benfeitorias.
3. A redução é realizável, quanto aos bens, ainda que a hipoteca tenha por objecto uma só coisa ou direito, desde que a coisa ou direito seja susceptível de cómoda divisão.
Aquele que adquiriu bens hipotecados, registou o título de aquisição e não é pessoalmente responsável pelo cumprimento das obrigações garantidas tem o direito de expurgar a hipoteca por qualquer dos modos seguintes:
a) Pagando integralmente aos credores hipotecários as dívidas a que os bens estão hipotecados ou, no caso previsto no n.º 2 do artigo 692.º, o valor indicado no n.º 3 do mesmo artigo;
b) Declarando que está pronto a entregar aos credores, para pagamento dos seus créditos, até à quantia pela qual obteve os bens, ou aquela em que os estima, quando a aquisição tenha sido feita por título gratuito ou não tenha havido fixação de preço.
O direito de expurgação é extensivo ao doador ou aos seus herdeiros, relativamente aos bens hipotecados pelo donatário que venham ao poder daqueles em consequência da revogação da liberalidade por ingratidão do donatário, ou da sua redução por inoficiosidade.
1. A sentença que declarar os bens livres de hipotecas em consequência de expurgação não é proferida sem se mostrar que foram citados todos os credores hipotecários.
2. O credor que, tendo a hipoteca registada, não for citado nem comparecer espontaneamente em juízo não perde os seus direitos de credor hipotecário, seja qual for a sentença proferida em relação aos outros credores.
3. Se o requerente da expurgação não depositar a importância devida, nos termos da lei de processo, fica o requerimento sem efeito e não pode ser renovado, sem prejuízo da responsabilidade do requerente pelos danos causados aos credores.
Se o adquirente da coisa hipotecada tinha, anteriormente à aquisição, algum direito real sobre ela que se extinga por força da aquisição, esse direito renasce no caso de venda em processo de execução ou de expurgação da hipoteca e é atendido em harmonia com as regras legais relativas a essa venda.
O credor hipotecário pode, antes do vencimento do prazo, exercer o seu direito contra o adquirente da coisa ou direito hipotecado se, por culpa deste, diminuir a segurança do crédito.
Para os efeitos dos artigos 1194.º, 1195.º e 1200.º, o terceiro adquirente é havido como possuidor de boa fé, na execução, até ao registo da penhora, e, na expurgação da hipoteca, até à venda judicial da coisa ou direito.
1. A hipoteca que não for inseparável da pessoa do devedor pode ser cedida sem o crédito assegurado, para garantia de crédito pertencente a outro credor do mesmo devedor, com observância das regras próprias da cessão de créditos; se, porém, a coisa ou direito hipotecado pertencer a terceiro, é necessário o consentimento deste.
2. O credor com hipoteca sobre mais de uma coisa ou direito só pode cedê-la à mesma pessoa e na sua totalidade.
1. A hipoteca cedida garante o novo crédito nos limites do crédito originariamente garantido.
2. Registada a cessão, a extinção do crédito originário não afecta a subsistência da hipoteca.
É também permitida a cessão do grau hipotecário a favor de qualquer outro credor hipotecário posteriormente inscrito sobre os mesmos bens, observadas igualmente as regras respeitantes à cessão do respectivo crédito.
A hipoteca extingue-se:
a) Pela extinção da obrigação a que serve de garantia;
b) Por prescrição, a favor de terceiro adquirente do prédio hipotecado, decorridos 15 anos sobre o registo da aquisição e 5 sobre o vencimento da obrigação;
c) Pelo perecimento da coisa hipotecada, sem prejuízo do disposto nos artigos 688.º e 697.º; ou
d) Pela renúncia do credor.
1. A renúncia à hipoteca está sujeita à forma exigida para a sua constituição, salvo quando a lei exija forma mais solene do que a do documento autenticado, caso em que é suficiente esta forma.
2. A renúncia à hipoteca deve ser expressa e não carece de aceitação do devedor ou do autor da hipoteca para produzir efeitos.
3. Os administradores de patrimónios alheios não podem renunciar às hipotecas constituídas em benefício das pessoas cujos patrimónios administram.
Se a causa extintiva da obrigação ou a renúncia do credor à garantia for declarada nula ou anulada, ou ficar por outro motivo sem efeito, a hipoteca, se a inscrição tiver sido cancelada, renasce apenas desde a data da nova inscrição.
Privilégio creditório é a faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos credores, independentemente do registo, de serem pagos com preferência a outros.
O privilégio creditório abrange os juros relativos aos últimos 2 anos, se forem devidos.
1. São de duas espécies os privilégios creditórios: privilégios mobiliários gerais e privilégios especiais.
2. Os privilégios são mobiliários gerais, se abrangem o valor de todos os bens móveis existentes no património do devedor à data da penhora ou de acto equivalente; são especiais, quando compreendem só o valor de determinados bens.
1. O território de Macau tem privilégio mobiliário geral para garantia dos créditos por impostos indirectos, e também pelos impostos directos inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora, ou acto equivalente, e nos 2 anos anteriores.
2. Este privilégio não abrange quaisquer impostos que gozem de privilégio especial.
1. Gozam de privilégio geral sobre os móveis:
a) O crédito por despesas com doenças do devedor ou de pessoas a quem este deva prestar alimentos, relativo aos últimos 6 meses;
b) O crédito por despesas indispensáveis para o sustento do devedor e das pessoas a quem este tenha a obrigação de prestar alimentos, relativo aos últimos 6 meses;
c) Os créditos emergentes do contrato de trabalho, ou da violação ou cessação deste contrato, pertencentes ao trabalhador e relativos aos últimos 6 meses;
d) O crédito por despesas do funeral do devedor, conforme os usos locais.
2. O prazo de 6 meses referido nas alíneas a) a c) do número anterior conta-se a partir da morte do devedor ou do pedido de pagamento.
Os créditos por despesas de justiça feitas directamente no interesse comum dos credores, para a conservação, execução ou liquidação de determinados bens, têm privilégio sobre estes bens.
O crédito da vítima de um facto que implique responsabilidade civil tem privilégio sobre a indemnização devida pelo segurador da responsabilidade em que o lesante haja incorrido.
O crédito do autor de obra intelectual, fundado em contrato de edição, tem privilégio sobre os exemplares da obra existentes em poder do editor.
1. Os créditos por contribuição predial devida ao território de Macau inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora, ou acto equivalente, e nos 2 anos anteriores, têm privilégio sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos àquela contribuição.
2. Os créditos do território de Macau pela sisa e pelo imposto sobre as sucessões e doações têm privilégio sobre os bens transmitidos, nos 2 anos seguintes aos factos que lhes deram causa.
1. Os créditos privilegiados são pagos pela ordem segundo a qual vão indicados nas disposições seguintes.
2. Havendo créditos igualmente privilegiados, procede-se ao rateio entre eles, na proporção dos respectivos montantes.
Os privilégios por despesas de justiça têm preferência não só sobre os demais privilégios, como sobre as outras garantias, mesmo anteriores, que onerem os mesmos bens.
Os créditos com privilégio graduam-se pela ordem seguinte:
a) Os créditos do território de Macau por impostos;
b) Os créditos da vítima de um facto que dê lugar a responsabilidade civil;
c) Os créditos do autor de obra intelectual;
d) Os créditos com privilégio mobiliário geral, pela ordem segundo a qual são enumerados no artigo 732.º
O privilégio mobiliário geral não vale contra terceiros, titulares de direitos que, recaindo sobre as coisas abrangidas pelo privilégio, sejam oponíveis ao exequente.
Salvo disposição em contrário, no caso de conflito entre o privilégio especial e um direito de terceiro, prevalece o que mais cedo se houver adquirido.
Os privilégios extinguem-se pelas mesmas causas por que se extingue o direito de hipoteca.
São aplicáveis aos privilégios, com as necessárias adaptações, os artigos 688.º e 690.º a 695.º
O devedor que disponha de um crédito contra o seu credor goza do direito de retenção se, estando obrigado a entregar certa coisa, o seu crédito resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados.
1. Gozam ainda do direito de retenção:
a) O transportador, sobre as coisas transportadas, pelo crédito resultante do transporte;
b) O hospedeiro, sobre as coisas que o hóspede haja trazido para a pousada ou acessórios dela, pelo crédito da hospedagem;
c) O mandatário, sobre as coisas que lhe tiverem sido entregues para execução do mandato, pelo crédito resultante da sua actividade;
d) O gestor de negócios, sobre as coisas que tenha em seu poder para execução da gestão, pelo crédito proveniente desta;
e) O depositário e o comodatário, sobre as coisas que lhes tiverem sido entregues em consequência dos respectivos contratos, pelos créditos deles resultantes;
f) O beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artigo 436.º;
g) O achador, nos termos do n.º 5 do artigo 1247.º
2. Quando haja transportes sucessivos, mas todos os transportadores se tenham obrigado em comum, entende-se que o último detém as coisas em nome próprio e em nome dos outros.
Não há direito de retenção:
a) A favor dos que tenham obtido por meios ilícitos a coisa que devem entregar, desde que, no momento da aquisição, conhecessem a ilicitude desta;
b) A favor dos que tenham realizado de má fé as despesas de que proveio o seu crédito;
c) Relativamente a coisas impenhoráveis; ou
d) Quando a outra parte preste caução suficiente.
1. O devedor goza do direito de retenção, mesmo antes do vencimento do seu crédito, desde que entretanto se verifique alguma das circunstâncias que importam a perda do benefício do prazo.
2. O direito de retenção não depende da liquidez do crédito do respectivo titular.
Recaindo o direito de retenção sobre coisa móvel, o respectivo titular goza dos direitos e está sujeito às obrigações do credor pignoratício, salvo pelo que respeita à substituição ou reforço da garantia.
1. Recaindo o direito de retenção sobre coisa imóvel, o respectivo titular, enquanto não entregar a coisa retida, tem a faculdade de a executar, nos mesmos termos em que o pode fazer o credor hipotecário, e de ser pago com preferência aos demais credores do devedor.
2. O direito de retenção sobre coisa imóvel prevalece sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada anteriormente, a não ser na hipótese figurada na alínea f) do n.º 1 do artigo 745.º, caso em que prevalece o direito que mais cedo se houver constituído.
3. Até à entrega da coisa são aplicáveis, quanto aos direitos e obrigações do titular da retenção, as regras do penhor, com as necessárias adaptações.
O direito de retenção não é transmissível sem que seja transmitido o crédito que ele garante.
O direito de retenção extingue-se pelas mesmas causas por que cessa o direito de hipoteca, e ainda pela entrega da coisa.
1. O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado.
2. No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé.
1. A prestação deve ser realizada integralmente e não por partes, excepto se outro for o regime convencionado ou imposto por lei ou pelos usos.
2. O credor tem, porém, a faculdade de exigir uma parte da prestação; a exigência dessa parte não priva o devedor da possibilidade de oferecer a prestação por inteiro.
1. O devedor tem de ser capaz, se a prestação constituir um acto de disposição; mas o credor que a haja recebido do devedor incapaz pode opor-se ao pedido de anulação, se o devedor não tiver tido prejuízo com o cumprimento.
2. O credor deve, pelo seu lado, ter capacidade para receber a prestação; mas, se esta chegar ao poder do representante legal do incapaz ou o património deste tiver enriquecido, pode o devedor opor-se ao pedido de anulação da prestação realizada e de novo cumprimento da obrigação, na medida do que tiver sido recebido pelo representante ou do enriquecimento do incapaz.
1. O credor que de boa fé receber a prestação de coisa que o devedor não pode alhear tem o direito de impugnar o cumprimento, sem prejuízo da faculdade de se ressarcir dos danos que haja sofrido.
2. O devedor que, de boa ou má fé, prestar coisa de que lhe não é lícito dispor não pode impugnar o cumprimento, a não ser que ofereça uma nova prestação.
Se o cumprimento for declarado nulo ou anulado por causa imputável ao credor, não renascem as garantias prestadas por terceiro, salvo se este conhecia o vício na data em que teve notícia do cumprimento da obrigação.
1. A prestação pode ser feita tanto pelo devedor como por terceiro, interessado ou não no cumprimento da obrigação.
2. O credor não pode, todavia, ser constrangido a receber de terceiro a prestação, quando se tenha acordado expressamente em que esta deve ser feita pelo devedor, ou quando a substituição o prejudique.
1. Quando a prestação puder ser efectuada por terceiro, o credor que a recuse incorre em mora perante o devedor.
2. É, porém, lícito ao credor recusá-la, desde que o devedor se oponha ao cumprimento e o terceiro não possa ficar sub-rogado nos termos do artigo 586.º; a oposição do devedor não obsta a que o credor aceite validamente a prestação.
A prestação deve ser feita ao credor, ao seu representante, ou a outrem autorizado para recebê-la em seu nome.
A prestação feita a terceiro não extingue a obrigação, excepto:
a) Se assim foi estipulado ou consentido pelo credor;
b) Se o credor a ratificar;
c) Se quem a recebeu houver adquirido posteriormente o crédito;
d) Se o credor vier a aproveitar-se do cumprimento e não tiver interesse fundado em não a considerar como feita a si próprio;
e) Se o credor for herdeiro de quem a recebeu e responder pelas obrigações do autor da sucessão;
f) Nos demais casos em que a lei o determinar.
1. Na falta de estipulação ou disposição especial da lei, a prestação deve ser efectuada no domicílio do devedor.
2. Se o devedor mudar de domicílio depois de constituída a obrigação, a prestação deve ser efectuada no novo domicílio, excepto se a mudança acarretar prejuízo para o credor.
3. Verificando-se a situação prevista na parte final do número anterior, a prestação deve ser efectuada no domicílio do credor, salvo se o devedor, mediante prévia declaração ao credor, optar pelo seu domicílio primitivo.
1. Se a prestação tiver por objecto coisa móvel determinada, a obrigação deve ser cumprida no lugar onde a coisa se encontrava ao tempo da conclusão do negócio.
2. A disposição do número anterior é ainda aplicável, quando se trate de coisa genérica que deva ser escolhida de um conjunto determinado ou de coisa que deva ser produzida em certo lugar.
Se a obrigação tiver por objecto certa quantia em dinheiro, deve a prestação ser efectuada no domicílio que o credor tiver ao tempo do cumprimento.
1. Se tiver sido estipulado, ou resultar da lei, que o cumprimento deve efectuar-se no domicílio do credor, e este mudar de domicílio após a constituição da obrigação, deve a prestação ser feita no novo domicílio do credor, excepto se a mudança acarretar prejuízo para o devedor.
2. Verificando-se a situação prevista na parte final do número anterior, a prestação deve ser efectuada no domicílio do devedor, salvo se o credor, mediante prévia declaração ao devedor, optar pelo seu domicílio primitivo.
Quando a prestação for ou se tornar impossível no lugar fixado para o cumprimento e não houver fundamento para considerar a obrigação nula ou extinta, são aplicáveis as regras supletivas dos artigos 761.º a 763.º
1. Na falta de estipulação ou disposição especial da lei, o credor tem o direito de exigir a todo o tempo o cumprimento da obrigação, assim como o devedor pode a todo o tempo exonerar-se dela.
2. Se, porém, se tornar necessário o estabelecimento de um prazo, quer pela própria natureza da prestação, quer por virtude das circunstâncias que a determinaram, quer por força dos usos, e as partes não acordarem na sua determinação, a fixação dele é deferida ao tribunal.
3. Se a determinação do prazo for deixada ao credor e este não usar da faculdade que lhe foi concedida, compete ao tribunal fixar o prazo, a requerimento do devedor.
1. Se tiver sido estipulado que o devedor cumprirá quando puder, a prestação só é exigível tendo este a possibilidade de cumprir; falecendo o devedor, é a prestação exigível dos seus herdeiros, independentemente da prova dessa possibilidade, mas sem prejuízo do disposto no artigo 1909.º
2. Quando o prazo for deixado ao arbítrio do devedor, só dos seus herdeiros tem o credor o direito de exigir que satisfaçam a prestação.
O prazo tem-se por estabelecido a favor do devedor, quando se não mostre que o foi a favor do credor, ou do devedor e do credor conjuntamente.
1. Estabelecido o prazo a favor do devedor, pode o credor, não obstante, exigir o cumprimento imediato da obrigação, se o devedor se tornar insolvente, ainda que a insolvência não tenha sido judicialmente declarada, ou se, por causa imputável ao devedor, diminuírem as garantias do crédito ou não forem prestadas as garantias prometidas.
2. O credor tem o direito de exigir do devedor, em lugar do cumprimento imediato da obrigação, a substituição ou reforço das garantias, se estas sofreram diminuição.
Se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas.
A perda do benefício do prazo não se estende aos co-obrigados do devedor, nem a terceiro que a favor do crédito tenha constituído qualquer garantia.
1. Se o devedor, por diversas dívidas da mesma espécie ao mesmo credor, efectuar uma prestação que não chegue para as extinguir a todas, fica à sua escolha designar as dívidas a que o cumprimento se refere.
2. O devedor, porém, não pode designar contra a vontade do credor uma dívida que ainda não esteja vencida, se o prazo tiver sido estabelecido em benefício do credor; e também não lhe é lícito designar contra a vontade do credor uma dívida de montante superior ao da prestação efectuada, desde que o credor tenha o direito de recusar a prestação parcial.
1. Se o devedor não fizer a designação, deve o cumprimento imputar-se na dívida vencida; entre várias dívidas vencidas, na que oferece menor garantia para o credor; entre várias dívidas igualmente garantidas, na mais onerosa para o devedor; entre várias dívidas igualmente onerosas, na que primeiro se tenha vencido; se várias se tiverem vencido simultaneamente, na mais antiga em data.
2. Não sendo possível aplicar as regras fixadas no número anterior, a prestação presume-se feita por conta de todas as dívidas, rateadamente, mesmo com prejuízo, neste caso, do disposto no artigo 753.º
1. Quando, além do capital, o devedor estiver obrigado a pagar despesas ou juros, ou a indemnizar o credor em consequência da mora, a prestação que não chegue para cobrir tudo o que é devido presume-se feita por conta, sucessivamente, das despesas, da indemnização, dos juros e do capital.
2. A imputação no capital só pode fazer-se em último lugar, salvo se o credor concordar em que se faça antes.
1. Se o credor der quitação do capital sem reserva dos juros ou de outras prestações acessórias, presume-se que estão pagos os juros ou prestações.
2. Sendo devidos juros ou outras prestações periódicas e dando o credor quitação, sem reserva, de uma dessas prestações, presumem-se realizadas as prestações anteriores.
3. A entrega voluntária, feita pelo credor ao devedor, do título original do crédito faz presumir a liberação do devedor e dos seus condevedores, solidários ou conjuntos, bem como do fiador e do devedor principal, se o título é entregue a algum destes.
1. Quem cumpre a obrigação tem o direito de exigir quitação daquele a quem a prestação é feita, devendo a quitação constar de documento autêntico ou autenticado ou ser provida de reconhecimento notarial, se aquele que cumpriu tiver nisso interesse legítimo.
2. O autor do cumprimento pode recusar prestação enquanto a quitação não for dada, assim como pode exigir a quitação depois do cumprimento.
1. Extinta a dívida, tem o devedor o direito de exigir a restituição do título da obrigação; se o cumprimento for parcial, ou o título conferir outros direitos ao credor, ou este tiver, por outro motivo, interesse legítimo na conservação dele, pode o devedor exigir que o credor mencione no título o cumprimento efectuado.
2. Goza dos mesmos direitos o terceiro que cumprir a obrigação, se ficar sub-rogado nos direitos do credor.
3. É aplicável à restituição do título e à menção do cumprimento o disposto no n.º 2 do artigo anterior.
Se o credor invocar a impossibilidade, por qualquer causa, de restituir o título ou de nele mencionar o cumprimento, pode o devedor exigir quitação passada em documento particular com reconhecimento notarial ou, quando se justifique, em documento autenticado ou autêntico, correndo o encargo por conta do credor.
1. A obrigação extingue-se quando a prestação se torna impossível por causa não imputável ao devedor.
2. Quando o negócio do qual a obrigação procede houver sido feito sob condição ou a termo, e a prestação for possível na data da conclusão do negócio, mas se tornar impossível antes da verificação da condição ou do vencimento do termo, é a impossibilidade considerada superveniente e não afecta a validade do negócio.
A impossibilidade relativa à pessoa do devedor importa igualmente a extinção da obrigação, se o devedor, no cumprimento desta, não puder fazer-se substituir por terceiro.
1. Se a impossibilidade for temporária, o devedor não responde pela mora no cumprimento.
2. A impossibilidade só se considera temporária enquanto, atenta a finalidade da obrigação, se mantiver o interesse do credor.
1. Se a prestação se tornar parcialmente impossível, o devedor exonera-se mediante a prestação do que for possível, devendo, neste caso, ser proporcionalmente reduzida a contraprestação a que a outra parte estiver vinculada.
2. Porém, o credor que não tiver, justificadamente, interesse no cumprimento parcial da obrigação pode resolver o negócio.
Se, por virtude do facto que tornou impossível a prestação, o devedor adquirir algum direito sobre certa coisa, ou contra terceiro, em substituição do objecto da prestação, pode o credor exigir a prestação dessa coisa ou substituir-se ao devedor na titularidade do direito que este tiver adquirido contra terceiro.
1. Quando no contrato bilateral uma das prestações se torne impossível, fica o credor desobrigado da contraprestação e tem o direito, se já a tiver realizado, de exigir a sua restituição nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa.
2. Se a prestação se tornar impossível por causa imputável ao credor, não fica este desobrigado da contraprestação; mas, se o devedor tiver algum benefício com a exoneração, o valor do benefício é descontado na contraprestação.
1. Nos contratos que importem a transferência do domínio sobre certa coisa ou que constituam ou transfiram um direito real sobre ela, o risco do perecimento ou deterioração da coisa por causa não imputável ao alienante corre por conta do adquirente.
2. Se, porém, a coisa tiver continuado em poder do alienante em consequência de termo constituído a seu favor, o risco só se transfere com o vencimento do termo ou a entrega da coisa, sem prejuízo do disposto no artigo 796.º
3. Quando o contrato estiver dependente de condição resolutiva, o risco do perecimento durante a pendência da condição corre por conta do adquirente, se a coisa lhe tiver sido entregue; quando for suspensiva a condição, o risco corre por conta do alienante durante a pendência da condição.
Quando se trate de coisa que, por força da convenção, o alienante deva enviar para local diferente do lugar do cumprimento, a transferência do risco opera-se com a entrega ao transportador ou expedidor da coisa ou à pessoa indicada para a execução do envio.
O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.
1. Incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua.
2. A culpa é apreciada nos termos aplicáveis à responsabilidade civil.
1. O devedor é responsável perante o credor pelos actos dos seus representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados pelo próprio devedor.
2. A responsabilidade pode ser convencionalmente excluída ou limitada, mediante acordo prévio dos interessados, desde que a exclusão ou limitação não compreenda actos que representem a violação de deveres impostos por normas de ordem pública.
1. Tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao devedor, é este responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação.
2. Tendo a obrigação por fonte um contrato bilateral, o credor, independentemente do direito à indemnização, pode resolver o contrato e, se já tiver realizado a sua prestação, exigir a restituição dela por inteiro.
1. Se a prestação se tornar parcialmente impossível, o credor tem a faculdade de resolver o negócio ou de exigir o cumprimento do que for possível, reduzindo neste caso a sua contraprestação, se for devida; em qualquer dos casos o credor mantém o direito à indemnização.
2. O credor não pode, todavia, resolver o negócio, se o não cumprimento parcial, atendendo ao seu interesse, tiver escassa importância.
1. É extensivo ao caso de impossibilidade imputável ao devedor o que dispõe o artigo 783.º
2. Se o credor fizer valer o direito conferido no número anterior, o montante da indemnização a que tenha direito é reduzido na medida correspondente.
1. A simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor.
2. O devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido.
1. O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.
2. Há, porém, mora do devedor, independentemente de interpelação:
a) Se a obrigação tiver prazo certo;
b) Se a obrigação provier de facto ilícito; ou
c) Se o próprio devedor impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste caso, na data em que normalmente o teria sido.
3. No caso da alínea a) do número anterior, devendo a prestação ser cumprida no domicílio do devedor, só há mora se o credor a reclamar aí.
4. Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor.
1. Na obrigação pecuniária a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora.
2. Os juros devidos são os juros legais, salvo se antes da mora for devido um juro mais elevado ou as partes houverem estipulado um juro moratório diferente do legal.
3. Pode, no entanto, o credor provar que a mora lhe causou dano consideravelmente superior aos juros referidos no número anterior e exigir a indemnização suplementar correspondente.
1. Pelo facto de estar em mora, o devedor torna-se responsável pelo prejuízo que o credor tiver em consequência da perda ou deterioração daquilo que deveria entregar, mesmo que estes factos lhe não sejam imputáveis.
2. Fica, porém, salva ao devedor a possibilidade de provar que o credor teria sofrido igualmente os danos se a obrigação tivesse sido cumprida em tempo.
1. Considera-se para os efeitos constantes do artigo 790.º como não cumprida a obrigação se, em consequência da mora:
a) O credor perder o interesse que tinha na prestação; ou
b) A prestação não for realizada dentro do prazo que, por interpelação, for razoavelmente fixado pelo credor.
2. A perda do interesse na prestação é apreciada objectivamente.
3. No caso da alínea b) do n.º 1, o credor pode, em alternativa às sanções cominadas pelo artigo 790.º, optar por exigir a realização coactiva da prestação e a indemnização pela mora, se o contrário não resultar da interpelação; contudo, o devedor pode fixar ao credor um prazo razoável para o exercício desta opção, sob pena de caducidade do direito do credor a exigir a realização coactiva da prestação.
4. O disposto nos números anteriores não prejudica a aplicação, com as necessárias adaptações, do regime constante do artigo 791.º para os casos de incumprimento parcial.
1. É nula a cláusula pela qual o credor renuncia antecipadamente a qualquer dos direitos que lhe são facultados nas divisões anteriores nos casos de não cumprimento ou mora do devedor, salvo o disposto no n.º 2 do artigo 789.º
2. É contudo válida, salvo disposição legal em contrário, a cláusula pela qual se exclua ou limite a responsabilidade pelo não cumprimento, cumprimento defeituoso ou mora, para os casos em que não haja dolo ou culpa grave.
1. As partes podem fixar por acordo a indemnização exigível ou a sanção aplicável, para os casos de não cumprimento, cumprimento defeituoso ou mora no cumprimento; a cláusula do primeiro tipo designa-se por cláusula penal compensatória e a do segundo por cláusula penal compulsória.
2. Em caso de dúvida, a cláusula penal é compensatória.
3. As partes podem estabelecer num mesmo contrato cláusulas penais para diferentes fins, mas se só tiverem estabelecido uma cláusula penal pelo não cumprimento, e esta for compensatória, presume-se que ela cobre todos os danos, e se for compulsória, que esta abrange toda a sanção aplicável.
4. A cláusula penal está sujeita às formalidades exigidas para a obrigação principal, e é nula se for nula esta obrigação.
1. Sem prejuízo de estipulação expressa em contrário, o cumprimento da cláusula penal só é exigível havendo culpa do devedor.
2. A cláusula penal compensatória obsta a que o credor exija o cumprimento da mesma cumulativamente com a realização coactiva da prestação a que diga respeito ou exija a indemnização pelo dano por ela coberto, mas, salvo convenção em contrário, não impede a indemnização pelo dano excedente quando este seja consideravelmente superior.
1. A pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente; é nula qualquer estipulação em contrário.
2. É admitida a redução nas mesmas circunstâncias, se a obrigação tiver sido parcialmente cumprida.
O credor incorre em mora quando, sem motivo justificado, não aceita a prestação que lhe é oferecida nos termos legais ou não pratica os actos necessários ao cumprimento da obrigação.
1. A partir da mora, o devedor apenas responde, quanto ao objecto da prestação, pelo seu dolo; relativamente aos proventos da coisa, só responde pelos que hajam sido percebidos.
2. Durante a mora, a dívida deixa de vencer juros, quer legais, quer convencionados.
1. A mora faz recair sobre o credor o risco da impossibilidade superveniente da prestação, que resulte de facto não imputável a dolo do devedor.
2. Sendo o contrato bilateral, o credor que, estando em mora, perca total ou parcialmente o seu crédito por impossibilidade superveniente da prestação não fica exonerado da contraprestação; mas, se o devedor tiver algum benefício com a extinção da sua obrigação, deve o valor do benefício ser descontado na contraprestação.
Quando o objecto da obrigação não consista na entrega de uma coisa, o devedor pode, se o credor estiver em mora, resolver o contrato em conformidade com as disposições que regem a mora do devedor.
O credor em mora deve indemnizar o devedor das maiores despesas que este seja obrigado a fazer com o oferecimento infrutífero da prestação e a guarda e conservação do respectivo objecto.
Não sendo a obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu cumprimento e de executar o património do devedor, nos termos declarados na lei.
O direito de execução pode incidir sobre bens de terceiro, quando estejam vinculados à garantia do crédito, ou quando sejam objecto de acto praticado em prejuízo do credor, que este haja procedentemente impugnado.
Sem prejuízo das regras do registo, são ineficazes em relação ao exequente os actos de disposição ou oneração dos bens penhorados.
Sendo penhorado algum crédito do devedor, a extinção dele por causa dependente da vontade do executado ou do seu devedor, verificada depois da penhora, é igualmente ineficaz em relação ao exequente.
A liberação ou cessão, antes da penhora, de rendas e alugueres não vencidos é inoponível ao exequente, na medida em que tais rendas ou alugueres respeitem a períodos de tempo não decorridos à data da penhora.
1. Salvo nos casos especialmente previstos na lei, o exequente adquire pela penhora o direito de ser pago com preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior.
2. Tendo os bens do executado sido previamente arrestados, a anterioridade da penhora reporta-se à data do arresto.
Se a coisa penhorada se perder, for expropriada ou sofrer diminuição de valor, e, em qualquer dos casos, houver lugar a indemnização de terceiro, o exequente conserva sobre os créditos respectivos, ou sobre as quantias pagas a título de indemnização, o direito que tinha sobre a coisa.
1. A venda em execução transfere para o adquirente os direitos do executado sobre a coisa vendida.
2. Os bens são transmitidos livres dos direitos de garantia que os onerarem, bem como dos demais direitos reais que não tenham registo anterior ao de qualquer arresto, penhora ou garantia, com excepção dos que, constituídos em data anterior, produzam efeitos em relação a terceiros independentemente de registo.
3. Os direitos de terceiro que caducarem nos termos do número anterior transferem-se para o produto da venda dos respectivos bens.
1. O adquirente, no caso de execução de coisa alheia, pode exigir que o preço lhe seja restituído por aqueles a quem foi atribuído e que os danos sejam reparados pelos credores e pelo executado que hajam procedido com culpa; é aplicável à restituição do preço o disposto no artigo 884.º
2. Se o terceiro tiver protestado pelo seu direito no acto da venda, ou anteriormente a ela, e o adquirente conhecer o protesto, não lhe é lícito pedir a reparação dos danos, salvo se os credores ou o devedor se tiverem responsabilizado pela indemnização.
3. Em lugar de exigir dos credores a restituição do preço, o adquirente pode exercer contra o devedor, por sub-rogação, os direitos desses credores.
As disposições dos artigos antecedentes relativos à venda são aplicáveis, com as necessárias adaptações, à adjudicação e à remição.
Se a prestação consiste na entrega de coisa determinada, o credor tem a faculdade de requerer, em execução, que a entrega lhe seja feita judicialmente.
O credor de prestação de facto fungível tem a faculdade de requerer, em execução, que o facto seja prestado por outrem à custa do devedor.
1. Se o devedor estiver obrigado a não praticar algum acto e vier a praticá-lo, tem o credor o direito de exigir que a obra, se obra feita houver, seja demolida à custa do que se obrigou a não a fazer.
2. Cessa o direito conferido no número anterior, havendo apenas lugar à indemnização, nos termos gerais, se o prejuízo da demolição para o devedor for consideravelmente superior ao prejuízo sofrido pelo credor, a não ser que a obra se consubstancie numa ofensa a um direito absoluto do credor a que apenas se ponha termo com a demolição.
1. Se alguém se tiver obrigado a celebrar certo contrato e não cumprir a promessa, pode a outra parte, na falta de convenção em contrário, obter sentença que produza os efeitos da declaração negocial do faltoso, sempre que a isso se não oponha a natureza da obrigação assumida.
2. Para efeitos do número anterior, a simples existência de sinal prestado no contrato-promessa, ou a fixação de pena para o caso do não cumprimento deste, não é entendida como convenção em contrário e, ainda que tenha havido convenção em contrário, o promitente-adquirente, relativamente a promessa de transmissão ou constituição onerosas de direito real sobre prédio ou fracção autónoma dele, goza do direito à execução específica, contanto que tenha havido a seu favor tradição da coisa objecto do contrato.
3. A requerimento do faltoso, a sentença que produza os efeitos da sua declaração negocial pode ordenar a modificação do contrato nos termos do artigo 431.º
4. Tratando-se de promessa, sujeita a execução específica, relativa à celebração de contrato oneroso de transmissão ou constituição de direito real sobre prédio, ou fracção autónoma dele, sobre que recaia hipoteca, pode o promitente-adquirente, para o efeito de expurgação da hipoteca, requerer que a sentença referida no n.º 1 condene também o promitente faltoso a entregar-lhe o montante do débito garantido, ou o valor nele correspondente à fracção objecto do contrato, e dos juros respectivos, vencidos e vincendos, até integral pagamento.
5. O disposto no número anterior só se aplica, porém, se:
a) A hipoteca tiver sido constituída posteriormente à celebração da promessa;
b) A hipoteca tiver sido constituída para garantia de um débito do promitente faltoso a terceiro, pelo qual o promitente-adquirente não seja corresponsável; e
c) A extinção da hipoteca não preceder a mencionada transmissão ou constituição, nem coincidir com esta.
6. Tratando-se de contrato em que ao obrigado seja lícito invocar a excepção de não cumprimento, a acção improcede, se o requerente não consignar em depósito a sua prestação no prazo que lhe for fixado pelo tribunal.
É aplicável o regime dos n.os 1 e 6 do artigo anterior aos casos em que exista um dever legal de contratar.
Dá-se a cessão de bens aos credores quando estes, ou alguns deles, são encarregados pelo devedor de liquidar o património deste, ou parte dele, e repartir entre si o respectivo produto, para satisfação dos seus créditos.
1. A cessão deve ser feita por escrito e está, além disso, sujeita à forma exigida para a validade da transmissão dos bens nela compreendidos.
2. A cessão deve ser registada sempre que abranja bens sujeitos a registo.
A cessão não impede que os bens cedidos sejam executados pelos credores que dela não participam, enquanto não tiverem sido alienados; não gozam de igual direito os cessionários nem os credores posteriores à cessão.
1. Enquanto a cessão se mantiver, os poderes de administração e de disposição dos respectivos bens pertencem exclusivamente aos cessionários.
2. O devedor conserva, porém, o direito de fiscalizar a gestão dos credores, e tem o direito à prestação de contas no fim da liquidação ou, se a cessão se prolongar por mais de 1 ano, no termo de cada ano.
O devedor só fica liberado em face dos credores a partir do recebimento da parte que a estes compete no produto da liquidação, e na medida do que receberam.
1. É permitido ao devedor desistir a todo o tempo da cessão, cumprindo as obrigações a que está adstrito para com os cessionários.
2. A desistência não tem efeito retroactivo.
A prestação de coisa ou de direito diverso do que for devido, embora de valor superior, só exonera o devedor se o credor der o seu assentimento.
O credor a quem for feita a dação em cumprimento goza de garantia pelos vícios da coisa ou do direito transmitido, nos termos prescritos para a compra e venda; mas pode optar pela prestação primitiva e reparação dos danos sofridos.
Sendo a dação declarada nula ou anulada por causa imputável ao credor, não renascem as garantias prestadas por terceiro, excepto se este conhecia o vício na data em que teve notícia da dação.
1. Se o devedor efectuar uma prestação diferente da devida, para que o credor obtenha mais facilmente, pela realização do valor dela, a satisfação do seu crédito, este só se extingue quando for satisfeito, e na medida respectiva.
2. Se a dação tiver por objecto a cessão de um crédito ou a assunção de uma dívida, presume-se feita nos termos do número anterior.
1. O devedor pode livrar-se da obrigação mediante o depósito da coisa devida, nos casos seguintes:
a) Quando, sem culpa sua, não puder efectuar a prestação ou não puder fazê-lo com segurança, por qualquer motivo relativo à pessoa do credor;
b) Quando o credor estiver em mora.
2. A consignação em depósito é facultativa.
A consignação em depósito pode ser efectuada a requerimento de terceiro a quem seja lícito efectuar a prestação.
Se o devedor tiver a faculdade de não cumprir senão contra uma prestação do credor, é-lhe lícito exigir que a coisa consignada não seja entregue ao credor enquanto este não efectuar aquela prestação.
Feita a consignação, fica o consignatário obrigado a entregar ao credor a coisa consignada, e o credor com o direito de exigir a sua entrega.
1. O devedor pode revogar a consignação, mediante declaração feita no processo, e pedir a restituição da coisa consignada.
2. Extingue-se o direito de revogação, se o credor, por declaração feita no processo, aceitar a consignação, ou se esta for considerada válida por sentença transitada em julgado.
A consignação aceite pelo credor ou declarada válida por decisão judicial libera o devedor, como se ele tivesse feito a prestação ao credor na data do depósito.
1. Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua obrigação por meio da compensação com a obrigação do seu credor, verificados os seguintes requisitos cumulativos:
a) Ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou dilatória, de direito material;
b) Terem as duas obrigações por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade.
2. Se as duas dívidas não forem de igual montante, pode dar-se a compensação na parte correspondente.
3. A iliquidez da dívida não impede a compensação.
1. A compensação torna-se efectiva mediante declaração de uma das partes à outra.
2. A declaração é ineficaz, se for feita sob condição ou a termo.
O credor que concedeu gratuitamente um prazo ao devedor está impedido de compensar a sua dívida antes do vencimento do prazo.
O crédito prescrito não impede a compensação, se a prescrição não podia ser invocada na data em que os dois créditos se tornaram compensáveis.
1. A compensação apenas pode abranger a dívida do declarante e não a de terceiro, ainda que aquele possa efectuar a prestação deste, salvo se o declarante estiver em risco de perder o que é seu em consequência de execução por dívida de terceiro.
2. O declarante só pode utilizar para a compensação créditos que sejam seus, e não créditos alheios, ainda que o titular respectivo dê o seu consentimento; e só procedem para o efeito créditos seus contra o seu credor.
1. Pelo simples facto de deverem ser cumpridas em lugares diferentes, as duas obrigações não deixam de ser compensáveis, salvo estipulação em contrário.
2. O declarante é, todavia, obrigado a reparar os danos sofridos pela outra parte, em consequência de esta não receber o seu crédito ou não cumprir a sua obrigação no lugar determinado.
1. Não podem extinguir-se por compensação:
a) Os créditos provenientes de factos ilícitos dolosos;
b) Os créditos impenhoráveis, excepto se ambos forem da mesma natureza;
c) Os créditos do território de Macau, excepto quando a lei autorize a compensação ou quando a prestação haja de ser realizada a favor da mesma instituição que deva satisfazer o crédito do declarante.
2. Também não é admitida a compensação, se houver prejuízo de direitos de terceiro, constituídos antes de os créditos se tornarem compensáveis, ou se o devedor a ela tiver renunciado.
Feita a declaração de compensação, os créditos consideram-se extintos desde o momento em que se tornaram compensáveis.
1. Se existirem, de uma ou outra parte, vários créditos compensáveis, a escolha dos que ficam extintos pertence ao declarante.
2. Na falta de escolha, é aplicável o disposto nos artigos 773.º e 774.º
Declarada nula ou anulada a compensação, subsistem as obrigações respectivas; mas, sendo a nulidade ou anulabilidade imputável a alguma das partes, não renascem as garantias que em seu benefício foram prestadas por terceiro, salvo se este conhecia o vício quando foi feita a declaração de compensação.
Dá-se a novação objectiva quando o devedor contrai perante o credor uma nova obrigação em substituição da antiga.
A novação por substituição do credor dá-se quando um novo credor é substituído ao antigo, vinculando-se o devedor para com ele por uma nova obrigação; e a novação por substituição do devedor, quando um novo devedor, contraindo nova obrigação, é substituído ao antigo, que é exonerado pelo credor.
A vontade de contrair a nova obrigação em substituição da antiga deve ser expressamente manifestada.
1. Se a primeira obrigação estava extinta ao tempo em que a segunda foi contraída, ou vier a ser declarada nula ou anulada, fica a novação sem efeito.
2. Se for declarada nula ou anulada a nova obrigação, subsiste a obrigação primitiva; mas, sendo a nulidade ou anulabilidade imputável ao credor, não renascem as garantias prestadas por terceiro, salvo se este, na data em que teve notícia da novação, conhecia o vício da nova obrigação.
1. Extinta a obrigação antiga pela novação, ficam igualmente extintas, na falta de reserva expressa, as garantias que asseguravam o seu cumprimento, mesmo quando resultantes da lei.
2. Dizendo a garantia respeito a terceiro, é necessária também a reserva expressa deste.
O novo crédito não está sujeito aos meios de defesa oponíveis à obrigação antiga, salvo estipulação em contrário.
1. O credor pode remitir a dívida por contrato com o devedor.
2. Quando tiver o carácter de liberalidade, a remissão por negócio entre vivos é havida como doação, na conformidade dos artigos 934.º e seguintes.
1. A remissão concedida a um devedor solidário libera os outros somente na parte do devedor exonerado.
2. Se o credor, neste caso, reservar o seu direito, por inteiro, contra os outros devedores, conservam estes, por inteiro também, o direito de regresso contra o devedor exonerado.
3. A remissão concedida por um dos credores solidários exonera o devedor para com os restantes credores, mas somente na parte que respeita ao credor remitente.
1. À remissão concedida pelo credor de obrigação indivisível a um dos devedores é aplicável o disposto no artigo 529.º
2. Sendo a remissão concedida por um dos credores ao devedor, este não fica exonerado para com os outros credores; mas estes não podem exigir do devedor a prestação senão entregando-lhe o valor da parte daquele concredor.
1. A remissão concedida ao devedor aproveita a terceiros.
2. A remissão concedida a um dos fiadores aproveita aos outros na parte do fiador exonerado; mas, se os outros consentirem na remissão, respondem pela totalidade da dívida, salvo declaração em contrário.
3. Se for declarada nula ou anulada a remissão por facto imputável ao credor, não renascem as garantias prestadas por terceiro, excepto se este conhecia o vício na data em que teve notícia da remissão.
A renúncia às garantias da obrigação não faz presumir a remissão da dívida.
Quando na mesma pessoa se reúnam as qualidades de credor e devedor da mesma obrigação, extinguem-se o crédito e a dívida.
1. A reunião na mesma pessoa das qualidades de devedor solidário e credor exonera os demais obrigados, mas só na parte da dívida relativa a esse devedor.
2. A reunião na mesma pessoa das qualidades de credor solidário e devedor exonera este na parte daquele.
1. Se na obrigação indivisível em que há vários devedores se reunirem as qualidades de credor e devedor, é aplicável o disposto no artigo 529.º
2. Sendo vários os credores e verificando-se a confusão entre um deles e o devedor, é aplicável o disposto no n.º 2 do artigo 856.º
1. A confusão não prejudica os direitos de terceiro.
2. Se houver, a favor de terceiro, direitos de usufruto ou de penhor sobre o crédito, este subsiste, não obstante a confusão, na medida em que o exija o interesse do usufrutuário ou do credor pignoratício.
3. Se na mesma pessoa se reunirem as qualidades de devedor e de fiador, fica extinta a fiança, excepto se o credor tiver legítimo interesse na subsistência da garantia.
4. A reunião na mesma pessoa das qualidades de credor e de proprietário da coisa hipotecada ou empenhada não impede que a hipoteca ou o penhor se mantenha, se o credor nisso tiver interesse e na medida em que esse interesse se justifique.
Não há confusão, se o crédito e a dívida pertencem a patrimónios separados.
1. Se a confusão se desfizer, renasce a obrigação com os seus acessórios, mesmo em relação a terceiro, quando o facto que a destrói seja anterior à própria confusão.
2. Quando a cessação da confusão for imputável ao credor, não renascem as garantias prestadas por terceiro, salvo se este conhecia o vício na data em que teve notícia da confusão.
Compra e venda é o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço.
O contrato de compra e venda de bens imóveis só é válido se for celebrado pela forma prescrita na lei do notariado.
1. Não podem ser compradores de coisa ou direito litigioso, quer directamente, quer por interposta pessoa, aqueles a quem a lei não permite que seja feita a cessão de créditos ou direitos litigiosos, conforme se dispõe nos artigos 573.º e 575.º
2. A venda feita com quebra do disposto no número anterior, além de nula, sujeita o comprador, nos termos gerais, à obrigação de reparar os danos causados.
3. A nulidade não pode ser invocada pelo comprador.
Na falta de convenção em contrário, as despesas do contrato e outras acessórias ficam a cargo do comprador.
A compra e venda tem como efeitos essenciais:
a) A transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito;
b) A obrigação de entregar a coisa;
c) A obrigação de pagar o preço.
1. Na venda de bens futuros, de frutos pendentes ou de partes componentes ou integrantes de uma coisa, o vendedor fica obrigado a exercer as diligências necessárias para que o comprador adquira os bens vendidos, segundo o que for estipulado ou resultar das circunstâncias do contrato.
2. Se as partes atribuírem ao contrato carácter aleatório, é devido o preço, ainda que a transmissão dos bens não chegue a verificar-se.
Quando se vendam bens de existência ou titularidade incerta e no contrato se faça menção dessa incerteza, é devido o preço, ainda que os bens não existam ou não pertençam ao vendedor, excepto se as partes recusarem ao contrato natureza aleatória.
1. A coisa deve ser entregue no estado em que se encontrava ao tempo da venda.
2. A obrigação de entrega abrange, salvo estipulação em contrário, as partes componentes e integrantes, os frutos pendentes e os documentos relativos à coisa ou direito.
3. Se os documentos contiverem outras matérias de interesse do vendedor, é este obrigado a entregar pública-forma da parte respeitante à coisa ou direito que foi objecto da venda, ou fotocópia de igual valor.
1. Se o preço não estiver fixado por entidade pública, e as partes o não determinarem nem convencionarem o modo de ele ser determinado, vale como preço contratual o que o vendedor normalmente praticar à data da conclusão do contrato ou, na falta dele, o do mercado no momento do contrato e no lugar em que o comprador deva cumprir; na insuficiência destas regras, o preço é determinado pelo tribunal, segundo juízos de equidade.
2. Quando as partes se tenham reportado ao justo preço, é aplicável o disposto no número anterior.
1. Se a venda ficar limitada a parte do seu objecto, nos termos do artigo 285.º ou por força de outros preceitos legais, o preço respeitante à parte válida do contrato é o que neste figurar, se houver sido discriminado como parcela do preço global.
2. Na falta de discriminação, a redução é feita por meio de avaliação.
1. O preço deve ser pago no momento e no lugar da entrega da coisa vendida.
2. Mas, se por estipulação das partes ou por força dos usos o preço não tiver de ser pago no momento da entrega, o pagamento deve ser efectuado no domicílio que o credor tiver ao tempo do cumprimento.
Transmitida a propriedade da coisa, ou direito sobre ela, e feita a sua entrega, o vendedor não pode, salvo convenção em contrário, resolver o contrato por falta de pagamento do preço.
Na venda de coisas determinadas, com preço fixado à razão de tanto por unidade, é devido o preço proporcional ao número, peso ou medida real das coisas vendidas, sem embargo de no contrato se declarar quantidade diferente.
1. Se na venda de coisas determinadas o preço não for estabelecido à razão de tanto por unidade, o comprador deve o preço declarado, mesmo que no contrato se indique o número, peso ou medida das coisas vendidas e a indicação não corresponda à realidade.
2. Se, porém, a quantidade efectiva diferir da declarada em mais de um vigésimo desta, o preço será reduzido ou aumentado proporcionalmente.
Quando se venda por um só preço uma pluralidade de coisas determinadas e homogéneas, com indicação do peso ou medida de cada uma delas, e se declare quantidade inferior à real quanto a alguma ou algumas e superior quanto a outra ou outras, far-se-á compensação entre as faltas e os excessos até ao limite da sua concorrência.
1. O direito ao recebimento da diferença de preço caduca dentro de 6 meses ou 1 ano após a entrega da coisa, consoante esta for móvel ou imóvel; mas, se a diferença só se tornar exigível em momento posterior à entrega, o prazo conta-se a partir desse momento.
2. Na venda de coisas que hajam de ser transportadas de um lugar para outro, o prazo reportado à data da entrega só começa a correr no dia em que o comprador as receber.
1. Se o preço devido por aplicação do artigo 877.º ou do n.º 2 do artigo 878.º exceder o proporcional à quantidade declarada em mais de um vigésimo deste, e o vendedor exigir esse excesso, o comprador tem o direito de resolver o contrato, salvo se houver procedido com dolo.
2. O direito à resolução caduca no prazo de 3 meses, a contar da data em que o vendedor fizer por escrito a exigência do excesso.
É nula a venda de bens alheios sempre que o vendedor careça de legitimidade para a realizar; mas o vendedor não pode opor a nulidade ao comprador de boa fé, como não pode opô-la ao vendedor de boa fé o comprador doloso.
A venda de bens alheios fica, porém, sujeita ao regime da venda de bens futuros, se as partes os considerarem nesta qualidade.
1. Sendo nula a venda de bens alheios, o comprador que tiver procedido de boa fé tem o direito de exigir a restituição integral do preço, ainda que os bens se hajam perdido, estejam deteriorados ou tenham diminuído de valor por qualquer outra causa.
2. Mas, se o comprador houver tirado proveito da perda ou diminuição de valor dos bens, o proveito deve ser abatido no montante do preço e da indemnização que o vendedor tenha de pagar-lhe.
O que exigir de terceiro coisa por este comprada, de boa fé, a comerciante que negoceie em coisa do mesmo género é obrigado a restituir o preço que o adquirente tiver dado por ela, mas goza do direito de regresso contra aquele que culposamente der causa ao prejuízo.
Logo que o vendedor adquira por algum modo a propriedade da coisa ou o direito vendido, o contrato torna-se válido e a dita propriedade ou direito transfere-se para o comprador.
1. O contrato não adquire, porém, validade, se entretanto ocorrer um dos seguintes factos:
a) Pedido judicial de declaração de nulidade do contrato, formulado por um dos contraentes contra o outro;
b) Restituição do preço ou pagamento da indemnização, no todo ou em parte, com aceitação do credor;
c) Transacção entre os contraentes, na qual se reconheça a nulidade do contrato;
d) Declaração escrita, feita por um dos estipulantes ao outro, de que não quer que o contrato deixe de ser declarado nulo.
2. As disposições das alíneas a) e d) do número precedente não prejudicam o disposto na segunda parte do artigo 882.º
1. Em caso de boa fé do comprador, o vendedor é obrigado a sanar a nulidade da venda, adquirindo a propriedade da coisa ou o direito vendido.
2. Quando exista uma tal obrigação, o comprador pode subordinar ao não cumprimento dela, dentro do prazo que o tribunal fixar, o efeito previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior.
Se um dos contraentes houver procedido de boa fé e o outro dolosamente, o primeiro tem direito a ser indemnizado, nos termos gerais, de todos prejuízos que não teria sofrido se o contrato fosse válido desde o começo, ou não houvesse sido celebrado, conforme venha ou não a ser sanada a nulidade.
O vendedor é obrigado a indemnizar o comprador de boa fé ainda que tenha agido sem dolo, ou sequer culpa; mas, em qualquer destes casos, a indemnização compreende apenas os danos emergentes que não resultem de despesas voluptuárias.
1. Se o vendedor for responsável pelo não cumprimento da obrigação de sanar a nulidade da venda ou pela mora no seu cumprimento, a respectiva indemnização acresce à regulada nos artigos anteriores, excepto na parte em que o prejuízo seja comum.
2. Mas, no caso previsto no artigo 889.º, o comprador deve escolher entre a indemnização dos lucros cessantes pela celebração do contrato nulo e a dos lucros cessantes pela falta ou retardamento da convalidação.
O vendedor é garante solidário do pagamento das benfeitorias que devam ser reembolsadas pelo dono da coisa ao comprador de boa fé.
Se os bens só parcialmente forem alheios e o contrato valer na parte restante por aplicação do artigo 285.º, devem observar-se as disposições antecedentes quanto à parte nula e deve reduzir-se proporcionalmente o preço estipulado.
1. O disposto no artigo 884.º, no n.º 1 do artigo 888.º, no artigo 890.º, no n.º 1 do artigo 891.º e no artigo 892.º cede perante convenção em contrário, excepto se o contraente a quem a convenção aproveitaria houver agido com dolo, e de boa fé o outro estipulante.
2. A declaração contratual de que o vendedor não garante a sua legitimidade ou não responde pela evicção envolve derrogação de todas as disposições legais a que o número anterior se refere, com excepção do preceituado no artigo 884.º
3. As cláusulas derrogadoras das disposições supletivas a que se refere o n.º 1 são válidas, sem embargo da nulidade do contrato de compra e venda onde se encontram insertas, desde que a nulidade proceda da ilegitimidade do vendedor, nos termos desta Secção.
As normas da presente Secção apenas se aplicam à venda de coisa alheia como própria.
Se o direito transmitido estiver sujeito a alguns ónus ou limitações não constantes do contrato que excedam os limites normais inerentes aos direitos da mesma categoria, o contrato é anulável por erro ou dolo, desde que no caso se verifiquem os requisitos legais da anulabilidade.
1. Desaparecidos por qualquer modo os ónus ou limitações a que o direito estava sujeito, fica sanada a anulabilidade do contrato.
2. A anulabilidade persiste, porém, se a existência dos ónus ou limitações já houver causado prejuízo ao comprador, ou se este já tiver pedido em juízo a anulação da compra e venda.
1. O vendedor é obrigado a sanar a anulabilidade do contrato, mediante a expurgação dos ónus ou limitações existentes.
2. O prazo para a expurgação é fixado pelo tribunal, a requerimento do comprador.
O vendedor deve promover, à sua custa, o cancelamento de qualquer ónus ou limitação que conste do registo, mas na realidade não exista.
Em caso de dolo, o vendedor, anulado o contrato, deve indemnizar o comprador do prejuízo que este não sofreria se a compra e venda não tivesse sido celebrada.
Nos casos de anulação fundada em simples erro, o vendedor também é obrigado a indemnizar o comprador, ainda que não tenha havido culpa da sua parte, mas a indemnização abrange apenas os danos emergentes do contrato que não resultem de despesas voluptuárias.
1. Se o vendedor se constituir em responsabilidade por não sanar a anulabilidade do contrato, a correspondente indemnização acresce à que o comprador tenha direito a receber na conformidade dos artigos precedentes, salvo na parte em que o prejuízo foi comum.
2. Mas, no caso previsto no artigo 900.º, o comprador deve escolher entre a indemnização dos lucros cessantes pela celebração do contrato que veio a ser anulado e a dos lucros cessantes pelo facto de não ser sanada a anulabilidade.
1. Se as circunstâncias mostrarem que, sem erro ou dolo, o comprador teria igualmente adquirido os bens, mas por preço inferior, apenas lhe cabe o direito à redução do preço, em harmonia com a desvalorização resultante dos ónus ou limitações, além da indemnização que no caso competir.
2. São aplicáveis à redução os preceitos anteriores, com as necessárias adaptações.
1. O disposto no n.º 1 do artigo 898.º, no artigo 899.º, no artigo 901.º e no n.º 1 do artigo 902.º cede perante estipulação das partes em contrário, a não ser que o vendedor tenha procedido com dolo e as cláusulas contrárias àquelas normas visem a beneficiá-lo.
2. Não obsta à validade das cláusulas derrogadoras destas disposições supletivas a anulação do contrato de compra e venda por erro ou dolo, segundo as prescrições desta Secção.
1. Se a coisa vendida sofrer de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinada, ou não tiver as qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias para a realização daquele fim, deve observar-se, com as devidas adaptações, o prescrito na Secção precedente, em tudo quanto não seja modificado pelas disposições dos artigos seguintes.
2. Quando do contrato não resulte o fim a que a coisa vendida se destina, deve atender-se à função normal das coisas da mesma categoria.
1. O comprador tem o direito de exigir do vendedor a reparação da coisa.
2. Não se aplica o disposto no número anterior, se o vendedor desconhecia sem culpa o vício ou falta de qualidade de que a coisa padece.
1. O comprador tem em alternativa à faculdade concedida no artigo anterior o direito de exigir do vendedor a substituição da coisa, quando tal se mostre necessário e a coisa tiver natureza fungível.
2. Não se aplica o disposto no número anterior, se o vendedor desconhecia sem culpa o vício ou falta de qualidade de que a coisa padece.
A indemnização prevista no artigo 901.º também não é devida, se o vendedor se encontrava nas condições a que se refere o n.º 2 do artigo anterior.
1. O comprador deve denunciar ao vendedor o vício ou a falta de qualidade da coisa, excepto se este houver usado de dolo.
2. A denúncia é feita até 30 dias depois de conhecido o defeito e dentro de 1 ano após a entrega da coisa.
3. Os prazos referidos no número anterior são, respectivamente, de 1 e de 5 anos, caso a coisa vendida seja um imóvel.
Em caso de simples erro, a acção de anulação, bem como o direito à reparação ou substituição da coisa, caduca, findo qualquer dos prazos fixados no artigo anterior sem o comprador ter feito a denúncia, ou decorridos sobre esta 6 meses, sem prejuízo, neste último caso, do disposto no n.º 2 do artigo 280.º
Se a coisa, depois de vendida e antes de entregue, se deteriorar, adquirindo vícios ou perdendo qualidades, ou a venda respeitar a coisa futura ou a coisa indeterminada de certo género, são aplicáveis as regras relativas ao não cumprimento das obrigações.
Sendo a venda feita sobre amostra, entende-se que o vendedor assegura a existência, na coisa vendida, de qualidades iguais às da amostra, salvo se da convenção ou dos usos resultar que esta serve somente para indicar de modo aproximado as qualidades do objecto.
Ficam ressalvadas as leis especiais ou, na falta destas, os usos sobre a venda de animais defeituosos.
1. Se o vendedor estiver obrigado, por convenção das partes ou por força dos usos, a garantir o bom funcionamento da coisa vendida, cabe-lhe repará-la, ou substituí-la quando a substituição for necessária e a coisa tiver natureza fungível, independentemente de culpa sua ou de erro do comprador.
2. No silêncio do contrato, o prazo da garantia expira 1 ano após a entrega da coisa, se os usos não estabelecerem prazo maior.
3. O defeito de funcionamento deve ser denunciado ao vendedor dentro do prazo da garantia e, salvo estipulação em contrário, até 30 dias depois de conhecido.
4. A acção caduca logo que finde o tempo para a denúncia sem o comprador a ter feito, ou passados 6 meses sobre a data em que a denúncia foi efectuada.
Na venda de coisas que devam ser transportadas de um lugar para outro, os prazos que os artigos 909.º e 914.º mandam contar a partir da entrega só começam a correr no dia em que o credor as receber.
1. A compra e venda feita sob reserva de a coisa agradar ao comprador vale como proposta de venda.
2. A proposta considera-se aceite se, entregue a coisa ao comprador, este não se pronunciar dentro do prazo da aceitação, nos termos do n.º 1 do artigo 220.º
3. A coisa deve ser facultada ao comprador para exame.
1. Se as partes estiverem de acordo sobre a resolução da compra e venda no caso de a coisa não agradar ao comprador, é aplicável ao contrato o disposto nos artigos 426.º e seguintes.
2. A entrega da coisa não impede a resolução do contrato.
3. O vendedor pode fixar um prazo razoável para a resolução, se nenhum for estabelecido pelo contrato ou, no silêncio deste, pelos usos.
1. A venda sujeita a prova considera-se feita sob a condição suspensiva de a coisa ser idónea para o fim a que é destinada e ter as qualidades asseguradas pelo vendedor, excepto se as partes a subordinarem a condição resolutiva.
2. A prova deve ser feita dentro do prazo e segundo a modalidade estabelecida pelo contrato ou pelos usos; se tanto o contrato como os usos forem omissos, devem observar-se o prazo fixado pelo vendedor e a modalidade escolhida pelo comprador, desde que sejam razoáveis.
3. Não sendo o resultado da prova comunicado ao vendedor antes de expirar o prazo a que se refere o número anterior, a condição tem-se por verificada quando suspensiva, e por não verificada quando resolutiva.
4. A coisa deve ser facultada ao comprador para prova.
Em caso de dúvida sobre a modalidade de venda que as partes escolheram, de entre as previstas nesta Secção, presume-se terem adoptado a primeira.
Diz-se a retro a venda em que se reconhece ao vendedor a faculdade de resolver o contrato.
1. É nula, sem prejuízo da validade das outras cláusulas, a estipulação de pagamento de dinheiro ao comprador ou de qualquer outra vantagem para este, como contrapartida da resolução.
2. É igualmente nula, quanto ao excesso, a cláusula que declare o vendedor obrigado a restituir, em caso de resolução, preço superior ao fixado para a venda.
3. Pode, no entanto, estipular-se que o preço seja actualizado de acordo com o critério constante do artigo 544.º
1. A resolução pode ser exercida dentro de 2 ou 5 anos a contar da venda, conforme esta for de bens móveis ou imóveis, salvo estipulação de prazo mais curto.
2. Se as partes convencionarem prazo ou prorrogação de prazo que exceda o limite de 2 ou 5 anos a partir da venda, a convenção considera-se reduzida a esse preciso limite.
A resolução é feita por meio de notificação judicial ao comprador dentro dos prazos fixados no artigo antecedente; se respeitar a coisas imóveis, a resolução deve ser reduzida a documento autenticado nos 15 dias imediatos, com ou sem a intervenção do comprador, sob pena de caducidade do direito.
No silêncio do contrato, a resolução fica igualmente sem efeito se, dentro do mesmo prazo de 15 dias, o vendedor não fizer ao comprador oferta real das importâncias líquidas que haja de pagar-lhe a título de reembolso do preço e das despesas com o contrato e outras acessórias.
A cláusula a retro é oponível a terceiros, desde que a venda tenha por objecto coisas imóveis, ou coisas móveis sujeitas a registo, e tenha sido registada com aquela cláusula.
Se for vendida coisa ou direito comum com a cláusula a retro, só em conjunto os vendedores podem exercer o direito de resolução.
Vendida a coisa a prestações, com reserva de propriedade, e feita a sua entrega ao comprador, a falta de pagamento de uma só prestação que não exceda a oitava parte do preço não dá lugar à resolução do contrato, nem sequer, haja ou não reserva de propriedade, importa a perda do benefício do prazo relativamente às prestações seguintes, não obstante convenção em contrário.
1. O disposto no artigo anterior é extensivo a todos os contratos pelos quais se pretenda obter resultado equivalente ao da venda a prestações.
2. Quando se locar uma coisa, com a cláusula de que ela se tornará propriedade do locatário depois de satisfeitas todas as rendas ou alugueres pactuados, a resolução do contrato por o locatário o não cumprir tem efeito retroactivo, devendo o locador restituir as importâncias recebidas, sem possibilidade de convenção em contrário, salvo o montante correspondente ao valor da indemnização ou da cláusula penal, nos termos gerais.
Na venda sobre documentos, a entrega da coisa é substituída pela entrega do seu título representativo e dos outros documentos exigidos pelo contrato ou, no silêncio deste, pelos usos.
1. Salvo convenção ou uso em contrário, o pagamento do preço deve efectuar-se no momento e no local da entrega dos documentos indicados no artigo anterior.
2. Quando os documentos estão em ordem, o comprador não pode recusar o pagamento do preço invocando excepções relativas à qualidade ou ao estado das coisas, se estas não estiverem já demonstradas.
1. Quando o pagamento do preço for feito por intermédio de um banco, o vendedor não pode exigi-lo ao comprador se não depois de o banco ter recusado o pagamento contra a apresentação dos documentos estabelecidos no contrato ou pelos usos.
2. O banco que tiver confirmado o crédito ao vendedor apenas pode opor-lhe as excepções que decorram da falta ou irregularidade dos documentos e as derivadas da relação de confirmação do crédito.
1. Se o contrato tiver por objecto coisa em viagem e, mencionada esta circunstância, figurar entre os documentos entregues a apólice de seguro contra os riscos do transporte, observar-se-ão as regras seguintes, na falta de estipulação em contrário:
a) O preço deve ser pago, ainda que a coisa já não existisse quando o contrato foi celebrado, por se haver perdido casualmente depois de ter sido entregue ao transportador;
b) O contrato não é anulável com fundamento em defeitos da coisa, produzidos casualmente após o momento da entrega;
c) O risco fica a cargo do comprador desde a data da compra.
2. As duas primeiras regras do número anterior não têm aplicação se, ao tempo do contrato, o vendedor já sabia que a coisa estava perdida ou deteriorada e dolosamente o não revelou ao comprador de boa fé.
3. Quando o seguro apenas cobrir parte dos riscos, o disposto neste artigo vale exclusivamente em relação à parte segurada.
As normas da compra e venda são aplicáveis aos outros contratos onerosos pelos quais se alienem bens ou se estabeleçam encargos sobre eles, na medida em que sejam conformes com a sua natureza e não estejam em contradição com as disposições legais respectivas.
1. Doação é o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício do outro contraente.
2. Não há doação na renúncia a direitos e no repúdio de herança ou legado, nem tão-pouco nos donativos conformes aos usos sociais.
É considerada doação a liberalidade remuneratória de serviços recebidos pelo doador, que não tenham a natureza de dívida exigível.
1. A doação não pode abranger bens futuros.
2. Incidindo, porém, a doação sobre uma universalidade de facto que continue no uso e fruição do doador, consideram-se doadas, salvo declaração em contrário, as coisas singulares que venham de futuro a integrar a universalidade.
A doação que tiver por objecto prestações periódicas extingue-se por morte do doador.
1. A doação feita a várias pessoas conjuntamente considera-se feita por partes iguais, sem que haja direito de acrescer entre os donatários, salvo se o doador houver declarado o contrário.
2. O disposto no número anterior não prejudica o direito de acrescer entre usufrutuários, quando o usufruto tenha sido constituído por doação.
1. A proposta de doação caduca, se não for aceite em vida do doador.
2. A tradição para o donatário, em qualquer momento, da coisa móvel doada, ou do seu título representativo, é havida como aceitação.
3. Se a proposta não for aceite no próprio acto ou não se verificar a tradição nos termos do número anterior, a aceitação deve obedecer à forma prescrita no artigo 941.º e ser declarada ao doador, sob pena de não produzir os seus efeitos.
1. É proibida a doação por morte.
2. É, porém, havida como disposição testamentária a doação que houver de produzir os seus efeitos por morte do doador, se tiverem sido observadas as formalidades dos testamentos.
1. A doação de coisas imóveis só é válida se for celebrada pela forma prescrita na lei do notariado.
2. A doação de coisas móveis não depende de forma alguma especial, quando acompanhada de tradição da coisa doada; não sendo acompanhada de tradição da coisa, só pode ser feita por escrito.
1. Têm capacidade para fazer doações todos o que podem contratar e dispor dos seus bens.
2. A capacidade é regulada pelo estado em que o doador se encontrar ao tempo da declaração negocial.
1. Não é permitido atribuir a outrem, por mandato, a faculdade de designar a pessoa do donatário ou determinar o objecto da doação, salvo nos casos previstos no n.º 2 do artigo 2019.º
2. Os representantes legais dos incapazes não podem fazer doações em nome destes.
1. Podem receber doações todos os que não estão especialmente inibidos de as aceitar por disposição da lei.
2. A capacidade do donatário é fixada no momento da aceitação.
1. As pessoas que não têm capacidade para contratar não podem aceitar doações modais senão por intermédio dos seus representantes legais.
2. Porém, as doações puras feitas a tais pessoas produzem efeitos independentemente de aceitação em tudo o que aproveite aos donatários.
1. Os nascituros concebidos ou não concebidos podem adquirir por doação, sendo filhos de pessoa determinada, viva ao tempo da declaração de vontade do doador.
2. Na doação feita a nascituro presume-se que o doador reserva para si o usufruto dos bens doados até ao nascimento do donatário.
É aplicável às doações, devidamente adaptado, o disposto nos artigos 2029.º a 2032.º
A doação tem como efeitos essenciais:
a) A transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito;
b) A obrigação de entregar a coisa;
c) A assunção da obrigação, quando for esse o objecto do contrato.
1. A coisa deve ser entregue no estado em que se encontrava ao tempo da aceitação.
2. A obrigação de entrega abrange, na falta de estipulação em contrário, as partes componentes e integrantes, os frutos pendentes e os documentos relativos à coisa ou direito.
1. É nula a doação de bens alheios; mas o doador não pode opor a nulidade ao donatário de boa fé.
2. O doador só responde pelo prejuízo causado ao donatário quando este esteja de boa fé e se verifique algum dos seguintes factos:
a) Ter o doador assumido expressamente a obrigação de indemnizar o prejuízo;
b) Ter o doador agido com dolo;
c) Ter a doação carácter remuneratório;
d) Ser a doação modal, ficando a responsabilidade do doador limitada, neste caso, ao valor dos encargos.
3. É imputável no prejuízo do donatário o valor da coisa ou do direito doado, mas não os benefícios que ele deixou de obter em consequência da nulidade.
4. Não havendo lugar a indemnização, o donatário fica sub-rogado nos direitos que possam competir ao doador relativamente à coisa ou direito doado.
1. Se o donatário, à data da aquisição, desconhecia o carácter alheio do bem, torna-se o contrato válido desde o momento em que o doador adquira, por qualquer meio, a propriedade da coisa doada.
2. A invalidade subsiste, porém, se, à data da aquisição do bem pelo doador, o donatário já tiver pedido judicialmente a declaração da nulidade e não vier a desistir do pedido ou se, na mesma data, já tiver declarado àquele, por escrito, que não quer que o contrato deixe de ser declarado nulo.
1. O doador não responde pelos ónus ou limitações do direito transmitido, nem pelos vícios da coisa, excepto quando se tiver expressamente responsabilizado ou tiver procedido com dolo.
2. A doação é, porém, anulável em qualquer caso, a requerimento do donatário de boa fé.
3. Desaparecidos por qualquer modo os ónus ou limitações a que o direito estava sujeito, fica sanada a anulabilidade do contrato.
4. A anulabilidade subsiste, porém, se à data do desaparecimento dos ónus ou limitações o donatário já tiver pedido em juízo a anulação da doação e não vier a desistir do pedido ou se, na mesma data, já tiver declarado ao doador, por escrito, que não quer que o contrato deixe de ser anulado.
1. O doador tem a faculdade de reservar para si, ou para terceiro, o usufruto dos bens doados.
2. Havendo reserva de usufruto em favor de várias pessoas, simultânea ou sucessivamente, são aplicáveis as disposições dos artigos 1375.º e 1376.º
1. O doador pode reservar para si o direito de dispor, por morte ou por acto entre vivos, de alguma ou algumas das coisas compreendidas na doação, ou o direito a certa quantia sobre os bens doados.
2. O direito reservado não se transmite aos herdeiros do doador, e só é eficaz perante terceiros adquirentes se disser respeito a bens sujeitos a registo e após este ter sido efectuado.
3. Consideram-se terceiros adquirentes todos aqueles que, à excepção do donatário ou seus herdeiros, tenham adquirido um direito sobre o bem.
4. Se o cumprimento da cláusula de reserva ficar impossibilitado por causa imputável ao donatário, fica este responsável perante o doador pelos danos que lhe tenha provocado.
1. O doador pode estipular a reversão da coisa doada.
2. A reversão dá-se no caso de o doador sobreviver ao donatário, ou a este e a todos os seus descendentes; não havendo estipulação em contrário, entende-se que a reversão só se verifica neste último caso.
3. É aplicável à cláusula de reversão o preceituado na segunda parte do n.º 2 e no n.º 3 do artigo anterior.
4. Se o cumprimento da cláusula de reversão ficar impossibilitado por causa imputável ao donatário, ou seus descendentes, fica quem tenha dado causa ao incumprimento responsável perante o doador pelos danos que lhe tenha provocado.
1. São admitidas substituições fideicomissárias nas doações.
2. A estas substituições são aplicáveis, com as necessárias correcções, os artigos 2115.º e seguintes.
1. As doações podem ser oneradas com encargos.
2. O donatário não é obrigado a cumprir os encargos senão dentro dos limites do valor da coisa ou do direito doado.
1. Se a doação for feita com o encargo de pagamento das dívidas do doador, entende-se a cláusula, na falta de outra declaração, como obrigando ao pagamento das que existirem ao tempo da doação.
2. Só é legal o encargo do pagamento de dívidas futuras do doador desde que se determine o seu montante no acto da doação.
Na doação modal, tanto o doador, ou os seus herdeiros, como quaisquer interessados têm legitimidade para exigir do donatário, ou dos seus herdeiros, o cumprimento dos encargos.
O doador, ou os seus herdeiros, também podem pedir a resolução da doação, fundada no não cumprimento de encargos, quando esse direito lhes seja conferido pelo contrato.
As condições ou encargos física ou legalmente impossíveis, contrários à lei ou à ordem pública, ou ofensivos dos bons costumes ficam sujeitos às regras estabelecidas em matéria testamentária.
Não pode prevalecer-se da nulidade da doação o herdeiro do doador que a confirme depois da morte deste ou lhe dê voluntária execução, conhecendo o vício e o direito à declaração de nulidade.
1. Enquanto não for aceite a doação, o doador pode livremente revogar a sua declaração negocial, desde que observe as formalidades desta.
2. A proposta de doação não caduca pelo decurso dos prazos fixados no n.º 1 do artigo 220.º
1. A doação pode ser revogada por ingratidão do donatário, quando este se torne incapaz, por indignidade, de suceder ao doador, ou quando se verifique alguma das ocorrências que justificam a deserdação.
2. Contudo, a doação não é revogável por ingratidão do donatário:
a) Sendo remuneratória;
b) Se o doador houver perdoado ao donatário; ou
c) No caso previsto na alínea e) do artigo 1874.º
1. A acção de revogação por ingratidão não pode ser proposta, nem depois da morte do donatário, nem pelos herdeiros do doador, salvo o caso previsto no n.º 3, e caduca ao cabo de 1 ano, contado desde o facto que lhe deu causa ou desde que o doador teve conhecimento desse facto.
2. Falecido o doador ou o donatário, a acção, quando pendente, é transmissível aos herdeiros de um ou de outro.
3. Se o donatário tiver cometido contra o doador o crime de homicídio doloso, ou por qualquer causa o tiver impedido de revogar a doação, a acção pode ser proposta pelos herdeiros do doador dentro de 1 ano a contar, respectivamente, da condenação do donatário ou da morte do doador.
O doador não pode antecipadamente renunciar ao direito de revogar a doação por ingratidão do donatário.
1. Os efeitos da revogação da doação retrotraem-se à data da proposição da acção.
2. Revogada a liberalidade, são os bens doados restituídos ao doador, ou aos seus herdeiros, no estado em que se encontrarem.
3. Se os bens tiverem sido alienados ou não puderem ser restituídos em espécie por outra causa imputável ao donatário, entregará este, ou entregarão os seus herdeiros, o valor que eles tinham ao tempo em que foram alienados ou se verificou a impossibilidade de restituição, acrescido dos juros legais a contar da proposição da acção.
A revogação da doação não afecta terceiros que hajam adquirido, anteriormente à demanda, direitos reais sobre os bens doados, sem prejuízo das regras relativas ao registo; neste caso, porém, o donatário deve indemnizar o doador.
Locação é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar a outra o gozo temporário de uma coisa, mediante retribuição.
A locação diz-se arrendamento quando versa sobre coisa imóvel, aluguer quando incide sobre coisa móvel.
A locação constitui, para o locador, um acto de administração ordinária, excepto quando for celebrada por prazo superior a 6 anos.
1. O contrato de locação, referente a bem indiviso, celebrado por prazo superior a 6 anos depende, para a sua validade, do acordo de todos os comproprietários e o celebrado por um prazo igual ou inferior a 6 anos depende do acordo da maioria indicada na alínea a) do n.º 3 do artigo 1304.º
2. Os actos efectuados em violação do disposto no número anterior são anuláveis; contudo, a anulabilidade é sanável pelo assentimento posterior dos comproprietários que representem a maioria exigida para a validade do acto.
3. O assentimento deve ser prestado pela forma a que estiver sujeito o contrato de locação.
A locação não pode celebrar-se por mais de 30 anos; quando estipulada por tempo superior, ou como contrato perpétuo, considera-se reduzida àquele limite.
1. Na falta de estipulação, entende-se que o prazo de duração do contrato de aluguer é igual à unidade de tempo a que corresponde a retribuição fixada, e o de arrendamento ao período de 1 ano.
2. O disposto na parte final do número anterior não prejudica o regime fixado no n.º 2 do artigo 1038.º quanto à denúncia do arrendamento.
1. Se do contrato e respectivas circunstâncias não resultar o fim a que a coisa locada se destina, é permitido ao locatário aplicá-la a quaisquer fins lícitos, dentro da função normal das coisas de igual natureza.
2. Tratando-se de arrendamento, aplica-se o disposto no artigo 1031.º
1. Se uma ou mais coisas forem locadas para fins diferentes, sem subordinação de uns a outros, deve observar-se, relativamente a cada um deles, o regime respectivo.
2. As causas de nulidade, anulabilidade ou resolução que respeitem a um dos fins não afectam a parte restante da locação, excepto se do contrato ou das circunstâncias que o acompanham não resultar a discriminação das coisas ou partes da coisa correspondentes às várias finalidades, ou estas forem solidárias entre si.
3. Se, porém, um dos fins for principal e os outros subordinados, prevalece o regime correspondente ao fim principal; os outros regimes só são aplicáveis na medida em que não contrariem o primeiro e a aplicação deles se não mostre incompatível com o fim principal.
São obrigações do locador:
a) Entregar ao locatário a coisa locada;
b) Assegurar-lhe o gozo desta para os fins a que a coisa se destina.
Quando a coisa locada apresentar vício que lhe não permita realizar cabalmente o fim a que é destinada, ou carecer de qualidades necessárias a esse fim ou asseguradas pelo locador, considera-se o contrato não cumprido:
a) Se o defeito datar, pelo menos, do momento da entrega e o locador não provar que o desconhecia sem culpa; ou
b) Se o defeito surgir posteriormente à entrega, por culpa do locador.
O disposto no artigo anterior não é aplicável:
a) Se o locatário conhecia o defeito quando celebrou o contrato ou recebeu a coisa;
b) Se o defeito já existia ao tempo da celebração do contrato e era facilmente reconhecível, a não ser que o locador tenha assegurado a sua inexistência ou usado de dolo para o ocultar;
c) Se o defeito for da responsabilidade do locatário; ou
d) Se este não avisou do defeito o locador, como lhe cumpria.
1. São aplicáveis, com as devidas adaptações, as disposições dos dois artigos anteriores:
a) Se o locador não tiver a faculdade de proporcionar a outrem o gozo da coisa locada;
b) Se o seu direito não for de propriedade ou estiver sujeito a algum ónus ou limitação que exceda os limites normais inerentes a este direito; ou
c) Se o direito do locador não possuir os atributos que ele assegurou ou estes atributos cessarem posteriormente por culpa dele.
2. As circunstâncias descritas no número anterior só importam a falta de cumprimento do contrato quando determinarem a privação, definitiva ou temporária, do gozo da coisa ou a diminuição dele por parte do locatário.
3. O disposto na alínea b) do n.º 1 não prejudica a legitimidade do promitente-comprador de prédio ou fracção para os dar de arrendamento, tendo havido tradição do imóvel e pagamento integral do preço.
1. O disposto nos artigos 978.º e 980.º não obsta à anulação do contrato por erro ou dolo, contanto que as circunstâncias que dêem causa à invalidade sejam contemporâneas do contrato.
2. Aos casos previstos no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 896.º a 910.º, com excepção do n.º 3 do artigo 909.º
1. Não obstante convenção em contrário, o locador não pode praticar actos que impeçam ou diminuam o gozo da coisa pelo locatário, com excepção dos que a lei ou os usos facultem ou o próprio locatário consinta em cada caso, mas não tem obrigação de assegurar esse gozo contra actos de terceiro.
2. O locatário que for privado da coisa ou perturbado no exercício dos seus direitos pode usar, mesmo contra o locador, dos meios de defesa facultados ao possuidor nos artigos 1201.º e seguintes.
São obrigações do locatário:
a) Pagar a renda ou aluguer;
b) Facultar ao locador o exame da coisa locada;
c) Não aplicar a coisa a fim diverso daqueles a que ela se destina;
d) Não fazer dela uma utilização imprudente;
e) Tolerar as reparações urgentes, bem como quaisquer obras ordenadas pela autoridade pública;
f) Não proporcionar a outrem o gozo total ou parcial da coisa por meio de cessão onerosa ou gratuita da sua posição jurídica, sublocação ou comodato, excepto se a lei o permitir ou o locador o autorizar;
g) Comunicar ao locador, dentro de 15 dias, a cedência do gozo da coisa por algum dos referidos títulos, quando permitida ou autorizada;
h) Não cobrar do sublocatário renda ou aluguer superior ao que é permitido nos termos do artigo 1010.º;
i) Avisar imediatamente o locador, sempre que tenha conhecimento de vícios na coisa, ou saiba que a ameaça algum perigo ou que terceiros se arrogam direitos em relação a ela, desde que o facto seja ignorado pelo locador;
j) Restituir a coisa locada findo o contrato, nos termos do n.º 1 do artigo 1025.º
Os encargos da coisa locada recaem sobre o locador, a não ser que a lei os imponha ao locatário ou que haja acordo entre locador e locatário quanto à sua transferência para este.
1. O acordo quanto à transferência de encargos para o locatário deve, sob pena de nulidade:
a) Constar de escrito assinado pelo locatário; e
b) Especificar quais os encargos a cargo do locatário.
2. A nulidade do acordo não prejudica a validade das restantes cláusulas do contrato.
1. Para efeitos do disposto no artigo anterior, as partes podem fixar uma quantia a pagar mensalmente, sujeita, salvo acordo em contrário, a eventuais acertos posteriores; a cláusula que fixe a quantia poderá prever, quando seja o caso, as fórmulas de revisão ou de actualização.
2. Quando haja lugar a eventuais acertos posteriores, o locador deverá, pelo menos uma vez por ano, comunicar ao locatário todas as informações necessárias para determinação e comprovação das despesas a cargo deste.
3. Ainda que não haja lugar a acertos posteriores, caberá sempre ao locatário o direito de obter a redução judicial do montante fixado caso haja manifesta desproporção entre o montante pago e os encargos correspondentes.
4. Nos casos em que não tenha sido fixada uma quantia mensal, o locador deve comunicar ao locatário, com uma antecedência razoável, todas as informações necessárias para determinação e comprovação das despesas a cargo deste.
5. No caso do número anterior, e salvo disposição contratual em contrário, as obrigações relativas aos encargos que impendem sobre o locatário vencem-se no final do mês seguinte ao da comunicação pelo locador, devendo ser cumpridas simultaneamente com o pagamento da renda ou aluguer subsequente.
6. Quando o acordo de transferência de encargos para o locatário incida sobre as despesas de condomínio, considera-se que o acordo se refere, salvo disposição em contrário, às despesas indicadas nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 1332.º
1. É lícito ao locatário realizar pequenas deteriorações na coisa locada, quando elas se tornem necessárias para assegurar o seu conforto ou comodidade.
2. As deteriorações referidas no número anterior devem, no entanto, ser reparadas pelo locatário antes da restituição da coisa, salvo estipulação em contrário.
1. Nas coisas podem ter lugar obras de conservação ordinária, obras de conservação extraordinária e obras de beneficiação.
2. São obras de conservação ordinária, em geral:
a) As obras destinadas a reparar a coisa ou a mantê-la nas condições requeridas pelo fim do contrato e existentes à data da sua celebração;
b) Nos contratos que tenham por objecto prédios urbanos, as obras impostas pela Administração Pública nos termos da lei e que visem manter um nível de habitabilidade adequado do prédio e das suas fracções.
3. São obras de conservação extraordinária as ocasionadas por defeito de construção ou fabrico da coisa ou por caso fortuito ou de força maior e, em geral, as de conservação que, não sendo imputáveis a acções ou omissões ilícitas perpetradas pelo locador, ultrapassem, no ano em que se tornem necessárias, dois terços do rendimento líquido da coisa nesse ano.
4. São obras de beneficiação todas as que não estejam abrangidas nos n.os 2 e 3.
1. As obras de conservação ordinária estão a cargo do locador, sem prejuízo do disposto nos artigos 987.º e 1025.º
2. As obras de conservação extraordinária e de beneficiação ficam a cargo do locador quando, nos termos da lei, a sua execução lhe seja ordenada pela entidade competente ou quando haja acordo escrito das partes no sentido da sua realização, com discriminação das obras a efectuar.
3. A realização das obras referidas no número anterior dá lugar à actualização das rendas ou alugueres nos termos dos artigos 1000.º a 1003.º
4. Ficam ressalvados todos os direitos que o locador e o locatário tenham perante terceiros.
1. Quando o locador, depois de notificado pela entidade competente, não iniciar, no prazo fixado, as obras de conservação ou beneficiação que legalmente lhe caibam, pode o locatário proceder à sua execução.
2. O início das obras deve, no entanto, ser precedido da elaboração de um orçamento do respectivo custo, a comunicar ao locador, por escrito, e que represente o valor máximo pelo qual este é responsável.
3. Havendo pluralidade de locatários, o disposto nos números anteriores, relativamente às partes comuns, depende do assentimento de, pelo menos, metade deles, ficando os restantes vinculados.
1. Se o locador estiver em mora quanto à obrigação de fazer obras que, pela sua urgência, se não compadeçam com as delongas do procedimento judicial, tem o locatário a possibilidade de fazê-las independentemente de processo judicial, com direito ao reembolso das despesas.
2. Quando a urgência não consinta qualquer dilação, o locatário pode fazer as obras, também com direito a reembolso, independentemente de mora do locador, contanto que o avise ao mesmo tempo.
1. Nos casos das obras realizadas ao abrigo do disposto nos artigos 990.º e 991.º, se o locador não proceder voluntariamente ao pagamento, o locatário pode descontar na renda ou aluguer até setenta por cento do seu montante, acrescido dos respectivos juros legais, durante o tempo necessário ao seu reembolso integral.
2. O disposto no número anterior não prejudica o direito de o locador discutir, pelos meios comuns, o custo das obras e, no caso do artigo 991.º, a necessidade e a urgência das mesmas.
1. O pagamento de renda ou aluguer deve ser efectuado no primeiro dia de vigência do contrato ou do período a que respeita, e no domicílio do locatário à data do vencimento, se as partes não fixarem outro regime.
2. Se a renda ou aluguer houver de ser pago no domicílio, geral ou particular, do locatário ou de procurador seu, e o pagamento não tiver sido efectuado, presume-se que o locador não veio nem mandou receber a prestação no dia do vencimento.
1. Não é permitido às partes estipularem o pagamento antecipado de mais do que uma renda ou aluguer, nem uma antecipação por tempo superior ao período a que respeita a renda ou aluguer, ficando a antecipação reduzida a esses limites, sempre que os exceda.
2. É, porém, lícita a convenção de antecipação do pagamento da renda ou aluguer acrescida do depósito, a título de caução, da importância correspondente a duas rendas ou alugueres.
Na falta de convenção em contrário, se as rendas ou os alugueres estiverem em correspondência com os meses do calendário gregoriano ou lunar, a primeira vencer-se-á com a celebração do contrato e cada uma das restantes no primeiro dia útil do mês a que diga respeito.
1. Constituindo-se o locatário em mora, o locador tem o direito de exigir, além das rendas ou alugueres em atraso, uma indemnização igual a metade do montante que for devido, salvo se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento; se o atraso exceder 30 dias, a indemnização referida é aumentada para o dobro.
2. Cessa o direito à indemnização ou à resolução do contrato, se o locatário fizer cessar a mora no prazo de 8 dias a contar do seu começo.
3. Enquanto não forem cumpridas as obrigações a que o n.º 1 se refere, o locador tem direito a recusar o recebimento das rendas ou alugueres seguintes, os quais são considerados em dívida para todos os efeitos.
4. A recepção de novas rendas ou alugueres não priva o locador do direito à resolução do contrato ou à indemnização referida, com base nas prestações em mora.
5. À mora do locatário no pagamento das rendas ou alugueres não pode ser aplicada a sanção prevista no artigo 333.º
1. Se o locatário depositar as rendas ou alugueres em atraso, bem como a indemnização fixada no n.º 1 do artigo anterior, quando devida, e requerer dentro de 5 dias a notificação judicial do depósito ao locador, presume-se que lhe ofereceu o pagamento respectivo, pondo fim à mora, e que este o recusou.
2. O depósito, quando abranja a indemnização, envolve da parte do locatário o reconhecimento de que caíra em mora, salvo se for feito condicionalmente.
3. A oferta de pagamento da renda ou aluguer conjuntamente com a indemnização referida no artigo anterior não implica confissão de mora.
1. Salvo estipulação em contrário, e sem prejuízo do disposto na Secção II, se, por motivo não atinente à sua pessoa ou à dos seus familiares, o locatário sofrer privação ou diminuição do gozo da coisa locada, haverá lugar a uma redução da renda ou aluguer proporcional ao tempo da privação ou diminuição e à extensão desta.
2. Mas, se a privação ou diminuição não for imputável ao locador nem seus familiares, a redução só terá lugar no caso de uma ou outra exceder um sexto da duração do contrato.
3. O locatário deve comunicar ao locador, por escrito e o mais tardar até 30 dias depois de ter cessado, o motivo da redução, bem como o seu quantitativo.
4. O disposto no número anterior não prejudica o direito de o locador discutir, pelos meios comuns, a privação ou diminuição do gozo da coisa ou o seu quantitativo.
5. Para efeitos deste artigo, consideram-se familiares o cônjuge, os parentes e os afins, que vivam habitualmente em comunhão de mesa e habitação com o locatário ou o locador.
6. Para os mesmos efeitos, é equiparada aos familiares a pessoa que com o locatário ou o locador viva em união de facto, independentemente das condições exigidas no artigo 1472.º, bem como os empregados domésticos que vivam habitualmente em comunhão de mesa e habitação com o locatário ou o locador.
7. No arrendamento rural aplica-se igualmente o disposto no artigo 1052.º
1. As rendas ou alugueres são actualizáveis:
a) Nos termos e condições que resultem do contrato ou por acordo posterior das partes; ou
b) Em função de obras de conservação extraordinária e de beneficiação da coisa que o locador seja compelido administrativamente a efectuar, salvo quando o seu pagamento possa ser exigido a terceiros.
2. As regras de actualização da renda ou aluguer firmadas aquando do contrato estão sujeitas a ser modificadas pelo tribunal, a requerimento do locatário, sempre que fixem critérios arbitrários ou manifestamente não razoáveis.
1. O aumento em que se traduz a actualização da renda ou aluguer por obras, referido na alínea b) do n.º 1 do artigo anterior, não pode exceder, por mês, na falta de acordo, um duodécimo do produto resultante da aplicação da taxa de juro legal ao custo total delas.
2. O novo valor é devido a partir da renda ou aluguer seguinte à conclusão das obras.
1. O locador deve comunicar, por escrito, ao locatário, com a antecedência mínima de 30 dias, o novo montante e os dados utilizados no seu cálculo.
2. A nova renda ou aluguer considera-se aceite quando o locatário não discorde nos termos do artigo seguinte.
3. Quando o montante previsto no n.º 1 não for múltiplo da pataca, será objecto de arredondamento para a unidade imediatamente superior.
4. Tratando-se de arrendamento rural e sendo a renda paga em géneros, o montante da actualização é convertível em acréscimo de géneros, determinado em função do valor dos mesmos à data da actualização.
l. Sem prejuízo do disposto no artigo 1024.º quanto ao direito à revogação unilateral, o locatário pode recusar a nova renda ou aluguer com base em erro sobre os factos relevantes ou erro na aplicação da lei.
2. A recusa, acompanhada da respectiva fundamentação, deve ser comunicada ao locador, por escrito, no prazo de 15 dias contados da recepção da comunicação de aumento, e nela deve o locatário indicar o montante que considera correcto.
3. O locador pode rejeitar o montante indicado pelo locatário mediante comunicação escrita a este dirigida e enviada no prazo de 15 dias contados da recepção da comunicação da recusa.
4. O silêncio do locador ou não acatamento, por ele, das formalidades referidas no número anterior valem como aceitação da indicação do locatário.
5. A recusa da nova renda ou aluguer por outros motivos que não os indicados no n.º 1 constitui o locatário em mora.
1. Quando as obras sejam realizadas por acordo das partes, pode ser convencionado livremente um aumento de renda ou aluguer compensatório.
2. A alteração da renda ou aluguer, por motivo de obras acordadas, só pode provar-se por escrito.
O adquirente do direito com base no qual foi celebrado o contrato sucede nos direitos e obrigações do locador, sem prejuízo das regras do registo.
A liberação ou cessão de rendas ou alugueres não vencidos é inoponível ao sucessor entre vivos do locador, na medida em que tais rendas ou alugueres respeitem a períodos de tempo não decorridos à data da sucessão, a não ser quando a liberação ou cessão conste do acto de alienação do direito com base no qual foi celebrado o contrato, através de declaração escrita assinada pelo adquirente.
1. A posição contratual do locatário é transmissível por morte dele ou, tratando-se de pessoa colectiva, pela extinção desta, se assim tiver sido convencionado por escrito ou quando admitido pela lei.
2. A cessão da posição do locatário está sujeita ao regime geral dos artigos 418.º e seguintes, sem prejuízo das disposições especiais deste capítulo e demais legislação.
3. A transmissão da posição contratual do locatário para terceiro não implica a suspensão ou a interrupção do prazo do contrato, nem conduz a quaisquer alterações ao seu conteúdo.
A locação diz-se sublocação, quando o locador a celebra com base no direito de locatário que lhe advém de um precedente contrato locativo.
1. A autorização para sublocar está sujeita à forma exigida para a locação.
2. A sublocação não autorizada considera-se, todavia, ratificada pelo locador, se ele reconhecer o sublocatário como tal.
3. O simples conhecimento de que a coisa foi sublocada não constitui reconhecimento do sublocatário como tal.
1. A sublocação só produz efeitos em relação ao locador ou a terceiros a partir do seu reconhecimento pelo locador ou da comunicação a que se refere a alínea g) do artigo 983.º
2. É dispensada a comunicação, quando se trate de sublocação especialmente consentida pelo locador a favor de pessoa determinada e que se faça até 90 dias depois de autorizada, ou quando o locador reconhecer o sublocatário como tal.
O locatário não pode cobrar do sublocatário renda ou aluguer superior ou proporcionalmente superior ao que é devido pelo contrato de locação, aumentado de vinte por cento, salvo se outra coisa tiver sido convencionada com o locador.
1. A sublocação caduca com a extinção, por qualquer causa, do contrato de locação, sem prejuízo da responsabilidade do locatário para com o sublocatário, quando o motivo da extinção lhe seja imputável.
2. A sublocação não caduca pela revogação do contrato de locação por acordo entre as partes nem pela confusão das qualidades de locador e locatário, sucedendo em tais casos o sublocatário nos direitos e obrigações do locatário.
1. Se o locador receber alguma renda ou aluguer do sublocatário e lhe passar recibo depois da extinção da locação, será o sub-locatário havido como locatário directo.
2. Se tanto o locatário como o sublocatário estiverem em mora quanto às respectivas dívidas de renda ou aluguer, é lícito ao locador exigir do sublocatário o que este dever, até ao montante do seu próprio crédito.
1. O aluguer pode cessar por:
a) Revogação por acordo entre as partes;
b) Resolução;
c) Caducidade; ou
d) Revogação unilateral.
2. O arrendamento pode cessar através dos meios indicados no número anterior e ainda através de denúncia, sujeita ao regime dos artigos 1038.º e 1039.º
3. O disposto neste capítulo sobre a resolução, a caducidade, a revogação unilateral e a denúncia tem natureza imperativa.
1. A cessação da locação opera por interpelação dirigida à outra parte, pela forma prevista na lei.
2. A interpelação faz-se pela citação, quando seja exigida acção judicial, ou extrajudicialmente, por comunicação; tratando-se de arrendamento, a comunicação tem de ser escrita.
3. Produz, ainda, os efeitos da interpelação o reconhecimento, pelo locatário, do facto jurídico que conduz à cessação da locação; tratando-se de imóvel, o reconhecimento tem de resultar de documento assinado pelo locatário ou de documento emitido seguramente pelo mesmo.
4. A interpelação feita pelo locador, quando efectuada na forma prevista pela lei, torna exigível, a partir do momento legalmente fixado, a desocupação da coisa locada e a sua entrega com as reparações que incumbem ao locatário.
Além dos demais casos em que, por disposição especial, exista título executivo suficiente para a restituição da coisa locada, constitui igualmente título executivo, para o mesmo fim, o contrato de locação cujas assinaturas se encontrem reconhecidas notarialmente:
a) No caso de revogação do contrato de arrendamento urbano por acordo das partes, contanto que o acordo conste de documento escrito com reconhecimento por semelhança das assinaturas e nos restantes contratos de locação com reconhecimento presencial das assinaturas;*
b) No caso de caducidade do contrato operada nos termos das alíneas a) e d) do artigo 1022.º;
c) No caso de denúncia do arrendamento requerida pelo senhorio nos termos da lei, contanto que seja junta a certidão de notificação judicial avulsa da denúncia.
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 13/2017
1. As partes podem, a todo o tempo, mediante acordo, fazer cessar o contrato.
2. O acordo referido no número anterior deve ser celebrado por escrito, sempre que não seja imediatamente executado ou sempre que contenha cláusulas compensatórias ou quaisquer outras cláusulas acessórias.
3. A revogação será sempre válida, independentemente da forma, quando o locatário restitua o gozo da coisa ao locador e este aceite a restituição.
1. O locatário pode resolver o contrato nos termos gerais de direito, com base em incumprimento pela outra parte.
2. A resolução do contrato fundada na falta de cumprimento por parte do locatário tem de ser decretada pelo tribunal; tratando-se de arrendamento, o senhorio só pode resolver o contrato nos casos previstos no artigo 1034.º
A acção de resolução deve ser proposta dentro de 1 ano a contar do conhecimento do facto que lhe serve de fundamento, sob pena de caducidade.
O direito à resolução do contrato por falta de pagamento da renda ou aluguer caduca logo que o locatário, até à contestação da acção destinada a fazer valer esse direito, pague ou deposite as somas devidas e a indemnização referida no artigo 996.º
O locador não tem direito à resolução do contrato com fundamento na violação do disposto nas alíneas f) e g) do artigo 983.º, se tiver reconhecido o beneficiário da cedência como tal, ou ainda, no caso da alínea g), se a comunicação lhe tiver sido feita por este.
1. O locatário pode resolver o contrato, independentemente de responsabilidade do locador:
a) Se, por motivo estranho à sua própria pessoa ou à dos seus familiares, for privado do gozo da coisa, ainda que só temporariamente; ou
b) Se na coisa locada existir ou sobrevier defeito que ponha em perigo a vida ou a saúde do locatário ou dos seus familiares.
2. Aplica-se a estes casos o disposto nos n.os 5 e 6 do artigo 998.º
1. O contrato de locação caduca:
a) Findo o prazo do contrato, salvo o disposto, quanto ao arrendamento, nos n.os 1 e 2 do artigo 1038.º;
b) Verificando-se a condição a que as partes o subordinaram, ou tornando-se certo que não pode verificar-se, conforme a condição seja resolutiva ou suspensiva;
c) Quando cesse o direito ou findem os poderes legais de administração com base nos quais o contrato foi celebrado;
d) Por morte do locatário ou, tratando-se de pessoa colectiva, pela extinção desta, salvo convenção escrita em contrário e o disposto quanto ao arrendamento nos artigos 1043.º, 1046.º, 1048.º e 1056.º;
e) Pela perda da coisa locada; ou
f) No caso de expropriação por utilidade pública, a não ser que a expropriação se compadeça com a subsistência do contrato.
2. Tratando-se de arrendamento, aplica-se igualmente o disposto nos artigos 1035.º a 1037.º
Verificando-se qualquer das situações previstas na alínea c) do n.º 1 do artigo anterior, o contrato de locação não caduca, todavia:
a) Se for celebrado pelo usufrutuário e a propriedade se consolidar na sua mão;
b) Se o usufrutuário alienar o seu direito ou renunciar a ele, pois nestes casos o contrato só caduca pelo termo normal do usufruto;
c) Se for celebrado pelo cônjuge administrador;
d) Se for celebrado pelo cabeça-de-casal com o consentimento de todos os interessados ou disser respeito a bem que lhe venha a ser adjudicado na partilha.
e) Se o contrato de arrendamento for celebrado pelo promitente-comprador nas condições do n.º 3 do artigo 980.º e a propriedade se consolidar na sua mão; ou
f) Antes de 2 anos passados sobre a celebração do contrato de arrendamento, se este for celebrado pelo promitente-comprador nas condições do n.º 3 do artigo 980.º e o contrato-promessa for resolvido.
1. O locatário tem a faculdade de revogar unilateralmente o contrato quando as obras de beneficiação feitas pelo locador nas circunstâncias referidas na alínea b) do n.º 1 do artigo 999.º importem alteração sensível no modo de utilização da coisa por parte do locatário ou quando este se não conforme com o acréscimo da renda ou aluguer.
2. O direito à revogação previsto no número anterior é exercido mediante comunicação escrita ao locador com a antecedência mínima de 30 dias sobre a data em que opere os seus efeitos.
3. No arrendamento para fins habitacionais, o arrendatário goza sempre do direito à revogação unilateral de acordo com o disposto no artigo 1044.º
1. Na falta de convenção em contrário, o locatário é obrigado a manter e restituir a coisa no estado em que a recebeu, ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato.
2. Presume-se que a coisa foi entregue ao locatário em bom estado de manutenção, quando não exista documento onde as partes tenham descrito o estado dela ao tempo da entrega.
O locatário responde pela perda ou deteriorações da coisa, não exceptuadas no n.º 1 do artigo anterior, salvo se resultarem de causa que lhe não seja imputável nem a terceiro a quem tenha permitido a utilização dela.
1. Se a coisa locada não for restituída, por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado, excepto se houver fundamento para consignar em depósito a coisa devida.
2. Logo, porém, que o locatário se constitua em mora, a indemnização é elevada ao dobro; à mora do locatário não é aplicável a sanção prevista no artigo 333.º
3. Fica salvo o direito do locador à indemnização dos prejuízos excedentes, se os houver.
1. Sem prejuízo do disposto nos artigos 990.º a 992.º e salvo estipulação em contrário, o locatário é equiparado ao possuidor de boa fé para efeito do direito a indemnização e do direito ao levantamento das benfeitorias que haja feito na coisa locada.
2. Tratando-se de aluguer de animais, as despesas de alimentação destes correm sempre, na falta de estipulação em contrário, por conta do locatário.
1. Os arrendamentos de prédios, quer sejam urbanos ou rústicos, ficam sujeitos às disposições da subsecção que regule especialmente o tipo de arrendamento em causa, às restantes normas contidas na presente subsecção e na subsecção seguinte que não estejam em oposição com elas e ainda às normas das secções anteriores que não contrariem as normas desta Secção.
2. Exceptuam-se:
a) Os arrendamentos para fins especiais transitórios;
b) Os arrendamentos sujeitos a legislação especial.
3. Aos arrendamentos referidos na alínea a) do número anterior são aplicáveis as disposições das secções anteriores e as contidas nesta Secção, com excepção dos artigos 1038.º e 1039.º e das demais regras que estejam em oposição com o fim especial desses arrendamentos; aos referidos na alínea b) do mesmo número são aplicáveis igualmente as disposições daquelas secções, e também as desta, que não estejam, umas ou outras, em oposição com o regime especial desses arrendamentos.
1. Não é havido como arrendamento de prédio o contrato pelo qual alguém transfere temporária e onerosamente para outrem, juntamente com o gozo do prédio, a exploração da empresa comercial nele instalada.
2. A cessão da utilização do prédio decorrente da locação da empresa comercial não carece de autorização do senhorio, devendo, no entanto, ser-lhe comunicada no prazo de 15 dias, sob pena de ineficácia.
3. Para efeitos do número anterior, é aplicável com as devidas adaptações o disposto no n.º 2 do artigo 1047.º
1. O arrendamento pode ter como fim a habitação, o exercício de empresa comercial, o exercício de profissão liberal, a actividade rural, ou outra aplicação lícita do prédio.
2. Na falta de estipulação, o arrendatário pode utilizar o prédio para o fim a que o mesmo se destina.
3. Se o prédio for urbano e houver licença de utilização, o fim é o que resultar da mesma.
4. Não sendo possível proceder à determinação do fim a que o prédio se destina, o arrendatário pode usar o prédio para o fim a que esteve afecto durante a utilização anterior ou, quando não for possível determiná-lo, para qualquer fim lícito, dentro da função normal das coisas de igual natureza.
1. O contrato de arrendamento é celebrado por escrito particular, cujas assinaturas devem ser reconhecidas notarialmente.*
2. Salvo disposição legal em contrário, o arrendamento será, não obstante a falta de título escrito, reconhecido em juízo, por qualquer outro meio de prova, quando se demonstre que a falta é imputável à contraparte no contrato.
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 13/2017
1. Com excepção do especialmente estabelecido para o arrendamento rural no artigo 1051.º, a renda é mensal e o seu quantitativo tem de ser fixado em patacas.
2. O mês computa-se pelo calendário gregoriano ou, havendo convenção das partes, pelo lunar, quando as rendas estejam em correspondência com os meses dos mesmos calendários, calculando-se, nas restantes hipóteses, em 30 dias.
3. Sem prejuízo da validade do contrato, é nula a cláusula pela qual se convencione o pagamento em moeda específica ou sem curso legal em Macau, independentemente do tipo de arrendamento.
4. O quantitativo da renda fixada em moeda específica ou sem curso legal em Macau corresponde ao seu equivalente em patacas, segundo o câmbio oficial do dia da celebração do contrato ou, na sua falta, segundo o valor corrente que essa moeda tenha à data da celebração do contrato.
O senhorio só pode resolver o contrato se o arrendatário:
a) Não pagar a renda no tempo e lugar próprios nem fizer depósito liberatório, sem prejuízo do disposto no artigo 1019.º;
b) Usar ou consentir que outrem use o prédio arrendado para fim ou ramo de negócio diverso daquele ou daqueles a que se destina;
c) Aplicar o prédio, reiterada ou habitualmente, a práticas ilícitas;
d) Fizer no prédio, sem consentimento escrito do senhorio, obras que alterem substancialmente a sua estrutura externa ou a disposição interna das suas divisões, ou praticar quaisquer actos que nele causem deteriorações consideráveis, igualmente não consentidas e que não possam justificar-se nos termos do artigo 987.º ou do n.º 1 do 1025.º;
e) Der hospedagem a mais de três pessoas das mencionadas no n.º 4 do artigo 1041.º, quando não seja esse o fim para que o prédio foi arrendado e não haja sido estipulado o contrário;
f) Subarrendar ou emprestar, total ou parcialmente, o prédio arrendado, ou ceder a sua posição contratual, nos casos em que estes actos são ilícitos, inválidos por falta de forma ou ineficazes em relação ao senhorio, salvo o disposto no artigo 1020.º;
g) Cobrar do sublocatário renda superior à que é permitida nos termos do artigo 1010.º;
h) Deixar de prestar ao proprietário ou ao senhorio os serviços pessoais, quando admitidos, que determinaram a ocupação do prédio;
i) Tratando-se de arrendamento para o exercício de empresa comercial ou profissão liberal, conservar o prédio encerrado por mais de 1 ano, consecutivamente, salvo caso de força maior ou ausência forçada do arrendatário, que não se prolongue por mais de 2 anos, ou em caso de assentimento do senhorio, prestado aquando ou após o contrato; ou
j) Tratando-se de arrendamento rural, prejudicar a produtividade do prédio, não velar pela boa conservação dele ou causar prejuízos graves nas coisas que, não sendo objecto do contrato, existam no prédio arrendado.
1. A caducidade do contrato em consequência da expropriação por utilidade pública obriga o expropriante a indemnizar o arrendatário, cuja posição é, para o efeito, considerada como um encargo autónomo.
2. A indemnização referida no número anterior é calculada nos termos da legislação reguladora das expropriações por utilidade pública.
Em qualquer dos casos de caducidade previstos nas alíneas b) a d) do n.º 1 do artigo 1022.º, a restituição do prédio só pode ser exigida passados 90 dias sobre a verificação do facto que determina a caducidade ou, sendo o arrendamento rural, no fim do ano agrícola em curso no termo do referido prazo.
1. Se, não obstante a caducidade do arrendamento, o arrendatário se mantiver no gozo da coisa pelo lapso de 1 ano, sem oposição do senhorio, o contrato considera-se renovado nas condições do artigo seguinte.
2. O disposto no número anterior é aplicável independentemente da causa da caducidade do arrendamento.
1. Findo o prazo do arrendamento, o contrato renova-se por períodos sucessivos, se nenhuma das partes o tiver denunciado no tempo e pela forma convencionados ou designados na lei.
2. No entanto, o senhorio não goza do direito de denunciar o contrato de arrendamento para o seu termo ou para o termo das renovações antes do decurso de 3 anos sobre o início do arrendamento.*
3. O prazo da renovação é igual ao do contrato; mas, salvo estipulação em contrário, é apenas de 1 ano, se o prazo do contrato for mais longo.
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 13/2017
1. A denúncia tem de ser comunicada por escrito ao outro contraente com a antecedência mínima seguinte:
a) 180 dias, se o prazo for igual ou superior a 6 anos;
b) 90 dias, se o prazo for igual ou superior a 1 ano e inferior a 6 anos;
c) 30 dias, se o prazo for igual ou superior a 3 meses e inferior a 1 ano;
d) Um terço do prazo, quando este for inferior a 3 meses.
2. A antecedência a que se refere o número anterior reporta-se ao fim do prazo do contrato ou da renovação.
Quando o arrendamento de prédio para habitação seja acompanhado do aluguer da respectiva mobília ao mesmo locatário, considera-se arrendamento todo o contrato, e renda todo o preço locativo, mas discriminar-se-ão neste preço a parte correspondente ao arrendamento do prédio e a parte correspondente ao aluguer da mobília.
1. Nos arrendamentos para habitação podem residir no prédio, além do arrendatário:
a) Todos os que vivam com ele em economia comum;
b) Um máximo de três hóspedes, salvo estipulação em contrário.
2. Consideram-se sempre como vivendo com o arrendatário em economia comum, ainda que paguem alguma retribuição, o seu cônjuge, os seus parentes ou afins na linha recta ou até ao 3.º grau da linha colateral, a pessoa, bem como os seus ascendentes e descendentes, com quem o arrendatário viva em união de facto, independentemente das condições exigidas no artigo 1472.º, e bem assim as pessoas relativamente às quais, por força da lei ou do negócio jurídico que não respeite directamente à habitação, haja obrigação de convivência ou de alimentos.
3. O disposto no n.º 1 entende-se com ressalva das estipulações em contrário que não respeitem ao cônjuge ou unido de facto do arrendatário, seus pais ou pais do seu cônjuge ou unido de facto, seus descendentes solteiros ou descendentes solteiros do seu cônjuge ou unido de facto, nem aos empregados domésticos do arrendatário.
4. Apenas se consideram hóspedes os indivíduos a quem o arrendatário proporcione habitação mediante retribuição.
1. Seja qual for o regime matrimonial, a posição do arrendatário não se comunica ao cônjuge e caduca por sua morte, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.
2. Requerido o divórcio, podem os cônjuges acordar em que posição de arrendatário fique pertencendo a qualquer deles.
3. Na falta de acordo, cabe ao tribunal decidir, considerando as necessidades de cada um dos cônjuges, o interesse dos filhos, as circunstâncias de facto relativas à ocupação da casa, a culpa imputada ao arrendatário no divórcio, o facto de ser o arrendamento anterior ou posterior ao casamento, e quaisquer outras razões atendíveis.
4. A transferência do direito ao arrendamento para o cônjuge do arrendatário, por efeito de acordo homologado pelo juiz ou pelo conservador do registo civil, consoante os casos, ou por decisão judicial, deve ser notificada oficiosamente ao senhorio.
1. O arrendamento para a habitação não caduca por morte do primitivo arrendatário ou daquele a quem tiver sido cedida a sua posição contratual, se lhe sobreviver:
a) Cônjuge não separado de facto ou que, embora separado, habitasse a casa arrendada, à data da morte;
b) Descendente a cargo do arrendatário que com ele convivesse na casa arrendada;
c) Ascendente que com ele convivesse na casa arrendada há mais de 1 ano;
d) Afim na linha recta, nas condições referidas nas alíneas b) e c) deste número; ou
e) Pessoa que com ele vivesse em união de facto na casa arrendada há mais de 1 ano, independentemente da condição exigida na alínea b) do n.º 1 do artigo 1472.º
2. A transmissão da posição de arrendatário, estabelecida no número anterior, defere-se pela ordem seguinte:
a) Ao cônjuge sobrevivo;
b) Aos parentes ou afins na linha recta, preferindo os primeiros aos segundos, os descendentes aos ascendentes e os de grau mais próximo aos de grau ulterior;
c) À pessoa mencionada na alínea e) do n.º 1.
3. A transmissão a favor dos parentes ou afins do arrendatário também se verifica por morte do cônjuge sobrevivo quando, nos termos deste artigo, lhe tenha sido transmitido o direito ao arrendamento.
4. Os beneficiários do direito à transmissão do arrendamento podem renunciar a ele, comunicando a renúncia por escrito ao senhorio no prazo de 60 dias a contar da data da morte do primitivo arrendatário.
5. Produz o mesmo efeito que a renúncia a restituição, pelos beneficiários, do uso do prédio, no prazo previsto no número anterior.
1. O arrendatário goza sempre do direito a pôr termo ao arrendamento antes do fim do prazo do contrato ou das suas renovações, mediante comunicação escrita ao senhorio com a antecedência mínima de 90 dias sobre a data em que opere os seus efeitos, sem prejuízo de prazo mais curto estabelecido no contrato.
2. Salvo estipulação em contrário, o direito à revogação unilateral efectuada nos termos do número anterior dá ao senhorio direito, a título de compensação, a 1 mês de renda; a indemnização nunca pode ser estipulada em montante superior a 2 meses de renda, sob pena de redução a este valor.
Considera-se arrendamento comercial o arrendamento de prédios urbanos ou rústicos tomados para fins directamente relacionados com o exercício de empresa comercial.
1. O arrendamento não caduca por morte do arrendatário, mas os sucessores podem renunciar à transmissão, comunicando a renúncia por escrito ao senhorio no prazo de 60 dias.
2. Produz o mesmo efeito que a renúncia a restituição, pelos sucessores, do uso do prédio, no prazo previsto no número anterior.
1. É permitida a transmissão da posição do arrendatário, sem dependência de autorização do senhorio, em caso de alienação da empresa comercial.
2. Consideram-se indícios da não verificação da alienação da empresa comercial:
a) Passar a exercer-se no prédio, transmitido o seu gozo, outro ramo de actividade, ou, de um modo geral, ser-lhe dado outro destino;
b) A transmissão que não seja acompanhada da transferência, em conjunto, das instalações, utensílios, mercadorias ou outros elementos que integram a empresa comercial.
É aplicável aos arrendamentos para o exercício de profissões liberais o disposto no artigo 1046.º
1. A posição do arrendatário é transmissível por acto entre vivos, sem autorização do senhorio, a pessoas que no prédio arrendado continuem a exercer a mesma profissão.
2. A cessão só é válida se for celebrada por escrito particular com reconhecimento presencial das assinaturas dos outorgantes.
A locação de prédios rústicos para fins agrícolas, pecuários ou florestais, nas condições de uma exploração regular, denomina-se arrendamento rural.
1. A renda é fixada em dinheiro ou em géneros e pode ser certa ou consistir numa quota dos frutos.
2. Só pode ser fixada em géneros a renda relativa a contrato de arrendamento com fins agrícolas ou pecuários.
3. Para efeitos do número anterior, a renda fixada em géneros tem de incidir sobre géneros derivados da exploração.
4. Salvo disposição em contrário, a renda em dinheiro é mensal; se paga em géneros, ter-se-á que atender à periodicidade das colheitas.
1. Quando, por causas imprevisíveis ou fortuitas, acidentes geológicos e pragas de natureza excepcional, o prédio não produzir frutos ou os frutos pendentes se perderem em quantidade não inferior, no todo, a metade dos que produzia normalmente, tem o arrendatário direito a uma redução equitativa da renda, que não exceda metade do seu quantitativo.
2. Não se encontram abrangidas pelo número anterior, salvo quando o contrário resulte do contrato, circunstâncias tais como inundações, tufões ou outros acidentes meteorológicos que não se possam considerar excepcionais em Macau.
3. O disposto nos números anteriores não prejudica o direito à resolução ou modificação do contrato, nos termos gerais, se a capacidade produtiva do prédio ficar, de maneira duradoura, consideravelmente afectada, por força das causas neles referidas.
4. A falta de produção ou perda dos frutos não é, todavia, atendível na medida em que for compensada pelo valor da produção do ano, ou dos anos anteriores no caso de contrato plurianual, ou por indemnização que o arrendatário tenha recebido ou haja de receber em razão da mesma falta ou perda.
5. As cláusulas derrogadoras do disposto nos n.os 1 e 3 consideram-se não escritas.
6. Para o exercício dos direitos facultados nos n.os 1 e 3, deve o arrendatário avisar por escrito o senhorio, a fim de lhe permitir a verificação do prejuízo.
Considera-se não escrita a cláusula pela qual o arrendatário se obrigue, por qualquer título, a serviços que não revertam em benefício directo do prédio, ou se sujeite a encargos extraordinários ou casuais não compreendidos na renda.
1. O arrendatário pode fazer benfeitorias úteis ou voluptuárias sem consentimento do proprietário, salvo se afectarem a substância do prédio ou o seu destino económico.
2. O arrendatário tem o direito de as levantar sem detrimento do prédio, bem como, tratando-se de benfeitorias úteis, o direito a ser indemnizado pelas mesmas, findo o contrato, nos termos e condições do n.º 2 do artigo 1198.º
1. O facto de o contrato não ser renovado não isenta o arrendatário do dever de assegurar, para o futuro, a produtividade normal do prédio.
2. Este dever não compreende a prática de actos de que o arrendatário não possa já tirar proveito; mas, neste caso, ele é obrigado a permitir que o senhorio tome as providências necessárias para assegurar a produtividade do prédio, sem prejuízo da indemnização a que tenha direito pelo danos sofridos.
Ao arrendamento rural é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1042.º e 1043.º
Comodato é o contrato gratuito pelo qual uma das partes entrega à outra certa coisa, móvel ou imóvel, para que se sirva dela, com a obrigação de a restituir.
1. Se o comodante emprestar a coisa com base num direito de duração limitada, não pode o contrato ser celebrado por tempo superior; e, quando o seja, reduz-se ao limite de duração desse direito.
2. É aplicável ao comodato constituído pelo usufrutuário o disposto nas alíneas a) e b) do artigo 1023.º
Se do contrato e respectivas circunstâncias não resultar o fim a que a coisa emprestada se destina, é permitido ao comodatário aplicá-la a quaisquer fins lícitos, dentro da função normal das coisas de igual natureza.
Só por força de convenção expressa o comodatário pode fazer seus os frutos colhidos.
1. O comodante deve abster-se de actos que impeçam ou restrinjam o uso da coisa pelo comodatário, mas não é obrigado a assegurar-lhe esse uso.
2. Se este for privado dos seus direitos ou perturbado no exercício deles, pode usar, mesmo contra o comodante, dos meios de defesa facultados ao possuidor nos artigos 1201.º e seguintes.
O comodante não responde pelos vícios ou limitações do direito nem pelos vícios da coisa, excepto quando se tiver expressamente responsabilizado ou tiver procedido com dolo.
São obrigações do comodatário:
a) Guardar e conservar a coisa emprestada;
b) Facultar ao comodante o exame dela;
c) Não a aplicar a fim diverso daquele a que a coisa se destina;
d) Não fazer dela uma utilização imprudente;
e) Tolerar quaisquer benfeitorias que o comodante queira realizar na coisa;
f) Não proporcionar a terceiro o uso da coisa, excepto se o comodante autorizar;
g) Avisar imediatamente o comodante, sempre que tenha conhecimento de vícios na coisa, ou saiba que a ameaça algum perigo ou que terceiro se arroga direitos em relação a ela, desde que o facto seja ignorado do comodante;
h) Restituir a coisa findo o contrato.
1. Quando a coisa emprestada perecer ou se deteriorar casualmente, o comodatário é responsável, se estava no seu poder tê-lo evitado, ainda que mediante sacrifício de coisa própria de valor não superior.
2. Quando, porém, o comodatário a tiver aplicado a fim diverso daquele a que a coisa se destina, ou tiver consentido que terceiro a use sem para isso estar autorizado, é sempre responsável pela perda ou deterioração, salvo provando que ela teria igualmente ocorrido sem a sua conduta ilegal.
3. Sendo avaliada a coisa ao tempo do contrato, presume-se que a responsabilidade ficou a cargo do comodatário, ainda que este não pudesse evitar o prejuízo pelo sacrifício de coisa própria.
1. Se os contraentes não convencionaram prazo certo para a restituição da coisa, mas esta foi emprestada para uso determinado, o comodatário deve restituí-la logo que o uso finde, independentemente de interpelação.
2. Se não foi convencionado o prazo para a restituição nem determinado o uso da coisa, o comodatário é obrigado a restituí-la logo que lhe seja exigida.
3. É aplicável à manutenção e restituição da coisa emprestada o disposto no artigo 1025.º
1. O comodatário é equiparado, quanto a benfeitorias, ao possuidor de má fé.
2. Tratando-se de empréstimo de animais, as despesas de alimentação destes correm, salvo estipulação em contrário, por conta do comodatário.
Sendo dois ou mais os comodatários, são solidárias as suas obrigações.
Não obstante a existência de prazo, o comodante pode resolver o contrato, se para isso tiver justa causa.
O contrato caduca pela morte do comodatário.
Mútuo é o contrato pelo qual uma partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade.
As coisas mutuadas tornam-se propriedade do mutuário pelo facto da entrega.
1. As partes podem convencionar o pagamento de juros como retribuição do mútuo; este presume-se oneroso em caso de dúvida.
2. Ainda que o mútuo não verse sobre dinheiro, deve observar-se, relativamente a juros, o disposto no artigo 552.º e, havendo mora do mutuário, o disposto no artigo 795.º
1. É havido como usurário o contrato de mútuo em que sejam estipulados juros superiores ao triplo dos juros legais.
2. É havida também como usurária a cláusula penal que fixar como indemnização devida pela falta de restituição do empréstimo, relativamente ao tempo de mora, mais do que o correspondente ao quíntuplo dos juros legais; tratando-se de cláusula penal estritamente compulsória, o montante da sanção não poderá ser superior ao triplo dos juros legais.
3. Se a taxa de juros estipulada ou o montante da indemnização ou sanção fixados exceder o máximo fixado nos números anteriores, considera-se reduzido a esse máximo, ainda que seja outra a vontade dos contraentes.
4. O respeito dos limites máximos referidos neste artigo não obsta à aplicabilidade dos artigos 275.º a 277.º
No mútuo oneroso o prazo presume-se estipulado a favor de ambas as partes, mas o mutuário pode antecipar o pagamento, desde que satisfaça os juros por inteiro.
1. Na falta de estipulação de prazo, a obrigação do mutuário, tratando-se de mútuo gratuito, só se vence 30 dias após a exigência do seu cumprimento.
2. Se o mútuo for oneroso e não se tiver fixado prazo, qualquer das partes pode pôr termo ao contrato, desde que o denuncie com uma antecipação mínima de 30 dias.
3. Tratando-se, porém, de empréstimo, gratuito ou oneroso, de produtos rurais a favor do lavrador, presume-se feito até à colheita seguinte dos produtos semelhantes.
4. A doutrina do número anterior é aplicável aos mutuários que, não sendo lavradores, recolhem pelo arrendamento de terras próprias frutos semelhantes aos que receberam de empréstimo.
Se o mútuo recair em coisa que não seja dinheiro e a restituição se tornar impossível ou extremamente difícil por causa não imputável ao mutuário, deve este pagar o valor que a coisa tiver no momento e lugar do vencimento da obrigação.
O mutuante pode resolver o contrato, se o mutuário não pagar os juros no seu vencimento.
É aplicável à responsabilidade do mutuante, no mútuo gratuito, o disposto no artigo 1062.º
1. Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta.
2. O contrato de trabalho está sujeito a legislação especial.
Contrato de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.
O mandato, o depósito e a empreitada, regulados nos capítulos subsequentes, são modalidades do contrato de prestação de serviço.
As disposições sobre o mandato são extensivas, com as necessárias adaptações, às modalidades do contrato de prestação de serviço que a lei não regule especialmente.
Mandato é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra.
1. O mandato presume-se gratuito, excepto se tiver por objecto actos que o mandatário pratique por profissão; neste caso, presume-se oneroso.
2. Se o mandato for oneroso, a medida da retribuição, não havendo ajuste entre as partes, é determinada pelas tarifas profissionais do lugar onde o mandato seja executado; na falta destas, pelos usos desse lugar; e, na falta de umas e outros, por juízos de equidade.
1. O mandato geral só compreende os actos de administração ordinária.
2. O mandato especial abrange, além dos actos nele referidos, todos os demais necessários à sua execução.
Se alguém incumbir duas ou mais pessoas da prática dos mesmos actos jurídicos, haverá tantos mandatos quantas as pessoas designadas, salvo se o mandante declarar que devem agir conjuntamente.
O mandatário é obrigado:
a) A praticar os actos compreendidos no mandato, segundo as instruções do mandante;
b) A prestar as informações que este lhe peça, relativas ao estado da gestão;
c) A comunicar ao mandante, com prontidão, a execução do mandato ou, se o não tiver executado, a razão por que assim procedeu;
d) A prestar contas, findo o mandato ou quando o mandante as exigir;
e) A entregar ao mandante o que recebeu em execução do mandato ou no exercício deste, se o não despendeu normalmente no cumprimento do contrato.
O mandatário pode deixar de executar o mandato ou afastar-se das instruções recebidas, quando seja razoável supor que o mandante aprovaria a sua conduta, se conhecesse certas circunstâncias que não foi possível comunicar-lhe em tempo útil.
Comunicada a execução ou inexecução do mandato, o silêncio do mandante por tempo superior àquele em que teria de pronunciar-se, segundo os usos ou, na falta destes, de acordo com a natureza do assunto, vale como aprovação da conduta do mandatário, ainda que este haja excedido os limites do mandato ou desrespeitado as instruções do mandante, salvo acordo em contrário.
O mandatário deve pagar ao mandante os juros legais correspondentes às quantias que recebeu dele ou por conta dele, a partir do momento em que devia entregar-lhas, ou remeter-lhas, ou aplicá-las segundo as suas instruções.
O mandatário pode, na execução do mandato, fazer-se substituir por outrem ou servir-se de auxiliares, nos mesmos termos em que o procurador o pode fazer.
Havendo dois ou mais mandatários com o dever de agirem conjuntamente, responde cada um deles pelos seus actos, se outro regime não tiver sido convencionado.
O mandante é obrigado:
a) A fornecer ao mandatário os meios necessários à execução do mandato, se outra coisa não foi convencionada;
b) A pagar-lhe a retribuição que ao caso competir, e fazer-lhe provisão por conta dela segundo os usos;
c) A reembolsar o mandatário das despesas feitas que este fundadamente tenha considerado indispensáveis, com juros legais desde que foram efectuadas;
d) A indemnizá-lo do prejuízo sofrido em consequência do mandato, ainda que o mandante tenha procedido sem culpa.
O mandatário pode abster-se da execução do mandato enquanto o mandante estiver em mora quanto à obrigação expressa na alínea a) do artigo anterior.
Sendo dois ou mais os mandantes, as suas obrigações para com o mandatário são solidárias, se o mandato tiver sido conferido para assunto de interesse comum.
1. O mandato é livremente revogável por qualquer das partes, não obstante convenção em contrário ou renúncia ao direito de revogação.
2. Se, porém, o mandato tiver sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro, não pode ser revogado pelo mandante sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa.
3. A apreciação da questão de saber se o mandato foi conferido no interesse do mandatário ou de terceiro é feita com base em critérios objectivos, mas a declaração desse facto no contrato de mandato cria uma presunção nesse sentido, embora ilidível mediante simples contraprova.
A designação de outra pessoa, por parte do mandante, para a prática dos mesmos actos implica revogação do mandato, mas só produz este efeito depois de ser conhecida pelo mandatário.
Salvo quando haja justa causa, a parte que revogar o contrato deve indemnizar a outra do prejuízo que esta sofrer:
a) Se assim tiver sido convencionado;
b) Se tiver sido estipulada a irrevogabilidade ou tiver havido renúncia ao direito de revogação;
c) Se a revogação proceder do mandante e versar sobre mandato oneroso, sempre que o mandato tenha sido conferido por certo tempo ou para determinado assunto, ou que o mandante o revogue sem a antecedência conveniente; ou
d) Se a revogação proceder do mandatário e não tiver sido realizada com a antecedência conveniente.
Sendo o mandato conferido por várias pessoas e para assunto de interesse comum, a revogação só produz efeito se for realizada por todos os mandantes.
O mandato caduca:
a) Por morte ou interdição do mandante ou do mandatário; ou
b) Por inabilitação do mandante, se o mandato tiver por objecto actos que não possam ser praticados sem intervenção do curador.
A morte, interdição ou inabilitação do mandante não faz caducar o mandato, quando este tenha sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro; nos outros casos, só o faz caducar a partir do momento em que seja conhecida do mandatário, ou quando da caducidade não possam resultar prejuízos para o mandante ou seus herdeiros.
1. Caducando o mandato por morte ou interdição do mandatário, os seus herdeiros devem prevenir o mandante e tomar as providências adequadas, até que ele próprio esteja em condições de providenciar.
2. Idêntica obrigação recai sobre as pessoas que convivam com o mandatário, no caso de incapacidade natural deste ou de sua impossibilidade duradoura.
Se houver vários mandatários com obrigação de agir conjuntamente, o mandato caduca em relação a todos, embora a causa de caducidade respeite apenas a um deles, salvo convenção em contrário.
1. Se o mandatário for representante, por ter recebido poderes para agir em nome do mandante, é também aplicável ao mandato o disposto nos artigos 251.º e seguintes.
2. O mandatário a quem hajam sido conferidos poderes de representação tem o dever de agir não só por conta, mas em nome do mandante, a não ser que outra coisa tenha sido estipulada.
A revogação e a renúncia da procuração implicam revogação do mandato.
O mandatário, se agir em nome próprio, adquire os direitos e assume as obrigações decorrentes dos actos que celebra, embora o mandato seja conhecido dos terceiros que participem nos actos ou sejam destinatários destes.
1. O mandatário é obrigado a transferir para o mandante os direitos adquiridos em execução do mandato.
2. Relativamente aos créditos, o mandante pode substituir-se ao mandatário no exercício dos respectivos direitos.
O mandante deve assumir, por qualquer das formas indicadas no n.º 1 do artigo 590.º, as obrigações contraídas pelo mandatário em execução do mandato; se não puder fazê-lo, deve entregar ao mandatário os meios necessários para as cumprir ou reembolsá-lo do que este houver despendido nesse cumprimento.
Salvo estipulação em contrário, o mandatário não é responsável pela falta de cumprimento das obrigações assumidas pelas pessoas com quem haja contratado, a não ser que no momento da celebração do contrato conhecesse ou devesse conhecer a insolvência delas.
Os bens que o mandatário haja adquirido em execução do mandato e devam ser transferidos para o mandante nos termos do n.º 1 do artigo 1107.º não respondem pelas obrigações daquele, desde que o mandato conste de documento anterior à data da penhora desses bens e não tenha sido feito o registo da aquisição, quando esta esteja sujeita a registo.
Depósito é o contrato pelo qual uma das partes entrega à outra uma coisa, móvel ou imóvel, para que a guarde, e a restitua quando for exigida.
É aplicável ao depósito o disposto no artigo 1084.º
O depositário é obrigado:
a) A guardar a coisa depositada;
b) A avisar imediatamente o depositante, quando saiba que algum perigo ameaça a coisa ou que terceiro se arroga direitos em relação a ela, desde que o facto seja desconhecido do depositante;
c) A restituir a coisa com os seus frutos.
1. Se o depositário for privado da detenção da coisa por causa que lhe não seja imputável, fica exonerado das obrigações de guarda e restituição, mas deve dar conhecimento imediato da privação ao depositante.
2. Independentemente da obrigação imposta no número anterior, o depositário que for privado da detenção da coisa ou perturbado no exercício dos seus direitos pode usar, mesmo contra o depositante, dos meios de defesa facultados ao possuidor nos artigos 1201.º e seguintes.
O depositário não tem o direito de usar a coisa depositada nem de a dar em depósito a outrem, se o depositante o não tiver autorizado.
O depositário pode guardar a coisa de modo diverso do convencionado, quando haja razões para supor que o depositante aprovaria a alteração, se conhecesse as circunstâncias que a fundamentam; mas deve participar-lhe a mudança logo que a comunicação seja possível.
1. Se o depósito recair sobre coisa encerrada nalgum invólucro ou recipiente, deve o depositário guardá-la e restituí-la no mesmo estado, sem a devassar.
2. No caso de o invólucro ou recipiente ser violado, presume-se que na violação houve culpa do depositário; e, se este não ilidir a presunção, presume-se verdadeira a descrição feita pelo depositante.
1. O depositário não pode recusar a restituição ao depositante com o fundamento de que este não é proprietário da coisa nem tem sobre ela outro direito.
2. Se, porém, for proposta por terceiro acção de reivindicação contra o depositário, este, enquanto não for julgada definitivamente a acção, só pode liberar-se da obrigação de restituir consignando em depósito a coisa.
3. Se chegar ao conhecimento do depositário que a coisa provém de crime, deve participar imediatamente o depósito à pessoa a quem foi subtraída ou, não sabendo quem é, ao Ministério Público; e só pode restituir a coisa ao depositante se dentro de 15 dias, contados da participação, ela não lhe for reclamada por quem de direito.
Se a coisa foi depositada também no interesse de terceiro e este comunicou ao depositário a sua adesão, o depositário não pode exonerar-se restituindo a coisa ao depositante sem consentimento do terceiro.
O prazo de restituição da coisa tem-se por estabelecido a favor do depositante; mas, sendo o depósito oneroso, o depositante deve satisfazer por inteiro a retribuição do depositário, mesmo quando exija a restituição da coisa antes de findar o prazo estipulado, salvo se para isso tiver justa causa.
No silêncio das partes, o depositário deve restituir a coisa móvel no lugar onde, segundo o contrato, tiver de a guardar.
As despesas da restituição ficam a cargo do depositante.
Se o depositário, devidamente autorizado, confiar por sua vez a coisa em depósito a terceiro, é responsável por culpa sua na escolha dessa pessoa.
O depositário pode socorrer-se de auxiliares no cumprimento das suas obrigações, sempre que o contrário não resulte do conteúdo ou finalidade do depósito.
O depositante é obrigado:
a) A pagar ao depositário a retribuição devida;
b) A reembolsá-lo das despesas que ele fundadamente tenha considerado indispensáveis para a conservação da coisa, com juros legais desde que foram efectuadas;
c) A indemnizá-lo do prejuízo sofrido em consequência do depósito, salvo se o depositante houver procedido sem culpa.
1. A remuneração do depositário, quando outra coisa se não tenha convencionado, deve ser paga no termo do depósito; mas, se for fixada por períodos de tempo, deve pagar-se no fim de cada um deles.
2. Findando o depósito antes do prazo convencionado, pode o depositário exigir uma parte proporcional ao tempo decorrido, sem prejuízo do preceituado no artigo 1120.º
Não tendo sido convencionado prazo para a restituição da coisa, o depositário tem o direito de a restituir a todo o tempo; se, porém, tiver sido convencionado prazo, só havendo justa causa o pode fazer antes de o prazo findar.
Se duas ou mais pessoas disputam a propriedade de uma coisa ou outro direito sobre ela, podem por meio de depósito entregá-la a terceiro, para que este a guarde e, resolvida a controvérsia, a restitua à pessoa a quem se apurar que pertence.
O depósito de coisa controvertida presume-se oneroso.
Salvo convenção em contrário, cabe ao depositário a obrigação de administrar a coisa.
Diz-se irregular o depósito que tem por objecto coisas fungíveis.
Consideram-se aplicáveis ao depósito irregular, na medida do possível, as normas relativas ao contrato de mútuo.
Empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço.
O empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato.
1. O dono da obra pode fiscalizar, à sua custa, a execução dela, desde que não perturbe o andamento ordinário da empreitada.
2. A fiscalização feita pelo dono da obra, ou por comissário, não impede aquele, findo o contrato, de fazer valer os seus direitos contra o empreiteiro, embora sejam aparentes os vícios da coisa ou notória a má execução do contrato, excepto se tiver havido da sua parte concordância expressa com a obra executada.
1. Os materiais e utensílios necessários à execução da obra devem ser fornecidos pelo empreiteiro, salvo convenção ou uso em contrário.
2. No silêncio do contrato, os materiais devem corresponder às características da obra e não podem ser de qualidade inferior à média.
1. É aplicável à determinação do preço, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 873.º
2. O preço deve ser pago, não havendo cláusula ou uso em contrário, no acto de aceitação da obra.
1. No caso de empreitada de construção de coisa móvel com materiais fornecidos, no todo ou na sua maior parte, pelo empreiteiro, a aceitação da coisa importa a transferência da propriedade dos materiais e da coisa para o dono da obra; nesse caso, e até que se dê a aceitação da coisa, a propriedade dos materiais fornecidos pelo dono da obra transfere-se para o empreiteiro à medida que venham a ser incorporados na obra.
2. No caso de empreitada de construção de coisa móvel com materiais fornecidos, no todo ou na sua maior parte, pelo dono da obra, a propriedade dos materiais fornecidos pelo empreiteiro transfere-se para o dono da obra à medida que venham a ser incorporados na obra; os materiais fornecidos pelo dono da obra continuam a ser sua propriedade, assim como é propriedade sua a coisa logo que seja concluída.
3. No caso de empreitada de construção de imóveis, sendo o solo ou a superfície pertença do dono da obra, a coisa é propriedade deste desde logo, ainda que seja o empreiteiro quem fornece os materiais; a propriedade destes transfere-se para o dono da obra à medida que vão sendo incorporados no solo.
1. Subempreitada é o contrato pelo qual um terceiro se obriga para com o empreiteiro a realizar a obra a que este se encontra vinculado, ou uma parte dela.
2. É aplicável à subempreitada, assim como ao concurso de auxiliares na execução da empreitada, o disposto no artigo 257.º, com as necessárias adaptações.
1. O empreiteiro não pode, sem autorização do dono da obra, fazer alterações ao plano convencionado.
2. A obra alterada sem autorização é havida como defeituosa; mas, se o dono quiser aceitá-la tal como foi executada, não fica obrigado a qualquer suplemento de preço nem a indemnização por enriquecimento sem causa.
3. Se tiver sido fixado para a obra um preço global e a autorização não tiver sido dada por escrito com fixação do aumento de preço, o empreiteiro só pode exigir do dono da obra uma indemnização correspondente ao enriquecimento deste.
1. Se, para execução da obra, for necessário, em consequência de direitos de terceiro ou de regras técnicas, introduzir alterações ao plano convencionado, e as partes não vierem a acordo, compete ao tribunal determinar essas alterações e fixar as correspondentes modificações quanto ao preço e prazo de execução.
2. Se, em consequência das alterações, o preço for elevado em mais de vinte por cento, o empreiteiro pode denunciar o contrato e exigir uma indemnização equitativa.
1. O dono da obra pode exigir que sejam feitas alterações ao plano convencionado, desde que o seu valor não exceda a quinta parte do preço estipulado e não haja modificação da natureza da obra.
2. O empreiteiro tem direito a um aumento do preço estipulado, correspondente ao acréscimo de despesa e trabalho, e a um prolongamento do prazo para a execução da obra.
3. Se das alterações introduzidas resultar uma diminuição de custo ou de trabalho, o empreiteiro tem direito ao preço estipulado, com dedução do que, em consequência das alterações, poupar em despesas ou adquirir por outras aplicações da sua actividade.
1. Não é aplicável o disposto nos artigos precedentes às alterações feitas depois da entrega da obra, nem às obras que tenham autonomia em relação às previstas no contrato.
2. O dono da obra tem o direito de recusar as alterações e as obras referidas no número anterior, se as não tiver autorizado; pode, além disso, exigir a sua eliminação, se esta for possível, e, em qualquer caso, uma indemnização pelo prejuízo, nos termos gerais.
1. O dono da obra deve verificar, antes de a aceitar, se ela se encontra nas condições convencionadas e sem vícios.
2. A verificação deve ser feita dentro do prazo usual ou, na falta de uso, dentro do período que se julgue razoável depois de o empreiteiro colocar o dono da obra em condições de a poder fazer.
3. Qualquer das partes tem o direito de exigir que a verificação seja feita, à sua custa, por peritos.
4. Os resultados da verificação devem ser comunicados ao empreiteiro.
5. A falta da verificação ou da comunicação importa aceitação da obra.
1. O empreiteiro não responde pelos defeitos da obra, se o dono a aceitou sem reserva, com conhecimento deles.
2. Presumem-se conhecidos os defeitos aparentes, tenha ou não havido verificação da obra.
1. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, o dono da obra, ou o terceiro adquirente da mesma, deve, sob pena de caducidade dos direitos conferidos nos artigos seguintes, denunciar ao empreiteiro os defeitos da obra dentro dos 30 dias seguintes ao seu descobrimento.
2. Equivale à denúncia o reconhecimento, por parte do empreiteiro, da existência do defeito.
1. Se os defeitos puderem ser suprimidos, o dono da obra, ou o terceiro adquirente da mesma, tem o direito de exigir do empreiteiro a sua eliminação; se não puderem ser eliminados, o dono pode exigir nova construção.
2. Cessam os direitos conferidos no número anterior, se as despesas forem desproporcionadas em relação ao proveito.
1. Não sendo eliminados os defeitos nem sendo construída de novo a obra, o dono da obra pode exigir a redução do preço ou a resolução do contrato, se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina.
2. A redução do preço é feita nos termos do artigo 874.º
O exercício dos direitos conferidos nos artigos antecedentes não exclui o direito à indemnização nos termos gerais.
1. Os direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização caducam, se não forem exercidos dentro de 1 ano a contar da recusa da aceitação da obra ou da aceitação com reserva, sem prejuízo da caducidade prevista no artigo 1146.º
2. Se os defeitos eram desconhecidos do dono da obra e este a aceitou, o prazo de caducidade conta-se a partir da denúncia; em nenhum caso, porém, aqueles direitos podem ser exercidos depois de decorrerem 2 anos sobre a entrega da obra.
1. Sem prejuízo do disposto no artigo 1145.º, se a empreitada tiver por objecto a construção, modificação ou reparação de edifícios ou outros imóveis destinados por sua natureza a longa duração e, no decurso de 5 anos a contar da entrega, ou no decurso do prazo de garantia convencionado, a obra, por vício do solo ou da construção, modificação ou reparação, ruir, total ou parcialmente, ou apresentar defeitos, aplica-se o disposto nos artigos 1147.º a 1149.º
2. A denúncia, neste caso, deve ser feita dentro do prazo de 1 ano a contar do seu descobrimento e os direitos conferidos nos artigos 1147.º a 1149.º devem ser exercidos no ano seguinte à denúncia.
3. O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável ao vendedor de imóvel que o tenha construído, modificado ou reparado.
1. O direito de regresso do empreiteiro contra os subempreiteiros quanto aos direitos conferidos nos artigos anteriores caduca, se ele não lhes comunicar a denúncia até 30 dias depois de a ter recebido.
2. O prazo referido no número anterior é elevado para 60 dias no caso regulado no artigo anterior.
Se a execução da obra se tornar impossível por causa não imputável a qualquer das partes, é aplicável o disposto no artigo 779.º; tendo, porém, havido começo de execução, o dono da obra é obrigado a indemnizar o empreiteiro do trabalho executado e das despesas realizadas.
1. Se, por causa não imputável a qualquer das partes, a coisa perecer ou se deteriorar, o risco corre por conta do proprietário.
2. Se, porém, o dono da obra estiver em mora quanto à verificação ou aceitação da coisa, o risco corre por conta dele.
O dono da obra pode desistir da empreitada a todo o tempo, ainda que tenha sido iniciada a sua execução, contanto que indemnize o empreiteiro dos seus gastos e trabalho e do proveito que poderia tirar da obra.
1. O contrato de empreitada não se extingue por morte do dono da obra, nem por morte ou incapacidade do empreiteiro, a não ser que, neste último caso, tenham sido tomadas em conta, no acto da celebração, as qualidades pessoais deste.
2. Extinto o contrato por morte ou incapacidade do empreiteiro, considera-se a execução da obra como impossível por causa não imputável a qualquer das partes.
Contrato de renda perpétua é aquele em que uma pessoa aliena em favor de outra certa soma de dinheiro, ou qualquer outra coisa móvel ou imóvel, ou um direito, e a segunda se obriga, sem limite de tempo, a pagar, como renda, determinada quantia em dinheiro ou outra coisa fungível.
A renda perpétua só é válida se for constituída por escritura pública.
O devedor da renda é obrigado a caucionar o cumprimento da obrigação.
Não há na renda perpétua direito de acrescer entre os beneficiários.
Ao beneficiário da renda é permitido resolver o contrato, quando o devedor se constitua em mora quanto às prestações correspondentes a 2 anos ou se verifique algum dos casos previstos no artigo 769.º
1. O devedor pode a todo o tempo remir a renda, mediante o pagamento da importância em dinheiro que represente o valor correspondente à soma das rendas de 20 ou 10 anos, consoante a remição tenha lugar nos primeiros 20 anos subsequentes à celebração do contrato ou depois desse período.
2. O direito de remição é irrenunciável, mas é lícito estipular-se que não possa ser exercido em vida do primeiro beneficiário ou dentro de certo prazo não superior a 20 anos.
A renda perpétua fica sujeita às disposições legais sobre juros, no que for compatível com a sua natureza e com o preceituado nos artigos antecedentes.
Contrato de renda vitalícia é aquele em que uma pessoa aliena em favor de outra certa soma de dinheiro, ou qualquer outra coisa móvel ou imóvel, ou um direito, e a segunda se obriga a pagar certa quantia em dinheiro ou outra coisa fungível durante a vida do alienante ou de terceiro.
Sem prejuízo da aplicação das regras especiais de forma quanto à alienação da coisa ou do direito, a renda vitalícia deve ser constituída por documento escrito com reconhecimento presencial de assinaturas, sendo necessária escritura pública se a coisa ou o direito alienado for de valor superior a 500 000 patacas.
A renda pode ser convencionada por uma ou duas vidas.
No silêncio do contrato, sendo dois ou mais os beneficiários da renda, e falecendo algum deles, a sua parte acresce à dos outros.
Ao beneficiário da renda vitalícia é lícito resolver o contrato nos mesmos termos em que é permitida a resolução da renda perpétua ao respectivo beneficiário.
O devedor só pode remir a renda, com reembolso do que tiver recebido e perda das prestações já efectuadas, se assim se tiver convencionado.
Se as prestações se vencem antecipadamente, a última é devida por inteiro, ainda que o beneficiário faleça antes de completado o período respectivo.
1. O jogo e a aposta constituem fonte de obrigações civis sempre que lei especial o preceitue, bem como nas competições desportivas, em relação às pessoas que nelas tomem parte; de contrário, o jogo e aposta, quando lícitos, são mera fonte de obrigações naturais.
2. Se houver fraude na sua execução, o contrato não produz qualquer efeito em benefício de quem a praticou.
3. Fica ressalvada a legislação especial sobre a matéria de que trata este capítulo.
1. Transacção é o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões.
2. As concessões podem envolver a constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do direito controvertido.
As partes não podem transigir sobre direitos de que lhes não é permitido dispor, nem sobre questões respeitantes a negócios jurídicos ilícitos.
A transacção preventiva ou extrajudicial deve constar de escritura pública quando dela possa derivar algum efeito para o qual a escritura seja exigida, e deve constar de documento escrito nos casos restantes.
Posse é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real.
1. A posse tanto pode ser exercida pessoalmente como por intermédio de outrem.
2. Em caso de dúvida, presume-se a posse naquele que exerce o poder de facto, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 1181.º
São havidos como detentores:
a) Os que exercem o poder de facto sem intenção de agir como beneficiários do direito;
b) Os que simplesmente se aproveitam da tolerância do titular do direito;
c) Os representantes ou mandatários do possuidor e, de um modo geral, todos os que possuem em nome de outrem.
1. Se o possuidor actual possuiu em tempo mais remoto, presume-se que possuiu igualmente no tempo intermédio.
2. A posse actual não faz presumir a posse anterior, salvo quando seja titulada; neste caso, presume-se que há posse desde a data do título.
Por morte do possuidor, a posse continua nos seus sucessores desde o momento da morte, independentemente da apreensão material da coisa.
1. Aquele que houver sucedido na posse de outrem por título diverso da sucessão por morte pode juntar à sua a posse do antecessor.
2. Quando a posse do antecessor tiver características diferentes ou for exercida a título de um direito real distinto, a acessão só se dará dentro dos limites daquela que tem menor âmbito.
1. A posse mantém-se enquanto durar a actuação correspondente ao exercício do direito ou a possibilidade de a continuar.
2. Presume-se que a posse continua em nome de quem a começou.
A posse pode ser titulada ou não titulada, de boa ou má fé, pacífica ou violenta, pública ou oculta.
1. Diz-se titulada a posse fundada em qualquer modo abstractamente idóneo para adquirir o direito nos termos do qual se possui, independentemente, quer do direito do transmitente, quer da validade do negócio jurídico.
2. O título não se presume, devendo a sua existência ser provada por aquele que o invoca; contudo, é insuficiente o recurso à mera prova testemunhal para prova do título, caso este padeça de vício de forma.
1. A posse diz-se de boa fé quando o possuidor ignorava, ao adquiri-la, que lesava o direito de outrem.
2. A posse titulada presume-se de boa fé, e a não titulada, de má fé.
3. A posse adquirida por violência é sempre considerada de má fé, mesmo quando seja titulada.
1. Posse pacífica é a que foi adquirida sem violência.
2. Considera-se violenta a posse quando, para obtê-la, o possuidor usou de coacção física, ou de coacção moral nos termos do artigo 248.º
Posse pública é a que foi adquirida ou se exerce de modo a poder ser conhecida pelos interessados.
A posse adquire-se:
a) Pela prática reiterada, com publicidade, dos actos materiais correspondentes ao exercício do direito;
b) Pela tradição material ou simbólica da coisa, efectuada pelo anterior possuidor;
c) Por constituto possessório;
d) Por traditio brevi manu; ou
e) Por inversão do título da posse.
1. Se o possuidor transmitir a outrem o direito nos termos do qual possui, não deixa de considerar-se transferida a posse para o adquirente, ainda que, por qualquer causa, aquele continue a deter a coisa.
2. Se o detentor da coisa, à data do negócio translativo do direito, for um terceiro, não deixa de considerar-se igualmente transferida a posse, ainda que essa detenção haja de continuar.
Se o possuidor transmitir o direito nos termos do qual possui a quem se encontre na detenção do objecto, a posse considera-se automaticamente transferida para o adquirente.
A inversão do título da posse pode dar-se por oposição do detentor do direito contra aquele em cujo nome possuía ou por acto de terceiro abstractamente idóneo para atribuir ao detentor o direito real nos termos do qual, e em virtude do qual, passe a possuir.
Podem adquirir posse todos os que têm uso da razão, e ainda os que o não têm, relativamente às coisas susceptíveis de ocupação.
1. O possuidor perde a posse:
a) Pelo abandono;
b) Pela perda ou destruição material da coisa ou por esta ser posta fora do comércio;
c) Pela cedência; ou
d) Pela posse de outrem, mesmo contra a vontade do antigo possuidor, se a nova posse houver durado por mais de 1 ano.
2. A nova posse de outrem conta-se desde o seu início, se foi tomada publicamente, ou desde que é conhecida do esbulhado, se foi tomada ocultamente; sendo adquirida por violência, só se conta a partir da cessação desta.
1. O possuidor goza da presunção da titularidade do direito, excepto se existir, a favor de outrem, presunção fundada em registo anterior ao início da posse.
2. Havendo concorrência de presunções legais fundadas em registo, a prioridade entre elas é fixada na legislação respectiva.
1. O possuidor que exerça a posse de boa fé só responde pela perda ou deterioração da coisa se tiver procedido com culpa.
2. O possuidor que exerça a posse de má fé responde independentemente de culpa, excepto quando prove que a perda ou deterioração da coisa se teriam dado de igual modo, ainda que o bem tivesse estado na posse do seu legítimo titular.
1. O possuidor de boa fé faz seus os frutos naturais percebidos até ao dia em que souber que está a lesar com a sua posse o direito de outrem, e os frutos civis correspondentes ao mesmo período.
2. Se ao tempo em que cessa a boa fé estiverem pendentes frutos naturais, é o titular obrigado a indemnizar o possuidor das despesas de cultura, sementes ou matérias-primas e, em geral, de todas as despesas de produção, desde que não sejam superiores ao valor dos frutos que vierem a ser colhidos.
3. Se o possuidor tiver alienado frutos antes da colheita e antes de cessar a boa fé, a alienação subsiste, mas o produto da alienação pertence ao titular do direito, deduzida a indemnização a que o número anterior se refere.
O possuidor de má fé deve restituir os frutos que a coisa produziu até ao termo da posse, deduzida a indemnização a que se refere o n.º 2 do artigo anterior, e responde, além disso, pelo valor daqueles que um proprietário diligente poderia ter obtido.
Os encargos com a coisa são pagos pelo titular do direito e pelo possuidor, na medida dos direitos de cada um deles sobre os frutos no período a que respeitam os encargos.
1. Tanto o possuidor de boa fé como o de má fé têm direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias que hajam feito, e bem assim a levantar as benfeitorias úteis realizadas na coisa, desde que o possam fazer sem detrimento dela.
2. Quando, para evitar o detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa.
A obrigação de indemnização por benfeitorias é susceptível de compensação com a responsabilidade do possuidor por deteriorações.
1. O possuidor de boa fé tem direito a levantar as benfeitorias voluptuárias, não se dando detrimento da coisa; no caso contrário, não pode levantá-las nem haver o valor delas.
2. O possuidor de má fé perde, em qualquer caso, as benfeitorias voluptuárias que haja feito.
Se o possuidor tiver justo receio de ser perturbado ou esbulhado por outrem, é o autor da ameaça, a requerimento do ameaçado, intimado para se abster de lhe fazer agravo, sob pena de responsabilidade pelo prejuízo que causar e eventual cominação de outras sanções aplicáveis.
O possuidor que for perturbado ou esbulhado pode manter-se ou restituir-se por sua própria força e autoridade, nos termos dos artigos 328.º e 329.º, ou recorrer ao tribunal para que este lhe mantenha ou restitua a posse.
1. No caso de recorrer ao tribunal, o possuidor perturbado ou esbulhado é mantido ou restituído enquanto não for convencido na questão da titularidade do direito.
2. Se a posse não tiver mais de 1 ano, o possuidor só pode ser mantido ou restituído contra quem não tiver melhor posse.
3. É melhor posse a que for titulada; na falta de título, a mais antiga; e, se tiverem igual antiguidade, a posse actual.
Sem prejuízo do disposto nos artigos anteriores, o possuidor que for esbulhado com violência tem o direito de ser restituído provisoriamente à sua posse, sem audiência do esbulhador, por meio de providência cautelar.
1. As acções mencionadas nos artigos antecedentes não são aplicáveis à defesa das servidões não aparentes, salvo quando a posse seja titulada, fundando-se em título provindo do proprietário do prédio serviente ou de quem lho transmitiu.
2. Para efeitos do número anterior, é equiparado ao proprietário o titular de outro direito real passível de ser onerado com a servidão.
1. A acção de manutenção da posse pode ser intentada pelo perturbado ou pelos seus herdeiros, mas apenas contra o perturbador, salva a acção de indemnização contra os herdeiros deste.
2. A acção de restituição de posse pode ser intentada pelo esbulhado ou pelos seus herdeiros, não só contra o esbulhador ou seus herdeiros, mas ainda contra quem esteja na posse da coisa, contanto que à data em que a adquiriu tivesse conhecimento do esbulho.
1. A acção de manutenção, bem como as de restituição da posse, caducam, se não forem intentadas dentro do ano subsequente ao facto da turbação ou do esbulho.
2. Tendo o esbulho sido praticado com violência ou às ocultas, o prazo de 1 ano só se conta a partir da data em que, em face do esbulhado, cesse a violência ou a posse se torne pública.
É havido como nunca perturbado ou esbulhado o que foi mantido na sua posse ou a ela foi restituído judicialmente, ou que conseguiu o mesmo efeito por meio de autotutela exercida nos limites da lei.
1. O possuidor mantido ou restituído tem direito a ser indemnizado do prejuízo que haja sofrido em consequência da turbação ou do esbulho.
2. A restituição da posse é feita à custa do esbulhador e no lugar do esbulho.
O possuidor cuja posse for ofendida por diligência ordenada judicialmente pode defender a sua posse mediante embargos de terceiro, nos termos definidos na lei de processo.
1. Cada um dos compossuidores, seja qual for a parte que lhe cabe, pode usar contra terceiro dos meios facultados nos artigos precedentes, quer para defesa da própria posse, quer para defesa da posse comum, sem que ao terceiro seja lícito opor-lhe que ela não lhe pertence por inteiro.
2. Em tudo o mais são aplicáveis à composse as disposições do presente capítulo.
A posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação: é o que se chama usucapião.
Invocada a usucapião, os seus efeitos retrotraem-se à data do início da posse.
1. A usucapião aproveita a todos os que podem adquirir.
2. Os incapazes podem adquirir por usucapião, tanto por si como por intermédio das pessoas que legalmente os representam.
Os detentores não podem adquirir para si, por usucapião, o direito nos termos do qual possuem, excepto achando-se invertido o título da posse; mas, neste caso, o tempo necessário para a usucapião só começa a correr desde a inversão do título.
A usucapião por um compossuidor relativamente ao objecto da posse comum aproveita igualmente aos demais compossuidores.
São aplicáveis à usucapião, com as necessárias adaptações, as disposição relativas à suspensão e interrupção da prescrição, bem como o preceituado nos artigos 293.º, 295.º, 296.º e 298.º
1. Não podem adquirir-se por usucapião:
a) As servidões prediais não aparentes, salvo quando a posse seja titulada, fundando-se em título provindo do proprietário do prédio serviente;
b) Os direitos de uso e habitação, salvo quando a posse seja titulada, fundando-se em título provindo do proprietário do prédio onerado com esse direito ou de quem lho transmitiu.
2. Para efeitos do número anterior, é equiparado ao proprietário o titular de outro direito real passível de ser onerado com os direitos aí mencionados.
Sendo a posse titulada e havendo registo do título de aquisição, a usucapião tem lugar:
a) Quando a posse, sendo de boa fé, tiver durado por 10 anos, contados desde a data do registo; ou
b) Quando a posse, ainda que de má fé, houver durado 15 anos, contados da mesma data.
1. Não sendo a posse titulada ou não havendo registo do título de aquisição, mas havendo registo da mera posse, a usucapião tem lugar:
a) Quando a posse tiver continuado por 5 anos, contados desde a data do registo, e for de boa fé; ou
b) Quando a posse tiver continuado por 10 anos, a contar da mesma data, ainda que não seja de boa fé.
2. A mera posse só é registada em vista de sentença passada em julgado, na qual se reconheça que o possuidor tem possuído pacífica e publicamente por tempo não inferior a 5 anos.
Não havendo registo do título nem da mera posse, a usucapião só pode dar-se no termo de 15 anos, se a posse for de boa fé, e de 20 anos, se for de má fé, independentemente do carácter titulado ou não da posse.
Se a posse tiver sido constituída com violência ou tomada ocultamente, aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 1225.º
Os direitos reais sobre coisas móveis sujeitas a registo adquirem-se por usucapião nos termos seguintes:
a) Sendo a posse titulada e havendo registo do título de aquisição, quando a posse tiver durado 2 anos, estando o possuidor de boa fé, ou 4 anos, se estiver de má fé;
b) Não havendo registo, quando a posse tiver durado 10 anos, independentemente da boa fé do possuidor e do carácter titulado da posse.
A usucapião de coisas não sujeitas a registo dá-se quando a posse, sendo titulada e de boa fé, tiver durado 3 anos, ou quando, independentemente de título e de boa fé, tiver durado 6 anos.
1. Se a posse tiver sido constituída com violência ou tomada ocultamente, os prazos da usucapião só começam a contar-se desde que cesse a violência ou a posse se torne pública.
2. Se, porém, a coisa possuída passar a terceiro de boa fé antes de cessar a violência ou de a posse se tornar pública em face do esbulhado, os prazos de usucapião contam-se a favor do terceiro desde a aquisição da posse por parte deste, se adquirida pacífica e publicamente, mas não se completam sem que antes hajam decorrido os prazos que seriam aplicáveis se a posse não se encontrasse sob violência ou sob ocultação perante o esbulhado, acrescidos de um quinto; porém, o acréscimo de tempo nunca pode ser inferior a 1 ano.
Só as coisas podem ser objecto do direito de propriedade regulado neste Código.
1. A empresa comercial, os direitos de autor e a propriedade industrial estão sujeitos a legislação especial.
2. São, todavia, subsidiariamente aplicáveis à empresa comercial, aos direitos de autor e à propriedade industrial as disposições deste Código, quando se harmonizem com a sua natureza e não contrariem o regime para eles especialmente estabelecido.
O domínio das coisas pertencentes ao território de Macau ou a quaisquer outras pessoas colectivas públicas está igualmente sujeito às disposições deste Código em tudo o que não for especialmente regulado e não contrarie a natureza própria daquele domínio.
O proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas.
Não é permitida a constituição, com carácter real, de restrições ao direito de propriedade ou de figuras parcelares deste direito senão nos casos previstos na lei; toda a restrição resultante de negócio jurídico, que não esteja nestas condições, tem natureza obrigacional.
1. O direito de propriedade pode constituir-se sob condição.
2. A propriedade temporária só é admitida nos casos especialmente previstos na lei.
3. À propriedade sob condição é aplicável o disposto nos artigos 265.º a 270.º
Ninguém pode ser privado, no todo ou em parte, do seu direito de propriedade senão nos casos fixados na lei.
Só nos casos previstos na lei pode ter lugar a requisição temporária de coisas do domínio privado.
Havendo expropriação por utilidade pública ou particular ou requisição de bens, é sempre devida a indemnização adequada ao proprietário e aos titulares dos outros direitos reais afectados.
1. O proprietário pode exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituição do que lhe pertence.
2. Havendo reconhecimento do direito de propriedade, a restituição só pode ser recusada nos casos previstos na lei.
A restituição da coisa é feita à custa do esbulhador, se o houver, e no lugar do esbulho.
Sem prejuízo dos direitos adquiridos por usucapião, a acção de reivindicação não prescreve pelo decurso do tempo.
1. O proprietário pode propor uma acção com o fim de se declarar a inexistência de um direito que um terceiro se arrogue sobre a coisa, quando a conduta deste seja apta a causar-lhe prejuízo.
2. Se o terceiro estiver a molestar ou perturbar o proprietário, este pode requerer que se ordene a cessação dessa conduta, sem prejuízo da indemnização e demais sanções eventualmente aplicáveis ao caso.
3. A acção negatória não prescreve pelo decurso do tempo.
É admitida a defesa da propriedade por meio de acção directa ou de legítima defesa, nos termos dos artigos 328.º e 329.º
As disposições desta secção são aplicáveis, com as necessárias correcções, à defesa de todo o direito real.
O direito de propriedade adquire-se por contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão e demais modos previstos na lei.
O momento da aquisição do direito de propriedade é:
a) No caso de contrato, o designado nos artigos 402.º e 403.º;
b) No caso de sucessão por morte, o da abertura da sucessão;
c) No caso de usucapião, o do início da posse;
d) Nos casos de ocupação e acessão, o da verificação dos factos respectivos.
Podem ser adquiridos por ocupação os animais e outras coisas móveis que nunca tiveram dono, ou foram abandonados, perdidos ou escondidos pelos seus proprietários, salvas as restrições dos artigos seguintes.
A ocupação dos animais bravios que se encontram no seu estado de liberdade natural é regulada por legislação especial relativa à caça e à pesca.
1. Os animais bravios habituados a certa guarida, ordenada por indústria do homem, que mudem para outra guarida de diverso dono ficam pertencendo a este, se não puderem ser individualmente reconhecidos; no caso contrário, pode o antigo dono recuperá-los, contanto que o faça sem prejuízo do outro.
2. Provando-se, porém, que os animais foram atraídos por fraude ou artifício do dono da guarida onde se hajam acolhido, é este obrigado a entregá-los ao antigo dono, ou a pagar-lhe em triplo o valor deles, se lhe não for possível restituí-los.
Os animais ferozes e maléficos que se evadirem da clausura em que seu dono os tiver podem ser destruídos ou ocupados livremente por qualquer pessoa que os encontre.
1. Aquele que encontrar animal ou outra coisa móvel perdida e souber a quem pertence deve restituir o animal ou a coisa a seu dono, ou avisar este do achado; se não souber a quem pertence, deve anunciar o achado pelo modo mais conveniente, atendendo ao valor da coisa, ou avisar as autoridades policiais, observando os usos, sempre que os haja.
2. O achador deverá sempre avisar as autoridades policiais, desde que a coisa tenha manifestamente um valor superior a 2 000 patacas.
3. Anunciado o achado ou feito o aviso, o achador faz sua a coisa perdida, se não for reclamada pelo dono dentro do prazo de 1 ano, a contar do anúncio ou aviso.
4. Restituída a coisa, o achador tem direito à indemnização do prejuízo havido e das despesas realizadas, bem como a um prémio dependente do valor do achado no momento da entrega, calculado pela forma seguinte: até ao valor de 2 000 patacas, dez por cento; sobre o excedente desse valor até 20 000 patacas, cinco por cento; sobre o restante, dois por cento.
5. O achador goza do direito de retenção sobre a coisa achada, pelos créditos referidos no número anterior, e não responde, no caso de perda ou deterioração da coisa, senão havendo da sua parte dolo ou culpa grave.
1. Se aquele que descobrir coisa móvel de algum valor, escondida ou enterrada, não puder determinar quem é o dono dela, torna-se proprietário de metade do achado; a outra metade pertence ao proprietário da coisa móvel ou imóvel onde o tesouro estava escondido ou enterrado.
2. O achador deve anunciar o achado ou avisar as autoridades, nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo anterior, excepto quando seja evidente que o tesouro foi escondido ou enterrado há mais de 20 anos.
3. Se o achador não cumprir o disposto no número anterior, ou fizer seu o achado ou parte dele sabendo quem é o dono, ou o ocultar do proprietário da coisa onde ele se encontrava, perde em benefício do território de Macau os direitos conferidos no n.º 1 deste artigo, sem exclusão dos que lhe possam caber como proprietário.
4. Se o usufrutuário descobrir na coisa usufruída algum tesouro, deve observar-se o disposto neste artigo acerca dos que acham tesouros em propriedade alheia.
Dá-se a acessão, quando com a coisa que é propriedade de alguém se une e incorpora outra coisa que lhe não pertencia.
1. A acessão diz-se natural, quando resulta exclusivamente das forças da natureza; dá-se a acessão industrial, quando, por facto do homem, se unem ou confundem objectos pertencentes a diversos donos, ou quando alguém aplica o trabalho próprio a matéria pertencente a outrem, confundindo o resultado desse trabalho com propriedade alheia.
2. A acessão industrial é mobiliária ou imobiliária, conforme a natureza das coisas.
1. Pertence ao dono da coisa tudo o que a esta acrescer por efeito da natureza.
2. Contudo, se, por acção violenta, a natureza levar qualquer objecto e o projectar sobre coisa alheia, aplica-se o disposto no artigo 1247.º, com excepção do n.º 4, na parte referente ao direito ao prémio.
1. Se alguém, de boa fé, unir ou confundir objecto seu com objecto alheio, de modo que a separação deles não seja possível ou, sendo-o, dela resulte prejuízo para alguma das partes, faz seu o objecto adjunto o dono daquele que for de maior valor, contanto que indemnize o dono do outro ou lhe entregue coisa equivalente.
2. Se ambas as coisas forem de igual valor e os donos não acordarem sobre qual haja de ficar com a coisa resultante da união ou confusão, abre-se entre eles licitação, adjudicando-se o objecto licitado àquele que maior valor oferecer por ele; verificada a soma que no valor oferecido deve pertencer ao outro, é o adjudicatário obrigado a pagar-lha.
3. Se os interessados não quiserem licitar, deve ser vendida a coisa e cada um deles haverá no produto da venda a parte que deva tocar-lhe.
4. Em qualquer dos casos previstos nos números anteriores, o autor da união ou confusão é obrigado a ficar com a coisa adjunta, ainda que seja de maior valor, se o dono dela preferir a respectiva indemnização.
1. Se a união ou confusão tiver sido feita de má fé e a coisa alheia puder ser separada sem padecer detrimento, deve esta ser restituída a seu dono, sem prejuízo do direito que este tem de ser indemnizado do dano sofrido.
2. Se, porém, a coisa não puder ser separada sem padecer detrimento, deve o autor da união ou confusão restituir o valor da coisa e indemnizar o seu dono, quando este não prefira ficar com ambas as coisas adjuntas e pagar ao autor da união ou confusão o valor que for calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa.
1. Se a união ou confusão se operar casualmente e as coisas unidas ou confundidas não puderem separar-se sem detrimento de alguma delas, ficam pertencendo ao dono da mais valiosa, que deve pagar o justo valor da outra; se, porém, este não quiser fazê-lo, assiste idêntico direito ao dono da menos valiosa.
2. Se nenhum deles quiser ficar com a coisa, deve esta ser vendida, e cada um haverá a parte do preço que lhe pertencer.
3. Se ambas as coisas forem de igual valor, deve observar-se o disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 1252.º
1. Quem de boa fé der nova forma, por seu trabalho, a coisa móvel pertencente a outrem faz sua a coisa transformada, se ela não puder ser restituída à primitiva forma ou não puder sê-lo sem perda do valor criado pela especificação; neste último caso, porém, se o valor da especificação não exceder o da matéria, tem o dono da matéria o direito de optar entre ficar com a coisa ou exigir a indemnização referida no número seguinte.
2. Em qualquer dos casos previstos no número anterior, o que ficar com a coisa é obrigado a indemnizar o outro do valor que lhe pertencer.
1. Se a especificação tiver sido feita de má fé, deve a coisa especificada ser restituída a seu dono no estado em que se encontrar, com indemnização dos danos, sem que o dono seja obrigado a indemnizar o especificador, se o valor da especificação não tiver aumentado em mais de um terço o valor da coisa especificada; se o aumento for superior, deve o dono da coisa repor o que exceder o dito terço.
2. O autor da especificação é sempre obrigado a ficar com a coisa especificada, se o dono dela preferir a indemnização pelo valor da coisa e pelos danos sofridos.
Constituem casos de especificação a escrita, a pintura, o desenho, a fotografia, a impressão, a gravura e outros actos semelhantes, feitos com utilização de materiais alheios.
1. Aquele que em terreno seu construir obra com materiais alheios adquire os materiais que utilizou, pagando o respectivo valor, além da indemnização a que haja lugar.
2. Para efeitos do número anterior, é equiparada à construção em terreno próprio aquela feita em terreno alheio pelo superficiário ou titular de outro direito real que lhe faculte o poder de aí construir e se tornar dono das construções.
1. Se alguém, de boa fé, construir obra em terreno alheio e o valor que as obras tiverem trazido à totalidade do prédio for maior do que o valor que este tinha antes, o autor da incorporação pode adquirir a propriedade dele, pagando o valor que o prédio tinha antes das obras; caso opte por não ficar com a coisa, fica o dono do terreno com os direitos que lhe são conferidos no artigo seguinte.
2. Se o valor acrescentado for igual ou menor, as obras pertencem ao dono do terreno, com obrigação de indemnizar o autor delas no valor que for fixado segundo as regras do enriquecimento sem causa; esse valor poderá ser aumentado até ao valor que as obras tinham ao tempo da incorporação, na medida em que a culpa do dono do terreno tenha concorrido para que a incorporação se tenha operado.
3. Entende-se que houve boa fé, se o autor da obra desconhecia que o terreno era alheio, ou se foi autorizada a incorporação pelo dono do terreno.
Se a obra for feita de má fé em terreno alheio, tem o dono do terreno o direito de exigir que seja desfeita e que o terreno seja restituído ao seu primitivo estado à custa do autor dela, ou, se o preferir, o direito de ficar com a obra pelo valor que for fixado segundo as regras do enriquecimento sem causa.
1. Quando as obras sejam feitas em terreno alheio com materiais alheios, sem culpa do dono destes, o dono do terreno tem o direito a ficar com os materiais, obrigando-se a indemnizar, quer o respectivo dono, no valor dos materiais e demais prejuízos que haja sofrido, quer o autor da incorporação, na diferença entre o montante fixado nos termos do n.º 2 do artigo 1259.º e a indemnização devida ao dono dos materiais.
2. Se a incorporação tiver sido efectuada de má fé, o seu autor é solidariamente responsável pelo pagamento da indemnização ao dono dos materiais, e, se o montante desta indemnização exceder o valor acrescentado pelas obras ao terreno, responderá perante o dono do terreno por esta diferença.
3. Quando a incorporação haja sido feita com culpa do dono dos materiais, é-lhe aplicável o disposto no artigo antecedente em relação ao autor da incorporação.
4. No caso do número anterior, se o autor da incorporação estiver de má fé, é solidária a responsabilidade de ambos, e a divisão do enriquecimento é feita em proporção do valor dos materiais e da mão-de-obra; se estiver de boa fé, é o dono dos materiais responsável perante ele pelo custo da mão-de-obra e demais prejuízos.
O regime dos artigos 1258.º a 1261.º é aplicável, com as devidas adaptações, às sementeiras ou plantações, com a diferença de que às situações previstas no artigo 1259.º se aplica o estatuído no artigo 1258.º
1. O dono de um terreno que, na construção de um edifício em terreno próprio, ocupe, de boa fé, uma parcela de terreno alheio, pode adquirir a propriedade do terreno ocupado, se tiverem decorrido 3 meses a contar do início da ocupação, sem oposição do proprietário, pagando o valor do terreno e reparando o prejuízo causado, designadamente o resultante da depreciação eventual do terreno restante.
2. É aplicável o disposto no número anterior relativamente a qualquer direito real de terceiro sobre o terreno ocupado.
3. Caso a construção seja efectuada de boa fé pelo titular do direito de superfície ou de outro direito real que faculte o poder de construir e se tornar dono do edifício, e desde que o proprietário do solo esteja igualmente de boa fé, pode qualquer destes requerer a aplicação do disposto no n.º 1 para a aquisição do terreno ocupado ao terceiro.
4. A parcela do terreno adquirida nos termos do número anterior fica sujeita ao mesmo regime a que estava sujeito o terreno aumentado, cabendo nas relações internas, e salvo repartição mais justa, ao proprietário do solo arcar com os custos da aquisição.
1. A propriedade dos imóveis abrange o espaço aéreo correspondente à superfície, bem como o subsolo, com tudo o que neles se contém e não esteja desintegrado do domínio por lei ou negócio jurídico.
2. O proprietário não pode, todavia, proibir os actos de terceiro que, pela altura ou profundidade a que têm lugar, não haja interesse em impedir.
As coisas imóveis sem dono consideram-se do património do território de Macau.
O proprietário de um imóvel pode opor-se à emissão de fumo, fuligem, vapores, cheiros, calor ou ruídos, bem como à produção de trepidações e a outros quaisquer factos semelhantes, provenientes de prédio alheio, sempre que tais factos importem para o uso do imóvel um prejuízo que exceda os limites da tolerância que deve existir entre vizinhos; deve atender-se, nomeadamente, aos usos e à situação e natureza dos imóveis.
1. O proprietário não pode construir nem manter no seu prédio quaisquer obras, instalações ou depósitos de substâncias corrosivas ou perigosas, se for de recear que possam ter sobre o prédio vizinho efeitos nocivos não permitidos por lei.
2. Se as obras, instalações ou depósitos tiverem sido autorizados por entidade pública competente, ou tiverem sido observadas as condições especiais prescritas na lei para a construção ou manutenção deles, a sua destruição ou remoção só é admitida a partir do momento em que o prejuízo se torne efectivo.
3. É devida, em qualquer dos casos, indemnização pelo prejuízo sofrido.
1. O proprietário tem a faculdade de abrir no seu prédio minas ou poços e fazer escavações, desde que não prive os prédios vizinhos do apoio necessário para evitar desmoronamentos ou deslocações de terra.
2. Logo que venham a padecer danos com as obras feitas, os proprietários vizinhos serão indemnizados pelo autor delas, mesmo que tenham sido tomadas as precauções julgadas necessárias.
1. Se, para reparar algum edifício ou construção, for indispensável levantar andaime, colocar objectos sobre prédio alheio, fazer passar por ele os materiais para a obra ou praticar outros actos análogos, é o dono do prédio obrigado a consentir nesses actos.
2. É igualmente permitido o acesso a prédio alheio a quem pretenda apoderar-se de coisas suas que acidentalmente nele se encontrem ou fazer a apanha dos frutos das suas árvores, quando tal não seja possível fazer no seu prédio; o proprietário pode impedir o acesso, entregando a coisa ou os frutos ao seu dono.
3. Em qualquer dos casos previstos neste artigo, o proprietário tem direito a ser indemnizado do prejuízo sofrido.
Se qualquer edifício ou outra obra oferecer perigo de ruir, no todo ou em parte, e do desmoronamento puderem resultar danos para o prédio vizinho, é lícito ao dono deste exigir da pessoa responsável pelos danos, nos termos do artigo 485.º, as providências necessárias para eliminar o perigo.
1. Os prédios inferiores estão sujeitos a receber as águas que, naturalmente e sem obra do homem, decorrem dos prédios superiores, assim como a terra e entulhos que elas arrastam na sua corrente.
2. Nem o dono do prédio inferior pode fazer obras que estorvem o escoamento, nem o dono do prédio superior obras capazes de o agravar, sem prejuízo da possibilidade de constituição da servidão legal de escoamento, nos casos em que é admitida.
1. O dono do prédio onde existam obras defensivas para conter as águas, ou onde, pela variação do curso das águas, seja necessário construir novas obras, é obrigado a fazer os reparos precisos, ou a tolerar que os façam, sem prejuízo dele, os donos dos prédios que padeçam danos ou estejam expostos a danos iminentes.
2. O disposto no número anterior é aplicável, sempre que seja necessário despojar algum prédio de materiais cuja acumulação ou queda estorve o curso das águas com prejuízo ou risco de terceiro.
3. Todos os proprietários que participam do benefício das obras são obrigados a contribuir para as despesas delas, em proporção do seu interesse, sem prejuízo da responsabilidade que recaia sobre o autor dos danos.
1. Tudo o que, nos termos deste capítulo, seja o proprietário impedido de fazer sobre o seu prédio é igualmente vedado a qualquer terceiro que exerça poderes sobre o mesmo.
2. Tudo o que, nos termos deste capítulo, o proprietário possa impedir que o dono de prédio alheio faça pode igualmente ser impedido por terceiro, titular de direito real sobre o prédio, que seja afectado no exercício do seu direito por essa conduta.
3. O disposto no número anterior é igualmente aplicável aos terceiros titulares de direitos obrigacionais sobre o bem que lhes facultem a utilização dos meios de defesa concedidos ao possuidor pelos artigos 1201.º e seguintes.
1. O proprietário pode obrigar os donos dos prédios confinantes a concorrerem para a demarcação das estremas entre o seu prédio e os deles.
2. Podem igualmente requerer a demarcação os titulares de outros direitos reais sobre o prédio.
1. A demarcação é feita de conformidade com os títulos de cada proprietário e, na falta de títulos suficientes, de harmonia com a posse em que estejam os confinantes ou segundo o que resultar de outros meios de prova.
2. Se os títulos não determinarem os limites dos prédios ou a área pertencente a cada proprietário, e a questão não puder ser resolvida pela posse ou por outro meio de prova, a demarcação faz-se distribuindo o terreno em litígio por partes iguais.
3. Se os títulos indicarem um espaço maior ou menor do que o abrangido pela totalidade do terreno, atribui-se a falta ou o acréscimo proporcionalmente à parte de cada um.
O direito de demarcação é imprescritível, sem prejuízo dos direitos adquiridos por usucapião.
1. A todo o tempo o proprietário pode murar ou rodear de sebes o seu prédio, ou tapá-lo de qualquer modo.
2. Contudo, não podem ser plantadas sebes vivas nas estremas dos prédios sem previamente se colocarem marcos divisórios.
1. Sem prejuízo da demais legislação aplicável, o proprietário que no seu prédio levantar edifício ou outra construção não pode abrir nela janelas ou portas que deitem directamente sobre o prédio vizinho sem deixar entre este e cada uma das obras o intervalo de metro e meio.
2. Igual restrição é aplicável às varandas, terraços com acesso ou obras semelhantes, quando sejam servidos de parapeitos de altura inferior a metro e meio em toda a sua extensão ou parte dela.
3. Se os dois prédios forem oblíquos entre si, a distância de metro e meio conta-se perpendicularmente do prédio para onde deitam as vistas até à construção ou edifício novamente levantado; mas, se a obliquidade for além de quarenta e cinco graus, não tem aplicação a restrição imposta ao proprietário.
4. Na distância que deva interceder entre as obras de prédios que sejam separados entre si por estrada, caminho, rua, travessa ou outra passagem por terreno do domínio público, contabilizar-se-á o espaço ocupado por essa passagem.
1. A existência de janelas, portas, varandas, terraços ou obras semelhantes, em contravenção do disposto na lei, pode importar, nos termos gerais, a constituição da servidão de vistas por usucapião.
2. Constituída a servidão de vistas, por usucapião ou outro título, ao proprietário vizinho só é permitido levantar edifício ou outra construção no seu prédio desde que entre toda a extensão defronte e acima das obras mencionadas no n.º 1 e o novo edifício ou construção deixe o espaço mínimo de metro e meio.
1. Não se consideram abrangidos pelas restrições da lei as frestas ou óculos para luz e ar, podendo o vizinho levantar a todo o tempo construção ou contramuro, ainda que vede tais aberturas.
2. As frestas ou óculos para luz e ar devem, todavia, situar-se pelo menos a 2 metros de altura, a contar do solo ou do soalho, e não devem ter, numa das suas dimensões, mais de 15 centímetros; a altura de 2 metros respeita a ambos os lados da parede ou muro onde essas aberturas se encontram.
3. É aplicável o disposto no n.º 1 às aberturas, quaisquer que sejam as suas dimensões, igualmente situadas pelo menos a 2 metros do solo ou do soalho, com grades fixas, de Secção não inferior a 1 centímetro quadrado e cuja malha não seja superior a 5 centímetros.
1. O proprietário deve edificar de modo que a beira do telhado ou outra cobertura não goteje sobre o prédio vizinho, deixando um intervalo mínimo de 5 decímetros entre o prédio e a beira, se de outro modo não puder evitá-lo.
2. A inobservância do disposto no número anterior pode importar, nos termos gerais, a constituição por usucapião da servidão de estilicídio.
3. Constituída a servidão de estilicídio, por usucapião ou outro título, o proprietário do prédio serviente não pode levantar edifício ou construção que impeça o escoamento das águas, devendo realizar as obras necessárias para que o escoamento se faça sobre o seu prédio, sem prejuízo para o prédio dominante.
Sem prejuízo de lei especial em contrário, é lícita a plantação de árvores e arbustos até à linha divisória dos prédios; mas ao dono do prédio vizinho é permitido arrancar e cortar as raízes que se introduzirem no seu terreno e o tronco ou ramos que sobre ele propenderem, se o dono da árvore, sendo rogado judicial ou extrajudicialmente, o não fizer dentro de 5 dias.
1. As árvores ou arbustos nascidos na linha divisória de prédios pertencentes a donos diferentes presumem-se comuns; qualquer dos consortes tem a faculdade de os arrancar, mas o outro tem direito a haver metade do seu valor.
2. Contudo, caso a árvore ou o arbusto sirva de marco divisório, não pode ser cortado ou arrancado senão de comum acordo.
1. A parede ou muro divisório entre dois edifícios presume-se comum em toda a sua altura, sendo os edifícios iguais, e até à altura do inferior, se o não forem, salvo havendo sinal em contrário.
2. Os muros entre prédios rústicos, ou entre pátios e jardins de prédios urbanos, presumem-se igualmente comuns, não havendo sinal em contrário.
3. São sinais que excluem a presunção de comunhão, nomeadamente:
a) Não estar o prédio contíguo igualmente murado pelos outros lados;
b) Sustentar o muro em toda a sua largura qualquer construção existente em apenas um dos lados.
4. No caso da alínea a) do número anterior, presume-se que o muro pertence em exclusivo ao dono do prédio murado; no caso da alínea b), presume-se que pertence exclusivamente ao dono do prédio em que a construção se situa.
1. O proprietário a quem pertença em comum alguma parede ou muro não pode abrir nele janelas ou frestas, nem fazer outra alteração, sem consentimento do seu consorte.
2. Qualquer dos consortes tem, no entanto, a faculdade de edificar sobre a parede ou muro comum e de introduzir nele traves ou barrotes, contanto que não ultrapasse o meio da parede ou do muro.
3. Tendo a parede ou muro espessura inferior a 5 decímetros, não tem lugar a restrição imposta na parte final do número anterior.
1. A qualquer dos consortes é permitido altear a parede ou muro comum, contanto que o faça à sua custa, ficando a seu cargo todas as despesas de conservação da parte alteada.
2. Se a parede ou muro não estiver em estado de aguentar o alçamento, o consorte que pretender levantá-lo tem de reconstruí-lo por inteiro à sua custa e, se quiser aumentar-lhe a espessura, é o espaço para isso necessário tomado do seu lado.
3. O consorte que não tiver contribuído para o alçamento pode adquirir comunhão na parte alteada, pagando metade do seu valor.
1. A reparação ou reconstrução da parede ou muro comum é feita por conta dos consortes, em proporção das suas partes e do proveito que cada um tirar da parede ou muro.
2. Se a ruína da parede ou muro provier de facto do qual só um dos consortes tire proveito, só o beneficiário é obrigado a reconstruí-lo ou repará-lo.
3. É sempre facultado ao consorte eximir-se dos encargos de reparação ou reconstrução da parede ou muro, renunciando ao seu direito nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo 1310.º
O dono do prédio particular pode servir-se e dispor livremente do uso:
a) Das águas que nascerem no prédio e das pluviais que nele caírem, enquanto não transpuserem, abandonadas, os limites do mesmo prédio;
b) Das águas subterrâneas existentes no prédio;
c) Dos lagos e lagoas existentes dentro do prédio, quando não sejam alimentados por corrente pública;
d) De outras águas indicadas por lei como águas de utilização particular.
Os donos dos terrenos particulares que sejam atravessados por correntes de águas não navegáveis nem flutuáveis podem servir-se e dispor livremente do uso das mesmas.
1. São particulares as obras destinadas à captação, derivação ou armazenamento de águas, bem como os leitos das correntes referidas no artigo anterior.
2. Entende-se por leito a porção do terreno que a água cobre sem transbordar para o solo natural, habitualmente enxuto.
1. Em casos urgentes de incêndio ou calamidade pública, as autoridades administrativas podem, sem forma de processo nem indemnização prévia, ordenar a utilização imediata de quaisquer águas referidas nos artigos 1288.º e 1289.º necessárias para conter ou evitar os danos.
2. Se da utilização da água resultarem danos apreciáveis, têm os lesados direito a indemnização, paga por aqueles em benefício de quem a água foi utilizada.
1. O dono do prédio onde haja alguma fonte ou nascente de água pode servir-se dela e dispor do seu uso livremente, salvas as restrições previstas na lei e os direitos que terceiro haja adquirido ao uso da água por título justo.
2. Considera-se título justo de aquisição da água das fontes e nascentes, conforme os casos, qualquer meio legítimo de adquirir a propriedade de coisas imóveis ou de constituir servidões.
3. A usucapião, porém, só é atendida quando for acompanhada da construção de obras, visíveis e permanentes, no prédio onde exista a fonte ou nascente, que revelem a captação e a posse da água nesse prédio; sobre o significado das obras é admitida qualquer espécie de prova.
Os donos dos prédios para onde se derivam as águas vertentes de qualquer fonte ou nascente podem eventualmente aproveitá-las nesses prédios; mas a privação desse uso por efeito de novo aproveitamento que faça o proprietário da fonte ou nascente não constitui violação de direito.
O disposto nos artigos anteriores é aplicável, com as necessárias adaptações, às águas pluviais referidas na alínea a) do artigo 1288.º e às águas dos lagos e lagoas compreendidas na alínea c) do mesmo artigo.
1. É lícito ao proprietário procurar águas subterrâneas no seu prédio, por meio de poços ordinários ou artesianos, minas ou quaisquer escavações, contanto que não prejudique direitos que terceiro haja adquirido por título justo.
2. Sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, a diminuição do caudal de qualquer água em consequência da exploração de água subterrânea não constitui violação de direitos de terceiro, excepto se a captação se fizer por meio de infiltrações provocadas e não naturais.
3. Consideram-se títulos justos de aquisição das águas subterrâneas os referidos nos n.os 2 e 3 do artigo 1292.º
4. A simples atribuição a terceiro do direito de explorar águas subterrâneas não importa, para o proprietário, privação do mesmo direito, se tal abdicação não resultar claramente do título.
O proprietário que, ao explorar águas subterrâneas, altere ou faça diminuir as águas de fonte ou reservatório destinado a uso público fica responsável perante o território de Macau pelos danos causados.
1. Cabendo o direito à água a dois ou mais co-utentes, todos devem contribuir para as despesas necessárias ao conveniente aproveitamento dela, na proporção do seu uso, podendo para esse fim executar-se as obras necessárias e fazer-se os trabalhos de pesquisa indispensáveis, quando se reconheça haver perda ou diminuição de volume ou caudal.
2. O co-utente não pode eximir-se do encargo, renunciando ao seu direito em benefício dos outros co-utentes, contra a vontade destes.
A divisão das águas comuns, quando deva realizar-se, é feita, no silêncio do título, em proporção da superfície e necessidades dos prédios, podendo repartir-se o caudal ou o tempo da sua utilização, como mais convier ao seu bom aproveitamento.
1. Existe propriedade em comum, ou compropriedade, quando duas ou mais pessoas são simultaneamente titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa.
2. Os direitos dos consortes ou comproprietários sobre a coisa comum são qualitativamente iguais, embora possam ser quantitativamente diferentes; as quotas presumem-se, todavia, quantitativamente iguais na falta de indicação em contrário do título constitutivo.
As regras da compropriedade são aplicáveis, com as necessárias adaptações, à comunhão de quaisquer outros direitos, sem prejuízo do disposto especialmente para cada um deles.
1. Os comproprietários exercem, em conjunto, todos os direitos que pertencem ao proprietário singular; separadamente, participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção das suas quotas e nos termos dos artigos seguintes.
2. Cada consorte pode reivindicar de terceiro a coisa comum, sem que a este seja lícito opor-lhe que ela lhe não pertence por inteiro.
1. Na falta de regulamento sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito.
2. O uso da coisa comum por um dos comproprietários não constitui posse exclusiva ou posse de quota superior à dele, salvo se tiver havido inversão do título.
1. Por decisão tomada pela unanimidade dos consortes, estes podem adoptar um regulamento no qual sejam definidos os termos em que a administração é efectuada e a quem esta deva ser deferida, bem como as regras sobre o uso da coisa.
2. O regulamento relativo a bens sujeitos a registo só é oponível a terceiros desde que conste do registo.
3. Referindo-se a bens não sujeitos a registo, o regulamento é inoponível em prejuízo dos consortes supervenientes, salvo quando se prove que estes o conheciam à data da aquisição dessa qualidade, bem como dos demais terceiros, salvo quando se prove que estes o conheciam no momento em que participaram no negócio relativo àquele bem.
1. Na falta de regras especiais constantes do regulamento sobre administração da compropriedade, esta cabe a todos os comproprietários, os quais têm poderes para praticarem individualmente os actos necessários à conservação da coisa e conjuntamente os demais actos de administração.
2. Contudo, qualquer dos consortes tem o direito de se opor ao acto de conservação que outro consorte pretenda realizar, salvo os indicados na alínea b) do artigo seguinte que se não compadeçam com a delonga, cabendo à maioria referida na alínea a) do número seguinte decidir sobre o mérito da oposição.
3. Salvo quando o regulamento preceitue de modo distinto, os actos que devam ser praticados conjuntamente estão dependentes do acordo dos consortes que representem:
a) Tratando-se de actos de administração ordinária, mais de metade do valor total da coisa;
b) Tratando-se de actos de administração extraordinária, mais de dois terços do mesmo valor.
4. Sempre que não seja possível formar a maioria legal exigida, a qualquer dos comproprietários é lícito recorrer ao tribunal, que decidirá segundo juízos de equidade.
Ainda que para a administração em geral, ou para determinada categoria de actos, seja exigido o assentimento de todos os consortes, ou da maioria deles, a qualquer dos comproprietários é sempre lícito:
a) Requerer que os actos de administração indispensáveis à manutenção do valor e utilidade da coisa sejam executados ou, sendo necessário, sejam ordenados pelo juiz;
b) Praticar os actos urgentes de administração destinados a evitar um dano iminente.
Os actos realizados em contravenção das regras de administração tornam o autor responsável pelo prejuízo a que der causa, e são anuláveis se as regras de administração forem oponíveis à contraparte.
1. O comproprietário pode dispor de toda a sua quota na comunhão ou de parte dela, mas não pode, sem consentimento dos restantes consortes, alienar nem onerar parte especificada da coisa comum.
2. A disposição ou oneração de todo o bem ou de sua parte especificada sem consentimento dos restantes consortes é havida como disposição ou oneração de coisa alheia.
3. A disposição da quota está sujeita à forma exigida para a disposição da coisa.
1. O comproprietário goza do direito de preferência e tem o primeiro lugar entre os preferentes legais no caso de venda, ou dação em cumprimento, a estranhos da quota de qualquer dos seus consortes.
2. É aplicável à preferência do comproprietário, com as adaptações convenientes, o disposto nos artigos 410.º a 412.º
3. Sendo dois ou mais os preferentes, a quota alienada é adjudicada a todos, na proporção das suas quotas.
1. O comproprietário a quem se não dê conhecimento da venda ou dação em cumprimento tem o direito de haver para si a quota alienada, contanto que o requeira dentro do prazo de 6 meses, a contar da data em que teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação, e deposite, nos 8 dias seguintes ao despacho que ordene a citação, o preço devido, acrescido das despesas, quando e na medida em que o beneficiem, com emolumentos notariais e de registo e com impostos devidos pela aquisição.
2. O direito de preferência e a respectiva acção não são prejudicados pela modificação ou revogação da alienação, ainda que estes efeitos resultem de confissão ou transacção judicial.
1. Os comproprietários devem contribuir, em proporção das respectivas quotas, para as despesas necessárias à conservação ou fruição da coisa comum, sem prejuízo da faculdade de se eximirem do encargo renunciando ao seu direito.
2. A renúncia, porém, não é válida sem o consentimento dos restantes consortes, quando a despesa tenha sido anteriormente aprovada pelo interessado, e é revogável sempre que as despesas previstas não venham a realizar-se.
3. A renúncia do comproprietário está sujeita à forma prescrita para a doação e aproveita a todos os consortes, na proporção das respectivas quotas.
1. Nenhum dos comproprietários é obrigado a permanecer na indivisão, salvo quando se houver convencionado que a coisa se conserve indivisa.
2. O prazo fixado para a indivisão da coisa não pode exceder 5 anos; mas é lícito renovar este prazo, uma ou mais vezes, por nova convenção.
3. A cláusula de indivisão só vale em relação a terceiros se:
a) Respeitando a compropriedade a coisas imóveis ou a coisas móveis sujeitas a registo, constar do registo;
b) Respeitando a compropriedade a coisas não sujeitas a registo, constar do acto de alienação através de declaração escrita assinada pelo adquirente.
1. A divisão é feita amigavelmente ou nos termos da lei de processo.
2. A divisão amigável está sujeita à forma exigida para a alienação onerosa da coisa.
Podem pertencer a proprietários diversos, em regime de propriedade horizontal, as fracções que integram um condomínio, em condições de constituírem unidades independentes.
1. O condomínio pode ser integrado por um único edifício ou por um conjunto de edifícios.
2. Para que um conjunto de edifícios possa integrar um mesmo condomínio é necessário que os edifícios que o compõem estejam funcionalmente ligados entre si pela existência de partes comuns ao conjunto dos edifícios afectadas ao uso de todos ou parte dos condóminos.
3. No caso referido no número anterior, é considerado edifício cada bloco ou corpo distinto dotado de autonomia funcional e saída própria para uma parte comum do condomínio ou para a via pública, ainda que seja construído sobre pódium comum.
4. Entende-se por prédio, para efeitos do disposto no presente capítulo, o solo e o edifício ou conjunto de edifícios que integram o condomínio.
1. Podem ser objecto de propriedade horizontal as fracções autónomas que, além de constituírem unidades independentes, sejam distintas e isoladas entre si, com saída própria para uma parte comum do condomínio ou para a via pública.
2. Podem ainda constituir fracções autónomas os lugares de estacionamento, desde que o respectivo espaço seja suficientemente delimitado e tenha saída própria para uma parte comum do condomínio ou para a via pública, mesmo que esses lugares não constituam unidades distintas e isoladas entre si.
3. Entende-se por espaço suficientemente delimitado a área individualizada pela demarcação, por forma indelével, dos seus limites de contiguidade, com afixação de numeração ou designação própria e, quando seja o caso, a indicação da designação da fracção autónoma em que esteja integrada, ou a cujo uso exclusivo se ache afecto.
1. A falta de requisitos legalmente exigidos importa a nulidade do título constitutivo da propriedade horizontal e a sujeição do prédio ao regime de compropriedade, atribuindo-se a cada consorte a quota que lhe tiver sido fixada nos termos do n.º 1 do artigo 1318.° ou, na falta de fixação, a quota correspondente ao valor relativo da sua fracção.
2. Caso o condomínio incida sobre um conjunto de edifícios estruturalmente autónomos, a nulidade do título que derive da falta das condições pressupostas no n.º 2 do artigo 1314.º leva à sujeição de cada edifício ao regime que se lhe aplicaria se não integrasse um mesmo condomínio.
3. A nulidade do título é invocável por qualquer condómino ou outro titular de interesse pessoal, directo e legítimo, bem como pelo Ministério Público sob participação da entidade pública a quem caiba a aprovação ou fiscalização das construções.
1. A propriedade horizontal pode ser constituída por negócio jurídico, acto administrativo, usucapião ou decisão judicial.
2. A constituição da propriedade horizontal por acto administrativo dá-se nos casos de destinação do prédio à construção em fracções autónomas, valendo como título constitutivo a memória descritiva das fracções autónomas que acompanha o projecto de construção, logo que este esteja aprovado pela entidade competente.
3. A constituição da propriedade horizontal por decisão judicial pode ser proferida, nomeadamente, em acção de divisão de coisa comum ou em processo de inventário, podendo ter lugar a requerimento de qualquer consorte, desde que no caso se verifiquem os requisitos exigidos pelo artigo 1315.º
1. As fracções autónomas são individualizadas nos títulos constitutivos da propriedade horizontal e nas descrições prediais por uma designação distinta ou qualquer outra referência que as diferencie das demais, fixando-se, através de critérios objectivos definidos pelo requerente, o valor relativo de cada fracção, expresso em percentagem ou permilagem do valor total do condomínio.
2. Se o condomínio pode ser sujeito ao regime de administração complexa é atribuído no título constitutivo, além do valor percentual ou permilar da fracção no condomínio, o valor percentual ou permilar da mesma no subcondomínio a que pertence.*
3. A designação de cada fracção autónoma, de edifício composto por mais do que uma fracção, é formada pelo número do piso ou andar ou outra designação convencional destes e por uma letra maiúscula, segundo a ordem alfabética, ou numeração que lhe competir no piso ou andar do edifício em que se localiza.
4. A designação de cada fracção autónoma deve ser afixada com carácter visível e permanente no respectivo acesso ou junto dele.
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 14/2017
1. Sendo o condomínio integrado por um conjunto de edifícios, é atribuída a cada edifício, independentemente do regime de administração a que fique sujeito o condomínio, uma designação própria formada por um número ou por uma letra maiúscula, de acordo com uma sequência que atenda à disposição dos edifícios, ou por outra expressão convencional.
2. O preceituado no número anterior é igualmente aplicável, com as devidas adaptações, aos subcondomínios que o título constitutivo preveja nos termos das alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo seguinte; no caso da alínea a) a designação dos subcondomínios, quando não coincidentes com os edifícios, tem de ser diferenciável da adoptada para estes.
1. Além das especificações referidas nos dois artigos anteriores, o título constitutivo deve ainda conter a menção do fim a que se destina cada fracção, e cada parte comum que seja afectada a fins específicos.
2. O título constitutivo pode ainda conter, designadamente:
a) Cláusula que permita sujeitar o condomínio de um conjunto de edifícios ao regime de administração complexa e para o efeito delimite os respectivos subcondomínios;*
b) Cláusula que permita sujeitar o condomínio de um único edifício ao regime de administração complexa, observados os pressupostos definidos no n.º 4, e para o efeito delimite os respectivos subcondomínios;*
c) O regulamento do condomínio, disciplinando o uso, fruição, segurança e conservação, quer das partes comuns, quer das fracções autónomas;
d) A previsão da obrigatoriedade da celebração de compromissos arbitrais para a resolução de litígios emergentes das relações do condomínio.
3. A cláusula prevista na alínea a) do número anterior só pode prever subcondomínios não coincidentes com os próprios edifícios que compõem o condomínio quando tal corresponda a interesses dignos de protecção legal, e a delimitação se faça com base em critérios razoáveis.
4. O condomínio de um único edifício só pode ser submetido ao regime de administração complexa quando cada uma das secções de que o edifício é constituído:*
a) É composta por várias fracções autónomas;*
b) Possui acesso individualizado;*
c) Dispõe de partes comuns destinadas ao seu serviço;*
d) Fica afectada a uma finalidade própria e distinta das outras secções.*
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 14/2017
1. O título constitutivo da propriedade horizontal pode ser modificado mediante deliberação tomada pela unanimidade dos condóminos de todo o condomínio, ou excepcionalmente do respectivo subcondomínio, nos termos da alínea e) do artigo 1367.º, devendo essa deliberação, em qualquer dos casos, constar de documento com as respectivas assinaturas reconhecidas; a inobservância do disposto nos artigos 1314.º e 1315.º importa a nulidade da deliberação e a aplicação, com as necessárias adaptações, do disposto no n.º 3 do artigo 1316.º
2. Se faltar a unanimidade, mas a proposta de modificação houver obtido o voto favorável de condóminos que representem, pelo menos, dois terços do valor total do condomínio ou do subcondomínio, consoante os casos, pode solicitar-se ao tribunal o suprimento do acordo dos restantes condóminos.
3. O suprimento referido no número anterior nunca será dado em violação do disposto na lei ou de interesses ponderosos dos condóminos que não deram o seu consentimento.
4. No que diga respeito aos elementos referidos nas alíneas c) e d) do n.º 2 do artigo anterior, a regra da unanimidade prevista no n.º 1 é substituída pela da maioria representativa do valor.
5. As modificações do título constitutivo relativas à destinação das partes comuns ficam sujeitas ao regime fixado no artigo 1334.º; ao mesmo regime ficam sujeitas as modificações relativas à destinação das partes próprias, com a diferença de que dependem também do acordo dos respectivos titulares.
1. Não é necessária a autorização dos restantes condóminos para a junção, numa só, de duas ou mais fracções do mesmo edifício, desde que estas sejam contíguas.
2. A contiguidade das fracções é dispensada quando se trate de juntar fracções autónomas com outras correspondentes a lugares de estacionamento e a arrecadações.
3. À divisão de fracções aplica-se, com as devidas adaptações, o disposto nos números anteriores, salvo se a lei ou o título constitutivo impedirem a divisão, ou definirem outros critérios para a sua admissibilidade.
4. Ao condómino que juntar ou dividir as fracções cabe o poder de, por acto unilateral constante de documento com assinatura reconhecida, introduzir a correspondente modificação no título constitutivo.
5. O acto de junção e divisão de fracções autónomas deve ser participado pelo interessado, para efeitos de harmonização da memória descritiva e da matriz, às entidades públicas competentes, respectivamente, para a aprovação ou fiscalização das construções e para a cobrança de impostos sobre os prédios, dando-se ainda conhecimento ao órgão de administração do edifício no prazo de 30 dias.
1. Cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do condomínio.
2. O conjunto dos dois direitos é incindível; nenhum deles pode ser alienado separadamente, nem é lícito renunciar à parte comum como meio de o condómino se desonerar das despesas necessárias à sua conservação ou fruição.
1. São comuns as seguintes partes do condomínio:
a) O direito sobre o solo que serve de base à constituição da propriedade horizontal;
b) Os alicerces, colunas, pilares, paredes mestras, fachadas e todas as partes que constituam a estrutura dos edifícios;
c) Os pátios e jardins anexos ao edifício ou edifícios do condomínio;
d) Os terraços de cobertura ou telhados dos edifícios do condomínio;
e) Os ascensores;
f) As entradas, vestíbulos, escadas, corredores e vias de uso ou passagem comum a dois ou mais condóminos;
g) As instalações gerais de água, electricidade, ar condicionado, aquecimento, gás, comunicações e semelhantes.
h) As dependências destinadas ao uso e habitação do porteiro, salvo se constituírem fracção autónoma nos termos do título constitutivo da propriedade horizontal;
i) Os lugares de estacionamento, quando não constituam fracções autónomas nem partes integrantes das mesmas, nos termos dos n.os 2 e 3 do artigo 1315.º;
j) Em geral, as coisas que não sejam afectadas ao uso exclusivo de um dos condóminos.
2. O título constitutivo pode afectar ao uso exclusivo de um condómino ou conjunto de condóminos:
a) As partes comuns previstas nas alíneas c) a e) do número anterior, desde que exista uma destinação objectiva das mesmas à utilização exclusiva por parte das fracções em causa;
b) Os lugares de estacionamento referidos na alínea i) do número anterior, devendo os mesmos ficar delimitados nos termos do n.º 3 do artigo 1315.º
3. Sendo o condomínio composto por edifícios estruturalmente autónomos, poderá o título constitutivo considerar como partes de cada edifício o direito ao solo em que este está implantado, assim como os pátios e jardins anexos ao mesmo que estejam funcionalmente afectos ao seu uso exclusivo; os alicerces, colunas, pilares, paredes mestras, fachadas e todas as partes que constituam a estrutura de edifício estruturalmente autónomo, e se este for constituído apenas por uma fracção, as restantes partes do mesmo, consideram-se, no silêncio do título, partes do edifício a que pertencem.
4. Encontrando-se o condomínio sujeito ao regime de administração complexa, são partes comuns de cada um dos subcondomínios:*
a) As partes referidas na alínea a) do número seguinte que, nos termos do título constitutivo, forem consideradas como partes desse subcondomínio ou que estejam afectadas ao seu uso exclusivo;*
b) As partes referidas nas alíneas d) a h) do n.º 1, quando façam parte ou sirvam unicamente esse subcondomínio;*
c) Os lugares comuns de parques de estacionamento que sirvam apenas esse subcondomínio e tenham saída própria para a via pública ou para uma parte comum do condomínio ou subcondomínio;*
d) Os alicerces, colunas, pilares, paredes mestras, fachadas e todas as partes que constituam a estrutura de um único subcondomínio;*
e) Em geral, as partes comuns que façam parte ou sirvam unicamente esse subcondomínio.*
5. Encontrando-se o condomínio sujeito ao regime de administração complexa, são partes comuns de todo o condomínio:*
a) O direito sobre o solo que serve de base à constituição da propriedade horizontal, os pátios e jardins anexos aos edifícios e o pódium comum aos vários subcondomínios, salvo as partes que, nos termos do título constitutivo, forem consideradas como partes de um subcondomínio ou que estejam afectadas ao uso exclusivo desse subcondomínio;*
b) As partes referidas nas alíneas d) a h) do n.º 1, quando não façam parte nem sirvam unicamente um subcondomínio;*
c) Os restantes lugares comuns de estacionamento, não referidos na alínea c) do número anterior;*
d) Os alicerces, colunas, pilares, paredes mestras, fachadas e todas as partes que constituam a estrutura comum dos vários subcondomínios;*
e) Em geral, todas as coisas, incluindo edifícios ou partes dos mesmos, que sirvam o condomínio no seu conjunto.*
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 14/2017
1. Os condóminos, nas relações entre si, estão sujeitos, de um modo geral, quanto às fracções que exclusivamente lhes pertencem e quanto às partes comuns, às limitações impostas, respectivamente, aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis.
2. É especialmente vedado aos condóminos:
a) Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do prédio;
b) Dar à fracção uso diverso do fim a que a mesma é destinada;
c) Praticar quaisquer actos ou actividades que estejam proibidos no título constitutivo.
3. O título constitutivo da propriedade horizontal, o regulamento e os órgãos do condomínio não podem impor limitações abusivas aos direitos dos condóminos, quanto às partes próprias ou comuns; consideram-se abusivas as limitações que não sejam justificadas pela especial destinação, localização ou características do prédio, ou por exigências de utilização comum ou convivência.
Os condóminos não gozam do direito de preferência na alienação de fracções nem do direito de pedir a divisão das partes comuns.
* Revogado - Consulte também: Lei n.º 14/2017
* Revogado - Consulte também: Lei n.º 14/2017
* Revogado - Consulte também: Lei n.º 18/2022
* Revogado - Consulte também: Lei n.º 14/2017
Usufruto é o direito de gozar temporária e plenamente uma coisa ou direito alheio, sem alterar a sua forma ou substância.
O usufruto pode ser constituído por contrato, testamento, usucapião ou disposição da lei.
O usufruto pode ser constituído em favor de uma ou mais pessoas, simultânea ou sucessivamente, contanto que existam ao tempo em que o direito do primeiro usufrutuário se torne efectivo.
Salvo estipulação em contrário, o usufruto constituído por contrato ou testamento em favor de várias pessoas conjuntamente só se consolida com a propriedade por morte da última que sobreviver.
1. Sem prejuízo do disposto nos dois artigos anteriores, o usufruto constituído a favor de pessoas singulares ou colectivas não pode ir além, respectivamente, da vida do usufrutuário ou da data da extinção da pessoa colectiva, salvo quando no título constitutivo se declare expressamente o contrário e se fixe um prazo determinado de duração do usufruto.
2. Sendo o usufruto constituído a favor de uma pessoa colectiva, com ou sem fixação de prazo, ou a favor de pessoa singular com fixação de prazo determinado e cláusula de não extinção pela morte do usufrutuário, a sua duração máxima nunca poderá exceder os 30 anos.
3. Para o usufruto oneroso relativo a bem imóvel não pode ser fixado prazo inferior a 2 anos, excepto tratando-se de usufruto estabelecido para fins especiais transitórios; considera-se não escrita a cláusula que estipule prazo inferior.
1. O usufruto considera-se gratuito, salvo quando conste expressamente o contrário do título constitutivo.
2. No acto de constituição do direito de usufruto, pode convencionar-se, a título de preço, que o usufrutuário pague uma única prestação ou pague certa prestação anual, durante a vigência do usufruto ou por um número de anos predeterminado não superior ao período da sua vigência.
3. As prestações são sempre em dinheiro.
1. Na falta de convenção sobre o tempo do pagamento, a prestação é paga no primeiro dia útil de cada ano, contado desde a data da constituição do usufruto.
2. Havendo mora no cumprimento, o proprietário tem o direito a uma indemnização igual a metade do que for devido; se o atraso exceder 45 dias, a indemnização é aumentada para o dobro.
3. Cessa o direito à indemnização, se o usufrutuário fizer cessar a mora no prazo de 15 dias a contar do seu começo.
4. À mora no cumprimento não pode ser aplicada a sanção prevista no artigo 333.º
5. Sendo dois ou mais os usufrutuários, ou sendo dois ou mais os proprietários, é aplicável ao pagamento da prestação anual o regime das obrigações solidárias, enquanto durar a comunhão.
1. O usufrutuário pode trespassar a outrem o seu direito, definitiva ou temporariamente, bem como onerá-lo, salvas as restrições impostas pelo título constitutivo ou pela lei.
2. O usufrutuário responde pelos danos que as coisas padecerem por culpa da pessoa que o substituir.
3. A duração do usufruto continua sujeita às regras que seriam aplicáveis caso não tivesse havido trespasse.
Os direitos e obrigações do usufrutuário são regulados pelo título constitutivo do usufruto; na falta ou insuficiência deste, devem observar-se as disposições seguintes.
O usufrutuário pode usar, fruir e administrar a coisa ou o direito como faria um bom pai de família, respeitando o seu destino económico.
O usufruto abrange as coisas acrescidas e todos os direitos inerentes à coisa usufruída.
1. O usufrutuário tem a faculdade de fazer na coisa usufruída as benfeitorias úteis e voluptuárias que bem lhe parecer, contanto que não altere a sua forma ou substância, nem o seu destino económico.
2. É aplicável ao usufrutuário, quanto a benfeitorias úteis e voluptuárias, o que neste Código se prescreve relativamente ao possuidor de boa fé.
1. O usufrutuário, ao começar o usufruto, não é obrigado a abonar ao proprietário despesa alguma feita; mas, findo o usufruto, o proprietário é obrigado a indemnizar aquele das despesas de cultura, sementes ou matérias-primas e, de um modo geral, de todas as despesas de produção feitas pelo usufrutuário, até ao valor dos frutos que vierem a ser colhidos.
2. Se o usufrutuário tiver alienado frutos antes da colheita e o usufruto se extinguir antes que sejam colhidos, a alienação subsiste, mas o produto dela pertence ao proprietário, deduzida a indemnização a que o número anterior se refere.
1. Quando o usufruto tiver por objecto coisas consumíveis, pode o usufrutuário servir-se delas ou aliená-las, mas é obrigado a restituir o seu valor, findo o usufruto, no caso de as coisas terem sido estimadas; se o não foram, a restituição é feita pela entrega de outras do mesmo género, qualidade ou quantidade, ou do valor destas na conjuntura em que findar o usufruto.
2. O usufruto de coisas consumíveis não importa transferência da propriedade para o usufrutuário.
1. Se o usufruto abranger coisas que, não sendo consumíveis, são, todavia, susceptíveis de se deteriorarem pelo uso, não é o usufrutuário obrigado a mais do que restituí-las no fim do usufruto como se encontrarem, a não ser que tenham sido deterioradas por uso diverso daquele que lhes era próprio ou por culpa do usufrutuário.
2. Se as não apresentar, o usufrutuário responde pelo valor que as coisas tinham na conjuntura em que começou o usufruto, salvo se provar que perderam todo o seu valor em uso legítimo.
Tendo o usufruto por objecto a exploração de pedreiras, o usufrutuário não pode abrir de novo pedreiras sem consentimento do proprietário; mas, se elas já estiverem em exploração ao começar o usufruto, tem o usufrutuário a faculdade de explorá-las, conformando-se com as praxes observadas pelo proprietário.
1. Relativamente à constituição de servidões activas, o usufrutuário goza dos mesmos direitos do proprietário, mas não lhe é lícito constituir encargos que ultrapassem a duração do usufruto.
2. O proprietário não pode constituir servidões sem consentimento do usufrutuário, desde que delas resulte diminuição do valor do usufruto.
1. Se o usufruto for constituído numa universalidade de animais, é o usufrutuário obrigado a substituir com as crias novas as cabeças que, por qualquer motivo, vierem a faltar.
2. Se os animais se perderem, na totalidade ou em parte, por caso fortuito, sem produzirem outros que os substituam, o usufrutuário é tão-somente obrigado a entregar as cabeças restantes.
3. Neste caso, porém, o usufrutuário é responsável pelo valor dos despojos dos animais, quando de tais despojos se tenha aproveitado.
O usufrutuário de rendas vitalícias tem direito a perceber as prestações correspondentes à duração do usufruto, sem ser obrigado a qualquer restituição.
1. O usufrutuário de capitais postos a juro ou a qualquer outro interesse, ou investidos em títulos de crédito, tem o direito de perceber os frutos correspondentes à duração do usufruto.
2. Não é lícito levantar ou investir capitais sem o acordo dos dois titulares; no caso de divergência, pode ser judicialmente suprido o consentimento, quer do proprietário, quer do usufrutuário.
1. Se o usufruto tiver por objecto certa quantia, e bem assim quando no decurso do usufruto sejam levantados capitais nos termos do artigo anterior, tem o usufrutuário a faculdade de administrar esses valores como bem lhe parecer, desde que preste a devida caução; neste caso, corre por sua conta o risco da perda da soma usufruída.
2. Se o usufrutuário não quiser usar desta faculdade, é aplicável o disposto no n.º 2 do artigo anterior.
O usufruto de títulos de crédito e de participações sociais está sujeito a legislação especial.
1. Antes de tomar conta dos bens, o usufrutuário deve:
a) Relacioná-los, com citação ou assistência do proprietário, declarando o estado deles, bem como o valor dos móveis, se os houver;
b) Prestar caução, se esta lhe for exigida, tanto para a restituição dos bens ou do respectivo valor, sendo bens consumíveis, como para a reparação das deteriorações que venham a padecer por sua culpa, ou para o pagamento de qualquer outra indemnização que seja devida.
2. A caução não é exigível do alienante com reserva de usufruto e pode ser dispensada no título constitutivo do usufruto.
1. Se o usufrutuário não prestar a caução devida, tem o proprietário a faculdade de exigir que os imóveis se arrendem ou ponham em administração, que os móveis se vendam ou lhe sejam entregues, que os capitais, bem como a importância dos preços das vendas, se dêem a juros ou se empreguem em títulos de crédito nominativos, que os títulos ao portador se convertam em nominativos ou se depositem nas mãos de terceiro, ou que se adoptem outras medidas adequadas.
2. Não havendo acordo do usufrutuário quanto ao destino dos bens, decidirá o tribunal.
1. O usufrutuário é obrigado a consentir ao proprietário quaisquer obras ou melhoramentos de que seja susceptível a coisa usufruída, e também quaisquer novas plantações, se o usufruto recair em prédios rústicos afectos a fins agrícolas, contanto que dos actos do proprietário não resulte diminuição do valor do usufruto.
2. Das obras ou melhoramentos realizados tem o usufrutuário direito ao usufruto, sem ser obrigado a pagar juros das somas desembolsadas pelo proprietário ou qualquer outra indemnização; no caso, porém, de as obras ou melhoramentos aumentarem o rendimento líquido da coisa usufruída, o aumento pertence ao proprietário.
1. Estão a cargo do usufrutuário tanto as reparações ordinárias indispensáveis para a conservação da coisa como as despesas de administração.
2. Não se consideram ordinárias as reparações que, no ano em que forem necessárias, excedam dois terços do rendimento líquido desse ano.
3. O usufrutuário pode eximir-se das reparações ou despesas a que é obrigado, renunciando ao usufruto.
1. Quanto às reparações extraordinárias, só incumbe ao usufrutuário avisar em tempo o proprietário para que este, querendo, as mande fazer; se, porém, elas se tiverem tornado necessárias por má administração do usufrutuário, é aplicável o disposto no artigo anterior.
2. Se o proprietário, depois de avisado, não fizer as reparações extraordinárias, e estas forem de utilidade real, pode o usufrutuário fazê-las a expensas suas e exigir a importância despendida, ou o pagamento do valor que tiverem no fim do usufruto, se este valor for inferior ao custo.
3. Se o proprietário fizer as reparações, deve observar-se o disposto no n.º 2 do artigo 1397.º
O pagamento dos impostos e quaisquer outros encargos anuais que incidam sobre o rendimento dos bens usufruídos incumbe a quem for titular do usufruto no momento do vencimento.
O usufrutuário é obrigado a avisar o proprietário de qualquer facto de terceiro, de que tenha notícia, sempre que ele possa lesar os direitos do proprietário; se o não fizer, responde pelos danos que este venha a sofrer.
1. O usufruto extingue-se:
a) Por morte ou extinção do usufrutuário, consoante se trate de pessoa singular ou colectiva, salvo no caso previsto na parte final do n.º 2 do artigo 1377.º;
b) Chegado o termo do prazo estabelecido pelas partes ou fixado na lei;
c) Pela reunião do usufruto e da propriedade na mesma pessoa;
d) Pelo seu não uso durante 15 anos, qualquer que seja o motivo;
e) Pela aquisição, por usucapião, da liberdade da coisa;
f) Pela perda total da coisa usufruída; ou
g) Pela renúncia.
2. A renúncia não requer aceitação do proprietário.
3. Extinguindo-se o usufruto por força da alínea c) ou g) do n.º 1, antes do seu termo normal, os direitos reais constituídos sobre o usufruto continuam a onerar o bem, como se não tivesse havido extinção, sem prejuízo da extinção destes direitos logo que se verifique qualquer das causas mencionadas nas alíneas a), b), e) ou f) do n.º 1.
1. Quando o usufrutuário faça mau uso da coisa usufruída, de modo a que o abuso se torne consideravelmente prejudicial ao proprietário, pode este:
a) Requerer em tribunal a extinção do usufruto;
b) Exigir que a coisa lhe seja entregue; ou
c) Exigir que se tomem as providências previstas no artigo 1396.º
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, o proprietário fica obrigado a pagar anualmente ao usufrutuário o produto líquido da coisa, depois de deduzidas as despesas e o prémio que pela sua administração lhe for arbitrado.
3. Os credores do usufrutuário podem intervir no processo de modo a conservarem os seus direitos, podendo, para o efeito, responsabilizar-se pelos danos e oferecer caução suficiente.
4. O juiz, atendendo à gravidade da ofensa e aos prejuízos causados, determinará a medida mais ajustada.
O usufruto concedido a alguém até certa idade de terceira pessoa durará pelos anos prefixos, ainda que o terceiro faleça antes da idade referida, excepto se o usufruto tiver sido concedido só em atenção à existência de tal pessoa.
1. A aquisição, por usucapião, da liberdade da coisa só pode dar-se quando haja, por parte do proprietário, oposição ao exercício do usufruto.
2. O prazo para a usucapião só começa a contar-se desde a oposição.
1. Se a coisa ou direito usufruído se perder só em parte, continua o usufruto na parte restante.
2. O disposto no número anterior é aplicável no caso de a coisa se transformar noutra que ainda tenha valor, embora com finalidade económica distinta.
1. Se o usufruto for constituído em algum prédio urbano e este for destruído por qualquer causa, tem o usufrutuário direito a desfrutar o solo e os materiais restantes.
2. O proprietário da raiz pode, porém, reconstruir o prédio, ocupando o solo e os materiais, desde que pague ao usufrutuário, durante o usufruto, os juros correspondentes ao valor do mesmo solo e dos materiais.
3. As disposições dos números anteriores são igualmente aplicáveis se o usufruto for constituído em algum prédio rústico de que faça parte o edifício destruído.
1. Se a coisa ou direito usufruído se perder, deteriorar ou diminuir de valor, e o proprietário tiver direito a ser indemnizado, o usufruto passa a incidir sobre a indemnização.
2. O disposto no número anterior é aplicável à indemnização resultante de expropriação ou requisição da coisa ou direito, à indemnização devida por extinção do direito de superfície e a outros casos análogos.
1. Se o usufrutuário tiver feito o seguro da coisa ou pago os prémios pelo seguro já feito, o usufruto transfere-se para a indemnização devida pelo segurador.
2. Tratando-se de um edifício, o proprietário pode reconstruí-lo, transferindo-se, neste caso, o usufruto para o novo edifício; se, porém, a soma despendida na reconstrução for superior à indemnização recebida, o direito do usufrutuário será proporcional à indemnização.
3. Sendo os prémios pagos pelo proprietário, a este pertence por inteiro a indemnização que for devida.
Findo o usufruto, deve o usufrutuário restituir a coisa ao proprietário, sem prejuízo do disposto para as coisas consumíveis e salvo o direito de retenção nos casos em que possa ser invocado.
1. O direito de uso consiste na faculdade de se servir de certa coisa alheia e haver os respectivos frutos, na medida das necessidades, quer do titular, quer da sua família.
2. Quando este direito se refere a casas de morada, chama-se direito de habitação.
1. Os direitos de uso e de habitação constituem-se e extinguem-se pelos mesmos modos que o usufruto, sem prejuízo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 1218.º e no número seguinte.
2. Os direitos de uso e de habitação não se podem prolongar para além da vida do beneficiário ou beneficiários.
3. Os direitos de uso e habitação são regulados pelo seu título constitutivo; na falta ou insuficiência deste, devem observar-se as disposições seguintes.
1. Na família do usuário ou do morador usuário compreendem-se apenas o cônjuge, os filhos a seu cargo e outros parentes a quem sejam devidos alimentos.
2. Para estes efeitos, é equiparado aos familiares o unido de facto, bem como as pessoas que, convivendo com o titular do direito, se encontrem ao seu serviço ou ao serviço das pessoas designadas neste artigo.
O usuário e o morador usuário não podem trespassar ou locar o seu direito, nem onerá-lo por qualquer modo.
1. Se o usuário consumir todos os frutos do prédio ou ocupar todo o edifício, ficam a seu cargo as reparações ordinárias, as despesas de administração e os impostos e encargos anuais, como se fosse usufrutuário.
2. Se o usuário perceber só parte dos frutos ou ocupar só parte do edifício, deve contribuir para as despesas mencionadas no número precedente em proporção da sua fruição.
São aplicados aos direitos de uso e de habitação as disposições que regulam o usufruto, quando conformes à natureza daqueles direitos.
O direito de superfície consiste na faculdade de construir ou manter, perpétua ou temporariamente, uma obra em terreno alheio.
1. O direito de superfície pode abranger uma parte do solo não necessária à implantação da construção, desde que ela tenha utilidade para o uso da obra.
2. O direito de superfície pode ter por objecto a construção ou a manutenção de obra quer no solo quer no subsolo.
1. O direito de superfície pode ter por objecto a construção de edifício ou conjunto de edifícios em regime de propriedade horizontal, contanto que se preencham as condições próprias para a constituição deste direito.
2. Neste caso, o direito de superfície tem de ser constituído com carácter perpétuo e não pode ser sujeito à estipulação prevista no n.º 2 do artigo 1427.º
3. Efectuada a construção, aplica-se às relações entre os condóminos e entre estes e terceiros o regime da propriedade horizontal, sendo, no entanto, nas relações entre condóminos e proprietário do solo aplicável o regime do direito de superfície, com as especificidades constantes do número anterior.
4. Sendo devida uma prestação anual ao dono do solo, compete à administração do condomínio cobrar de cada condómino a parte correspondente à sua fracção autónoma e proceder ao seu pagamento.
O direito de construir sobre edifício alheio está sujeito, com as necessárias adaptações, ao disposto no artigo anterior, e, em geral, às disposições deste título.
O direito de superfície pode ser constituído por contrato, testamento ou usucapião, e pode resultar da alienação de obra já existente, separadamente da propriedade do solo.
1. A constituição do direito de superfície importa a constituição das servidões necessárias ao uso e fruição da obra; se no título não forem designados o local e as demais condições de exercício das servidões, serão fixados, na falta de acordo, pelo tribunal.
2. A constituição coerciva da servidão de passagem sobre prédio de terceiro só é possível se, à data da constituição do direito de superfície, já era encravado o prédio sobre que este direito recaía.
1. No acto de constituição do direito de superfície pode convencionar-se, a título de preço, que o superficiário pague uma única prestação ou pague certa prestação anual, perpétua ou temporária.
2. O pagamento temporário de uma prestação anual é compatível com a constituição perpétua do direito de superfície.
3. As prestações são sempre em dinheiro.
1. Ao pagamento das prestações anuais é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos n.os 1 a 4 do artigo 1379.º
2. Sendo dois ou mais os superficiários, exceptuados os casos referidos nos artigos 1419.º e 1420.º, ou sendo dois ou mais os proprietários do solo, é aplicável ao pagamento da prestação anual o regime das obrigações solidárias, enquanto durar a comunhão.
1. Enquanto não se iniciar a construção da obra, o uso e fruição de todo o prédio pertencem ao proprietário do solo, o qual, todavia, não pode impedir nem tornar mais onerosa a construção.
2. Mesmo após a construção, o uso e fruição do subsolo ou do solo pertencem ao proprietário, consoante o direito de superfície haja sido constituído para construção no solo ou no subsolo; o proprietário é, porém, responsável pelos prejuízos causados ao superficiário em consequência da exploração que fizer.
O direito de superfície e o direito de propriedade do solo são transmissíveis por acto entre vivos ou por morte.
1. O direito de superfície extingue-se:
a) Se o superficiário não concluir a obra dentro do prazo fixado ou, na falta de fixação, dentro do prazo de 7 anos;
b) Se, destruída a obra, o superficiário não reconstruir a obra, dentro dos mesmos prazos a contar da destruição;
c) Pelo decurso do prazo, sendo constituído por certo tempo;
d) Pela reunião na mesma pessoa do direito de superfície e do direito de propriedade;
e) Pela aquisição, por usucapião, da liberdade do prédio;
f) Pelo desaparecimento ou inutilização do solo; ou
g) Pela expropriação por utilidade pública.
2. No título constitutivo pode também estipular-se a extinção do direito de superfície em consequência da destruição da obra, ou da verificação de qualquer condição resolutiva.
3. À extinção do direito de superfície nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 são aplicáveis as regras da prescrição.
4. À extinção do direito de superfície no caso previsto na alínea e) do n.º 1 é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 1405.º
1. A falta de pagamento das prestações anuais durante 15 anos extingue a obrigação de as pagar, mas o superficiário não adquire a propriedade do solo, salvo se houver usucapião em seu benefício.
2. À extinção da obrigação de pagamento das prestações são aplicáveis as regras da prescrição.
1. Sendo o direito de superfície constituído por certo tempo, o proprietário do solo, logo que expire o prazo, adquire a propriedade da obra.
2. Salvo estipulação em contrário, o superficiário tem, nesse caso, direito a uma indemnização, calculada segundo as regras do enriquecimento sem causa.
3. O superficiário responde pelas deteriorações que haja causado dolosamente na obra e, não havendo lugar a qualquer indemnização pela restituição da obra, igualmente pelas que haja causado culposamente.
1. A extinção do direito de superfície pelo decurso do prazo fixado importa a extinção dos direitos reais de gozo ou de garantia constituídos pelo superficiário em benefício de terceiro.
2. Se, porém, o superficiário tiver a receber alguma indemnização nos termos do artigo anterior, aqueles direitos transferem-se para a indemnização, conforme o disposto nos lugares respectivos.
Os direitos reais constituídos pelo proprietário sobre o solo estendem-se à obra adquirida nos termos do artigo 1429.º
Extinguindo-se o direito de superfície perpétuo, ou o temporário antes do decurso do prazo, os direitos reais constituídos sobre a superfície ou sobre o solo continuam a onerar separadamente as duas parcelas, como se não tivesse havido extinção, sem prejuízo da aplicação das disposições dos artigos anteriores logo que o prazo decorra.
Extinguindo-se o direito de superfície em consequência de expropriação por utilidade pública, cabe a cada um dos titulares a parte da indemnização que corresponder ao valor do respectivo direito.
Servidão predial é o encargo imposto num prédio em proveito exclusivo de outro prédio, ainda que pertencente ao mesmo dono; diz-se serviente o prédio sujeito à servidão e dominante o que dela beneficia.
Podem ser objecto da servidão quaisquer utilidades, ainda que futuras ou eventuais, susceptíveis de ser gozadas por intermédio do prédio dominante, mesmo que não aumentem o seu valor.
1. Salvas as excepções previstas na lei, as servidões não podem ser separadas dos prédios a que pertencem, activa ou passivamente.
2. A afectação das utilidades próprias da servidão a outros prédios importa sempre a constituição de uma servidão nova e a extinção da antiga.
As servidões são indivisíveis: se o prédio serviente for dividido entre vários donos, cada porção fica sujeita à parte da servidão que lhe cabia; se for dividido o prédio dominante, tem cada consorte o direito de usar da servidão sem alteração nem mudança.
1. As servidões prediais podem ser constituídas por contrato, testamento, usucapião ou destinação do pai de família.
2. As servidões legais previstas neste Código, na falta de constituição voluntária, podem ser constituídas por sentença judicial.
1. As servidões não aparentes não podem ser constituídas por usucapião, salvo quando a posse seja titulada, fundando-se em título provindo do proprietário do prédio serviente.
2. Consideram-se não aparentes as servidões que não se revelam por sinais visíveis e permanentes.
Se em dois prédios do mesmo dono, ou em duas fracções de um só prédio, houver sinal ou sinais visíveis e permanentes, postos em um ou em ambos, que revelem serventia de um para com outro, são esses sinais havidos como prova da servidão quando, em relação ao domínio, os dois prédios, ou as duas fracções do mesmo prédio, vierem a separar-se por divisão de coisa comum entre os consortes ou por partilha, salvo se ao tempo da separação outra coisa se houver declarado no respectivo documento ou decisão judicial.
1. Os proprietários de prédios que não tenham comunicação com a via pública, nem condições que permitam estabelecê-la sem excessivo incómodo ou dispêndio, têm a faculdade de exigir a constituição de servidões de passagem sobre os prédios rústicos vizinhos, ou, na sua falta, sobre os terrenos que sirvam de logradouro aos prédios urbanos vizinhos.
2. De igual faculdade goza o proprietário que tenha comunicação insuficiente com a via pública, por terreno seu ou alheio.
1. Os proprietários de prédios rústicos murados, bem como os proprietários de prédios urbanos, podem subtrair-se ao encargo de ceder passagem, adquirindo o prédio encravado pelo seu justo valor.
2. Na falta de acordo, o preço é fixado judicialmente; sendo dois ou mais os proprietários interessados, abre-se licitação entre eles, revertendo o excesso para o alienante.
1. O proprietário que, sem justo motivo, provocar o encrave absoluto ou relativo do prédio só pode constituir a servidão mediante o pagamento de indemnização agravada.
2. A indemnização agravada é fixada, de harmonia com a culpa do proprietário, até ao triplo da que normalmente seria devida.
A passagem deve ser concedida através do prédio ou prédios que sofram menor prejuízo, e pelo modo e lugar menos inconvenientes para os prédios onerados.
Pela constituição da servidão de passagem é devida a indemnização correspondente ao prejuízo sofrido.
1. O proprietário de prédio onerado com a servidão legal de passagem, qualquer que tenha sido o título constitutivo, tem direito de preferência, no caso de venda ou dação em cumprimento do prédio dominante.
2. É aplicável a este caso o disposto nos artigos 410.º a 412.º e 1309.º
3. Sendo dois ou mais os preferentes, abre-se entre eles licitação, revertendo o excesso para o alienante.
Os proprietários e os donos de empresas industriais, que tenham direito ao uso de águas particulares existentes em prédio alheio, indicadas nos artigos 1288.º e 1289.º, podem fazer neste prédio as obras necessárias ao represamento e derivação da respectiva água, mediante o pagamento da indemnização correspondente ao prejuízo que causarem.
1. Em proveito da agricultura ou da indústria, ou para gastos domésticos, a todos é permitido encanar, subterraneamente ou a descoberto, as águas indicadas nos artigos 1288.º e 1289.º a que tenham direito, através de prédios rústicos alheios, não sendo quintais, jardins ou terreiros contíguos a casas de habitação, mediante indemnização do prejuízo que da obra resulte para os ditos prédios; os prédios rústicos murados só estão sujeitos ao encargo quando o aqueduto seja construído subterraneamente.
2. O proprietário do prédio serviente tem, a todo o tempo, o direito de ser também indemnizado do prejuízo que venha a resultar da infiltração ou erupção das águas ou da deterioração das obras feitas para a sua condução.
3. A natureza, direcção e forma do aqueduto devem ser as mais convenientes para o prédio dominante e as menos onerosas para o prédio serviente.
4. Se a água do aqueduto não for toda necessária ao seu proprietário, e o proprietário do prédio serviente quiser ter parte no excedente, é-lhe concedida essa parte a todo o tempo, mediante prévia indemnização, e pagando ele, além disso, a quota proporcional à despesa feita com a sua condução até ao ponto donde pretende derivá-la.
1. A constituição forçada da servidão de escoamento de águas indicadas nos artigos 1288.º e 1289.º é permitida precedendo indemnização do prejuízo:
a) Quando, por obra do homem, e para fins agrícolas ou industriais, nasçam águas em algum prédio ou para ele sejam conduzidas de outro prédio;
b) Quando se pretenda dar direcção definida a águas que seguiam o seu curso natural; ou
c) Em relação às águas provenientes de qualquer modo de enxugo de prédios.
2. Aos proprietários onerados com a servidão de escoamento é aplicável o disposto no artigo 1293.º
3. Na liquidação da indemnização deve ser levado em conta o valor dos benefícios que para o prédio serviente advenham do uso da água, nos termos do número anterior; e, no caso da alínea b) do n.º 1, deve ser atendido o prejuízo que já resultava do decurso natural das águas.
4. Só estão sujeitos à servidão de escoamento os prédios que podem ser onerados com a servidão legal de aqueduto.
As servidões são reguladas, no que respeita à sua extensão e exercício, pelo respectivo título; na insuficiência do título, deve observar-se o disposto nos artigos seguintes.
1. O direito de servidão compreende tudo o que é necessário para o seu uso e conservação.
2. Em caso de dúvida quanto à extensão ou modo de exercício, entende-se constituída a servidão por forma a satisfazer as necessidades normais e previsíveis do prédio dominante com o menor prejuízo para o prédio serviente.
1. É lícito ao proprietário do prédio dominante fazer obras no prédio serviente, dentro dos poderes que lhe são conferidos no artigo anterior, desde que não torne mais onerosa a servidão.
2. As obras devem ser feitas no tempo e pela forma que sejam mais convenientes para o proprietário do prédio serviente.
1. As obras são feitas à custa do proprietário do prédio dominante, salvo se outro regime tiver sido convencionado.
2. Sendo diversos os prédios dominantes, todos os proprietários são obrigados a contribuir, na proporção da parte que tiverem nas vantagens da servidão, para as despesas das obras; e só poderão eximir-se do encargo renunciando à servidão em proveito dos outros.
3. Se o proprietário do prédio serviente também auferir utilidades da servidão, é obrigado a contribuir pela forma estabelecida no número anterior.
4. Se o proprietário do prédio serviente se houver obrigado a custear as obras, só lhe será possível eximir-se desse encargo pela renúncia ao seu direito de propriedade em benefício do proprietário do prédio dominante, podendo a renúncia, no caso de a servidão onerar apenas uma parte do prédio, limitar-se a essa parte; recusando-se o proprietário do prédio dominante a aceitar a renúncia, não fica, por isso, dispensado de custear as obras.
1. O proprietário do prédio serviente não pode estorvar o uso da servidão, mas pode, a todo o tempo, exigir a mudança dela para sítio diferente do primitivamente assinado, ou para outro prédio, se a mudança lhe for conveniente e não prejudicar os interesses do proprietário do prédio dominante, contanto que a faça à sua custa; com o consentimento de terceiro pode a servidão ser mudada para o prédio deste.
2. A mudança também pode dar-se a requerimento e à custa do proprietário do prédio dominante, se dela lhe advierem vantagens e com ela não for prejudicado o proprietário do prédio serviente.
3. O modo e o tempo de exercício da servidão são igualmente alterados, a pedido de qualquer dos proprietários, desde que se verifiquem os requisitos referidos nos números anteriores.
4. As faculdades conferidas neste artigo não são renunciáveis nem podem ser limitadas por negócio jurídico.
1. As servidões extinguem-se:
a) Pelo não uso durante 15 anos, qualquer que seja o motivo;
b) Pela aquisição, por usucapião, da liberdade do prédio;
c) Pela renúncia; ou
d) Pelo decurso do prazo, se tiverem sido constituídas temporariamente.
2. As servidões constituídas por usucapião são judicialmente declaradas extintas, a requerimento do proprietário do prédio serviente, desde que se mostrem desnecessárias ao prédio dominante.
3. O disposto no número anterior é aplicável às servidões legais, qualquer que tenha sido o título da sua constituição; tendo havido indemnização, é esta restituída, no todo ou em parte, conforme as circunstâncias.
4. À extinção das servidões no caso previsto na alínea b) do n.º 1 é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 1405.º
5. A renúncia a que se refere a alínea c) do n.º 1 não requer aceitação do proprietário do prédio serviente; contudo, se for efectuada antes do decurso do prazo, os titulares de direitos reais menores que onerem o prédio continuam a beneficiar da servidão até ao seu termo normal, como se não tivesse havido extinção.
1. O prazo para a extinção das servidões pelo não uso conta-se a partir do momento em que deixaram de ser usadas; tratando-se de servidões para cujo exercício não é necessário o facto do homem, o prazo corre desde a verificação de algum facto que impeça o seu exercício.
2. Nas servidões exercidas com intervalos de tempo, o prazo corre desde o dia em que poderiam exercer-se e não foi retomado o seu exercício.
3. Se o prédio dominante pertencer a vários proprietários, o uso que um deles fizer da servidão impede a extinção relativamente aos demais.
A impossibilidade de exercer a servidão não importa a sua extinção, enquanto não decorrer o prazo da alínea a) do n.º 1 do artigo 1455.º
A servidão não deixa de considerar-se exercida por inteiro, quando o proprietário do prédio dominante aproveite apenas uma parte das utilidades que lhe são inerentes.
O exercício da servidão em época diferente da fixada no título não impede a sua extinção pelo não uso, sem prejuízo da possibilidade de aquisição de uma nova servidão por usucapião.
As servidões activas constituídas pelo usufrutuário não se extinguem pela cessação do usufruto.
São fontes das relações jurídicas familiares o casamento, o parentesco, a afinidade e a adopção.
Casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições deste Código.
Parentesco é o vínculo que une duas pessoas, em consequência de uma delas descender da outra ou de ambas procederem de um progenitor comum.
O parentesco determina-se pelas gerações que vinculam os parentes um ao outro: cada geração forma um grau, e a série dos graus constitui a linha de parentesco.
1. A linha diz-se recta, quando um dos parentes descende do outro; diz-se colateral, quando nenhum dos parentes descende do outro, mas ambos procedem de um progenitor comum.
2. A linha recta é descendente ou ascendente: descendente, quando se considera como partindo do ascendente para o que dele procede; ascendente, quando se considera como partindo deste para o progenitor.
1. Na linha recta há tantos graus quantas as pessoas que formam a linha de parentesco, excluindo o progenitor.
2. Na linha colateral os graus contam-se pela mesma forma, subindo por um dos ramos e descendo pelo outro, mas sem contar o progenitor comum.
Salvo disposição da lei em contrário, os efeitos do parentesco produzem-se em qualquer grau na linha recta e até ao quarto grau na colateral.
Afinidade é o vínculo que liga cada um dos cônjuges aos parentes do outro.
1. A afinidade determina-se pelos mesmos graus e linhas que definem o parentesco.
2. A afinidade não cessa pela dissolução do casamento por morte, mas cessa pelo divórcio.
Adopção é o vínculo que, à semelhança da filiação natural, mas independentemente dos laços do sangue, se estabelece legalmente entre duas pessoas nos termos dos artigos 1825.º e seguintes.
União de facto é a relação havida entre duas pessoas que vivem voluntariamente em condições análogas às dos cônjuges.
1. Salvo disposição legal em contrário, só se considera relevante para os efeitos estabelecidos no presente Código a união de facto de pessoas que:
a) Sejam maiores de 18 anos;
b) Não se encontrem em qualquer das condições referidas nas alíneas b) e c) do artigo 1479.º e no artigo 1480.º; e
c) Vivam na situação descrita no artigo anterior há, pelo menos, 2 anos.
2. Na contagem do tempo da vida em união de facto observar-se-ão as seguintes regras:
a) Se a coabitação se tiver iniciado durante a menoridade de um ou de ambos os unidos de facto, o prazo só se conta a partir da data em que a mais jovem tenha atingido a maioridade;
b) Se qualquer dos unidos de facto tiver sido casado, o prazo só se conta a partir da separação de facto.
O contrato pelo qual duas pessoas de sexo diferente se comprometem a contrair matrimónio não dá direito a exigir a celebração do casamento, nem a reclamar, na falta de cumprimento, quaisquer sanções ou outras indemnizações que não sejam as previstas no artigo 1476.º, mesmo quando resultantes de cláusula penal.
1. No caso de o casamento deixar de celebrar-se por incapacidade ou retractação de algum dos promitentes, cada um deles é obrigado a restituir os donativos que o outro ou terceiro lhe tenha feito em virtude da promessa e na expectativa do casamento, segundo os termos prescritos para a nulidade ou anulabilidade dos negócios jurídicos.
2. A obrigação de restituir abrange as cartas e retratos pessoais do outro contraente, mas não as coisas que hajam sido consumidas antes da retractação ou da verificação da incapacidade.
1. Se o casamento não se efectuar em razão da morte de algum dos promitentes, o promitente sobrevivo pode conservar os donativos do falecido, mas, nesse caso, perde o direito de exigir os que, por sua parte, lhe tenha feito.
2. O mesmo promitente pode reter a correspondência e os retratos pessoais do falecido e exigir a restituição dos que este haja recebido da sua parte.
1. Se algum dos contraentes romper a promessa sem justo motivo ou, por culpa sua, der lugar a que o outro se retracte, deve indemnizar o esposado inocente, bem como os pais deste ou terceiros, quer das despesas feitas, quer das obrigações contraídas na previsão do casamento.
2. Igual indemnização é devida, quando o casamento não se realize por motivo de incapacidade de algum dos contraentes, se ele ou os seus representantes houverem procedido com dolo.
3. A indemnização é fixada segundo o prudente arbítrio do tribunal, devendo atender-se, no seu cálculo, não só à medida em que as despesas e obrigações se mostrem razoáveis, perante as circunstâncias do caso e a condição dos contraentes, mas também às vantagens que, independentemente do casamento, umas e outras possam ainda proporcionar.
O direito de exigir a restituição dos donativos ou a indemnização caduca no prazo de 1 ano, contado da data do rompimento da promessa ou da morte do promitente.
Têm capacidade para contrair casamento todos aqueles em quem se não verifique algum dos impedimentos matrimoniais previstos na lei.
São impedimentos dirimentes, obstando ao casamento da pessoa a quem respeitam com qualquer outra:
a) A idade inferior a 16 anos;
b) A demência notória, mesmo durante os intervalos lúcidos, e a interdição ou inabilitação por anomalia psíquica;
c) O casamento anterior não dissolvido, ainda que o respectivo assento não tenha sido lavrado no registo do estado civil.
São também impedimentos dirimentes, obstando ao casamento entre si das pessoas a quem respeitam, o parentesco na linha recta e o parentesco no segundo grau da linha colateral.
1. A prova da maternidade ou paternidade para efeitos do disposto no artigo precedente é sempre admitida no processo de casamento, mas o reconhecimento do parentesco, quer neste processo, quer na acção de anulação do casamento, não produz qualquer outro efeito, e não vale sequer como começo de prova em acção de investigação de maternidade ou paternidade.
2. Fica salvo o recurso aos meios ordinários para o efeito de se fazer declarar a inexistência do impedimento em acção proposta contra as pessoas que teriam legitimidade para requerer a anulação do casamento, com base no impedimento reconhecido.
São impedimentos impedientes, além de outros designados em leis especiais:
a) A falta de autorização dos pais ou do tutor para o casamento do nubente menor, quando não suprida judicialmente;
b) O vínculo de tutela, curatela ou administração legal de bens relativamente a menores, interditos ou inabilitados.
O vínculo de tutela, curatela ou administração legal de bens impede o casamento do menor, interdito ou inabilitado com o tutor, curador ou administrador, ou seus parentes ou afins na linha recta, irmãos, cunhados ou sobrinhos, enquanto não tiver decorrido 1 ano sobre o termo da incapacidade e não estiverem aprovadas as respectivas contas, se houver lugar a elas.
1. Contanto que as contas estejam aprovadas ou que se trate de casamento com os parentes ou afins referidos no artigo anterior, o impedimento aí referido pode ser dispensado pelo tribunal, quando haja motivos sérios que justifiquem a celebração do casamento.
2. Se algum dos nubentes for menor, o tribunal ouvirá, sempre que possível, os pais ou o tutor.
O processo de casamento inicia-se com o requerimento para casamento nos termos das leis do registo civil.
1. Até ao momento da celebração do casamento, qualquer pessoa pode declarar os impedimentos de que tenha conhecimento.
2. A declaração é obrigatória para o Ministério Público e para quem tenha competência funcional para celebrar o casamento logo que tenham conhecimento do impedimento.
3. Se, no prazo de 5 dias a contar da declaração, o impedimento não for suficientemente provado por meio de prova documental, o casamento poderá ser celebrado ainda assim, desde que os nubentes declarem, sob compromisso de honra, a inexistência de quaisquer impedimentos.
4. Neste caso, quem tenha competência funcional para celebrar o casamento deverá requerer ao Ministério Público que promova a averiguação da existência do impedimento, a fim de serem tomadas as providências que no caso couberem.
5. Fora a situação prevista no n.º 3, uma vez efectuada a declaração o casamento só será celebrado se o impedimento cessar, for dispensado ou for julgado improcedente por decisão judicial com trânsito em julgado.
1. A autorização para o casamento de menor de 18 anos e maior de 16 deve ser concedida pelos progenitores que exerçam o poder paternal, ou pelo tutor.
2. Pode o tribunal suprir a autorização a que se refere o número anterior, se razões ponderosas justificarem a celebração do casamento e o menor tiver suficiente maturidade física e psíquica.
Podendo o casamento ser realizado, cabe ao funcionário do registo civil proferir despacho, no qual autorizará os nubentes a celebrar o casamento.
Autorizada a realização do casamento, este deve celebrar-se dentro dos 90 dias seguintes.
A celebração do casamento é pública e está sujeita às solenidades fixadas nas leis do registo civil.
É indispensável para a celebração do casamento a presença:
a) Dos contraentes, ou de um deles e do procurador do outro;
b) De quem tenha competência funcional para o acto, nos termos das leis do registo civil; e
c) De duas testemunhas, sempre que exigida nas leis do registo civil.
A vontade dos nubentes só é relevante quando manifestada no próprio acto da celebração do casamento.
1. A vontade de contrair casamento importa aceitação de todos os efeitos legais do matrimónio, sem prejuízo das legítimas estipulações dos esposos em convenção matrimonial.
2. Consideram-se não escritas as cláusulas pelas quais os nubentes, em convenção matrimonial, no momento da celebração do casamento ou em outro acto, pretendam modificar os efeitos do casamento, ou submetê-lo a condição, a termo ou à preexistência de algum facto.
A vontade de contrair casamento é estritamente pessoal em relação a cada um dos nubentes.
1. É lícito a um dos nubentes fazer-se representar por procurador na celebração do casamento.
2. A procuração deve conter poderes especiais para o acto e a designação expressa do outro nubente.
1. Cessam todos os efeitos da procuração pela revogação dela, pela morte do constituinte ou do procurador, ou pela interdição ou inabilitação de qualquer deles em consequência de anomalia psíquica.
2. O constituinte pode revogar a todo o tempo a procuração, mas é responsável pelo prejuízo que causar se, por culpa sua, o não fizer a tempo de evitar a celebração do casamento.
1. Quando haja fundado receio de morte próxima de algum dos nubentes, ou iminência de parto, é permitida a celebração do casamento independentemente do processo de casamento e sem a intervenção da pessoa a quem a lei atribua competência funcional para o acto.
2. Do casamento urgente é lavrado, oficiosamente, um assento provisório.
3. O funcionário do registo civil é obrigado a lavrar o assento provisório, desde que lhe seja apresentada, para esse fim, a acta do casamento urgente, nas condições prescritas nas leis do registo civil.
Lavrado o assento provisório, o funcionário decide se o casamento deve ser homologado.
1. O casamento não pode ser homologado:
a) Se não se verificarem os requisitos exigidos por lei, ou não tiverem sido observadas as formalidades prescritas para a celebração do casamento urgente e para a realização do respectivo assento provisório;
b) Se houver indícios sérios de serem supostos ou falsos esses requisitos ou formalidades; ou
c) Se existir algum impedimento dirimente.
2. Se o casamento não for homologado, o assento provisório é cancelado.
3. Do despacho que recusar a homologação podem os cônjuges ou seus herdeiros, bem como o Ministério Público, recorrer para o tribunal, a fim de ser declarada a validade do casamento.
É válido o casamento relativamente ao qual não se verifique alguma das causas de inexistência jurídica ou de anulabilidade especificadas na lei.
É juridicamente inexistente:
a) O casamento celebrado perante quem não tinha competência funcional para o acto, salvo tratando-se de casamento urgente;
b) O casamento urgente que não tenha sido homologado;
c) O casamento em cuja celebração tenha faltado a declaração de vontade de um ou ambos os nubentes, ou do procurador de um deles;
d) O casamento contraído por intermédio de procurador, quando celebrado depois de terem cessado os efeitos da procuração, ou quando esta não tenha sido outorgada por quem nela figura como constituinte, ou quando seja nula por falta de concessão de poderes especiais para o acto ou de designação expressa do outro contraente;
e) O casamento contraído por duas pessoas do mesmo sexo.
Não se considera, porém, juridicamente inexistente o casamento celebrado perante quem, sem ter competência funcional para o acto, exercia publicamente as correspondentes funções de funcionário do registo civil, salvo se ambos os nubentes, no momento da celebração, conheciam a falta daquela competência.
1. O casamento juridicamente inexistente não produz qualquer efeito jurídico e nem sequer é havido como putativo.
2. A inexistência pode ser invocada por qualquer pessoa, a todo o tempo, independentemente de declaração judicial.
É anulável o casamento:
a) Contraído com algum impedimento dirimente;
b) Celebrado, por parte de um ou de ambos os nubentes, com falta de vontade ou com vontade viciada por erro ou coacção; ou
c) Celebrado sem a presença das testemunhas, quando exigida por lei.
A anulabilidade do casamento não é invocável para nenhum efeito, judicial ou extrajudicial, enquanto não for reconhecida por sentença em acção especialmente intentada para esse fim.
1. Considera-se sanada a anulabilidade, e válido o casamento desde o momento da celebração, se antes de transitar em julgado a sentença de anulação ocorrer algum dos seguintes factos:
a) Ser o casamento de menor não núbil confirmado por este depois de atingir a maioridade;
b) Ser o casamento do interdito ou inabilitado por anomalia psíquica confirmado por ele depois de lhe ser levantada a interdição ou inabilitação ou, tratando-se de demência notória, depois de o demente fazer verificar judicialmente o seu estado de sanidade mental;
c) Ser anulado o primeiro casamento do bígamo;
d) Ser a falta de testemunhas devida a circunstâncias atendíveis, como tais reconhecidas pelo juiz, desde que não haja dúvidas sobre a celebração do acto.
2. O disposto no número anterior não prejudica a aplicação do regime do artigo 281.º para as demais causas de anulabilidade do casamento, com excepção da simulação.
3. A confirmação, nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 e no número anterior, é feita perante o funcionário do registo civil e, quando exigida por lei, na presença de duas testemunhas.
4. Não é aplicável ao casamento o disposto no n.º 2 do artigo 280.º
A declaração da vontade, no acto da celebração, constitui presunção não só de que os nubentes quiseram contrair o matrimónio, mas também de que a sua vontade não está viciada por erro ou coacção.
O casamento é anulável por falta de vontade:
a) Quando o nubente, no momento da celebração, não tinha a consciência do acto que praticava, por incapacidade acidental ou outra causa;
b) Quando o nubente estava em erro acerca da identidade física do outro contraente;
c) Quando a declaração da vontade tenha sido extorquida por coacção física; ou
d) Quando tenha sido simulado.
O erro que vicia a vontade só é relevante para efeitos de anulação quando recaia sobre qualidades essenciais da pessoa do outro cônjuge, seja desculpável e se mostre que sem ele, razoavelmente, o casamento não teria sido celebrado.
1. É anulável o casamento celebrado sob coacção moral, contanto que seja grave o mal com que o nubente é ilicitamente ameaçado, e justificado o receio da sua consumação.
2. É equiparada à ameaça ilícita o facto de alguém, consciente e ilicitamente, extorquir ao nubente a declaração da vontade mediante a promessa de o libertar de um mal fortuito ou causado por outrem.
1. Têm legitimidade para intentar a acção de anulação fundada em impedimento dirimente, ou para prosseguir nela, os cônjuges, os seus parentes, afins na linha recta ou herdeiros, e o Ministério Público.
2. Além das pessoas mencionadas no número anterior, podem ainda intentar a acção, ou prosseguir nela, o tutor ou curador, no caso de menoridade, interdição ou inabilitação por anomalia psíquica, e o primeiro cônjuge do infractor, no caso de bigamia.
1. A anulação por simulação pode ser requerida pelos próprios cônjuges ou por quaisquer pessoas prejudicadas com o casamento.
2. Nos restantes casos de falta de vontade, a acção de anulação só pode ser proposta pelo cônjuge cuja vontade faltou; mas podem prosseguir nela os seus parentes, afins na linha recta ou herdeiros, se o autor falecer na pendência da causa.
A acção de anulação fundada em vícios da vontade só pode ser intentada pelo cônjuge que foi vítima do erro ou da coacção; mas podem prosseguir na acção os seus parentes, afins na linha recta ou herdeiros, se o autor falecer na pendência da causa.
A acção de anulação por falta de testemunhas só pode ser proposta pelo Ministério Público.
1. A acção de anulação fundada em impedimento dirimente deve ser instaurada:
a) Nos casos de menoridade, interdição ou inabilitação por anomalia psíquica ou demência notória, quando proposta pelo próprio incapaz ou demente, até 6 meses depois de ter atingido a maioridade, de lhe ter sido levantada a interdição ou inabilitação ou de a demência ter cessado; quando proposta por outra pessoa, dentro dos 3 anos seguintes à celebração do casamento, mas nunca depois da maioridade, do levantamento da incapacidade ou da cessação da demência;
b) Nos outros casos, até 6 meses depois da dissolução do casamento.
2. O Ministério Público só pode propor a acção até à dissolução do casamento.
3. Sem prejuízo do prazo fixado na alínea b) do n.º 1, a acção de anulação fundada na existência de casamento anterior não dissolvido não pode ser instaurada, nem prosseguir, enquanto estiver pendente acção de anulação do primeiro casamento do bígamo.
A acção de anulação por falta de vontade de um ou ambos os nubentes só pode ser instaurada dentro dos 3 anos subsequentes à celebração do casamento ou, se este era ignorado do requerente, nos 6 meses seguintes ao momento em que dele teve conhecimento.
A acção de anulação fundada em vícios da vontade caduca, se não for instaurada dentro dos 6 meses subsequentes à cessação do vício.
A acção de anulação por falta de testemunhas só pode ser intentada dentro do ano posterior à celebração do casamento.
1. O casamento anulado, quando contraído de boa fé por ambos os cônjuges, produz os seus efeitos em relação a estes e a terceiros até ao trânsito em julgado da respectiva sentença.
2. Se apenas um dos cônjuges o tiver contraído de boa fé, só esse cônjuge pode arrogar-se os benefícios do estado matrimonial e opô-los a terceiros, desde que, relativamente a estes, se trate de mero reflexo das relações havidas entre os cônjuges.
1. Considera-se de boa fé o cônjuge que tiver contraído o casamento na ignorância desculpável do vício causador da anulabilidade, ou cuja declaração de vontade tenha sido extorquida por coacção física ou moral.
2. A boa fé dos cônjuges presume-se.
1. O menor que casar sem ter obtido autorização dos pais ou do tutor, ou o respectivo suprimento judicial, continua a ser considerado menor quanto à administração de bens que leve para o casal ou que posteriormente lhe advenham por título gratuito até à maioridade, mas dos rendimentos desses bens são-lhe arbitrados os alimentos necessários ao seu estado.
2. Os bens subtraídos à administração do menor são administrados pelos pais, tutor ou administrador legal, não podendo em caso algum ser entregues à administração do outro cônjuge durante a menoridade do seu consorte; além disso, não respondem, nem antes nem depois da dissolução do casamento, por dívidas contraídas por um ou ambos os cônjuges no mesmo período.
A infracção do disposto na alínea b) do artigo 1482.º importa para o tutor, curador ou administrador, ou seus parentes ou afins na linha recta, irmãos, cunhados ou sobrinhos, a incapacidade para receberem do seu consorte qualquer benefício por doação ou testamento, enquanto se mantiver a causa determinante do impedimento.
1. É obrigatório o registo:
a) Dos casamentos celebrados em Macau perante funcionário do registo civil;
b) Dos demais casamentos que as leis de registo sujeitem a registo obrigatório.
2. São admitidos a registo, a requerimento de quem mostre legítimo interesse no assento, quaisquer outros casamentos que não sejam manifestamente incompatíveis com a ordem pública.
O registo do casamento consiste no assento, que é lavrado por inscrição ou transcrição, na conformidade das leis do registo.
1. Na acção judicial proposta para suprir a omissão ou perda do registo do casamento presume-se a existência deste, sempre que as pessoas vivam ou tenham vivido na posse do estado de casado.
2. Existe posse de estado quando se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições:
a) Viverem as pessoas como casadas;
b) Serem reputadas como tais nas relações sociais, especialmente nas respectivas famílias.
São lavrados por transcrição:
a) Os assentos dos casamentos urgentes celebrados em Macau;
b) Os assentos dos casamentos referidos na alínea b) do n.º 1 do artigo 1523.º;
c) Os assentos mandados lavrar por decisão judicial;
d) Os assentos dos casamentos admitidos a registo, a requerimento dos interessados, nos termos do n.º 2 do artigo 1523.º
O despacho que homologar o casamento urgente deve fixar o conteúdo do assento, de acordo com o registo provisório, documentos juntos e diligências efectuadas.
A transcrição é feita com base no despacho de homologação, trasladando-se para o assento apenas os elementos normais do registo, acrescidos da referência à natureza especial do casamento transcrito.
1. O registo dos casamentos a que se referem a alínea b) do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 1523.º é efectuado por transcrição, com base nos documentos que os comprovem, lavrados de acordo com a lei do lugar da celebração.
2. O registo, porém, só pode realizar-se mediante prova de que não há manifesta incompatibilidade com a ordem pública.
O casamento cujo registo é obrigatório não pode ser invocado, seja pelos cônjuges ou seus herdeiros, seja por terceiro, enquanto não for lavrado o respectivo assento, sem prejuízo das excepções previstas neste Código.
1. Efectuado o registo, e ainda que venha a perder-se, os efeitos civis do casamento retrotraem-se à data da sua celebração.
2. Ficam, porém, ressalvados os direitos de terceiro que sejam compatíveis com os direitos e deveres de natureza pessoal dos cônjuges e dos filhos.
1. O casamento baseia-se na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.
2. A direcção da família pertence a ambos os cônjuges, que devem acordar sobre a orientação da vida em comum tendo em conta o bem da família e os interesses de um e outro.
Os cônjuges estão reciprocamente vinculados pelos deveres de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência.
1. Os cônjuges devem escolher de comum acordo a residência da família, atendendo, nomeadamente, às exigências da sua vida profissional e aos interesses dos filhos e procurando salvaguardar a unidade da vida familiar.
2. Salvo motivos ponderosos em contrário, os cônjuges devem adoptar a residência da família.
3. Na falta de acordo sobre a fixação ou alteração da residência da família, decidirá o tribunal a requerimento de qualquer dos cônjuges.
O dever de cooperação importa para os cônjuges a obrigação de socorro e auxílio mútuos e a de assumirem em conjunto as responsabilidade inerentes à vida da família que fundaram.
1. O dever de assistência compreende a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir para os encargos da vida familiar.
2. O dever de assistência mantém-se durante a separação de facto, se esta não for imputável a qualquer dos cônjuges.
3. Se a separação de facto for imputável a um dos cônjuges, ou a ambos, o dever de assistência, a favor do outro cônjuge, só incumbe em princípio ao único ou principal culpado; o tribunal pode, todavia, excepcionalmente e por motivos de equidade, impor esse dever ao cônjuge inocente ou menos culpado, considerando, em particular, a duração do casamento e a colaboração que o outro cônjuge tenha prestado à economia do casal.
1. O dever de contribuir para os encargos da vida familiar incumbe a ambos os cônjuges, de harmonia com as possibilidades de cada um, e pode ser cumprido, por qualquer deles, pela afectação dos seus recursos àqueles encargos e pelo trabalho despendido no lar ou na manutenção e educação dos filhos.
2. Se a contribuição de um dos cônjuges para os encargos da vida familiar exceder a parte que lhe pertencia nos termos do número anterior, presume-se a renúncia ao direito de exigir do outro a correspondente compensação.
3. Não sendo prestada a contribuição devida, qualquer dos cônjuges pode exigir que lhe seja directamente entregue a parte dos rendimentos ou proventos do outro que o tribunal fixar.
1. Cada um dos cônjuges conserva os seus próprios apelidos, mas pode acrescentar-lhes apelidos do outro até ao máximo de dois.
2. A faculdade conferida na segunda parte do número anterior não pode ser exercida por aquele que conserve apelidos do cônjuge de anterior casamento.
O cônjuge que tenha acrescentado ao seu nome apelidos do outro conserva-os em caso de viuvez e, se o declarar até à celebração do novo casamento, mesmo depois das segundas núpcias.
1. Decretado o divórcio, cada um dos cônjuges pode conservar os apelidos do outro que tenha adoptado, se o ex-cônjuge der o seu consentimento ou o tribunal o autorizar, tendo em atenção os motivos invocados.
2. O consentimento do ex-cônjuge pode ser prestado por documento autêntico ou autenticado, termo lavrado em juízo ou declaração perante o funcionário do registo civil.
3. O pedido de autorização judicial do uso dos apelidos do ex-cônjuge pode ser deduzido no processo de divórcio litigioso ou em processo próprio, mesmo depois de o divórcio ter sido decretado.
1. Falecido um dos cônjuges ou decretado o divórcio, o cônjuge que conserve apelidos do outro pode ser privado pelo tribunal do direito de os usar quando esse uso lese gravemente os interesses morais do outro cônjuge ou da sua família.
2. Têm legitimidade para o pedido de privação do uso do nome, no caso de divórcio, o ex-cônjuge, e, no caso de viuvez, os descendentes, ascendentes e irmãos do cônjuge falecido.
Cada um dos cônjuges pode exercer qualquer profissão ou actividade sem o consentimento do outro.
1. Cada um dos cônjuges tem a administração dos seus bens próprios.
2. Cada um dos cônjuges tem ainda a administração:
a) Dos proventos que receba por seu trabalho;
b) Dos seus direitos de autor;
c) Dos bens comuns por ele levados para o casamento ou adquiridos a título gratuito depois do casamento, bem como dos sub-rogados em lugar deles;
d) Dos bens que tenham sido doados ou deixados a ambos os cônjuges com exclusão da administração do outro cônjuge, salvo se se tratar de bens doados ou deixados por conta da legítima desse outro cônjuge;
e) Dos bens móveis, próprios do outro cônjuge ou comuns, por ele exclusivamente utilizados como instrumento de trabalho;
f) Dos bens comuns ou próprios do outro cônjuge, se este se encontrar impossibilitado de exercer a administração por se achar em lugar remoto ou não sabido ou por qualquer outro motivo, e desde que não tenha sido conferida procuração bastante para administração desses bens;
g) Dos bens comuns ou próprios do outro cônjuge, se este lhe conferir por mandato esse poder.
3. Fora dos casos previstos no número anterior, cada um dos cônjuges tem legitimidade para a prática de actos de administração ordinária relativamente aos bens comuns do casal; os restantes actos de administração só podem ser praticados com o consentimento de ambos os cônjuges.
O cônjuge que não tem a administração dos bens não está inibido de tomar providências a ela respeitantes, se o outro se encontrar, por qualquer causa, impossibilitado de o fazer, e do retardamento das providências puderem resultar prejuízos.
Qualquer que seja o regime de bens, pode cada um dos cônjuges fazer depósitos bancários em seu nome exclusivo e movimentá-los livremente.
1. O cônjuge que administrar bens comuns ou próprios do outro cônjuge, ao abrigo do disposto nas alíneas a) a f) do n.º 2 do artigo 1543.º, não é obrigado a prestar contas da sua administração, mas responde pelos actos intencionalmente praticados em prejuízo do casal ou do outro cônjuge.
2. Quando a administração, por um dos cônjuges, dos bens comuns ou próprios do outro se fundar em mandato, são aplicáveis as regras deste contrato, mas, salvo se outra coisa tiver sido estipulada, o cônjuge administrador só tem de prestar contas e entregar o respectivo saldo, se o houver, relativamente a actos praticados durante os últimos 5 anos.
3. Se um dos cônjuges entrar na administração dos bens próprios do outro ou de bens comuns cuja administração lhe não caiba, sem mandato escrito mas com conhecimento e sem oposição expressa do outro cônjuge, é aplicável o disposto no número anterior; havendo oposição, o cônjuge administrador responde como possuidor de má fé.
1. A alienação ou oneração de móveis comuns cuja administração caiba aos dois cônjuges carece do consentimento de ambos, salvo se se tratar de acto de administração ordinária.
2. Cada um dos cônjuges tem legitimidade para alienar ou onerar, por acto entre vivos, os móveis próprios ou comuns de que tenha a administração, nos termos do n.º 1 do artigo 1543.º e das alíneas a) a f) do n.º 2 do mesmo artigo, ressalvado o disposto nos números seguintes.
3. Carece do consentimento de ambos os cônjuges a alienação ou oneração:
a) De móveis utilizados conjuntamente por ambos os cônjuges na vida do lar ou como instrumento comum de trabalho;
b) De móveis pertencentes exclusivamente ao cônjuge que os não administra, salvo tratando-se de acto de administração ordinária.
4. Quando um dos cônjuges, sem consentimento do outro, alienar ou onerar, por negócio gratuito, móveis comuns de que tem a administração, é o valor dos bens alheados ou a diminuição de valor dos onerados levado em conta na sua meação, salvo tratando-se de doação remuneratória ou de donativo conforme aos usos sociais.
1. Carece do consentimento de ambos os cônjuges a alienação, oneração, locação ou constituição de outros direitos pessoais de gozo sobre imóveis ou empresa comercial comuns, sem prejuízo do disposto na lei comercial.
2. A alienação, oneração, arrendamento ou constituição de outros direitos pessoais de gozo sobre a casa de morada da família carece sempre do consentimento de ambos os cônjuges.
Relativamente à casa de morada da família, carece sempre do consentimento de ambos os cônjuges:
a) A resolução, denúncia ou revogação unilateral do contrato de arrendamento pelo arrendatário;
b) A revogação do arrendamento por acordo entre as partes;
c) A cessão da posição de arrendatário;
d) O subarrendamento ou o empréstimo, total ou parcial.
Os cônjuges não necessitam do consentimento um do outro para:
a) Aceitar doações, heranças ou legados;
b) Repudiar heranças ou legados, a menos que vigore o regime da comunhão geral de bens.
1. A forma do consentimento conjugal, nos casos em que é legalmente exigido, é a prevista para a procuração.
2. O consentimento pode ser judicialmente suprido, havendo injusta recusa ou impossibilidade, por qualquer causa, de o prestar.
1. Independentemente das regras de administração dos bens do casal, qualquer dos cônjuges, ou ambos de modo recíproco, pode, por meio de procuração a favor do outro cônjuge, conferir poderes especiais para a prática de actos onerosos entre vivos sobre todos ou parte dos seus bens próprios ou dos bens comuns, presentes ou futuros.
2. Contudo, é sempre especial para cada acto o consentimento conjugal exigido pela lei relativo:
a) À casa de morada de família;
b) Aos bens móveis utilizados como instrumentos de trabalho;
c) Ao repúdio da herança ou legado.
3. A procuração entre cônjuges é sempre livremente revogável a todo o tempo por qualquer deles e, sem prejuízo das regras gerais, extingue-se com a morte de qualquer dos cônjuges; tendo a procuração sido efectuada com carácter de reciprocidade, a invalidade ou revogação de uma das declarações produz a ineficácia da outra.
1. Cada um dos cônjuges tem a faculdade de dispor, para depois da morte, dos bens próprios e da sua meação nos bens comuns, sem prejuízo das restrições impostas por lei em favor dos herdeiros legitimários.
2. A disposição que tenha por objecto coisa certa e determinada do património comum apenas dá ao contemplado o direito de exigir o respectivo valor em dinheiro.
3. Pode, porém, ser exigida a coisa em espécie:
a) Se esta, por qualquer título, se tiver tornado propriedade exclusiva do disponente à data da sua morte;
b) Se a disposição tiver sido previamente autorizada pelo outro cônjuge por forma autêntica ou no próprio testamento; ou
c) Se a disposição tiver sido feita por um dos cônjuges em benefício do outro.
1. Os actos praticados contra o disposto nos n.os 1 e 3 do artigo 1547.º, nos artigos 1548.º e 1549.º e na alínea b) do artigo 1550.º são anuláveis a requerimento do cônjuge que não deu o consentimento ou dos seus herdeiros, ressalvado o disposto nos n.os 3 e 4 deste artigo.
2. O direito de anulação pode ser exercido nos 6 meses subsequentes à data em que o requerente teve conhecimento do acto, mas nunca depois de decorridos 3 anos sobre a sua celebração.
3. Em caso de alienação ou oneração de móvel não sujeito a registo feita apenas por um dos cônjuges, quando é exigido o consentimento de ambos, a anulabilidade não pode ser oposta ao adquirente de boa fé.
4. À alienação ou oneração de bens próprios do outro cônjuge, feita sem legitimidade, são aplicáveis as regras relativas à alienação de coisa alheia.
As relações pessoais e patrimoniais entre os cônjuges cessam pela dissolução ou anulação do casamento, sem prejuízo das disposições deste Código relativas a alimentos.
1. Cessando as relações patrimoniais entre os cônjuges, assim como nos demais casos em que, por força do n.º 4 do artigo 1578.º, haja lugar à determinação do titular e do montante do crédito na participação ou à partilha do património comum, cada um dos cônjuges, ou os seus herdeiros, recebe:
a) No regime da participação nos adquiridos, os seus bens, sem prejuízo do disposto acerca do crédito na participação, com que seja beneficiado ou onerado;
b) Nos regimes de comunhão, os bens próprios e a sua meação no património comum.
2. Havendo dívidas a liquidar, aplica-se o disposto na Secção seguinte.
1. Tanto o marido como a mulher têm legitimidade para contrair dívidas sem o consentimento do outro cônjuge.
2. Para a determinação da responsabilidade dos cônjuges, as dívidas por eles contraídas têm a data do facto que lhes deu origem.
1. São da responsabilidade de ambos os cônjuges:
a) As dívidas contraídas, antes ou depois da celebração do casamento, pelos dois cônjuges, ou por um deles com o consentimento do outro;
b) As dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges, antes ou depois da celebração do casamento, para ocorrer aos encargos normais da vida familiar;
c) As dívidas contraídas na constância do matrimónio pelo cônjuge administrador, em proveito comum do casal e nos limites dos seus poderes de administração;
d) As dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio, salvo se se provar que não foram contraídas em proveito comum do casal ou se vigorar entre os cônjuges o regime da separação de bens ou da participação nos adquiridos;
e) As dívidas consideradas comunicáveis nos termos do n.º 2 do artigo 1560.º
2. No regime da comunhão geral de bens, são ainda comunicáveis as dívidas contraídas antes do casamento por qualquer dos cônjuges, em proveito comum do casal.
3. O proveito comum do casal não se presume, excepto nos casos em que a lei o declarar.
São da exclusiva responsabilidade do cônjuge a que respeitam:
a) As dívidas contraídas, antes ou depois da celebração do casamento, por cada um dos cônjuges sem o consentimento do outro, fora dos casos indicados nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo anterior;
b) As dívidas provenientes de crimes e as indemnizações, sanções, restituições, custas judiciais ou multas devidas por factos imputáveis a cada um dos cônjuges, salvo se esses factos, implicando responsabilidade meramente civil, estiverem abrangidos pelo disposto nos n.os 1 ou 2 do artigo anterior;
c) As dívidas cuja incomunicabilidade resulta do disposto no n.º 2 do artigo 1561.º
1. As dívidas que onerem doações, heranças ou legados são da exclusiva responsabilidade do cônjuge aceitante, ainda que a aceitação tenha sido efectuada com o consentimento do outro.
2. Porém, se por força do regime de bens adoptado os bens doados, herdados ou legados ingressarem no património comum, a responsabilidade pelas dívidas é comum, sem prejuízo do direito que tem o cônjuge do aceitante de impugnar o seu cumprimento com o fundamento de que o valor dos bens não é suficiente para a satisfação dos encargos.
1. As dívidas que onerem bens comuns são sempre da responsabilidade comum dos cônjuges, quer se tenham vencido antes, quer depois da comunicação dos bens.
2. As dívidas que onerem bens próprios de um dos cônjuges são da sua exclusiva responsabilidade, salvo se tiverem como causa a percepção dos respectivos rendimentos e estes, por força do regime aplicável, forem considerados comuns.
Pelas dívidas que são da responsabilidade de ambos os cônjuges respondem:
a) No regime da participação nos adquiridos, conjuntamente, os bens próprios dos cônjuges e, na falta ou insuficiência dos bens de um dos cônjuges, subsidiariamente os bens do outro cônjuge;
b) No regime da separação de bens, conjuntamente, os bens próprios dos cônjuges;
c) Nos regimes de comunhão, os bens comuns do casal, e, na falta ou insuficiência deles, solidariamente, os bens próprios de qualquer dos cônjuges.
Nos regimes de comunhão, são pagas em primeiro lugar as dívidas comunicáveis até ao valor do património comum, e só depois as restantes.
1. Pelas dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges respondem os bens próprios do cônjuge devedor e, nos regimes de comunhão, subsidiariamente, a sua meação nos bens comuns.
2. Respondem, todavia, ao mesmo tempo que os bens próprios do cônjuge devedor o produto do trabalho e os direitos de autor do cônjuge devedor.
3. Quando, por falta ou insuficiência de bens próprios do cônjuge devedor e dos bens comuns indicados no número anterior, forem nomeados à penhora bens comuns, o cônjuge não devedor é citado para requerer nos termos da lei de processo a separação judicial de bens, sob pena de a execução prosseguir nos bens penhorados.
4. Decretada a separação de bens, nos termos do número anterior, o cônjuge não devedor pode, no prazo de 6 meses após a satisfação da dívida, requerer judicialmente a constituição ex nunc do regime de bens anterior.
1. Quando por dívidas da responsabilidade de ambos os cônjuges tenham respondido bens de um só deles, este torna-se credor do património comum pela totalidade do montante da dívida; não existindo bens comuns ou sendo estes insuficientes, ele torna-se credor do outro cônjuge pelo que haja satisfeito além do que lhe competia satisfazer.
2. O cônjuge, para efeitos de cobrança dos créditos indicados no número anterior, é equiparado aos credores comuns.
3. Sempre que por dívidas da exclusiva responsabilidade de um só dos cônjuges tenham respondido bens comuns, o cônjuge devedor torna-se responsável perante o outro cônjuge, até ao montante da dívida satisfeita, pela reconstituição, com os seus bens próprios, do património comum; não existindo bens próprios ou sendo estes insuficientes, o cônjuge não devedor torna-se credor do património comum pelo montante da dívida em falta.
4. Contudo, o crédito referido na parte final do número anterior só é exigível no momento da dissolução do regime de bens, salvo na parte satisfeita com os bens indicados no n.º 2 do artigo anterior.
5. Quando por dívidas da exclusiva responsabilidade de um só dos cônjuges tenham respondido bens próprios do outro, o cônjuge do devedor torna-se credor deste pelo montante da dívida por si satisfeita.
6. O cônjuge, para efeitos de cobrança dos créditos indicados na parte final do n.º 3 e no número anterior, é equiparado aos credores próprios do cônjuge devedor.
As convenções matrimoniais dividem-se em convenções antenupciais e convenções pós-nupciais, consoante sejam celebradas antes da celebração do casamento ou durante a vigência da relação matrimonial.
Os esposos podem fixar livremente, em convenção antenupcial, o regime de bens do casamento, quer escolhendo um dos regimes previstos neste Código, quer estipulando o que a esse respeito lhes aprouver, dentro dos limites da lei.
1. Salvo no caso previsto no n.º 2 do artigo seguinte, é permitido aos esposos estipularem na convenção antenupcial, com carácter de reciprocidade, que a partilha dos bens derivada do casamento, no caso de dissolução do casamento por morte do outro cônjuge, se faça de acordo com o regime da comunhão geral, independentemente do regime de bens adoptado; tal estipulação poderá ficar sujeita a condição.
2. O disposto no número anterior não prejudica os direitos de terceiro na liquidação do passivo.
1. Não podem ser objecto de convenção antenupcial:
a) A regulamentação da sucessão hereditária dos cônjuges ou de terceiro, salvo o disposto nos dois artigos seguintes;
b) A alteração dos direitos ou deveres, quer paternais, quer conjugais;
c) A alteração das regras sobre administração dos bens do casal;
d) A estipulação da comunicabilidade dos bens enumerados no n.º 1 do artigo 1610.º
2. Se o casamento for celebrado por quem tenha filhos que não sejam comuns a ambos os cônjuges, ainda que maiores ou emancipados, não pode ser convencionado o regime da comunhão geral nem estipulada a comunicabilidade dos bens que:
a) Cada um dos cônjuges tiver à data do casamento;
b) Advierem aos cônjuges depois do casamento por sucessão ou doação;
c) Forem adquiridos na constância do matrimónio por virtude de direito próprio anterior.
1. A convenção antenupcial pode conter a instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário feita por qualquer dos esposados, em favor quer do outro esposado quer de terceiro.
2. A instituição de herdeiro e a nomeação de legatário, embora lícitas, têm valor meramente testamentário.
3. São admitidas na convenção antenupcial cláusulas de reversão ou fideicomissárias relativas às liberalidades aí efectuadas, sem prejuízo das limitações a que genericamente estão sujeitas essas cláusulas.
4. A instituição e o legado feitos na convenção antenupcial caducam se o casamento não for celebrado dentro de 1 ano e ainda quando se verifique qualquer das causas de caducidade das disposições testamentárias.
A convenção antenupcial pode, desde que com carácter de reciprocidade, conter a renúncia à qualidade de herdeiro legitimário dos cônjuges.
1. Têm capacidade para celebrar convenções antenupciais aqueles que têm capacidade para contrair casamento.
2. Aos menores, bem como aos interditos ou inabilitados, só é permitido celebrar convenções antenupciais com autorização dos respectivos representantes legais ou curadores ou mediante o suprimento judicial dessa autorização feito a seu pedido.
A anulabilidade da convenção antenupcial por falta de autorização ou do respectivo suprimento judicial só pode ser invocada pelo incapaz, pelos seus herdeiros ou por aqueles a quem competir conceder a autorização, dentro do prazo de 1 ano a contar da celebração do casamento, considerando-se a anulabilidade sanada se o casamento vier a ser celebrado depois de findar a incapacidade.
As convenções antenupciais só são válidas se forem celebradas por escritura pública ou, com os limites determinados nas leis do registo civil, pela forma consagrada nestas leis.
1. As convenções antenupciais só produzem efeitos em relação a terceiros depois de registadas, e, mesmo então, não são oponíveis a terceiros que hajam adquirido direitos antes do registo, na medida em que os prejudiquem.
2. Os herdeiros dos cônjuges não são considerados terceiros.
3. O registo da convenção não dispensa o registo predial relativo aos factos a ele sujeitos.
1. A convenção antenupcial é livremente revogável ou modificável pelos esposos até à celebração do casamento.
2. O novo acordo está sujeito aos requisitos de forma e publicidade estabelecidos nos artigos antecedentes.
A convenção antenupcial caduca, se o casamento não for celebrado dentro de 1 ano, ou se, tendo-o sido, vier a ser anulado, salvo o disposto em matéria de casamento putativo.
1. Através de convenção pós-nupcial os cônjuges podem, durante o casamento, por acordo:
a) Alterar a convenção antenupcial;
b) Celebrar pela primeira vez uma convenção matrimonial, nomeadamente com o fim de substituírem o regime de bens supletivo;
c) Modificar uma anterior convenção pós-nupcial.
2. A convenção pós-nupcial produz efeitos entre os cônjuges a partir do dia da sua celebração, sendo nula qualquer estipulação em contrário.
3. À convenção pós-nupcial é aplicável, com as devidas adaptações, o disposto na subsecção anterior.
4. Se, por força da convenção pós-nupcial, o regime de bens aplicável ao casamento deixar de ser o da participação nos adquiridos, procede-se à determinação do titular e do montante do crédito na participação, salvo se passar a ser o da comunhão geral, e se deixar de ser um regime de comunhão, procede-se à partilha do património comum; a substituição do regime da comunhão de adquiridos pelo regime da comunhão geral, ou vice-versa, não dá lugar à partilha.
5. A determinação do titular e do montante do crédito na participação, bem como a partilha do património comum, pode efectuar-se extrajudicialmente ou por via de inventário judicial.
Na falta de convenção antenupcial, ou no caso de caducidade, invalidade ou ineficácia da convenção, o casamento considera-se celebrado sob o regime da participação nos adquiridos.
O regime de bens do casamento não pode ser fixado, no todo ou em parte, por simples remissão genérica para uma lei exterior a Macau, para um preceito revogado, ou para usos e costumes locais.
Se o regime de bens adoptado pelos cônjuges, ou aplicado supletivamente, for o da participação nos adquiridos, deve observar-se o disposto nos artigos seguintes.
1. No regime da participação nos adquiridos cada um dos cônjuges tem o domínio e fruição, tanto dos bens que lhe pertenciam à data da celebração do casamento ou da adopção superveniente desse regime de bens, como dos que adquiriu posteriormente por qualquer título, podendo, salvas as excepções previstas na lei, dispor deles livremente.
2. Aquando da cessação do regime da participação nos adquiridos, e com vista a igualar o acréscimo patrimonial obtido por cada um dos cônjuges durante a vigência do regime de bens, é atribuído ao cônjuge cujo acréscimo patrimonial for menor o direito de participar pela metade na diferença entre o valor do acréscimo do património do outro cônjuge e o valor do acréscimo do seu próprio património, designando-se tal direito por crédito na participação.
3. Para efeitos da determinação do acréscimo patrimonial de cada cônjuge, referido no número anterior, só são contabilizados os bens ou valores que nos termos dos artigos seguintes sejam integrados no respectivo património em participação.
4. É nula qualquer estipulação dos cônjuges que altere a fracção referida no n.º 2.
5. Os bens de cada cônjuge são considerados próprios independentemente de comporem ou não o respectivo património em participação.
Fazem parte do património em participação do cônjuge:
a) O produto do seu trabalho adquirido na constância do regime da participação nos adquiridos;
b) Os bens por si adquiridos na constância do regime da participação nos adquiridos que não sejam exceptuados nos termos dos artigos seguintes ou por lei especial.
1. Estão excluídos do património em participação os bens ou valores do cônjuge, adquiridos na constância do regime da participação nos adquiridos, que lhe advierem:
a) Por sucessão ou doação, salvas as excepções admitidas por lei;
b) Por virtude de direito próprio anterior ao casamento ou à adopção do regime de bens da participação;
c) Por virtude da titularidade de bens próprios excluídos da participação, e que não possam considerar-se como frutos destes;
d) Por meio de indemnizações devidas por factos verificados contra a sua pessoa ou contra bens seus excluídos da participação;
e) Por força dos seguros vencidos em favor da sua pessoa ou para cobertura de riscos sofridos por bens seus excluídos da participação.
2. São igualmente excluídos da participação:
a) As roupas e outros objectos de uso pessoal e exclusivo do cônjuge, bem como os seus diplomas e a sua correspondência;
b) As recordações da família do cônjuge de diminuto valor económico.
3. O disposto nos números anteriores não prejudica o direito à compensação, eventualmente devida ao património em participação, por tudo o que haja sido pago com bens integrados nesse património para a aquisição dos bens ou para a satisfação dos encargos inerentes aos bens advindos por doação ou sucessão.
1. Para efeitos da alínea b) do n.º 1 do artigo anterior, consideram-se, entre outros, adquiridos por virtude de direito próprio anterior ao casamento ou à adopção superveniente do regime da participação nos adquiridos:
a) Os bens adquiridos em consequência de direitos anteriores a essa data sobre patrimónios ilíquidos partilhados depois dessa data;
b) Os bens adquiridos por usucapião fundada em posse que tenha o seu início antes daquela data;
c) Os bens comprados antes da mesma data com reserva de propriedade;
d) Os bens adquiridos no exercício de direito de preferência fundado em situação já existente àquela data.
2. Para efeitos da alínea c) do n.º 1 do artigo anterior, consideram-se, entre outros, adquiridos por virtude da titularidade de bens próprios excluídos da participação:
a) As acessões sobre bens excluídos da participação, sem prejuízo do disposto no artigo 1590.º;
b) Os materiais resultantes da demolição ou destruição de bens excluídos da participação;
c) A parte do tesouro adquirida na qualidade de proprietário de bens excluídos da participação;
d) Os prémios de amortização de títulos de créditos ou de outros valores mobiliários excluídos da participação, bem como os títulos ou valores adquiridos por virtude de um direito de subscrição àqueles inerente.
1. Sem prejuízo da compensação devida, os rendimentos derivados do exercício de uma empresa comercial excluída do património em participação permanecem excluídos desse património, se forem reinvestidos na empresa.
2. Não é devida qualquer compensação, se o investimento for necessário à manutenção da rentabilidade da empresa.
Estão igualmente excluídos do património em participação:
a) Os bens sub-rogados no lugar de bens excluídos da participação, por meio de troca directa;
b) O preço dos bens excluídos da participação que hajam sido alienados;
c) Os bens adquiridos com dinheiro ou valores do cônjuge excluídos da participação.
1. Está igualmente excluída do património em participação a parte adquirida em bens indivisos pelo cônjuge que deles for comproprietário, contanto que a parte que anteriormente lhe pertencia já estivesse excluída desse património, sem prejuízo da compensação devida ao património em participação pelas somas prestadas pelo mesmo para a respectiva aquisição.
2. Contudo, se o valor dos bens do património em participação utilizados para adquirir essa parte for superior a metade do valor total do bem, ou da parte do mesmo que passe a pertencer ao cônjuge, o bem integra-se no património em participação, sem prejuízo da compensação devida.
1. Os bens adquiridos em parte com dinheiro ou bens do cônjuge incluídos na participação e noutra parte com dinheiro ou bens dela excluídos integram-se no património em participação, se o valor daquela prestação for igual ou superior ao desta; de contrário, ficam excluídos do património em participação.
2. Fica, porém, sempre salva a compensação devida entre os patrimónios do cônjuge.
1. Sem prejuízo do direito a compensação, as benfeitorias, partes integrantes e quaisquer construções ou plantações que, em qualquer dos casos, sejam efectuadas com valores ou bens incluídos na participação em bens dela excluídos, ou vice-versa, integram-se no património a que pertence a coisa principal.
2. Contudo, sem prejuízo do direito à compensação, o todo torna-se um bem integrado no património a que pertencem os bens ou valores com os quais foram efectuadas as benfeitorias, partes integrantes, construções ou plantações, se o valor destes bens for, à data da integração, superior ao das coisas principais.
3. Não é devida qualquer compensação pelas despesas efectuadas com bens da participação em benfeitorias realizadas nos bens dela excluídos, desde que as mesmas fossem necessárias para manter ou preservar estes bens.
1. Os bens havidos pelo cônjuge por meio de doação ou deixa testamentária de terceiro só entram no seu património em participação se o doador ou testador assim o tiver determinado.
2. O disposto no número anterior não abrange as doações e deixas testamentárias que integrem a legítima do donatário.
3. Às doações para casamento entre os esposados e às doações entre casados é aplicável o disposto no n.º 1 do artigo 1616.º
1. Presume-se, quer para efeitos entre os cônjuges, quer para efeitos perante terceiros, que os bens de cada cônjuge foram adquiridos e as benfeitorias efectuadas com dinheiro ou valores incluídos no seu património em participação.
2. Quando haja dúvidas sobre a propriedade exclusiva de um dos cônjuges, os bens móveis têm-se como pertencentes em compropriedade a ambos os cônjuges.
No cálculo do património em participação de cada um dos cônjuges, com vista à determinação do titular e do montante do crédito na participação, incluem-se:
a) Os bens do cônjuge integrados, à data da cessação do regime da participação nos adquiridos, no seu património em participação;
b) Os bens do cônjuge integrados no seu património em participação, por si dispostos a título gratuito sem o consentimento do outro cônjuge na vigência do regime da participação nos adquiridos, salvo tratando-se de doação remuneratória ou de donativo conforme aos usos sociais;
c) O valor do prejuízo causado ao consorte com os actos de alienação de bens que o cônjuge tenha efectuado, no período indicado na alínea anterior, com intuito de prejudicar o consorte;
d) O montante das dívidas de exclusiva responsabilidade do cônjuge existentes à data da celebração do casamento ou da adopção superveniente do regime de bens, pagas com bens integrados no património em participação durante a vigência do regime de bens;
e) O valor das despesas já pagas pelo cônjuge com bens integrados no seu património em participação relacionadas com a aquisição de bens que apenas advenham ao cônjuge posteriormente à data da cessação do regime da participação nos adquiridos; e
f) As dívidas do cônjuge indicadas na alínea b) do artigo 1559.º, ou parte das mesmas, pagas antes da cessação do regime da participação nos adquiridos com bens do seu património em participação.
1. A determinação do montante do património em participação de cada cônjuge só é feita após:
a) Serem efectuadas as compensações a que haja lugar entre o património em participação do respectivo cônjuge e o património dela excluído do mesmo cônjuge; e
b) Serem deduzidas as dívidas não pagas do respectivo cônjuge a terceiros, com excepção das indicadas no n.º 4.
2. Salvo quando tal envolva resultados menos justos, os créditos não satisfeitos que um dos cônjuges tenha contra o outro à data da cessação do regime de bens são computados no património em participação do cônjuge devedor e, caso tenham provindo de bens ou valores excluídos da participação do cônjuge credor, são deduzidos do património em participação deste.
3. No entanto, se o montante da dívida tiver sido aplicado na aquisição de bens do património em participação do cônjuge devedor que, à data da cessação do regime de bens, permaneçam nele integrados, é descontado no valor do crédito computado no património do devedor o valor do bem ou parte do mesmo resultante da aplicação desse capital.
4. No cálculo do património em participação não são deduzidas as dívidas, ou parte das mesmas por saldar:
a) Relacionadas com a aquisição de bens que só advenham ao cônjuge posteriormente à dissolução do regime da participação nos adquiridos;
b) Indicadas na alínea b) do artigo 1559.º; ou
c) Contraídas exclusivamente em benefício do cônjuge, na medida em que não tenham aumentado o património em participação.
1. Os bens indicados na alínea a) do artigo 1593.º são avaliados segundo o estado em que se encontravam à data da cessação do regime de bens e os indicados na alínea b) do mesmo artigo segundo o estado em que se encontravam à data do acto de disposição gratuita.
2. Os valores resultantes da aplicação do disposto no número anterior serão actualizados, de acordo com os critérios constantes do artigo 544.º, desde a cessação do regime de bens ou da disposição gratuita, consoante se trate do caso da alínea a) ou da alínea b) do artigo 1593.º, até à data da determinação do montante do crédito na participação.
3. Os valores referidos nas restantes alíneas do artigo 1593.º, bem como os montantes derivados das compensações devidas, serão igualmente actualizados de acordo com o mesmo critério, desde o momento em que as despesas foram efectuadas até à data da determinação do montante do crédito na participação.
4. Se a aplicação das regras de avaliação referidas nos números anteriores implicar um resultado manifestamente contrário à equidade, o tribunal poderá alterá-lo a pedido de um dos cônjuges de acordo com a equidade.
O direito à determinação do titular e do montante do crédito na participação não pode ser exercido para além do prazo de 3 anos a contar da cessação do casamento.
1. É nula qualquer renúncia antecipada ao crédito na participação.
2. É, contudo, válida a renúncia efectuada após a cessação do regime, por meio de documento autêntico, por termo lavrado em juízo ou por declaração prestada perante o funcionário do registo civil.
3. Havendo renúncia ao crédito na participação, o que deveria caber ao cônjuge beneficiado com o crédito mantém-se no património do outro cônjuge.
4. Fica ressalvado, contudo, o direito dos credores do cônjuge renunciante a impugnarem a renúncia nos termos dos artigos 605.º e seguintes.
5. A impugnação deve efectuar-se, sem prejuízo da aplicação do disposto no artigo 614.º, no prazo de 6 meses, a contar do conhecimento da renúncia.
1. O crédito na participação deve ser satisfeito em dinheiro, sem prejuízo do disposto no presente artigo.
2. Se houver dificuldades graves de pagamento imediato por parte do devedor, o juiz pode, a pedido do devedor, estabelecer um plano de pagamento num prazo nunca superior a 2 anos, contanto que o crédito na participação e os interesses do seu titular fiquem adequadamente garantidos.
3. O crédito na participação pode satisfazer-se mediante a entrega de bens determinados, por acordo das partes ou se o juiz assim o determinar a pedido fundamentado do devedor.
4. Se o devedor for condenado no pagamento imediato da totalidade ou de parte do crédito na participação e não cumprir no prazo de 30 dias após a decisão definitiva, pode o credor, no mesmo processo e no prazo de 90 dias, requerer que o devedor indique bens seus, previamente relacionados e avaliados, para lhe serem entregues; não sendo feita a indicação, o juiz determina a entrega ao credor dos bens do devedor, previamente relacionados e avaliados, que o credor indique.
1. Na falta ou insuficiência de bens, o cônjuge credor pode impugnar, no prazo de 2 anos a contar da cessação do regime da participação, os actos do outro cônjuge referidos nas alíneas b) e c) do artigo 1593.º, nos termos dos artigos 605.º a 613.º
2. Presume-se, para efeitos do número anterior, que foram realizados dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do cônjuge credor os actos praticados pelo cônjuge devedor, sem o consentimento do cônjuge credor, no ano anterior à morte de qualquer dos cônjuges ou à instauração da acção de divórcio litigioso, de anulação do casamento ou de separação judicial de bens:
a) Quando tenham sido praticados a título gratuito;
b) Quando tenham sido praticados em favor de parente, do unido de facto, independentemente das condições exigidas pelo artigo 1472.º, ou concubino ou de pessoa ligada ao cônjuge devedor por qualquer vínculo de dependência, bem como de sociedade coligada com a dele ou por ele dominada; ou
c) Quando as obrigações por ele assumidas excedam manifestamente as da contraparte.
1. A cessação do regime não prejudica os direitos anteriormente adquiridos pelos credores contra todo o património do seu devedor.
2. Satisfeito o crédito na participação, os credores apenas podem exercer o seu direito contra o cônjuge devedor.
3. No entanto, se as dívidas não tiverem sido tidas em conta na determinação do montante do crédito na participação, conforme o preceituado no artigo 1594.º, os credores podem, depois de excutido o património do cônjuge devedor, exigir o pagamento das mesmas do cônjuge beneficiado com o crédito na participação.
4. Em nenhum caso poderá o cônjuge do devedor ser chamado a satisfazer dívidas de montante superior ao valor dos bens recebidos por força da satisfação do crédito na participação.
5. O cônjuge que, por virtude do n.º 3, haja pago dívidas do outro tem direito a ser compensado por este pelo prejuízo sofrido.
Se o regime de bens adoptado pelos cônjuges for o da separação, cada um deles conserva o domínio e fruição de todos os seus bens presentes e futuros, podendo, salvas as excepções previstas na lei, dispor deles livremente.
É aplicável ao regime da separação o disposto no n.º 2 do artigo 1592.º
1. Se o regime de bens adoptado pelos cônjuges for o da comunhão de adquiridos, cada cônjuge conserva o domínio e fruição dos bens que lhe pertenciam à data do casamento ou da adopção superveniente desse regime de bens e passa a ser titular em comunhão com o outro cônjuge dos bens adquiridos por qualquer dos cônjuges na constância desse regime, que não sejam exceptuados por lei, nos termos dos artigos seguintes.
2. Os bens que nos termos do número anterior integrem a comunhão são qualificados como bens comuns e os restantes como bens próprios.
1. Não fazem parte da comunhão os bens que nos termos dos artigos 1584.º a 1590.º, aplicáveis com as devidas adaptações, sejam considerados excluídos do património em participação, bem como os demais bens indicados no artigo 1610.º
2. A compensação a que, no regime da participação nos adquiridos, haja lugar entre o património em participação e o património dela excluído é entendida para efeitos do presente regime como referida, respectivamente, ao património comum e aos patrimónios próprios dos cônjuges.
1. Os bens havidos pelo cônjuge por meio de doação ou deixa testamentária de terceiro entram na comunhão, se o doador ou testador assim o tiver determinado; entende-se que essa é a vontade do doador ou testador, quando a liberalidade for feita em favor dos dois cônjuges conjuntamente.
2. É aplicável o disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 1591.º
1. Presume-se, quer para efeitos entre os cônjuges, quer para efeitos perante terceiros, que são comuns o dinheiro ou valores utilizados por qualquer dos cônjuges na aquisição de bens ou em benfeitorias.
2. Em caso de dúvidas sobre a comunicabilidade dos bens móveis, estes consideram-se comuns.
1. Os cônjuges participam por metade no activo e no passivo da comunhão, sendo nula qualquer estipulação em sentido diverso.
2. A regra da metade não impede que cada um dos cônjuges faça doações ou deixas por conta da sua meação nos bens comuns, nos termos permitidos por lei.
Se os instrumentos de trabalho de cada um dos cônjuges tiverem entrado no património comum por força do regime de bens, o cônjuge que deles necessite para o exercício da sua profissão tem direito a ser neles encabeçado no momento da partilha.
Se o regime de bens adoptado pelos cônjuges for o da comunhão geral, o património comum é constituído por todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, que não sejam exceptuados por lei.
1. São exceptuados da comunhão:
a) Os bens doados ou deixados, ainda que por conta da legítima, com a cláusula de incomunicabilidade;
b) Os bens doados ou deixados com cláusula de reversão ou fideicomissária, a não ser que a cláusula tenha caducado;
c) O usufruto que deva extinguir-se por morte ou extinção do usufrutuário, o uso ou habitação, e demais direitos estritamente pessoais;
d) Os bens referidos nas alíneas d) e e) do n.º 1 e os referidos no n.º 2, ambos do artigo 1584.º
2. A incomunicabilidade dos bens não abrange os respectivos frutos nem o valor das benfeitorias úteis.
São aplicáveis à comunhão geral de bens, com as necessárias adaptações, as disposições relativas à comunhão de adquiridos.
1. Doação para casamento é a doação entre vivos feita a um dos esposados, ou a ambos, em vista do seu casamento.
2. Às doações para casamento são aplicáveis as disposições da presente Secção e, subsidiariamente, as dos artigos 934.º a 968.º
As doações para casamento podem ser feitas por um dos esposados ao outro, pelos dois reciprocamente, ou por terceiro a um ou a ambos os esposados.
As doações para casamento produzem os seus efeitos a partir da celebração do casamento, salvo estipulação em contrário.
1. Sob pena de inaplicabilidade do regime especial desta secção, as doações para casamento, salvo se forem feitas na convenção antenupcial, necessitam, para além da forma especialmente prevista na lei, que se indique de modo expresso que são feitas em vista do casamento do ou dos donatários.
2. A doação de coisas móveis, ainda que acompanhada da tradição da coisa, deve constar de documento escrito.
1. Salvo estipulação em contrário, os bens doados por um esposado ao outro consideram-se próprios do donatário, seja qual for o regime matrimonial; vigorando o regime da participação nos adquiridos, consideram-se excluídos do património em participação do donatário, salvo disposição em contrário.
2. Sendo a doação feita por terceiros, aplica-se o disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 1591.º e no artigo 1605.º
1. As doações para casamento são revogáveis por mútuo consentimento dos contraentes.
2. Contudo, quando os bens doados por terceiros a um dos esposados tiverem entrado na comunhão, a revogação carece ainda do consentimento do cônjuge do donatário.
As doações para casamento estão sujeitas a redução por inoficiosidade, nos termos gerais.
1. As doações para casamento caducam:
a) Se o casamento não for celebrado dentro de 1 ano, ou se, tendo-o sido, vier a ser anulado, salvo o disposto em matéria de casamento putativo; ou
b) Se ocorrer divórcio no qual o donatário seja considerado único ou principal culpado.
2. Se a doação tiver sido feita por terceiro a ambos os esposados ou os bens doados tiverem entrado na comunhão, e um dos cônjuges for declarado único ou principal culpado no divórcio, a caducidade atinge apenas a parte dele.
As doações entre casados regem-se pelas disposições desta secção e, subsidiariamente, pelas regras dos artigos 934.º a 968.º
A doação de coisas móveis, ainda que acompanhada da tradição da coisa, deve constar de documento escrito.
A doação entre casados caduca:
a) Se o casamento vier a ser anulado, sem prejuízo do disposto em matéria de casamento putativo; ou
b) Ocorrendo divórcio, se o donatário for considerado único ou principal culpado.
É aplicável às doações entre casados o disposto no n.º 1 do artigo 1616.º, no n.º 1 do artigo 1617.º e no artigo 1618.º
1. Qualquer dos cônjuges que esteja em perigo de sofrer um dano considerável em virtude de má administração do outro cônjuge pode requerer a separação judicial de bens.
2. O mesmo poder assiste ao cônjuge em caso de ausência do outro cônjuge por período superior a 3 anos sem que dele se saiba parte.
1. Só tem legitimidade para a acção de separação, por força do n.º 1 do artigo anterior, o cônjuge lesado ou, estando ele interdito, o seu representante legal, ouvido o conselho de família.
2. Se o representante legal do cônjuge lesado for o outro cônjuge, a acção só pode ser intentada, em nome daquele, por algum parente na linha recta ou até ao terceiro grau da linha colateral.
3. Se o cônjuge lesado estiver inabilitado, a acção pode ser intentada por ele, ou pelo curador com autorização judicial.
4. O direito à separação não se transmite por morte, mas a acção pode ser continuada pelos herdeiros do autor, para os efeitos constantes dos n.os 3 e 4 do artigo seguinte, se o autor falecer na pendência da causa; para os mesmos efeitos pode a acção prosseguir contra os herdeiros do réu.
5. No caso de o motivo da separação ser a ausência, a legitimidade para a acção cabe apenas ao cônjuge do ausente, capaz ou inabilitado, sendo ao caso aplicável igualmente o disposto no número anterior.
1. A separação judicial de bens leva a que o regime de bens do casamento passe a ser o da separação, procedendo-se, consoante o regime de bens adoptado, à determinação do titular e do montante do crédito na participação ou à partilha do património comum, como se o casamento tivesse sido dissolvido.
2. O disposto no número anterior pode efectuar-se extra-judicialmente ou por via de inventário judicial.
3. Os efeitos da separação retrotraem-se à data da proposição da acção quanto às relações patrimoniais entre os cônjuges.
4. Se a falta de coabitação entre os cônjuges estiver provada no processo, qualquer deles pode requerer que os efeitos da separação se retrotraiam à data, que a sentença deve fixar, em que a coabitação tenha cessado por culpa exclusiva ou predominante do outro.
5. Os efeitos patrimoniais da separação só podem ser opostos a terceiros a partir da data do registo da sentença.
O disposto no artigo anterior é aplicável a todos os casos, previstos na lei, de separação unilateral de bens na vigência do casamento.
1. O divórcio pode ser por mútuo consentimento ou litigioso.
2. O divórcio por mútuo consentimento pode ser requerido por ambos os cônjuges, de comum acordo, no tribunal ou na conservatória do registo civil.*
3. O divórcio litigioso é requerido no tribunal por um dos cônjuges contra o outro, com algum dos fundamentos previstos nos artigos 1635.º e 1637.º
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 11/2024
1. No processo de divórcio há sempre uma tentativa de conciliação dos cônjuges.
2. Se, no processo de divórcio litigioso, a tentativa de conciliação não resultar, o juiz deverá procurar obter o acordo dos cônjuges para o divórcio por mútuo consentimento; obtido o acordo ou tendo os cônjuges, em qualquer altura do processo, optado por essa modalidade do divórcio, seguir-se-ão os termos do processo de divórcio por mútuo consentimento, com as necessárias adaptações.
1. Só podem requerer o divórcio por mútuo consentimento os cônjuges que forem casados há mais de 1 ano.
2. Os cônjuges não têm de revelar a causa do divórcio, mas devem acordar sobre a prestação de alimentos ao cônjuge que deles careça, o exercício do poder paternal relativamente aos filhos menores e o destino da casa de morada da família.
3. Os cônjuges devem acordar ainda sobre o regime que vigorará, no período da pendência do processo, quanto à prestação de alimentos, ao exercício do poder paternal e à utilização da casa de morada da família.
1. Recebido o requerimento, o juiz deve convocar os cônjuges para uma conferência em que tentará conciliá-los.
2. Não sendo a conciliação obtida, o juiz deve apreciar na conferência os acordos a que se referem os n.os 2 e 3 do artigo anterior.
3. Caso os acordos não acautelem suficientemente os interesses de um dos cônjuges ou dos filhos, o juiz pode:
a) Alterar os acordos referidos no n.º 3 do artigo anterior, ouvidos os cônjuges, quando o interesse dos filhos o exigir;
b) Convidar os cônjuges a alterar os acordos referidos no n.º 2 do artigo anterior, sob pena de indeferimento do pedido, fixando prazo para o efeito.
4. Salvo se os cônjuges não persistirem no seu propósito, o dever de coabitação fica suspenso a partir da conferência.
5. Caso haja lugar, nos termos do artigo seguinte, a uma segunda conferência, o termo do prazo concedido pelo juiz nos termos da alínea b) do n.º 3 não poderá ultrapassar a data da sua realização.
1. Quando os cônjuges tiverem filhos comuns menores, ou, em primeira conferência, não houverem demonstrado de modo inequívoco a insusceptibilidade de se conciliarem, o juiz convocá-los-á para uma segunda conferência a realizar entre 3 a 6 meses, e na qual tentará de novo conciliá-los.
2. Se os cônjuges persistirem no seu propósito de se divorciarem, o juiz, caso tenha usado da prerrogativa concedida pela alínea b) do n.º 3 do artigo anterior, apreciará a alteração aos acordos aí previstos.
1. O juiz, em primeira conferência, caso não seja necessária uma segunda conferência e não tenha usado da prerrogativa concedida pela alínea b) do n.º 3 do artigo 1631.º, proferirá sentença na qual decretará o divórcio e homologará os acordos referidos nos n.os 2 e 3 do artigo 1630.º; se tiver usado da prerrogativa concedida pela alínea b) do n.º 3 do artigo 1631.º, proferirá, após o decurso do prazo concedido, sentença na qual decretará o divórcio e homologará os acordos previstos no n.º 2 do artigo 1630.º, caso estes acautelem suficientemente os interesses de ambos os cônjuges e dos filhos, ou indeferirá o pedido no caso contrário.
2. Sendo necessária a segunda conferência, e persistindo os cônjuges no seu propósito de se divorciarem, o juiz decretará o divórcio e homologará os acordos previstos no n.º 2 do artigo 1630.º; tendo, porém, usado da prerrogativa concedida pela alínea b) do n.º 3 do artigo 1631.º, o juiz indeferirá o pedido de divórcio caso os acordos não acautelem suficientemente os interesses de ambos os cônjuges e dos filhos.
1. Ao divórcio por mútuo consentimento decretado pelo conservador do registo civil é aplicável o disposto nas leis do registo civil e, em tudo o que aí não se encontre especialmente previsto, subsidiariamente, e com as necessárias adaptações, o disposto na presente secção e no Código de Processo Civil.
2. As decisões proferidas pelo conservador produzem os mesmos efeitos das sentenças judiciais sobre idêntica matéria.
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 11/2024
1. Qualquer dos cônjuges pode requerer o divórcio se o outro violar culposamente os deveres conjugais, quando a violação, pela sua gravidade ou reiteração, comprometa a possibilidade da vida em comum.
2. Na apreciação da gravidade dos factos invocados, deve o tribunal tomar em conta, nomeadamente, a culpa que possa ser imputada ao requerente e o grau de educação e sensibilidade moral dos cônjuges.
O cônjuge não pode obter o divórcio, nos termos do artigo anterior:
a) Se tiver instigado o outro a praticar o facto invocado como fundamento do pedido ou tiver intencionalmente criado condições propícias à sua verificação; ou
b) Se houver revelado pelo seu comportamento posterior, designadamente por perdão, expresso ou tácito, não considerar o acto praticado como impeditivo da vida em comum.
São ainda fundamentos do divórcio litigioso:
a) A separação de facto por 2 anos consecutivos;
b) A ausência, sem que do ausente haja notícias, por tempo não inferior a 3 anos;
c) A alteração das faculdades mentais do outro cônjuge, quando dure há mais de 3 anos e, pela sua gravidade, comprometa a possibilidade de vida em comum.
1. Entende-se que há separação de facto, para os efeitos da alínea a) do artigo anterior, quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges e há da parte de ambos, ou de um deles, o propósito de não a restabelecer.
2. Na acção de divórcio com fundamento em separação de facto, o juiz deve declarar a culpa dos cônjuges, quando a haja, nos termos do artigo 1642.º
É aplicável ao divórcio decretado com fundamento em ausência o disposto no n.º 2 do artigo anterior.
1. Só tem legitimidade para intentar acção de divórcio, nos termos do artigo 1635.º, o cônjuge ofendido ou, estando este interdito por anomalia psíquica, o seu representante legal, com autorização do conselho de família; quando o representante legal seja o outro cônjuge, a acção pode ser intentada, em nome do ofendido, por qualquer parente deste na linha recta ou até ao terceiro grau da linha colateral, se for igualmente autorizado pelo conselho de família.
2. O divórcio pode ser requerido por qualquer dos cônjuges com o fundamento da alínea a) do artigo 1637.º; com os fundamentos das alíneas b) e c) do mesmo artigo, só pode ser requerido pelo cônjuge que invoca a ausência ou a alteração das faculdades mentais do outro.
3. O direito ao divórcio não se transmite por morte, mas a acção pode ser continuada pelos herdeiros do autor para efeitos patrimoniais, nomeadamente os decorrentes da declaração prevista no artigo 1642.º, se o autor falecer na pendência da causa; para os mesmos efeitos, pode a acção prosseguir contra os herdeiros do réu.
1. O direito ao divórcio caduca no prazo de 3 anos, a contar da data em que o cônjuge ofendido ou o seu representante legal teve conhecimento do facto susceptível de fundamentar o pedido.
2. O prazo de caducidade corre separadamente em relação a cada um dos factos; tratando-se de facto continuado, só corre a partir da data em que o facto tiver cessado.
1. Se houver culpa de um ou de ambos os cônjuges, assim o deve declarar a sentença; sendo a culpa de um dos cônjuges consideravelmente superior à do outro, a sentença deve declarar ainda qual deles é o principal culpado.
2. O disposto no número anterior é aplicável mesmo que o réu não tenha deduzido reconvenção ou já tenha decorrido, relativamente aos factos alegados, o prazo referido no artigo anterior.
O divórcio dissolve o casamento e tem juridicamente os mesmos efeitos da dissolução por morte, salvas as excepções consagradas na lei.
1. Os efeitos do divórcio produzem-se a partir da data em que a respectiva sentença transita em julgado ou a decisão se torna definitiva, mas retrotraem-se à data da proposição do processo quanto às relações patrimoniais entre os cônjuges.
2. Se a falta de coabitação entre os cônjuges estiver provada no processo, qualquer deles pode requerer que os efeitos do divórcio se retrotraiam à data, que a sentença deve fixar, em que a coabitação tenha cessado por culpa exclusiva ou predominante do outro.
3. Os efeitos patrimoniais do divórcio só podem ser opostos a terceiros a partir da data do registo da sentença ou decisão.
O cônjuge declarado único ou principal culpado não pode na partilha receber mais do que receberia se o casamento tivesse sido celebrado segundo o regime da comunhão de adquiridos.
1. O cônjuge declarado único ou principal culpado perde todos os benefícios recebidos ou que tenha a receber do outro cônjuge ou de terceiro, em vista do casamento ou em consideração do estado de casado, quer a estipulação seja anterior quer posterior à celebração do casamento.
2. Não se consideram benefícios, para efeitos deste artigo, aquilo a que o cônjuge tenha direito por força do regime de bens nem os donativos que haja recebido em conformidade com os usos sociais.
3. O cônjuge inocente ou que não seja o principal culpado conserva todos os benefícios recebidos ou que haja de receber do outro cônjuge ou de terceiro, ainda que tenham sido estipulados com cláusula de reciprocidade, mas pode renunciar a esses benefícios por declaração unilateral de vontade, efectuada nos termos do n.º 2 do artigo 1597.º; havendo filhos do casal, a renúncia presume-se em benefício dos mesmos.
4. É aplicável à renúncia, com as necessárias adaptações, o disposto nos n.os 4 e 5 do artigo 1597.º
1. O cônjuge declarado único ou principal culpado e, bem assim, o cônjuge que pediu o divórcio com o fundamento da alínea c) do artigo 1637.º devem reparar os danos não patrimoniais causados ao outro cônjuge pela dissolução do casamento.
2. O pedido de indemnização deve ser deduzido na própria acção de divórcio.
1. Pode o tribunal dar de arrendamento a qualquer dos cônjuges, a seu pedido, a casa de morada da família, quer esta seja comum quer própria do outro, considerando as necessidades de cada um dos cônjuges, o interesse dos filhos e quaisquer outras razões atendíveis.
2. O arrendamento previsto no número anterior fica sujeito às regras do arrendamento para habitação, mas o tribunal pode definir as condições do contrato, ouvidos os cônjuges, e fazer caducar o arrendamento, a requerimento do senhorio, quando circunstâncias supervenientes o justifiquem.
Independentemente das circunstâncias em que se deu a concepção ou ocorreu o nascimento, a lei confere os mesmos poderes e deveres emergentes da relação de filiação.
1. Os poderes e deveres emergentes da filiação ou do parentesco nela fundado só são atendíveis se a filiação se encontrar legalmente estabelecida.
2. O estabelecimento da filiação tem, todavia, eficácia retroactiva.
Nas acções relativas à filiação são admitidos como meios de prova os exames de sangue e quaisquer outros métodos cientificamente comprovados.
Salvo nos casos especificados na lei, a prova da filiação só pode fazer-se pela forma estabelecida nas leis do registo civil.
O momento da concepção do filho é fixado, para os efeitos legais, dentro dos primeiros 120 dias dos 300 que precederem o seu nascimento, salvas as excepções dos artigos seguintes.
1. Se dentro dos 300 dias anteriores ao nascimento tiver sido interrompida ou completada outra gravidez, não são considerados para a determinação do momento da concepção os dias que tiverem decorrido até à interrupção da gravidez ou ao parto.
2. A prova da interrupção de outra gravidez, não havendo registo do facto, é efectuada judicialmente a requerimento de qualquer interessado ou do Ministério Público.
1. É admitida acção judicial destinada a fixar a data provável da concepção dentro do período referido no artigo 1653.º, ou a provar que o período de gestação do filho foi inferior a 180 dias ou superior a 300.
2. A acção pode ser proposta por qualquer interessado ou pelo Ministério Público; se for julgada procedente, deve o tribunal fixar, em qualquer dos casos referidos no número anterior, a data provável da concepção.
1. A declaração de maternidade, a perfilhação e o estabelecimento da filiação em acção de investigação de maternidade ou de paternidade são ineficazes no que aproveite patrimonialmente ao declarante ou proponente, nomeadamente para efeitos sucessórios e de alimentos, quando:
a) Sejam efectuadas ou intentadas decorridos mais de 15 anos após o conhecimento dos factos dos quais se poderia concluir a relação de filiação; e
b) As circunstâncias tornem patente que o propósito principal que moveu a declaração ou proposição da acção foi o da obtenção de benefícios patrimoniais.
2. O prazo fixado na alínea a) do número anterior, para além de estar sujeito às restantes regras da prescrição, não começa nem corre enquanto:
a) O declarante ou proponente não for maior ou emancipado;
b) O declarante ou proponente se encontrar interdito por anomalia psíquica ou sofrer de demência notória;
c) Entre o filho e a pretensa mãe ou pai existir posse de estado; ou
d) Para efeitos das acções de investigação de maternidade ou paternidade propostas pelo filho, este e a pretensa mãe ou pai forem reputados e se tratarem entre eles respectivamente como filho e mãe ou filho e pai.
3. Existe posse de estado quando se verifiquem, cumulativamente, os seguintes requisitos:
a) Serem o filho e a pretensa mãe ou pai reputados e tratados entre eles respectivamente como filho e mãe ou filho e pai;
b) Serem reputados como tais nas relações sociais, especialmente nas respectivas famílias.
1. Relativamente à mãe, a filiação resulta do facto do nascimento e estabelece-se nos termos dos artigos 1658.º a 1684.º
2. A paternidade presume-se em relação ao marido da mãe e, nos casos de filiação fora do casamento, estabelece-se pelo reconhecimento.
1. Aquele que declarar o nascimento deve, sempre que possa, identificar a mãe do registando.
2. A maternidade indicada é mencionada no registo.
3. Para a declaração de maternidade basta a capacidade natural de entender o nascimento, bem como, sendo a declaração efectuada por terceiros, de identificar a mãe.
4. A declaração de maternidade feita por quem à data da declaração não estivesse nas condições referidas no número anterior é anulável a requerimento da pessoa declarada como mãe ou, sendo esta incapaz, dos seus pais ou tutor, até 1 ano após o conhecimento da declaração.
5. À declaração de maternidade efectuada pela mãe aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1712.º e 1714.º
1. No caso de declaração de nascimento ocorrido há menos de 1 ano, a maternidade indicada considera-se estabelecida.
2. Lavrado o registo, deve o conteúdo do assento ser comunicado à mãe do registado sempre que possível, mediante notificação pessoal, salvo se a declaração tiver sido feita por ela ou pelo marido.
1. No caso de declaração de nascimento ocorrido há 1 ano ou mais, a maternidade indicada considera-se estabelecida se a mãe for o declarante, estiver presente no acto ou nele se achar representada por procurador com poderes especiais.
2. Fora dos casos previstos no número anterior, a pessoa indicada como mãe é notificada pessoalmente para, no prazo de 15 dias, vir declarar se confirma a maternidade; o facto da notificação e a confirmação são averbados ao registo do nascimento.
3. Se a pretensa mãe não puder ser notificada ou não confirmar a maternidade, a menção da maternidade fica sem efeito.
4. Das certidões extraídas do registo de nascimento não pode constar qualquer referência à menção que tenha ficado sem efeito nem aos averbamentos que lhe respeitem.
1. A mãe pode, mesmo após a morte do filho, fazer a declaração de maternidade se o registo for omisso quanto a esta, salvo se se verificar a situação prevista no artigo 1683.º
2. Quando a mãe possa fazer a declaração de maternidade, qualquer das pessoas a quem compete fazer a declaração do nascimento tem a faculdade de identificar a mãe do registado, sendo aplicável o disposto nos artigos 1658.º a 1660.º
3. É igualmente válida, ainda que não produza quaisquer efeitos enquanto não puder ser registada, a declaração de maternidade contra o que consta do registo, desde que feita pela mãe por testamento, por escritura pública ou por termo lavrado em juízo.
1. A declaração de maternidade não comporta cláusulas que limitem ou modifiquem os efeitos que lhe são atribuídos por lei, nem admite condição ou termo.
2. As cláusulas ou declarações proibidas não invalidam a declaração de maternidade, mas têm-se por não escritas.
3. Contudo, se das cláusulas ou declarações proibidas resultarem dúvidas acerca da progenitura, tem-se a declaração por não efectuada.
A declaração de maternidade feita depois de intentada em juízo acção de investigação da maternidade contra pessoa diferente da declarada como mãe fica sem efeito, e o respectivo registo deve ser cancelado, se a acção for julgada procedente.
A declaração de maternidade é irrevogável e, quando feita em testamento, não é prejudicada pela revogação deste.
1. Se a maternidade estabelecida nos termos dos artigos anteriores não for a verdadeira, pode ser impugnada em juízo:
a) Pela pessoa declarada como mãe;
b) Pelo registado;
c) Por quem se declarar mãe do registado;
d) Pelo pai;
e) Por quem tenha interesse moral ou patrimonial na procedência da acção; ou
f) Pelo Ministério Público.
2. A maternidade pode a todo o tempo ser impugnada, mesmo depois da morte da pessoa declarada como filho.
3. Contudo, se entre a pessoa declarada como mãe e o registado houver posse de estado mantida por um período mínimo de 15 anos, a acção de impugnação intentada pelas pessoas ou entidade indicadas nas alíneas c) a f) do n.º 1 não procederá contra a vontade conjunta da pessoa declarada como mãe e do filho, contanto que estes tenham discernimento para entender e querer os efeitos da acção.
4. Existe posse de estado quando se verifiquem, cumulativamente, os seguintes requisitos:
a) Serem o registado e a pessoa declarada como mãe reputados e tratados entre eles respectivamente como filho e mãe;
b) Serem reputados como tais nas relações sociais, especialmente nas respectivas famílias.
5. Se uma ou ambas as partes da relação controvertida tiverem falecido ou carecerem do discernimento necessário à oposição, presume-se, até prova em contrário, que a sua vontade hipotética seria contrária à impugnação.
1. Na acção de impugnação de maternidade devem ser demandados, quando nela não figurem como autores, a pessoa declarada como mãe, o filho e o presumido pai.
2. A acção deve ser intentada ou prosseguir:
a) No caso de morte da pessoa declarada como mãe ou do presumido pai, contra o cônjuge, os descendentes e ascendentes;
b) No caso de morte do filho, contra o cônjuge e os descendentes.
3. O tribunal nomeia curador especial quando faltarem as pessoas indicadas no número anterior, bem como ao filho menor não emancipado.
4. Quando existam herdeiros ou legatários cujos direitos sejam atingidos pela procedência da acção, esta não produzirá efeitos contra eles se não tiverem sido também demandados.
1. Sempre que a maternidade não esteja mencionada no registo do nascimento, deve o funcionário remeter ao tribunal certidão integral do registo e cópia do auto de declarações, se as houver, a fim de se averiguar oficiosamente a maternidade.
2. O tribunal deve proceder às diligências necessárias para identificar a mãe; se por qualquer modo chegar ao seu conhecimento a identidade da pretensa mãe, deve ouvi-la em declarações, que serão reduzidas a auto.
3. Se a pretensa mãe confirmar a maternidade, é lavrado termo e remetida certidão para averbamento à conservatória competente para o registo.
4. Se a maternidade não for confirmada, mas o tribunal concluir pela existência de provas seguras que abonem a viabilidade da acção de investigação, ordenará a remessa do processo ao agente do Ministério Público junto do tribunal competente, a fim de a acção ser proposta.
A acção de investigação oficiosa da maternidade não pode ser intentada após terem decorrido 2 anos sobre a data do nascimento.
Se, em consequência do disposto no artigo 1667.º, o tribunal concluir pela existência de provas seguras de que o filho nasceu ou foi concebido na constância do matrimónio da pretensa mãe, ordenará a remessa do processo ao agente do Ministério Público junto do tribunal competente a fim de ser intentada a acção a que se refere o artigo 1681.º, salvo se já houver decorrido o prazo referido no artigo anterior.
Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 1667.º, as declarações prestadas durante o processo a que se refere o artigo 1667.º não implicam presunção de maternidade nem constituem sequer princípio de prova.
A instrução do processo é secreta e será conduzida por forma a evitar ofensa ao pudor ou dignidade das pessoas.
A improcedência da acção oficiosa não obsta a que seja intentada nova acção de investigação de maternidade, ainda que fundada nos mesmos factos.
Quando não resulte de declaração, nos termos dos artigos anteriores, a maternidade pode ser reconhecida em acção especialmente intentada pelo filho para esse efeito.
O pai menor do filho cuja maternidade é investigada tem legitimidade para intentar a acção em representação deste sem necessidade de autorização dos pais dele, mas é sempre representado na causa por curador especial nomeado pelo tribunal.
Não é admitido o reconhecimento da maternidade em contrário da que conste do registo de nascimento.
1. Na acção de investigação de maternidade o filho deve provar que nasceu da pretensa mãe.
2. A maternidade presume-se:
a) Quando o filho houver sido reputado e tratado como tal pela pretensa mãe e reputado como filho também pelo público; ou
b) Quando exista carta ou outro escrito no qual a pretensa mãe declare inequivocamente a sua maternidade.
3. A presunção considera-se ilidida quando existam dúvidas sérias sobre a maternidade.
1. A acção de investigação da maternidade pode ser proposta a todo o tempo.
2. O cônjuge ou os descendentes do filho podem prosseguir na acção, se este falecer na pendência da causa; podem igualmente propô-la até 1 ano após a morte do filho, se este morreu sem a haver intentado.
1. A acção deve ser proposta contra a pretensa mãe ou, se esta tiver falecido, contra o cônjuge sobrevivo e também, sucessivamente, contra os descendentes, ascendentes ou irmãos; na falta destas pessoas, é nomeado curador especial.
2. Quando existam herdeiros ou legatários cujos direitos sejam atingidos pela procedência da acção, esta não produzirá efeitos contra eles se não tiverem sido também demandados.
Na acção de investigação de maternidade é permitida a coligação de investigantes em relação ao mesmo pretenso progenitor.
O filho menor, interdito ou inabilitado tem direito a alimentos provisórios desde a proposição da acção, contanto que o tribunal considere provável o reconhecimento da maternidade.
1. Se se tratar de filho nascido ou concebido na constância do matrimónio da pretensa mãe, a acção de investigação deve ser intentada também contra o marido e, se existir perfilhação, ainda contra o perfilhante.
2. A acção referida no número anterior pode igualmente ser intentada a todo o tempo pelo marido da pretensa mãe; neste caso deverá sê-lo contra a pretensa mãe e contra o filho e, se existir perfilhação, também contra o perfilhante.
1. Na acção a que se refere o artigo anterior pode ser sempre impugnada a presunção de paternidade do marido da mãe.
2. Se o filho tiver sido perfilhado por pessoa diferente do marido da mãe, a perfilhação só prevalece se for afastada, nos termos do número anterior, a presunção de paternidade ou se a perfilhação não for impugnável por força do n.º 4 do artigo 1710.º
1. Se se tratar de filho nascido ou concebido na constância do matrimónio e existir perfilhação por pessoa diferente do marido da mãe, pode esta, a todo o tempo, requerer ao tribunal que declare a maternidade.
2. No caso referido no número anterior, é aplicável, com as devidas adaptações, o disposto nos artigos 1681.º e 1682.º
Em caso de falecimento do autor ou dos réus nas acções a que se referem os artigos 1681.º a 1683.º, é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 2 do artigo 1677.º e no artigo 1678.º
1. Presume-se que o filho nascido ou concebido na constância do matrimónio tem como pai o marido da mãe.
2. O momento da dissolução do casamento por divórcio ou da sua anulação é o da data em que a respectiva sentença transita em julgado ou a decisão se torna definitiva.
A anulação do casamento, ainda que contraído de má fé por ambos os cônjuges, não exclui a presunção de paternidade.
1. Relativamente ao filho nascido dentro dos 180 dias posteriores à celebração do casamento, cessa a presunção estabelecida no artigo 1685.º se a mãe ou o marido declararem no acto do registo do nascimento que o marido não é o pai.
2. Contudo, a declaração efectuada pela mãe de que o marido não é o pai, quando exista posse de estado entre este e o filho mantida por um período mínimo de 15 anos, não produz efeitos contra a vontade conjunta destes.
3. Ao caso do número anterior é aplicável com as devidas adaptações o disposto nos n.os 4 e 5 do artigo 1665.º
1. Cessa igualmente a presunção de paternidade, se o nascimento do filho ocorrer passados 300 dias depois de finda a coabitação dos cônjuges, nos termos do número seguinte.
2. Considera-se finda a coabitação dos cônjuges:
a) Na data da primeira conferência, tratando-se de divórcio por mútuo consentimento;
b) Na data da citação do réu para a acção de anulação ou de divórcio litigioso, ou na data que a sentença fixar como a da cessação da coabitação;
c) Na data em que deixou de haver notícias do marido, conforme decisão proferida em acção de declaração da ausência ou de declaração de morte presumida.
Para o efeito do disposto no n.º 1 do artigo 1685.º, são equiparados a novo casamento:
a) O regresso do ausente, sem que o casamento se encontre dissolvido;
b) A sentença transitada em julgado ou a decisão definitiva que, sem ter anulado o casamento ou decretado o divórcio, pôs termo ao respectivo processo.
1. Quando o início do período legal da concepção seja anterior à data em que transite em julgado a sentença ou se torne definitiva a decisão proferida nos processos a que se referem as alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 1688.º, renasce a presunção de paternidade se, em acção intentada por um dos cônjuges ou pelo filho, se provar que no período legal da concepção existiram relações entre os cônjuges que tornam verosímil a paternidade do marido ou que o filho, na ocasião do nascimento, beneficiou de posse de estado relativamente a ambos os cônjuges.
2. Existe posse de estado relativamente a ambos os cônjuges quando se verifiquem, cumulativamente, os seguintes requisitos:
a) Ser a pessoa reputada e tratada como filho por ambos os cônjuges;
b) Ser reputada como tal nas relações sociais, especialmente nas respectivas famílias.
3. Se existir perfilhação, na acção a que se refere o n.º 1 deve ser igualmente demandado o perfilhante, sendo neste caso aplicável o disposto no n.º 4 do artigo 1710.º
1. A mulher casada pode fazer a declaração de maternidade com a indicação de que o filho não é do marido.
2. A declaração prevista no número anterior faz cessar a presunção de paternidade.*
3. Cessando a presunção de paternidade, no caso previsto no número anterior, pode, desde logo, ser aceite o reconhecimento voluntário da paternidade, sem prejuízo do disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 1687.º, aplicável com as necessárias adaptações.*
4. Sem prejuízo do disposto no n.º 1, não são admissíveis no registo de nascimento menções que contrariem a presunção de paternidade enquanto esta não cessar.
5. Se a mãe fizer a declaração prevista no n.º 1, o poder paternal só caberá ao marido quando for averbada ao registo a menção da sua paternidade.
6. Quando a presunção de paternidade houver cessado nos termos do n.º 2, é aplicável o disposto no artigo anterior.
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 11/2024
* Revogado - Consulte também: Lei n.º 11/2024
1. Se o filho nasceu depois de a mãe ter contraído novo casamento sem que o primeiro se achasse dissolvido ou dentro dos 300 dias após a sua dissolução, presume-se que o pai é o segundo marido.
2. Julgada procedente a acção de impugnação de paternidade, renasce a presunção relativa ao anterior marido da mãe.
1. A paternidade presumida nos termos dos artigos anteriores constará obrigatoriamente do registo do nascimento do filho, não sendo admitidas menções que a contrariem, salvo o disposto nos artigos 1687.º e 1691.º
2. Se o registo do casamento dos pais só vier a ser efectuado depois do registo do nascimento, e deste não constar a paternidade do marido da mãe, será a paternidade mencionada oficiosamente.
1. Se contra o disposto na lei não se fizer menção da paternidade do filho nascido de mulher casada, pode a todo o tempo qualquer interessado, o Ministério Público ou o funcionário competente promover a rectificação do registo.
2. De igual faculdade gozam as mesmas pessoas quando tenha sido registado como filho do marido da mãe quem não beneficie de presunção de paternidade, sem prejuízo da aplicação do disposto no n.º 4 do artigo 1697.º
1. Se for rectificado, declarado inexistente ou nulo ou cancelado qualquer registo por falsidade ou qualquer outra causa e, em consequência da rectificação, declaração de inexistência ou nulidade ou cancelamento, o filho deixar de ser havido como filho do marido da mãe ou passar a beneficiar da presunção de paternidade relativamente a este, é lavrado oficiosamente o respectivo averbamento, se não tiver sido ordenado pelo tribunal.
2. O disposto no número anterior não prejudica, para os casos em que o filho deixe de ser havido como filho do marido da mãe, a aplicação, com as necessárias adaptações, do disposto no n.º 4 do artigo seguinte.
1. Se a paternidade presumida nos termos do artigo 1685.º não for a verdadeira, pode ser impugnada em juízo:
a) Pelo presumido pai;
b) Pelo filho;
c) Pela mãe;
d) Por quem se declarar pai do filho;
e) Por quem tenha interesse moral ou patrimonial na procedência da acção; ou
f) Pelo Ministério Público.
2. Na acção o autor deve provar que, de acordo com as circunstâncias, a paternidade do marido da mãe é manifestamente improvável.
3. A paternidade pode ser impugnada a todo o tempo, mesmo depois da morte da pessoa declarada como filho.
4. É aplicável, com as devidas adaptações, o disposto nos n.os 3 a 5 do artigo 1665.º; para o efeito, as referências constantes do n.º 3 desse artigo às alíneas do n.º 1 devem ser lidas como remissões para as alíneas correspondentes do n.º 1 do presente artigo.
1. A mãe ou o marido podem ainda impugnar a paternidade do filho nascido dentro dos 180 dias posteriores à celebração do casamento independentemente da prova a que se refere o n.º 2 do artigo anterior, excepto:
a) Se o marido, antes de casar, teve conhecimento da gravidez da mulher;
b) Se, estando pessoalmente presente ou representado por procurador com poderes especiais, o marido consentiu que o filho fosse declarado seu no registo do nascimento; ou
c) Se por qualquer outra forma o marido reconheceu o filho como seu.
2. Cessa o disposto na alínea a) do número anterior, se se provar que à data do casamento havia da parte do marido um erro sobre circunstâncias que tenham contribuído decisivamente para o convencimento da paternidade, ou se o casamento for anulado por falta de vontade ou por coacção moral exercida contra o marido.
3. Cessa o disposto nas alíneas b) e c) do n.º 1, quando se prove ter sido o consentimento ou reconhecimento viciado por erro, nas condições enunciadas no número anterior, ou extorquido por coacção.
4. O disposto no presente artigo e no artigo seguinte não prejudica a possibilidade de impugnação da paternidade de acordo com o regime estabelecido no artigo anterior.
1. O regime do artigo anterior só é aplicável às acções de impugnação intentadas:
a) Pelo marido, no prazo de 2 anos contados desde que teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade;
b) Pela mãe, dentro dos 2 anos posteriores ao nascimento.
2. Se o registo for omisso quanto à maternidade, o prazo fixado na alínea a) do número anterior conta-se a partir do estabelecimento da maternidade.
3. Se o titular do direito de impugnar a paternidade falecer no decurso da acção, ou sem a haver intentado, mas antes de findar o prazo estabelecido nos números anteriores, têm legitimidade para nela prosseguir, ou para a intentar, o cônjuge que não seja progenitor do filho, os descendentes e os ascendentes.
4. O direito de impugnação conferido às pessoas mencionadas no número anterior caduca, se a acção não for proposta no prazo de 90 dias a contar da morte do marido ou da mãe, ou do nascimento de filho póstumo.
Às acções de impugnação de paternidade é aplicável o disposto no artigo 1666.º
O reconhecimento do filho nascido ou concebido fora do matrimónio efectua-se por perfilhação ou decisão judicial em acção de investigação.
1. Não é admitido o reconhecimento em contrário da filiação que conste do registo de nascimento enquanto este não for rectificado, declarado inexistente ou nulo ou cancelado.
2. O disposto no número anterior não invalida a perfilhação feita por alguma das formas mencionadas nas alíneas b) a d) do artigo 1707.º, embora ela não produza efeitos enquanto não puder ser registada.
A perfilhação é o acto pelo qual o progenitor declara a sua paternidade.
A perfilhação é um acto pessoal; pode, contudo, ser feita por intermédio de procurador com poderes especiais.
1. Têm capacidade para perfilhar os indivíduos maiores de 16 anos, se não estiverem interditos por anomalia psíquica ou não forem notoriamente dementes no momento da perfilhação.
2. Os menores e os interditos que disponham de capacidade nos termos do número anterior, bem com os inabilitados, não necessitam de autorização dos pais, tutores ou curadores para perfilhar.
3. Para efeitos do n.º 1, considera-se notória a demência certa e inequívoca, independentemente da sua cognoscibilidade por terceiros.
Não obsta à perfilhação o facto de a maternidade do perfilhando não se encontrar declarada no registo.
A perfilhação pode fazer-se:
a) Por declaração prestada perante o funcionário do registo civil;
b) Por testamento;
c) Por escritura pública; ou
d) Por termo lavrado em juízo.
A perfilhação pode ser feita a todo o tempo, antes ou depois do nascimento do filho ou depois da morte deste.
A perfilhação de nascituro só é válida se for posterior à concepção e o perfilhante identificar a mãe.
1. A perfilhação que não corresponda à verdade é impugnável em juízo mesmo depois da morte do perfilhado.
2. A acção pode ser intentada, a todo o tempo:
a) Pelo perfilhante;
b) Pelo perfilhado;
c) Por quem se declare pai do perfilhado;
d) Pela mãe;
e) Por quem tenha interesse moral ou patrimonial na procedência da acção; ou
f) Pelo Ministério Público.
3. A mãe ou o filho, quando autores, só têm de provar que o perfilhante não é o pai se este demonstrar ser verosímil que coabitou com a mãe do perfilhado no período da concepção.
4. É aplicável, com as devidas adaptações, o disposto nos n.os 3 a 5 do artigo 1665.º; para o efeito, as referências constantes do n.º 3 desse artigo às alíneas do n.º 1 devem ser lidas como remissões para as alíneas correspondentes do n.º 2 do presente artigo.
1. Na acção de impugnação devem ser demandados, quando nela não figurem como autores, o filho e o perfilhante.
2. A acção deve ser intentada ou prosseguir:
a) No caso de morte do perfilhante, contra o cônjuge, os descendentes e ascendentes;
b) No caso de morte do filho, contra o cônjuge e os descendentes.
3. É aplicável a esta acção o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 1666.º
1. A perfilhação é anulável judicialmente a requerimento do perfilhante quando viciada por erro ou coacção moral.
2. Só é relevante o erro sobre circunstâncias que tenham contribuído decisivamente para o convencimento da paternidade.
3. A acção de anulação caduca no prazo de 1 ano, a contar do momento em que o perfilhante teve conhecimento do erro ou em que cessou a coacção, salvo se ele for menor não emancipado ou interdito por anomalia psíquica; neste caso a acção não caduca sem ter decorrido 1 ano sobre a maioridade, emancipação ou levantamento da interdição.
1. A perfilhação é anulável por incapacidade do perfilhante a requerimento deste ou de seus pais ou tutor.
2. A acção pode ser intentada dentro de 1 ano, contado:
a) Do conhecimento da perfilhação, quando intentada pelos pais ou tutor;
b) Da maioridade ou emancipação, quando intentada pelo que perfilhou antes da idade exigida por lei;
c) Do termo da incapacidade, quando intentada por quem perfilhou estando interdito por anomalia psíquica ou notoriamente demente.
Se o perfilhante falecer sem haver intentado a acção de anulação, e antes de o prazo expirar, ou se falecer no decurso dela, têm legitimidade para a intentar no ano seguinte à sua morte, ou nela prosseguir, o seu cônjuge, os seus descendentes ou ascendentes e todos os que mostrem ter sido prejudicados nos seus direitos sucessórios por efeito da perfilhação.
É aplicável à perfilhação, com as devidas adaptações, o disposto nos artigos 1662.º a 1664.º
Sempre que seja lavrado registo de nascimento de menor apenas com a maternidade estabelecida, deve o funcionário remeter ao tribunal certidão integral do registo, a fim de se averiguar oficiosamente a identidade do pai.
1. Sempre que possível, o tribunal ouvirá a mãe acerca da paternidade que atribui ao filho.
2. Se a mãe indicar quem é o pai ou por outro meio chegar ao conhecimento do tribunal a identidade do pretenso progenitor, será este também ouvido.
3. No caso de o pretenso progenitor confirmar a paternidade será lavrado termo de perfilhação e remetida certidão para averbamento à conservatória competente para o registo.
4. Se o pretenso pai negar ou se recusar a confirmar a paternidade, o tribunal deve proceder às diligências necessárias para averiguar a viabilidade da acção de investigação de paternidade.
5. Se o tribunal concluir pela existência de provas seguras da paternidade, ordenará a remessa do processo ao agente do Ministério Público junto do tribunal competente, a fim de ser intentada a acção de investigação.
É aplicável à acção oficiosa de investigação de paternidade, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1668.º e 1670.º a 1672.º
A paternidade pode ser reconhecida em acção especialmente intentada pelo filho.
1. Na acção de investigação de paternidade o autor deve provar a paternidade biológica.
2. No caso de a maternidade já se achar estabelecida ou for pedido conjuntamente o reconhecimento da maternidade e da paternidade, a paternidade presume-se:
a) Quando o filho houver sido reputado e tratado como tal pelo pretenso pai e reputado como filho também pelo público;
b) Quando exista carta ou outro escrito no qual o pretenso pai declare inequivocamente a sua paternidade;
c) Quando, durante o período legal da concepção, tenha existido união de facto, independentemente das condições exigidas pelo artigo 1472.º, ou concubinato duradouro entre a mãe e o pretenso pai; ou
d) Quando o pretenso pai tenha seduzido a mãe, no período legal da concepção, se esta era virgem e menor no momento em que foi seduzida, ou se o consentimento dela foi obtido por meio de promessa de casamento, abuso de confiança ou abuso de autoridade.
3. A presunção considera-se ilidida quando existam dúvidas sérias sobre a paternidade do investigado.
Na acção de investigação de paternidade é permitida a coligação de investigantes filhos da mesma mãe, em relação ao mesmo pretenso progenitor.
É aplicável à acção de investigação de paternidade, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1674.º, 1677.º, 1678.º e 1680.º
A participação através da simples contribuição com material genético para a procriação medicamente assistida de uma outra pessoa não constitui fundamento para a constituição de qualquer laço de filiação entre o dador e a criança nascida da procriação.
1. Ninguém pode impugnar a filiação de uma criança pelo facto de a sua procriação ter sido medicamente assistida, com recurso a um dador de gâmetas.
2. Contudo, o marido da mãe pode impugnar a paternidade se não deu o seu consentimento para a procriação medicamente assistida ou se provar que a criança não nasceu dessa procriação.
1. O unido de facto que tenha consentido na utilização de métodos de procriação medicamente assistida, pela sua companheira, é considerado o pai da criança que no decurso do tratamento tenha sido concebida, independentemente da condição exigida na alínea c) do n.º 1 do artigo 1472.º
2. Para efeitos do número anterior, o consentimento só pode ser prestado por maior de 18 anos e desde que não se verifique relativamente aos unidos de facto nenhuma das condições referidas nas alíneas b) e c) do artigo 1479.º e no artigo 1480.º
São nulos quaisquer acordos tendentes à procriação ou gestação em nome de terceiro.
1. A informação nominativa relacionada com a procriação medicamente assistida de uma criança é confidencial.
2. Contudo, quando da falta de informação possa resultar uma ofensa grave à saúde de uma pessoa nascida por esse processo, dos seus descendentes ou familiares próximos, o tribunal poderá autorizar a transmissão a título confidencial dessa informação às autoridades médicas envolvidas.
Para efeitos sucessórios, quando tenha sido utilizado material genético de uma pessoa morta, esta pessoa não é considerada o progenitor da criança.
1. Pais e filhos devem-se mutuamente respeito, auxílio e assistência.
2. O dever de assistência compreende a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir, durante a vida em comum, de acordo com os recursos próprios, para os encargos da vida familiar.
1. O filho usa apelidos do pai e da mãe ou só de um deles.
2. A escolha do nome próprio e dos apelidos do filho menor pertence aos pais; na falta de acordo decide o juiz, de harmonia com o interesse do filho.
3. Se a maternidade ou paternidade forem estabelecidas posteriormente ao registo do nascimento, os apelidos do filho podem ser alterados nos termos dos números anteriores.
1. Quando a paternidade se não encontre estabelecida, podem ser atribuídos ao filho menor apelidos do marido da mãe se esta e o marido declararem, perante o funcionário do registo civil, ser essa a sua vontade.
2. Nos 2 anos posteriores à maioridade ou à emancipação, o filho pode requerer que sejam eliminados do seu nome os apelidos do marido da mãe.
3. O mesmo regime é aplicável, com as devidas adaptações, aos casos em que a maternidade se não encontre estabelecida.
Os filhos estão sujeitos ao poder paternal até à maioridade ou emancipação.
1. Compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens.
2. Os filhos devem obediência aos pais; estes, porém, de acordo com a maturidade dos filhos, devem ter em conta a sua opinião nos assuntos familiares importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da própria vida.
Os pais ficam desobrigados de prover ao sustento dos filhos e de assumir as despesas relativas à sua segurança, saúde e educação na medida em que os filhos estejam em condições de suportar, pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos, aqueles encargos.
Se no momento em que atingir a maioridade ou for emancipado o filho não houver completado a sua instrução, mantém-se a obrigação a que se refere o artigo anterior na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento e pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se complete.
1. O poder de representação compreende o exercício de todos os direitos e o cumprimento de todas as obrigações do filho, exceptuados os actos puramente pessoais, aqueles que o menor tem o direito de praticar pessoal e livremente e os actos respeitantes a bens cuja administração não pertença aos pais.
2. Se houver conflito de interesses cuja resolução dependa de autoridade pública, entre qualquer dos pais e o filho sujeito ao poder paternal, ou entre os filhos, ainda que, neste caso, algum deles seja maior, são os menores representados por um ou mais curadores especiais nomeados pelo tribunal.
Os pais não podem renunciar ao poder paternal nem a qualquer dos direitos que ele especialmente lhes confere, sem prejuízo do que neste Código se dispõe acerca da adopção.
O pai ou a mãe não pode introduzir no lar conjugal o filho concebido na constância do matrimónio que não seja filho do seu cônjuge, sem consentimento deste.
1. Cabe aos pais, de acordo com as suas possibilidades, promover o desenvolvimento físico, intelectual e moral dos filhos.
2. Os pais devem proporcionar aos filhos, em especial aos diminuídos física ou mentalmente, adequada instrução geral e profissional, correspondente, na medida do possível, às aptidões e inclinações de cada um.
Pertence aos pais decidir sobre a educação religiosa dos filhos menores de 16 anos.
1. Os menores não podem abandonar a casa de morada da família ou aquela que os pais lhe destinaram, nem dela ser retirados.
2. Se a abandonarem ou dela forem retirados, qualquer dos pais e, em caso de urgência, as pessoas a quem eles tenham confiado o filho podem reclamá-lo, recorrendo, se for necessário, ao tribunal ou à autoridade competente.
Os pais não podem injustificadamente privar os filhos do convívio com os irmãos, descendentes e ascendentes.
1. Os pais não têm a administração:
a) Dos bens do filho que procedam de sucessão da qual os pais tenham sido excluídos por indignidade ou deserdação;
b) Dos bens que tenham advindo ao filho por doação ou sucessão contra a vontade dos pais;
c) Dos bens deixados ou doados ao filho com exclusão da administração dos pais;
d) Dos bens adquiridos pelo filho maior de 16 anos pelo seu trabalho.
2. A exclusão da administração, referida na alínea c) do número anterior, é permitida mesmo relativamente a bens que caibam ao filho a título de legítima.
1. Como representantes do filho não podem os pais, sem autorização do tribunal:
a) Alienar ou onerar bens, salvo tratando-se de alienação onerosa de coisas susceptíveis de perda ou deterioração;
b) Votar, nas assembleias gerais das sociedades, deliberações que importem a sua dissolução;
c) Adquirir empresa comercial ou continuar a exploração da que o filho haja recebido por sucessão ou doação;
d) Entrar em sociedade em nome colectivo ou em comandita simples ou por acções como sócio de responsabilidade ilimitada;
e) Contrair obrigações cambiárias ou resultantes de qualquer título transmissível por endosso;
f) Garantir ou assumir dívidas alheias;
g) Contrair empréstimos;
h) Contrair obrigações cujo cumprimento se deva verificar depois da maioridade;
i) Ceder direitos de crédito;
j) Repudiar herança ou legado;
l) Aceitar herança, doação ou legado com encargos;
m) Locar bens, por prazo superior a 6 anos;
n) Convencionar ou requerer em juízo a divisão de coisa comum ou a liquidação e partilha de patrimónios sociais;
o) Negociar transacção ou comprometer-se em árbitros relativamente a actos referidos nas alíneas anteriores, ou negociar concordata com os credores.
2. Não se considera abrangida na restrição da alínea a) do número anterior a aplicação de dinheiro ou capitais do menor na aquisição de bens.
1. Se ao filho for deixada herança ou legado, ou for feita proposta de doação que necessite de ser aceite, devem os pais aceitar a liberalidade, se o puderem fazer legalmente, ou requerer ao tribunal, no prazo de 30 dias, autorização para a aceitar ou rejeitar.
2. Se, decorrido aquele prazo sobre a abertura da sucessão ou sobre a proposta de doação, os pais nada tiverem providenciado, pode o filho ou qualquer dos seus parentes, o Ministério Público, o doador ou algum interessado nos bens deixados requerer ao tribunal a notificação dos pais para darem cumprimento ao disposto no número anterior, dentro do prazo que lhes for assinado.
3. Se os pais nada declararem dentro do prazo fixado, a liberalidade tem-se por aceite, salvo se o tribunal julgar mais conveniente para o menor a sua rejeição.
1. Se o menor não tiver quem legalmente o represente, qualquer das pessoas mencionadas no n.º 2 do artigo anterior tem legitimidade para requerer ao tribunal a nomeação de um curador especial para os efeitos do disposto no n.º 1 do mesmo artigo.
2. Quando o tribunal recusar autorização aos pais para rejeitarem a liberalidade, é também nomeado oficiosamente um curador para o efeito da sua aceitação.
1. Sem autorização do tribunal não podem os pais tomar de arrendamento ou adquirir, directamente ou por interposta pessoa, ainda que em hasta pública, bens ou direitos do filho sujeito ao poder paternal, nem tornar-se cessionários de créditos ou outros direitos contra este, excepto no caso de sub-rogação legal ou de licitação em processo de inventário.
2. Entende-se que a aquisição é feita por interposta pessoa nos casos referidos no n.º 2 do artigo 573.º
1. Os actos praticados pelos pais em contravenção do disposto nos artigos 1744.º e 1747.º são anuláveis a requerimento do filho, até 1 ano depois de atingir a maioridade ou ser emancipado, ou, se ele entretanto falecer, a pedido dos seus herdeiros, excluídos os próprios pais responsáveis, no prazo de 1 ano a contar da morte do filho.
2. A anulação pode ser requerida depois de findar o prazo se o filho ou seus herdeiros mostrarem que só tiveram conhecimento do acto impugnado nos 6 meses anteriores à proposição da acção.
3. A acção de anulação pode também ser intentada pelas pessoas com legitimidade para requerer a inibição do poder paternal, contanto que o façam no ano seguinte à prática dos actos impugnados e antes de o menor atingir a maioridade ou ser emancipado.
O tribunal pode confirmar os actos praticados pelos pais sem a necessária autorização.
1. Pertence aos pais a propriedade dos bens que o filho menor, vivendo em sua companhia, produza por trabalho prestado aos seus progenitores e com meios ou capitais pertencentes a estes.
2. Os pais devem dar ao filho parte nos bens produzidos ou por outra forma compensá-lo do seu trabalho.
1. Os pais podem utilizar os rendimentos dos bens do filho para satisfazerem as despesas com o sustento, segurança, saúde e educação deste, bem como, dentro de justos limites, com outras necessidades da vida familiar.
2. No caso de só um dos pais exercer o poder paternal, a ele pertence a utilização dos rendimentos do filho, nos termos do número anterior.
3. A utilização de rendimentos de bens que caibam ao filho a título de legítima não pode ser excluída pelo doador ou testador.
Os pais devem administrar os bens dos filhos com o mesmo cuidado com que administram os seus.
1. Sem prejuízo do disposto no artigo 1774.º, os pais não são obrigados a prestar caução como administradores dos bens do filho, excepto quando a este couberem valores móveis e o tribunal, considerando o valor dos bens, o julgue necessário, a pedido das pessoas com legitimidade para a acção de inibição do exercício do poder paternal.
2. Se os pais não prestarem a caução que lhes for exigida, é aplicável o disposto no artigo 1396.º
Os pais não são obrigados a prestar contas da sua administração, sem prejuízo do disposto no artigo 1774.º
1. Os pais devem entregar ao filho, logo que este atinja a maioridade ou, sem prejuízo do disposto no artigo 1521.º, seja emancipado, todos os bens que lhe pertençam; quando por outro motivo cesse o poder paternal ou a administração, devem os bens ser entregues ao representante legal do filho.
2. Os móveis devem ser restituídos no estado em que se encontrarem; não existindo, pagarão os pais o respectivo valor, excepto se houverem sido consumidos em uso comum ao filho ou tiverem perecido por causa não imputável aos progenitores.
1. Na constância do matrimónio dos pais o exercício do poder paternal pertence-lhes a ambos.
2. Os pais exercem o poder paternal de comum acordo e, se este faltar em questões de particular importância, qualquer deles pode recorrer ao tribunal, que tentará a conciliação; se esta não for possível, o tribunal ouvirá, antes de decidir, o filho maior de 12 anos, salvo quando circunstâncias ponderosas o desaconselhem.
1. Se um dos pais praticar acto que integre o exercício do poder paternal, presume-se que age de acordo com o outro, salvo quando a lei expressamente exija o consentimento de ambos os progenitores ou se trate de acto de particular importância; a falta de acordo não é oponível a terceiro de boa fé.
2. O terceiro deve recusar-se a intervir no acto praticado por um dos cônjuges quando, nos termos do número anterior, não se presuma o acordo do outro cônjuge ou quando conheça a oposição deste.
Quando um dos pais não puder exercer o poder paternal por ausência, impossibilidade temporária, incapacidade ou outro impedimento, cabe esse exercício unicamente ao outro progenitor.
Dissolvido o casamento por morte de um dos cônjuges, o poder paternal pertence ao sobrevivo.
1. Nos casos de divórcio, separação de facto ou anulação do casamento, o destino do filho, os alimentos a este devidos e a forma de os prestar são regulados por acordo dos pais sujeito a homologação, sendo a homologação recusada se o acordo não corresponder ao interesse do menor, incluindo o interesse deste em manter com aquele progenitor a quem não seja confiado uma relação de grande proximidade.*
2. Na falta de acordo, o tribunal decidirá de harmonia com o interesse do menor, podendo este ser confiado à guarda de qualquer dos pais ou, quando se verifique alguma das circunstâncias previstas no artigo 1772.º, a terceira pessoa ou a instituição, pública ou particular, adequada.
3. No caso referido no número anterior, é estabelecido um regime de visitas ao progenitor ou progenitores a quem não tenha sido confiada a guarda do filho, a menos que excepcionalmente o interesse deste o desaconselhe.
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 11/2024
1. Nos casos de divórcio, separação de facto ou anulação do casamento, o poder paternal é exercido pelo progenitor a quem o filho foi confiado.
2. Os pais podem, todavia, acordar, nos termos do n.º 1 do artigo anterior, no exercício em comum do poder paternal, decidindo as questões relativas à vida do filho em condições idênticas às que vigoram para tal efeito na constância da vida em conjunto no matrimónio.
3. Os pais podem ainda acordar, nos termos do n.º 1 do artigo anterior, em que determinados assuntos sejam resolvidos por acordo de ambos os pais ou em que a administração dos bens do filho seja exercida pelo progenitor a quem o menor não tenha sido confiado.
4. Ao progenitor que não exerça o poder paternal assiste o poder de vigiar a educação e as condições de vida do filho.
1. Quando o filho seja confiado a terceira pessoa ou a instituição, cabem a estes os poderes e deveres dos pais que forem exigidos pelo adequado desempenho das suas funções.
2. Na parte não prejudicada pelo disposto no número anterior, o exercício do poder paternal na constância do matrimónio competirá a ambos os progenitores, salvo se o tribunal decidir que deve competir a apenas um deles.
3. Em caso de divórcio, separação de facto ou anulação do casamento, ao exercício do poder paternal na parte não prejudicada pelo disposto no n.º 1 são aplicáveis, com as devidas adaptações, as regras dos dois artigos anteriores.
Quando se verifique alguma das circunstâncias previstas no artigo 1772.º, pode o tribunal, ao regular o exercício do poder paternal, decidir que, se falecer o progenitor a quem o menor for entregue, a guarda não passe para o progenitor sobrevivo; o tribunal designará então a pessoa a quem, provisoriamente, o menor será confiado.
Se a filiação do menor se encontrar estabelecida apenas quanto a um dos progenitores, a este pertence o poder paternal.
1. Quando a filiação se encontre estabelecida relativamente a ambos os pais e estes não tenham contraído matrimónio após o nascimento do menor, o exercício do poder paternal pertence ao progenitor que tiver a guarda do filho.
2. Para os efeitos do número anterior, presume-se que a mãe tem a guarda do filho; esta presunção só é ilidível judicialmente.
3. Se os progenitores viverem em união de facto, o exercício do poder paternal pertence a ambos quando declarem, perante o funcionário do registo civil, ser essa a sua vontade; é aplicável, neste caso, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1756.º a 1759.º
4. A aplicação do regime do número anterior é independente da duração da união de facto, e não é prejudicada pela existência de um anterior casamento não dissolvido de qualquer dos progenitores, nem pela menoridade destes, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 1767.º
1. É aplicável ao caso previsto no artigo anterior, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1759.º a 1763.º
2. Os pais que pretendam, por mútuo acordo, proceder à alteração de acordo do exercício do poder paternal de filhos menores homologado pelo conservador do registo civil podem requerê-lo na conservatória do registo civil.
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 11/2024
1. Consideram-se de pleno direito inibidos do exercício do poder paternal:
a) Os condenados definitivamente por crime a que a lei atribua esse efeito;
b) Os interditos e os inabilitados por anomalia psíquica;
c) As pessoas sujeitas, nos termos do n.º 1 do artigo 89.º, ao instituto da curadoria, desde a nomeação do curador.
2. Consideram-se de pleno direito inibidos de representar o filho e administrar os seus bens os menores não emancipados e os interditos e inabilitados não referidos na alínea b) do número anterior.
3. As decisões judiciais que importem inibição do exercício do poder paternal são comunicadas, logo que transitem em julgado, ao tribunal competente, a fim de serem tomadas as providências que no caso couberem.
A inibição de pleno direito do exercício do poder paternal cessa pelo levantamento da interdição ou inabilitação e pelo termo da curadoria.
1. A requerimento do Ministério Público, de qualquer parente do menor ou de pessoa a cuja guarda ele esteja confiado, de facto ou de direito, pode o tribunal decretar a inibição do exercício do poder paternal quando qualquer dos pais infrinja culposamente os deveres para com os filhos, com grave prejuízo destes, ou quando, por inexperiência, enfermidade, ausência ou outras razões, se não mostre em condições de cumprir aqueles deveres.
2. A inibição pode ser total ou limitar-se à representação e administração dos bens dos filhos; pode abranger ambos os progenitores ou apenas um deles e referir-se a todos os filhos ou apenas a algum ou alguns.
3. Salvo decisão em contrário, os efeitos da inibição que abranja todos os filhos estendem-se aos que nascerem depois de decretada.
1. A inibição do exercício do poder paternal decretada pelo tribunal será levantada quando cessem as causas que lhe deram origem.
2. O levantamento pode ser pedido pelo Ministério Público, a todo o tempo, ou por qualquer dos pais, passado 1 ano sobre o trânsito em julgado da sentença de inibição ou da que houver desatendido outro pedido de levantamento.
A inibição do exercício do poder paternal em nenhum caso isenta os pais do dever de alimentarem o filho.
Quando a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação de um menor se encontre em perigo e não seja caso de inibição do exercício do poder paternal, pode o tribunal, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer das pessoas indicadas no n.º 1 do artigo 1769.º, decretar as providências adequadas, designadamente confiá-lo a terceira pessoa ou a instituição, pública ou particular, adequada.
1. Quando tiver sido decretada alguma das providências referidas no artigo anterior, os pais conservam o exercício do poder paternal em tudo o que com ela se não mostre inconciliável.
2. Se o menor tiver sido confiado a terceira pessoa ou a instituição, será estabelecido um regime de visitas aos pais, a menos que, excepcionalmente, o interesse do filho o desaconselhe.
1. Quando a má administração ponha em perigo o património do filho e não seja caso de inibição do exercício do poder paternal, pode o tribunal, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer parente, decretar as providências que julgue adequadas.
2. Atendendo em especial ao valor dos bens, pode nomeadamente o tribunal exigir a prestação de contas e de informações sobre a administração e estado do património do filho e, quando estas providências não sejam suficientes, a prestação de caução.
As decisões que decretem providências ao abrigo do disposto nos artigos 1772.º a 1774.º podem ser revogadas ou alteradas a todo o tempo pelo tribunal que as proferiu, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer dos pais.
São oficiosamente comunicadas à conservatória do registo civil competente a fim de serem registadas:
a) As decisões que regulem o exercício do poder paternal ou homologuem acordo sobre esse exercício;
b) As decisões que façam cessar a regulação do poder paternal em caso de reconciliação de cônjuges separados de facto;
c) As decisões que importem a inibição do exercício do poder paternal, o suspendam provisoriamente ou estabeleçam providências limitativas desse poder.
As decisões judiciais a que se refere o artigo anterior não podem ser invocadas contra terceiro de boa fé enquanto se não mostre efectuado o registo.
1. O menor está obrigatoriamente sujeito a tutela se os pais:
a) Houverem falecido;
b) Estiverem inibidos do poder paternal quanto à regência da pessoa do filho;
c) Estiverem há mais de 6 meses impedidos de facto de exercer o poder paternal; ou
d) Forem incógnitos.
2. Havendo impedimento de facto dos pais, deve o Ministério Público tomar as providências necessárias à defesa do menor, independentemente do decurso do prazo referido na alínea c) do número anterior, podendo para o efeito promover a nomeação de pessoa que, em nome do menor, celebre os negócios jurídicos que sejam urgentes ou de que resulte manifesto proveito para este.
É instituído o regime de administração de bens do menor previsto nos artigos 1819.º e seguintes:
a) Quando os pais tenham sido apenas excluídos, inibidos ou suspensos da administração de todos os bens do incapaz ou de alguns deles, se por outro título se não encontrar designado o administrador; ou
b) Quando a entidade competente para designar o tutor confie a outrem, no todo ou em parte, a administração dos bens do menor.
1. Sempre que o menor se encontre numa das situações previstas nos artigos anteriores, deve o tribunal promover oficiosamente a instauração da tutela ou da administração de bens.
2. Qualquer autoridade administrativa ou judicial, bem como os funcionários do registo civil, que no exercício do cargo tenham conhecimento de tais situações devem comunicar o facto ao tribunal competente.
1. A tutela é exercida por um tutor e pelo conselho de família.
2. A administração de bens é exercida por um ou mais administradores e, se estiver instaurada a tutela, pelo conselho de família.
Tanto a tutela como a administração de bens são exercidas sob vigilância do tribunal competente para a instauração das mesmas.
Os cargos de tutor, administrador de bens e vogal do conselho de família são obrigatórios, não podendo ninguém ser deles escusado senão nos casos expressos na lei.
O cargo de tutor recai sobre a pessoa designada pelos pais, sujeita a confirmação do tribunal, ou sobre quem o tribunal nomear.
1. Os pais podem nomear tutor ao filho menor para o caso de virem a falecer ou se tornarem incapazes; se apenas um dos progenitores exercer o poder paternal, a ele pertence esse poder.
2. Quando, falecido um dos progenitores que houver nomeado tutor ao filho menor, lhe sobreviver o outro, a designação considera-se eficaz se não for revogada por este no exercício do poder paternal.
3. A designação do tutor e respectiva revogação só têm validade sendo feitas em testamento ou em documento autêntico ou autenticado.
Quando, nos termos do artigo anterior, tiver sido designado mais de um tutor para o mesmo filho, recairá a tutela em cada um dos designados segundo a ordem da designação, quando a precedência entre eles não for de outro modo especificada.
1. Quando os pais não tenham designado tutor ou este não haja sido confirmado, compete ao tribunal, ouvido o conselho de família, nomear o tutor de entre os parentes ou afins do menor ou de entre as pessoas que de facto tenham cuidado ou estejam a cuidar do menor ou tenham por ele demonstrado afeição.
2. Antes de proceder à nomeação do tutor, deve o tribunal ouvir o menor que tenha completado 12 anos.
A tutela respeitante a dois ou mais irmãos caberá, sempre que possível, a um só tutor.
1. Não podem ser tutores:
a) Os menores não emancipados, os interditos e os inabilitados;
b) Os notoriamente dementes, ainda que não estejam interditos ou inabilitados;
c) As pessoas de mau procedimento ou que não tenham modo de vida conhecido;
d) Os que tiverem sido inibidos ou se encontrarem total ou parcialmente suspensos do poder paternal;
e) Os que tiverem sido removidos ou se encontrarem suspensos de outra tutela ou do cargo de vogal de conselho de família por falta de cumprimento das respectivas obrigações;
f) Os que tenham demanda pendente com o menor ou com seus pais, ou a tenham tido há menos de 5 anos;
g) Aqueles cujos pais, filhos, cônjuges ou unidos de facto tenham, ou hajam tido há menos de 5 anos, demanda com o menor ou seus pais;
h) Os que sejam inimigos pessoais do menor ou dos seus pais;
i) Os que tenham sido excluídos pelo pai ou mãe do menor, nos mesmos termos em que qualquer deles pode designar tutor.
2. Os inabilitados por prodigalidade, os falidos ou insolventes, e bem assim os inibidos ou suspensos do poder paternal ou removidos da tutela quanto à administração de bens, podem ser nomeados tutores, desde que sejam apenas encarregados da guarda e regência da pessoa do menor.
1. Podem escusar-se da tutela:
a) Os titulares de cargos políticos;
b) Os magistrados judiciais ou do Ministério Público, em exercício de funções em Macau, se o menor aqui tiver domicílio ou aqui estiverem sitos os seus bens;
c) Os que residam em lugar distante daquele em que o menor tiver a maior parte dos bens, salvo se a tutela compreender apenas a regência da pessoa do menor, ou os bens deste forem de reduzido valor;
d) Os que tiverem mais de dois descendentes a seu cargo;
e) Os que exerçam outra tutela ou curatela, salvo no caso previsto no artigo 1788.º;
f) Os que tenham mais de 65 anos;
g) Os que não sejam parentes do menor ou seus afins em linha recta; ou
h) Os que, em virtude de doença, obrigações legais absorventes, ocupações profissionais, ou similares, absorventes ou carência de meios económicos, não possam exercer a tutela sem grave incómodo ou prejuízo.
2. O que for escusado da tutela pode ser compelido a aceitá-la, desde que cesse o motivo da escusa.
1. O tutor tem os mesmos direitos e obrigações dos pais, com as modificações e restrições constantes dos artigos seguintes.
2. O tutor deve exercer a tutela com a diligência de um bom pai de família.
O tutor só pode utilizar os rendimentos do pupilo no sustento e educação deste e na administração dos seus bens.
É vedado ao tutor:
a) Dispor a título gratuito dos bens do menor;
b) Tomar de arrendamento ou adquirir, directamente ou por interposta pessoa, ainda que seja em hasta pública, bens ou direitos do menor, ou tornar-se cessionário de créditos ou outros direitos contra ele, excepto nos casos de sub-rogação legal ou de licitação em processo de inventário;
c) Celebrar em nome do pupilo contratos que o obriguem pessoalmente a praticar certos actos, excepto quando as obrigações contraídas sejam necessárias à sua educação, estabelecimento ou ocupação;
d) Receber do pupilo, directamente ou por interposta pessoa, quaisquer liberalidades, por acto entre vivos ou por morte, se tiverem sido feitas depois da sua designação e antes da aprovação das respectivas contas, sem prejuízo do disposto para as deixas testamentárias no n.º 3 do artigo 2029.º
1. O tutor, como representante do pupilo, necessita de autorização do tribunal:
a) Para praticar qualquer dos actos mencionados no n.º 1 do artigo 1744.º;
b) Para adquirir bens, móveis ou imóveis, como aplicação de capitais do menor;
c) Para aceitar herança, doação ou legado;
d) Para contrair ou solver obrigações, salvo quando respeitem a alimentos do menor ou se mostrem necessárias à administração do seu património;
e) Para intentar acções, salvas as destinadas à cobrança de prestações periódicas e aquelas cuja demora possa causar prejuízo.
2. O tribunal não concederá a autorização que lhe seja pedida sem previamente ouvir o conselho de família.
3. O disposto no n.º 1 não prejudica o que é especialmente determinado em relação aos actos praticados em processo de inventário.
1. São nulos os actos praticados pelo tutor em contravenção do disposto no artigo 1793.º; a nulidade não pode, porém, ser invocada pelo tutor ou seus herdeiros nem pela interposta pessoa de quem ele se tenha servido.
2. A nulidade é sanável mediante confirmação do pupilo, depois de maior ou emancipado, mas somente enquanto não for declarada por sentença com trânsito em julgado.
1. Os actos praticados pelo tutor em contravenção do disposto nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 1794.º podem ser anulados oficiosamente pelo tribunal ou a requerimento de qualquer vogal do conselho de família, até à maioridade ou emancipação do pupilo, ou a requerimento do próprio pupilo até 4 anos após a sua maioridade ou emancipação.
2. Os herdeiros do pupilo podem também requerer a anulação, desde que o façam antes de decorridos 2 anos sobre o falecimento e não tenha expirado o prazo indicado no número anterior.
3. Se o tutor intentar alguma acção em contravenção do disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 1794.º, deve o tribunal ordenar oficiosamente a suspensão da instância, depois da citação, até que seja concedida a autorização necessária.
4. Se o tutor continuar a explorar, sem autorização, a empresa comercial do pupilo, é pessoalmente responsável por todos os danos, ainda que acidentais, resultantes da exploração.
O tribunal, ouvido o conselho de família, pode confirmar os actos praticados pelo tutor sem a necessária autorização.
1. O tutor tem direito a ser remunerado.
2. Se a remuneração não tiver sido fixada pelos pais do menor no acto de designação do tutor, é arbitrada pelo tribunal, ouvido o conselho de família, não podendo, em qualquer caso, exceder a décima parte dos rendimentos líquidos dos bens do menor.
1. O tutor é obrigado a apresentar uma relação do activo e do passivo do pupilo dentro do prazo que lhe for fixado pelo tribunal.
2. Se o tutor for credor do menor, mas não tiver relacionado o respectivo crédito, não lhe é lícito exigir o cumprimento durante a tutela, salvo provando que à data da apresentação da relação ignorava a existência da dívida.
1. O tutor é obrigado a prestar contas ao tribunal quando cessar a sua gerência ou, durante ela, sempre que o tribunal o exija.
2. Sendo as contas prestadas no termo da gerência, o tribunal deve ouvir o ex-pupilo ou os seus herdeiros, se tiver terminado a tutela; no caso contrário, será ouvido o novo tutor.
1. O tutor é responsável pelo prejuízo que por dolo ou culpa causar ao pupilo.
2. Quando à vista das contas houver saldo a favor do pupilo, a importância do saldo vence os juros legais desde a aprovação daquelas, se os não vencer por outra causa desde data anterior.
1. São abonadas ao tutor as despesas que legalmente haja feito, ainda que delas, sem culpa sua, nenhum proveito tenha provindo ao menor.
2. O saldo a favor do tutor é satisfeito pelos primeiros rendimentos do menor; ocorrendo, porém, despesas urgentes, de forma que o tutor se não possa inteirar, vence juros o saldo, se não se prover de outro modo ao pronto pagamento da dívida.
A aprovação das contas não impede que elas sejam judicialmente impugnadas pelo pupilo nos 2 anos subsequentes à maioridade ou emancipação, ou pelos seus herdeiros dentro do mesmo prazo, a contar do falecimento do pupilo, se este falecer antes de decorrido o prazo que lhe seria concedido se fosse vivo.
Pode ser removido da tutela:
a) O tutor que falte ao cumprimento dos deveres próprios do cargo ou revele inaptidão para o seu exercício;
b) O tutor que por facto superveniente à investidura no cargo se constitua nalguma das situações que impediriam a sua nomeação.
A remoção do tutor é decretada pelo tribunal, ouvido o conselho de família, a requerimento do Ministério Público, de qualquer parente do menor, ou de pessoa a cuja guarda este esteja confiado de facto ou de direito.
O tutor pode, a seu pedido, ser exonerado do cargo pelo tribunal:
a) Se sobrevier alguma das causas de escusa; ou
b) Ao fim de 3 anos, nos casos em que o tutor se podia ter escusado a aceitar o cargo, se subsistir a causa da escusa.
O conselho de família é constituído por dois vogais, escolhidos nos termos do artigo seguinte, e pelo agente do Ministério Público, que preside.
1. Os vogais do conselho de família são escolhidos entre os parentes ou afins do menor, tomando em conta, nomeadamente, a proximidade do grau, as relações de amizade, as aptidões, a idade, o lugar de residência e o interesse manifestado pela pessoa do menor.
2. Na falta de parentes ou afins que possam ser designados nos termos do número anterior, cabe ao tribunal escolher os vogais de entre os amigos dos pais, vizinhos ou outras pessoas que possam interessar-se pelo menor.
3. Sempre que possível, um dos vogais do conselho de família deve pertencer ou representar a linha paterna e o outro a linha materna do menor.
1. É aplicável aos vogais do conselho de família o disposto nos artigos 1789.º e 1790.º
2. É ainda fundamento de escusa o facto de o vogal designado residir em lugar distante daquele em que o menor tiver residência habitual.
Pertence ao conselho de família vigiar o modo por que são desempenhadas as funções do tutor e exercer as demais atribuições que a lei especialmente lhe confere.
1. A fiscalização da acção do tutor é exercida com carácter permanente por um dos vogais do conselho de família, denominado protutor.
2. O protutor deve, sempre que possível, representar a linha de parentesco diversa da do tutor.
3. Se o tutor for irmão germano do menor ou cônjuge de irmão germano, ou se ambos os vogais do conselho de família pertencerem à mesma linha de parentesco ou não pertencerem a nenhuma delas, cabe ao tribunal a escolha do protutor.
Além de fiscalizar a acção do tutor, compete ao protutor:
a) Cooperar com o tutor no exercício das funções tutelares, podendo encarregar-se da administração de certos bens do menor nas condições estabelecidas pelo conselho de família e com o acordo do tutor;
b) Substituir o tutor nas suas faltas e impedimentos, passando, nesse caso, a servir de protutor o outro vogal do conselho de família;
c) Representar o menor em juízo ou fora dele, quando os seus interesses estejam em oposição com os do tutor e o tribunal não haja nomeado curador especial.
1. O conselho de família é convocado por determinação do tribunal ou do Ministério Público, ou a requerimento de um dos vogais, do tutor, do administrador de bens, de qualquer parente do menor, ou do próprio menor, quando for maior de 14 anos.
2. A convocação deve indicar o objecto principal da reunião e ser enviada a cada um dos vogais com 8 dias de antecedência.
3. Faltando algum dos vogais, o conselho será convocado para outro dia; se de novo faltar algum dos vogais, as deliberações são tomadas pelo Ministério Público, ouvido o outro vogal, quando esteja presente.
4. A falta injustificada às reuniões do conselho de família torna o faltoso responsável pelos danos que o menor venha a sofrer.
1. Os vogais do conselho de família são obrigados a comparecer pessoalmente.
2. O conselho de família pode deliberar que às suas reuniões ou a alguma delas assista o tutor, o administrador de bens, qualquer parente do menor, o próprio menor, ou ainda pessoa estranha à família cujo parecer seja útil; mas, em qualquer caso, só os vogais do conselho têm voto.
3. De igual faculdade goza o Ministério Público.
O exercício do cargo de vogal do conselho de família é gratuito.
São aplicáveis aos vogais do conselho de família, com as necessárias adaptações, as disposições relativas à remoção e exoneração do tutor.
A tutela termina:
a) Pela maioridade, salvo o disposto no artigo 119.º;
b) Pela emancipação, salvo o disposto no artigo 1521.º;
c) Pela adopção;
d) Pelo termo da inibição do poder paternal;
e) Pela cessação do impedimento dos pais; ou
f) Pelo estabelecimento da maternidade ou paternidade.
1. Quando não exista pessoa em condições de exercer a tutela, o menor é confiado a instituição, pública ou particular, adequada, exercendo as funções de tutor o respectivo director.
2. Neste caso, não é nomeado protutor, mas, sempre que possível e em concreto se não revele inconveniente, existirá o conselho de família.
Quando haja lugar à instituição da administração de bens do menor nos termos do artigo 1779.º, são aplicáveis à designação do administrador as disposições relativas à nomeação do tutor, salvo o preceituado nos artigos seguintes.
Ao autor de doação ou deixa em benefício de menor é lícita a designação de administrador, mas só com relação aos bens compreendidos na liberalidade.
1. Tendo os pais ou terceiro designado vários administradores e tendo sido determinados os bens cuja administração compete a cada um deles, não é aplicável o critério da preferência pela ordem da designação.
2. O tribunal pode também designar vários administradores, determinando os bens que a cada um compete administrar.
1. Além das pessoas que a lei impede de serem tutores, não podem ser administradores:
a) Os inabilitados por prodigalidade, os falidos ou insolventes, e bem assim os inibidos ou suspensos do poder paternal ou removidos da tutela quanto à administração de bens;
b) Os condenados como autores ou cúmplices dos crimes de furto, roubo, burla, extorsão, infidelidade, usura, frustração de créditos, falência intencional e, em geral, de crimes dolosos contra o património.
2. O impedimento estabelecido na alínea b) do número anterior mantém-se por um período de 2 a 5 anos após o trânsito em julgado da sentença condenatória, em função da concreta gravidade dos factos.
1. No âmbito da sua administração, o administrador tem os direitos e deveres do tutor.
2. O administrador é o representante legal do menor nos actos relativos aos bens cuja administração lhe pertença.
3. O administrador deve abonar aos pais ou tutor, por força dos rendimentos dos bens, as importâncias necessárias aos alimentos do menor.
4. As divergências entre o administrador e os pais ou tutor são decididas pelo tribunal, ouvido o conselho de família, se o houver.
São aplicáveis ao administrador, com as necessárias adaptações, as disposições relativas à remoção e exoneração do tutor e ao termo da tutela.
1. O vínculo da adopção constitui-se por sentença judicial.
2. O processo é instruído com um relatório social, que deve incidir, nomeadamente, sobre a personalidade e a saúde do adoptante e do adoptando, a idoneidade do adoptante para cuidar do adoptando e educá-lo, a situação familiar e económica do adoptante e as razões determinantes do pedido de adopção.
A adopção apenas é decretada quando apresente reais vantagens para o adoptando, se funde em motivos legítimos, não envolva sacrifício injusto para os outros filhos do adoptante ou para os filhos do adoptando e seja razoável supor que entre o adoptante e o adoptando se estabelecerá um vínculo semelhante ao da filiação.
1. Para que a adopção possa ser decretada, o adoptando deverá ter estado ao cuidado do adoptante durante prazo suficiente para se poder avaliar da conveniência da constituição do vínculo.
2. A adopção pressupõe que o adoptante tenha tomado previamente o adoptando a seu cargo, com vista a futura adopção, mediante confiança judicial ou administrativa, salvo quando lei especial dispense a confiança.
3. A confiança judicial e a confiança administrativa são reguladas por lei especial.
1. Podem adoptar conjuntamente duas pessoas casadas há mais de 3 anos e não separadas de facto ou que vivam em união de facto há mais de 5 anos, se ambas tiverem mais de 25 anos.
2. Pode ainda adoptar:
a) Quem tiver mais de 28 anos;
b) Sendo o adoptando filho do cônjuge do adoptante, quem tiver mais de 25 anos;
c) Sendo o adoptando filho da pessoa com quem o adoptante viva em união de facto há mais de 3 anos, quem tiver mais de 25 anos.
3. Só pode adoptar quem não tivesse mais de 60 anos à data em que o adoptando lhe foi confiado.
4. Salvo razões ponderosas, a diferença de idades entre o adoptante e o adoptado deve ser superior a 18 anos e inferior a 50.
5. Para efeitos do cômputo do tempo necessário para adopção conjunta de duas pessoas casadas, é contado o tempo em que os cônjuges eventualmente hajam vivido em união de facto imediatamente antes da celebração do casamento.
O tutor ou administrador legal de bens só pode adoptar o pupilo ou a pessoa cujos bens administra depois de aprovadas as contas da tutela ou administração de bens e saldada a sua responsabilidade.
1. Só podem ser adoptadas as pessoas que, respeitando as demais condições pressupostas no artigo seguinte:
a) Sejam menores;
b) Sejam filhos do cônjuge do adoptante ou de quem com este viva em união de facto; ou
c) Se encontrem interditas por anomalia psíquica.
2. Fora os casos referidos no número seguinte, o adoptando deve ter menos de 16 anos à data da petição judicial de adopção; poderá, no entanto, ser adoptado quem, a essa data, tenha menos de 18 anos e não se encontre emancipado, quando, desde idade inferior a 16 anos, tenha estado, de direito ou de facto, ao cuidado dos adoptantes ou de um deles.
3. As pessoas indicadas nas alíneas b) e c) do n.º 1 podem ser adoptadas independentemente da sua idade, contanto que desde idade inferior a 16 anos tenham estado, de direito ou de facto, ao cuidado dos adoptantes ou de um deles.
1. Só pode ser adoptado:
a) Quem seja filho de pais incógnitos ou falecidos;
b) Aquele relativamente ao qual tenha havido consentimento prévio para a adopção;
c) Quem tenha sido abandonado pelos pais;
d) A pessoa cujos pais, por acção ou omissão, ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação moral ou educação em termos que, pela sua gravidade, comprometam seriamente os vínculos afectivos próprios da filiação; ou
e) Quem haja sido acolhido por uma pessoa ou por uma instituição, contanto que os seus pais tenham revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente os vínculos afectivos próprios da filiação, durante, pelo menos, os 6 meses que precederem o pedido de confiança.
2. A adopção com fundamento nas situações previstas nas alíneas a), c), d) e e) do número anterior não pode ser decretada se o adoptando se encontrar a viver com ascendente, colateral até ao 3.º grau ou tutor e a seu cargo, salvo se aqueles familiares ou o tutor puserem em perigo, de forma grave, a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação do adoptando ou se o tribunal concluir que a situação não é adequada a assegurar suficientemente o interesse do adoptando.
3. No caso de o adoptando ser um interdito, aos familiares indicados no número anterior acrescem os descendentes do adoptando com quem, e a cujo cargo, este se encontre a viver.
4. Tratando-se de adopção dos filhos do cônjuge do adoptante ou de quem com este viva em união de facto, as condições pressupostas neste artigo ter-se-ão que verificar relativamente ao progenitor cuja relação de filiação se extinga por força da adopção; porém, no caso do falecimento de um dos progenitores do adoptando a adopção não pode prescindir do consentimento do adoptando.
1. Enquanto subsistir uma adopção não pode constituir-se outra quanto ao mesmo adoptado, excepto se os adoptantes forem casados um com o outro ou viverem em união de facto.
2. O disposto no número anterior não prejudica a possibilidade de o adoptado ser sujeito a nova adopção em caso de superveniência de alguma das situações referidas no artigo anterior.
3. A decretação judicial da nova adopção implica, no caso referido no número anterior, a extinção da anterior adopção.
1. É necessário para a adopção o consentimento:
a) Do adoptando maior de 12 anos;
b) Do cônjuge, não separado de facto, do adoptante;
c) Dos pais do adoptando, ainda que menores e mesmo que não exerçam o poder paternal, salvo se tiver sido decidida a confiança judicial do adoptando ou se verificar o caso previsto no n.º 2 do artigo 1831.º;
d) No caso previsto no n.º 2 do artigo 1831.º, do familiar aí referido ou do tutor, salvo se tiver sido decidida a confiança judicial do adoptando.
2. O tribunal pode dispensar o consentimento:
a) Das pessoas que o deveriam prestar, se estiverem privadas do uso das faculdades mentais ou se por qualquer outra razão houver grave dificuldade em as ouvir;
b) Das pessoas referidas nas alíneas c) e d) do número anterior, quando se verificar alguma das situações que, nos termos das alíneas c) a e) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 1831.º, respectivamente, permitiriam a adopção.
1. O consentimento é sempre prestado perante o juiz, que deve esclarecer o declarante sobre o significado e os efeitos do acto.
2. Com excepção do consentimento do adoptando, o consentimento pode ser prestado independentemente da instauração do processo de adopção, não sendo necessária a identificação do futuro adoptante.
3. A mãe não pode dar o seu consentimento antes de decorridas 6 semanas após o parto.
1. O consentimento prestado nos termos do n.º 2 do artigo anterior pode ser revogado no prazo de 2 meses; decorrido este prazo, só é revogável enquanto o adoptando não se encontrar acolhido por alguém que pretenda adoptá-lo.
2. A revogação é feita por termo no processo ou por documento autêntico ou autenticado junto ao mesmo.
3. O consentimento caduca se, no prazo de 3 anos, o adoptando não tiver sido adoptado nem confiado judicial ou administrativamente com vista a futura adopção.
O juiz deverá ouvir, salvo se estiverem privados do uso das faculdades mentais ou se, por qualquer outra razão, houver grave dificuldade em os ouvir:
a) O adoptando maior de 7 anos e menor de 12 anos; e
b) Os filhos do adoptante e do adoptando, maiores de 12 anos.
1. A identidade do adoptante não pode ser revelada aos pais naturais do adoptado, salvo se aquele declarar expressamente que não se opõe a essa revelação.
2. Os pais naturais do adoptado podem opor-se, mediante declaração expressa, a que a sua identidade seja revelada ao adoptante.
1. Pela adopção o adoptado adquire a situação de filho do adoptante e integra-se com os seus descendentes na família deste, extinguindo-se as relações familiares entre o adoptado e os seus ascendentes e colaterais naturais, sem prejuízo do disposto quanto a impedimentos matrimoniais nos artigos 1480.º e 1481.º
2. Se um dos cônjuges adopta o filho do outro, mantêm-se as relações entre o adoptado e o cônjuge do adoptante e os respectivos parentes; o mesmo regime é aplicável ao caso de adopção do filho da pessoa com quem o adoptante viva em união de facto.
Depois de decretada a adopção, não é possível estabelecer a filiação natural do adoptado nem fazer a prova dessa filiação, salvo para os efeitos do disposto no artigo 1481.º
1. O adoptado perde os seus apelidos de origem, sendo o seu novo nome constituído, com as necessárias adaptações, nos termos do artigo 1730.º
2. A pedido do adoptante, pode o tribunal, quando tal se justifique, modificar o nome próprio do adoptado, se a modificação salvaguardar o seu interesse, nomeadamente o direito à identidade pessoal, e favorecer a integração na família.
A adopção não é revogável nem sequer por acordo do adoptante e do adoptado.
1. A sentença que tiver decretado a adopção só é susceptível de revisão:
a) Se tiver faltado o consentimento do adoptante ou dos pais do adoptado, quando necessário e não dispensado;
b) Se o consentimento dos pais do adoptado tiver sido indevidamente dispensado, por não se verificarem as condições do n.º 2 do artigo 1833.º;
c) Se o consentimento do adoptante tiver sido viciado por erro desculpável e essencial sobre a pessoa do adoptado;
d) Se o consentimento do adoptante ou dos pais do adoptado tiver sido determinado por coacção moral, contanto que seja grave o mal com que eles foram ilicitamente ameaçados e justificado o receio da sua consumação; ou
e) Se tiver faltado o consentimento do adoptado, quando necessário.
2. O erro só se considera essencial quando for de presumir que o conhecimento da realidade excluiria razoavelmente a vontade de adoptar.
3. A revisão não será, contudo, concedida quando os interesses do adoptado possam ser consideravelmente afectados, salvo se razões invocadas pelo adoptante imperiosamente o exigirem.
1. A revisão nos termos do n.º 1 do artigo anterior pode ser pedida:
a) No caso das alíneas a) e b), pelas pessoas cujo consentimento faltou, no prazo de 6 meses a contar da data em que tiveram conhecimento da adopção;
b) Nos casos das alíneas c) e d), pelas pessoas cujo consentimento foi viciado, dentro dos 6 meses subsequentes à cessação do vício;
c) No caso da alínea e), pelo adoptado, no prazo de 6 meses a contar do conhecimento da adopção.
2. No caso das alíneas a) e b) do número anterior, o pedido de revisão não pode ser deduzido decorridos 3 anos sobre a data do trânsito em julgado da sentença que tiver decretado a adopção.
3. No caso da alínea c) do n.º 1, o prazo não se iniciará antes de o adoptado, sendo menor, ter atingido a maioridade ou ser emancipado, ou, sendo ele interdito, lhe ter sido levantada a interdição.
1. Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável à satisfação das necessidades da vida do alimentado, nomeadamente ao seu sustento, habitação, vestuário, saúde e lazer.
2. Os alimentos compreendem também a instrução e educação do alimentado no caso de este ser menor ou, embora maior, se encontrar na situação prevista no artigo 1735.º
1. Os alimentos devem ser proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los.
2. Na fixação dos alimentos deve atender-se, igualmente, à possibilidade de o alimentado prover à sua subsistência.
1. Os alimentos devem ser fixados em prestações pecuniárias mensais, salvo se houver acordo ou disposição legal em contrário, ou se ocorrerem motivos que justifiquem medidas de excepção.
2. Se, porém, aquele que for obrigado aos alimentos mostrar que os não pode prestar como pensão, mas tão-somente em sua casa e companhia, assim podem ser decretados.
Os alimentos são devidos desde a proposição da acção ou, estando já fixados pelo tribunal ou por acordo, desde o momento em que o devedor se constituiu em mora, sem prejuízo do disposto no artigo 2103.º
1. Enquanto se não fixarem definitivamente os alimentos, pode o tribunal, a requerimento do alimentando, ou oficiosamente se este for menor ou interdito, conceder alimentos provisórios, que serão fixados segundo o seu prudente arbítrio.
2. Não há lugar, em caso algum, à restituição dos alimentos provisórios recebidos.
1. O direito a alimentos não pode ser renunciado ou cedido, ainda que os alimentos possam deixar de ser pedidos e possam renunciar-se as prestações vencidas.
2. O crédito de alimentos não é penhorável, e o obrigado não pode livrar-se por meio de compensação, ainda que se trate de prestações já vencidas.
1. Estão vinculados à prestação de alimentos, pela ordem indicada:
a) O cônjuge ou o ex-cônjuge;
b) Os descendentes;
c) Os ascendentes;
d) O padrasto e a madrasta não separados de facto, relativamente a enteados menores que estejam a cargo do cônjuge, ou o estivessem no momento da morte deste;
e) Os irmãos, durante a menoridade do alimentando.
2. Entre as pessoas designadas nas alíneas b) e c) do número anterior, a obrigação defere-se segundo a ordem da sucessão legítima.
3. Se algum dos vinculados não puder prestar os alimentos ou não puder saldar integralmente a sua responsabilidade, o encargo recai sobre os onerados subsequentes.
1. Sendo várias as pessoas vinculadas à prestação de alimentos, respondem todas na proporção das suas quotas como herdeiros legítimos do alimentando.
2. Se alguma das pessoas assim oneradas não puder satisfazer a parte que lhe cabe, o encargo recai sobre as restantes.
1. Se o alimentando tiver disposto de bens por doação, as pessoas designadas nos artigos anteriores não são obrigadas à prestação de alimentos, na medida em que os bens doados pudessem assegurar ao doador meios de subsistência.
2. Neste caso, a obrigação alimentar recai, no todo ou em parte, sobre o donatário ou donatários, segundo a proporção do valor dos bens doados; esta obrigação transmite-se aos herdeiros do donatário, na medida em que estes venham a beneficiar da doação.
Se, depois de fixados os alimentos pelo tribunal ou por acordo dos interessados, as circunstâncias determinantes da sua fixação se modificarem, podem os alimentos fixados ser reduzidos ou aumentados, conforme os casos, ou podem outras pessoas ser obrigadas a prestá-los.
1. A obrigação de prestar alimentos cessa:
a) Pela morte do obrigado ou do alimentado;
b) Enquanto aquele que os presta não possa continuar a prestá-los ou aquele que os recebe deixe de precisar deles; ou
c) Quando o credor viole gravemente os seus deveres para com o obrigado.
2. A morte do obrigado ou a impossibilidade de este continuar a prestar alimentos não priva o alimentado de exercer o seu direito em relação a outros, igual ou sucessivamente onerados.
1. À obrigação alimentar que tenha por fonte um negócio jurídico são aplicáveis, com as necessárias correcções, as disposições deste capítulo, desde que não estejam em oposição com a vontade manifestada ou com disposições especiais da lei.
2. As disposições deste capítulo são ainda aplicáveis a todos os outros casos de obrigação alimentar imposta por lei, na medida em que possam ajustar-se aos respectivos preceitos.
Na vigência do casamento, os cônjuges são reciprocamente obrigados à prestação de alimentos nos termos do artigo 1536.º
1. Têm direito a alimentos, em caso de divórcio:
a) O cônjuge não considerado culpado ou, quando haja culpa de ambos, não considerado principal culpado na sentença de divórcio, se este tiver sido decretado com fundamento no artigo 1635.º ou nas alíneas a) ou b) do artigo 1637.º;
b) O cônjuge réu, se o divórcio tiver sido decretado com fundamento na alínea c) do artigo 1637.º;
c) Qualquer dos cônjuges, se o divórcio tiver sido decretado por mútuo consentimento ou se, tratando-se de divórcio litigioso, ambos foram considerados igualmente culpados.
2. Excepcionalmente, pode o tribunal, por motivos de equidade, conceder alimentos ao cônjuge que a eles não teria direito, nos termos do número anterior, considerando, em particular, a duração do casamento e a colaboração prestada por esse cônjuge à economia do casal.
3. Na fixação dos alimentos deve o tribunal tomar em conta a idade e estado de saúde dos cônjuges, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, o tempo que têm de dedicar, eventualmente, à criação de filhos comuns, os seus rendimentos e proventos e, de modo geral, todas as circunstâncias que influam sobre as necessidades do cônjuge que recebe os alimentos e sobre as possibilidades do que os presta.
Tendo sido anulado o casamento, o cônjuge de boa fé conserva o direito a alimentos após o trânsito em julgado da decisão respectiva.
1. Falecendo um dos cônjuges, o viúvo tem direito a ser alimentado pelos rendimentos dos bens deixados pelo falecido.
2. São obrigados, neste caso, à prestação dos alimentos os herdeiros ou legatários a quem tenham sido transmitidos os bens, segundo a proporção do respectivo valor.
3. O apanágio deve ser registado, quando onere coisas imóveis, ou coisas móveis sujeitas a registo.
Em todos os casos referidos nos artigos anteriores, cessa o direito a alimentos se o alimentado contrair novo casamento, passar a viver em união de facto, independentemente da duração desta, ou se tornar indigno do benefício pelo seu comportamento moral.
1. Falecendo um dos progenitores, os filhos menores ou não emancipados, ou que se encontrem na situação do artigo 1735.º, têm direito a ser alimentados pelos rendimentos dos bens deixados pelo falecido, nos termos do artigo 1859.º
2. O apanágio deve ser registado, quando onere coisas imóveis, ou coisas móveis sujeitas a registo.
3. Cessa o direito ao apanágio, se o filho se tornar indigno do benefício pelo seu comportamento moral perante o progenitor.
1. Tem direito a ser alimentado pelos rendimentos dos bens deixados pelo autor da sucessão, nos termos do artigo 1859.º, quem à data da morte deste se encontrasse a viver com ele em união de facto há pelo menos 4 anos, desde que o unido de facto não estivesse casado ou estivesse separado de facto há mais de 4 anos.
2. O direito do unido de facto a exigir alimentos gradua-se abaixo do direito a alimentos que o cônjuge do falecido, estando este casado à data da morte, ou os filhos deste tenham sobre os rendimentos dos bens da herança.
3. O direito a que se refere o número anterior caduca se não for exercido nos 2 anos subsequentes à data da morte do autor da sucessão.
4. O apanágio deve ser registado, quando onere coisas imóveis, ou coisas móveis sujeitas a registo.
5. O direito a alimentos previsto neste artigo cessa nos casos mencionados no artigo 1860.º, aplicado com as necessárias adaptações, e ainda se o unido de facto, estando casado à data da morte do seu companheiro, restabelecer a comunhão conjugal.
1. O pai não unido pelo matrimónio à mãe do filho é obrigado, desde a data do estabelecimento da paternidade, a prestar à mãe alimentos relativos ao período que medeia entre o início da gravidez e o fim do primeiro ano de vida do filho, sem prejuízo das indemnizações a que por lei ela tenha direito.
2. A mãe pode pedir os alimentos na acção de investigação de paternidade e tem direito a alimentos provisórios se a acção foi proposta antes de decorrido o prazo a que se refere o número anterior, desde que o tribunal considere provável o reconhecimento.
3. Cessa o direito a alimentos a partir do nascimento do filho, se o alimentado contrair casamento com terceiro ou se tornar indigno do benefício pelo seu comportamento moral perante o obrigado.
Diz-se sucessão o chamamento de uma ou mais pessoas à titularidade das relações jurídicas patrimoniais de uma pessoa falecida e a consequente devolução dos bens que a esta pertenciam.
1. Não constituem objecto de sucessão as relações jurídicas que devam extinguir-se por morte do respectivo titular, em razão da sua natureza ou por força da lei.
2. Podem também extinguir-se à morte do titular, por vontade deste, os direitos renunciáveis.
A sucessão é deferida por lei, testamento ou contrato.
A sucessão legal é legítima ou legitimária, conforme possa ou não ser afastada pela vontade do seu autor.
1. Entende-se por contrato sucessório aquele pelo qual alguém renuncia à sucessão de pessoa viva ou à qualidade de herdeiro legitimário de pessoa viva, ou dispõe da sua própria sucessão ou da sucessão de terceiro ainda não aberta.
2. Os contratos sucessórios são nulos, excepto quando a lei expressamente os admita.
3. O disposto na primeira parte do número anterior não prejudica o disposto no n.º 2 do artigo 940.º e no artigo 1570.º
1. Não é havido por sucessório o contrato pelo qual alguém faz doação entre vivos, com ou sem reserva de usufruto, de todos os seus bens ou de parte deles a algum ou alguns dos presumidos herdeiros legitimários, com o consentimento dos outros, e os donatários pagam ou se obrigam a pagar a estes o valor das partes que proporcionalmente lhes tocariam nos bens doados.
2. Se sobrevier ou se tornar conhecido outro presumido herdeiro legitimário, pode este exigir que lhe seja composta em dinheiro a parte correspondente.
3. As tornas em dinheiro, quando não sejam logo efectuados os pagamentos, estão sujeitas a actualização nos termos gerais.
1. Os sucessores são herdeiros ou legatários.
2. Diz-se herdeiro o que sucede na totalidade ou numa quota do património do falecido e legatário o que sucede em bens ou valores determinados.
3. É havido como herdeiro o que sucede no remanescente dos bens do falecido, não havendo especificação destes.
4. O usufrutuário, ainda que o seu direito incida sobre a totalidade do património, é havido como legatário.
5. A qualificação dada pelo testador aos seus sucessores não lhes confere o título de herdeiro ou legatário em contravenção do disposto nos números anteriores.
A sucessão abre-se no momento da morte do seu autor e no lugar do último domicílio dele.
1. Aberta a sucessão, são chamados à titularidade das relações jurídicas do falecido aqueles que gozam de prioridade na hierarquia dos sucessíveis, desde que tenham a necessária capacidade.
2. Se os primeiros sucessíveis não quiserem ou não puderem aceitar, são chamados os subsequentes, e assim sucessivamente; a devolução a favor dos últimos retrotrai-se ao momento da abertura da sucessão.
1. Têm capacidade sucessória, além do território de Macau, todas as pessoas nascidas ou concebidas ao tempo da abertura da sucessão, não exceptuadas por lei.
2. Na sucessão testamentária têm ainda capacidade:
a) Os nascituros não concebidos, que sejam filhos de pessoa determinada, viva ao tempo da abertura da sucessão;
b) As pessoas colectivas.
Carecem de capacidade sucessória, por motivo de indignidade:
a) O condenado como autor ou cúmplice de homicídio doloso, ainda que não consumado, contra o autor da sucessão ou contra o seu cônjuge ou unido de facto, descendente ou ascendente;
b) O condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas pessoas, relativamente a crime a que corresponda pena de prisão superior a 2 anos, qualquer que seja a sua natureza;
c) O que por meio de dolo ou coacção induziu o autor da sucessão a fazer, revogar ou modificar o testamento, ou disso o impediu;
d) O que dolosamente subtraiu, ocultou, inutilizou, falsificou ou suprimiu o testamento, antes ou depois da morte do autor da sucessão, ou se aproveitou de algum desses factos;
e) O que tenha estabelecido a maternidade ou paternidade nas condições do artigo 1656.º
1. A condenação a que se referem as alíneas a) e b) do artigo anterior pode ser posterior à abertura da sucessão, mas só o crime anterior releva para o efeito.
2. Estando dependente de condição suspensiva a instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário, é relevante o crime cometido até à verificação da condição.
1. A indignidade só produz efeitos mediante a sua declaração judicial em acção especialmente dirigida a esse fim, salvo o disposto no n.º 3.
2. A acção referida no número anterior tem que ser intentada dentro do prazo de 2 anos a contar da abertura da sucessão, ou dentro de 1 ano a contar do conhecimento da causa de indignidade.
3. Nos casos previstos nas alíneas a) e b) do artigo 1874.º, a indignidade resulta da própria sentença de condenação proferida na acção penal, contanto que no processo se encontrem provados todos os pressupostos da indignidade.
1. Declarada a indignidade ou resultando esta de sentença condenatória proferida em acção penal, a devolução da sucessão ao indigno é havida como inexistente, sendo ele considerado, para todos os efeitos, possuidor de má fé dos respectivos bens.
2. Na sucessão legal, a incapacidade do indigno não prejudica o direito de representação dos seus descendentes.
1. O que tiver incorrido em indignidade, mesmo que esta já tenha sido judicialmente declarada, readquire a capacidade sucessória, se o autor da sucessão expressamente o reabilitar em testamento ou escritura pública.
2. Não havendo reabilitação expressa, mas sendo o indigno contemplado em testamento quando o testador já conhecia a causa da indignidade, pode ele suceder dentro dos limites da disposição testamentária.
Dá-se a representação sucessória, quando a lei chama os descendentes de um herdeiro ou legatário a ocupar a posição daquele que não pôde ou não quis aceitar a herança ou o legado.
1. A representação tem sempre lugar na sucessão legal em benefício dos descendentes de filho do autor da sucessão e dos descendentes de irmão do falecido, qualquer que seja, num caso ou noutro, o grau de parentesco.
2. A representação tem lugar na sucessão testamentária em benefício dos descendentes do filho ou irmão do testador que faleceu antes deste ou que repudiou a herança ou o legado, se não houver outra causa de caducidade da vocação sucessória.
3. A representação não se verifica na sucessão testamentária:
a) Se tiver sido designado substituto ao herdeiro ou legatário;
b) Em relação ao fideicomissário, nos termos do n.º 2 do artigo 2122.º;
c) No legado de usufruto, excepto se este não caducar por morte ou extinção do beneficiário, ou no legado de outro direito pessoal; ou
d) Quando o testador manifeste por outro modo uma vontade contrária à representação.
Os descendentes representam o seu ascendente, mesmo que tenham repudiado a sucessão deste ou sejam incapazes em relação a ele.
1. Havendo representação, cabe a cada estirpe aquilo em que sucederia o ascendente respectivo.
2. Do mesmo modo se procede para o efeito da subdivisão, quando a estirpe compreenda vários ramos.
A representação tem lugar, ainda que todos os membros das várias estirpes estejam, relativamente ao autor da sucessão, no mesmo grau de parentesco, ou exista uma só estirpe.
Diz-se jacente a herança aberta, mas ainda não aceite nem declarada vaga para o território de Macau.
1. O sucessível chamado à herança, se ainda a não tiver aceite nem repudiado, não está inibido de providenciar acerca da administração dos bens, se do retardamento das providências puderem resultar prejuízos.
2. Sendo vários os herdeiros, é lícito a qualquer deles praticar os actos urgentes de administração; mas, se houver oposição de algum, prevalece a vontade do maior número.
3. O disposto neste artigo não prejudica a possibilidade de nomeação de curador à herança.
1. Quando se torne necessário, para evitar a perda ou deterioração dos bens, por não haver quem legalmente os administre, o tribunal nomeia curador à herança jacente, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer interessado.
2. À curadoria da herança é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto sobre a curadoria nos artigos 89.º e seguintes.
3. A curadoria termina logo que cessem as razões que a determinaram.
1. Se o sucessível chamado à herança, sendo conhecido, a não aceitar nem repudiar dentro dos 15 dias seguintes, pode o tribunal, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer interessado, mandá-lo notificar para, no prazo que lhe for fixado, declarar se a aceita ou repudia.
2. Na falta de declaração de aceitação, ou não sendo apresentado documento legal do repúdio dentro do prazo fixado, a herança tem-se por aceite.
3. Se o notificado repudiar a herança, serão notificados, sem prejuízo do disposto no artigo 1905.º, os herdeiros imediatos, e assim sucessivamente até não haver quem prefira a sucessão do território de Macau.
1. O domínio e posse dos bens da herança adquirem-se pela aceitação, independentemente da sua apreensão material.
2. Os efeitos da aceitação retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão.
Sendo vários os sucessíveis, pode a herança ser aceite por algum ou alguns deles e repudiada pelos restantes.
1. A herança pode ser aceite pura e simplesmente ou a benefício de inventário.
2. Têm-se como não escritas as cláusulas testamentárias que, directa ou indirectamente, imponham uma ou outra espécie de aceitação.
1. A herança deferida a menor, interdito, inabilitado ou pessoa colectiva de utilidade pública administrativa só pode ser aceite a benefício de inventário.
2. A aceitação a benefício de inventário faz-se requerendo inventário judicial, nos termos da lei de processo, ou intervindo em inventário pendente.
1. A herança não pode ser aceite sob condição nem a termo.
2. A herança também não pode ser aceite só em parte, salvo o disposto no artigo seguinte.
1. Se alguém é chamado à herança, simultânea ou sucessivamente, por testamento e por lei, e a aceita ou repudia por um dos títulos, entende-se que a aceita ou repudia igualmente pelo outro; mas pode aceitá-la ou repudiá-la pelo primeiro, não obstante a ter repudiado ou aceitado pelo segundo, se ao tempo ignorava a existência do testamento.
2. O sucessível legitimário pode sempre repudiar a herança quanto à quota disponível e aceitá-la quanto à legítima.
1. A aceitação pode ser expressa ou tácita.
2. A aceitação é havida como expressa quando nalgum documento escrito o sucessível chamado à herança declara aceitá-la ou assume o título de herdeiro com a intenção de a adquirir.
3. Os actos de administração praticados pelo sucessível não implicam aceitação tácita da herança.
1. Não importa aceitação a alienação da herança, quando feita gratuitamente em benefício de todos aqueles a quem ela caberia se o alienante a repudiasse.
2. Entende-se, porém, que aceita a herança e a aliena aquele que declara renunciar a ela, se o faz a favor apenas de algum ou alguns dos sucessíveis que seriam chamados na sua falta ou se, embora fazendo-o a favor de todos, o faz em condições distintas daquelas em que a sucessão lhes caberia em caso de repúdio do primeiramente chamado.
1. Se o sucessível chamado à herança falecer sem a haver aceitado ou repudiado, transmite-se aos seus herdeiros o direito de a aceitar ou repudiar.
2. A transmissão só se verifica se os herdeiros aceitarem a herança do falecido, o que os não impede de repudiar, querendo, a herança a que este fora chamado.
1. O direito de aceitar a herança caduca ao fim de 10 anos, contados desde que o sucessível tem conhecimento de haver sido a ela chamado.
2. No caso de instituição sob condição suspensiva, o prazo conta-se a partir do conhecimento da verificação da condição; no caso de substituição fideicomissária, conta-se a partir do conhecimento da morte do fiduciário ou da extinção da pessoa colectiva.
A aceitação da herança é anulável por dolo ou coacção, mas não com fundamento em simples erro.
A aceitação é irrevogável.
Os efeitos do repúdio da herança retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, considerando-se como não chamado o sucessível que a repudia, salvo para efeitos de representação.
O repúdio está sujeito à forma exigida para a alienação da herança.
1. A herança não pode ser repudiada sob condição nem a termo.
2. A herança também não pode ser repudiada só em parte, salvo o disposto no artigo 1893.º
O repúdio da herança é anulável por dolo ou coacção, mas não com fundamento em simples erro.
O repúdio é irrevogável.
1. Os credores do repudiante podem aceitar a herança em nome dele, nos termos dos artigos 601.º e seguintes.
2. A aceitação deve efectuar-se no prazo de 6 meses, a contar do conhecimento do repúdio.
3. Pagos os credores do repudiante, o remanescente da herança não aproveita a este, mas aos herdeiros imediatos.
A herança responde pelas despesas com o funeral do autor e cerimónias religiosas que o acompanhem, pelos encargos com a testamentaria, administração e liquidação do património hereditário, pelo pagamento das dívidas do falecido, e pelo cumprimento dos legados.
Fazem parte da herança:
a) Os bens sub-rogados no lugar de bens da herança por meio de troca directa;
b) O preço dos alienados;
c) Os bens adquiridos com dinheiro ou valores da herança;
d) Os frutos percebidos até à partilha.
1. Os credores da herança e os legatários gozam de preferência sobre os credores pessoais do herdeiro, e os primeiros sobre os segundos.
2. Os encargos da herança são satisfeitos segundo a ordem por que vêm indicados no artigo 1906.º
3. As preferências mantêm-se nos 5 anos subsequentes à abertura da sucessão ou à constituição da dívida, se esta é posterior, ainda que a herança tenha sido partilhada; e prevalecem mesmo quando algum credor preterido tenha adquirido garantia real sobre os bens hereditários.
1. Sendo a herança aceite a benefício de inventário, só respondem pelos encargos respectivos os bens inventariados, salvo se os credores ou legatários provarem a existência de outros bens.
2. Sendo a herança aceite pura e simplesmente, a responsabilidade pelos encargos também não excede o valor dos bens herdados, mas incumbe, neste caso, ao herdeiro provar que na herança não existem valores suficientes para cumprimento dos encargos.
1. O usufrutuário da totalidade ou de uma quota do património do falecido pode adiantar as somas necessárias, conforme os bens que usufruir, para cumprimento dos encargos da herança, ficando com o direito de exigir dos herdeiros, findo o usufruto, a restituição sem juros das quantias que despendeu.
2. Se o usufrutuário não fizer o adiantamento das somas necessárias, podem os herdeiros exigir que dos bens usufruídos se vendam os necessários para cumprimento dos encargos, ou pagá-los com dinheiro seu, ficando, neste último caso, com o direito de haver do usufrutuário os juros correspondentes.
1. O usufrutuário da totalidade do património do falecido é obrigado a cumprir por inteiro o legado de alimentos ou pensão vitalícia.
2. Incidindo o usufruto sobre uma quota-parte do património, o usufrutuário só em proporção dessa quota é obrigado a contribuir para o cumprimento do legado de alimentos ou pensão vitalícia.
3. O usufrutuário de coisas determinadas não é obrigado a contribuir para os sobreditos alimentos ou pensão, se o encargo lhe não tiver sido imposto expressamente.
1. O herdeiro conserva, em relação à herança, até à sua integral liquidação e partilha, todos os direitos e obrigações que tinha para com o falecido, à excepção dos que se extinguem por efeito da morte deste.
2. São imputadas na quota do herdeiro as quantias em dinheiro de que ele é devedor à herança.
3. Se houver necessidade de fazer valer em juízo os direitos e obrigações do herdeiro, e este for cabeça-de-casal, deve ser nomeado à herança, para esse fim, um curador especial.
1. O herdeiro pode pedir judicialmente o reconhecimento da sua qualidade sucessória, e consequente restituição de todos os bens da herança ou de parte deles, contra quem os possua como herdeiro, ou por outro título, ou mesmo sem título.
2. A acção pode ser intentada a todo o tempo, sem prejuízo da aplicação das regras da usucapião relativamente a cada uma das coisas possuídas, e do disposto no artigo 1897.º
1. Se o possuidor de bens da herança tiver disposto deles, no todo ou em parte, a favor de terceiro, a acção de petição pode ser também proposta contra o adquirente, sem prejuízo da responsabilidade do disponente pelo valor dos bens alienados.
2. A acção não procede, porém, contra terceiro que haja adquirido do herdeiro aparente, por título oneroso e de boa fé, bens determinados ou quaisquer direitos sobre eles; neste caso, estando também de boa fé, o alienante é apenas responsável segundo as regras do enriquecimento sem causa.
3. Diz-se herdeiro aparente aquele que é reputado herdeiro por força de erro comum ou geral.
Se o testamento for declarado nulo ou anulado depois do cumprimento de legados, com ou sem encargos, feito de boa fé, fica o suposto herdeiro quite para com o verdadeiro herdeiro entregando-lhe o remanescente da herança, sem prejuízo do direito deste último contra o legatário.
1. Sendo vários os herdeiros, qualquer deles tem legitimidade para pedir separadamente a totalidade dos bens em poder do demandado, sem que este possa opor-lhe que tais bens lhe não pertencem por inteiro.
2. O disposto no número anterior não prejudica o direito que assiste ao cabeça-de-casal de pedir a entrega dos bens que deva administrar, nos termos do capítulo seguinte.
A administração da herança, até à sua liquidação e partilha, pertence ao cabeça-de-casal.
1. O cargo de cabeça-de-casal defere-se pela ordem seguinte:
a) Ao cônjuge sobrevivo, se for herdeiro ou estiver casado em regime de bens que não o da separação;
b) Ao testamenteiro, salvo declaração do testador em contrário;
c) Aos parentes ou ao unido de facto, que sejam herdeiros legais;
d) Aos herdeiros testamentários.
2. Não sendo o cônjuge sobrevivo herdeiro e estando o mesmo casado no regime da participação nos adquiridos, o cargo de cabeça-de-casal poderá ser, nos termos do n.º 2 do artigo 1924.º, entregue pelo tribunal à pessoa que se lhe segue na ordem de preferência da lei, contanto que não haja expectativas de o cônjuge vir a ser beneficiado com o crédito na participação.
3. De entre os parentes que sejam herdeiros legais, preferem os mais próximos em grau.
4. De entre os herdeiros legais do mesmo grau de parentesco, ou de entre os herdeiros testamentários, preferem os que viviam com o falecido há pelo menos 1 ano à data da morte.
5. Em igualdade de circunstâncias, prefere o herdeiro mais velho.
6. A escolha entre os parentes e o unido de facto é feita de acordo com os critérios de preferência na sucessão legal.
Tendo sido distribuído em legados todo o património hereditário, servirá de cabeça-de-casal, em substituição dos herdeiros, o legatário mais beneficiado; em igualdade de circunstâncias, preferirá o mais velho.
1. Se o cônjuge, o herdeiro ou o legatário que tiver preferência for incapaz ou estiver sujeito ao regime de curadoria regulado pelos artigos 89.º e seguintes, exercerá as funções de cabeça-de-casal o seu representante legal.
2. O curador é tido como representante do inabilitado para o efeito do número anterior.
Se todas as pessoas referidas nos artigos anteriores se escusarem ou forem removidas, será o cabeça-de-casal designado pelo tribunal, oficiosamente, a requerimento de qualquer interessado, ou a pedido do Ministério Público, se houver lugar a inventário obrigatório.
As regras dos artigos precedentes não são imperativas; por acordo de todos os interessados, e do Ministério Público, se houver lugar a inventário obrigatório, podem entregar-se a administração da herança e o exercício das demais funções de cabeça-de-casal a qualquer outra pessoa.
1. O cabeça-de-casal pode a todo o tempo escusar-se do cargo:
a) Se tiver completado 70 anos de idade;
b) Se estiver impossibilitado, por doença, de exercer convenientemente as funções;
c) Se, sendo o tribunal de Macau competente para o inventário, residir fora de Macau; ou
d) Se o exercício das funções de cabeça-de-casal for incompatível com o desempenho de cargo público que exerça.
2. O disposto neste artigo não prejudica a liberdade de aceitação da testamentaria e consequente exercício das funções de cabeça-de-casal.
1. O cabeça-de-casal pode ser removido, sem prejuízo das demais sanções que no caso couberem:
a) Se dolosamente ocultou a existência de bens pertencentes à herança ou de doações feitas pelo falecido, ou se, também dolosamente, denunciou doações ou encargos inexistentes;
b) Se não administrar o património hereditário com prudência e zelo;
c) Se, havendo lugar a inventário obrigatório, o não requereu no prazo de 3 meses a contar da data em que teve conhecimento da abertura da sucessão, ou não cumpriu no inventário, ainda que não seja obrigatório, os deveres que a lei de processo lhe impuser; ou
d) Se revelar incompetência para o exercício do cargo.
2. Tem legitimidade para pedir a remoção qualquer interessado, ou o Ministério Público, se houver lugar a inventário obrigatório.
1. O cabeça-de-casal administra os bens próprios do falecido e, tendo este sido casado em regime de comunhão, os bens comuns do casal.
2. Os bens doados em vida pelo autor da sucessão não se consideram hereditários e continuam a ser administrados pelo donatário.
1. O cabeça-de-casal pode pedir aos herdeiros ou a terceiro a entrega dos bens que deva administrar e que estes tenham em seu poder, e usar contra eles de acções possessórias a fim de ser mantido na posse das coisas sujeitas à sua gestão ou a ela restituído.
2. O exercício das acções possessórias cabe igualmente aos herdeiros ou a terceiro contra o cabeça-de-casal.
O cabeça-de-casal pode cobrar as dívidas activas da herança, quando a cobrança possa perigar com a demora ou o pagamento seja feito espontaneamente.
1. O cabeça-de-casal deve vender os frutos ou outros bens deterioráveis, podendo aplicar o produto na satisfação das despesas do funeral e cerimónias religiosas que o acompanhem, bem como no cumprimento dos encargos da administração.
2. Para satisfazer as despesas do funeral e cerimónias religiosas que o acompanhem, bem como os encargos da administração, pode o cabeça-de-casal vender os frutos não deterioráveis, na medida do que for necessário.
1. Fora dos casos declarados nos artigos anteriores, e sem prejuízo do disposto no artigo 1916.º, os direitos relativos à herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos os herdeiros ou contra todos os herdeiros.
2. O disposto no número anterior não prejudica os direitos que tenham sido atribuídos pelo testador ao testamenteiro nos termos dos artigos 2154.º e 2155.º, sendo o testamenteiro cabeça-de-casal.
Qualquer dos herdeiros ou o cônjuge meeiro tem o direito de exigir que o cabeça-de-casal distribua por todos até metade dos rendimentos que lhes caibam, salvo se forem necessários, mesmo nessa parte, para satisfação de encargos da administração.
1. O cabeça-de-casal deve prestar contas anualmente.
2. Nas contas entram como despesas os rendimentos entregues pelo cabeça-de-casal aos herdeiros ou ao cônjuge meeiro nos termos do artigo anterior, e bem assim o juro do que haja gasto à sua custa na satisfação de encargos da administração.
3. Havendo saldo positivo, é distribuído pelos interessados, segundo o seu direito, depois de deduzida a quantia necessária para os encargos do novo ano.
O cargo de cabeça-de-casal é gratuito, sem prejuízo do disposto no artigo 2160.º, se for exercido pelo testamenteiro.
O cargo de cabeça-de-casal não é transmissível em vida nem por morte.
1. O herdeiro que sonegar bens da herança, ocultando dolosamente a sua existência, seja ou não cabeça-de-casal, perde em benefício dos co-herdeiros o direito que possa ter a qualquer parte dos bens sonegados, além de incorrer nas demais sanções que forem aplicáveis.
2. O que sonegar bens da herança é considerado mero detentor desses bens.
Os bens da herança indivisa respondem colectivamente pela satisfação dos respectivos encargos.
1. Efectuada a partilha, cada herdeiro só responde pelos encargos em proporção da quota que lhe tenha cabido na herança.
2. Podem, todavia, os herdeiros deliberar que o pagamento se faça à custa de dinheiro ou outros bens separados para esse efeito, ou que fique a cargo de algum ou alguns deles.
3. A deliberação obriga os credores e os legatários; mas, se uns ou outros não puderem ser pagos integralmente nos sobreditos termos, têm recurso contra os outros bens ou contra os outros herdeiros, nos termos gerais.
Se existirem direitos de terceiro, de natureza remível, sobre determinados bens da herança, e houver nesta dinheiro suficiente, pode qualquer dos co-herdeiros ou o cônjuge meeiro exigir que esses direitos sejam remidos antes de efectuada a partilha.
1. Entrando os bens na partilha com os direitos referidos no artigo anterior, desconta-se neles o valor desses direitos, que serão suportados exclusivamente pelo interessado a quem os bens couberem.
2. Se não se fizer tal desconto, o interessado que pagar a remição tem regresso contra os outros pela parte que a cada um tocar, em proporção do seu quinhão; mas, em caso de insolvência de algum deles, é a sua parte repartida entre todos proporcionalmente.
1. Qualquer co-herdeiro tem o direito de exigir partilha quando lhe aprouver.
2. Igual direito assiste ao cônjuge sobrevivo que por força do regime de bens tenha direito à meação no património comum ou a exigir a determinação do titular e montante do crédito na participação.
3. Não pode renunciar-se ao direito de partilha, mas pode convencionar-se que o património se conserve indiviso por certo prazo, que não exceda 5 anos; é lícito renovar este prazo, uma ou mais vezes, por nova convenção.
1. A partilha pode fazer-se extrajudicialmente, quando houver acordo de todos os interessados, ou por inventário judicial nos termos prescritos na lei de processo.
2. O inventário judicial é, porém, obrigatório, sempre que a lei exija aceitação da herança a benefício de inventário, e ainda nos casos em que algum dos herdeiros não possa, por motivo de ausência em parte incerta ou de impossibilidade ou incapacidade de facto duradouras, outorgar em partilha extrajudicial.
3. O inventário obrigatório finda quando cessa a causa que o determina, salvo se algum dos interessados requerer o seu prosseguimento como facultativo.
Havendo um único interessado, o inventário a que haja de proceder-se nos termos do n.º 2 do artigo anterior tem apenas por fim relacionar os bens e, eventualmente, servir de base à liquidação da herança.
1. O cônjuge sobrevivo tem direito a ser encabeçado, no momento da partilha, no direito de habitação da casa de morada da família e no direito de uso do respectivo recheio, devendo tornas aos co-herdeiros se o valor recebido exceder o da sua parte sucessória e meação, se a houver.
2. Caducam os direitos atribuídos no número anterior, se o cônjuge não habitar a casa por prazo superior a 1 ano.
3. Não há, contudo, lugar à caducidade se:
a) Ocorrer motivo de força maior, doença do cônjuge sobrevivo ou outro motivo ponderoso de carácter transitório;
b) Permanecer no prédio qualquer das pessoas referidas no n.º 5 do artigo 998.º ou o unido de facto, se viverem habitualmente em comunhão de mesa e habitação com o cônjuge sobrevivo, desde que a ausência deste seja devida a motivo atendível de carácter transitório; ou
c) Os proprietários derem o seu consentimento.
4. Para efeitos da alínea b) do número anterior, só releva a união de facto iniciada posteriormente à dissolução do casamento.
5. A pedido dos proprietários, pode o tribunal, quando o considere justificado, impor ao cônjuge a obrigação de prestar caução.
Se a casa de morada da família não fizer parte da herança, deve observar-se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo anterior relativamente ao recheio.
Para os efeitos do disposto nos artigos anteriores, considera-se recheio o mobiliário e demais objectos ou utensílios destinados ao serviço, comodidade e ornamentação da casa.
1. Os descendentes e o cônjuge sobrevivo que pretendam entrar na sucessão, respectivamente, do ascendente e do cônjuge devem restituir à massa da herança, para igualação da partilha, os bens ou valores que lhes foram doados pelo falecido: esta restituição tem o nome de colação.
2. São havidas como doação, para efeitos de colação, as despesas referidas no artigo 1951.º
Só estão sujeitos à colação os descendentes e o cônjuge que eram à data da doação presuntivos herdeiros legitimários do doador.
A obrigação de conferir recai sobre o donatário, se vier a suceder ao doador, ou sobre os seus representantes, havendo-os, ainda que estes não hajam tirado benefício da liberalidade.
1. Não estão sujeitos a colação os bens ou valores doados ao cônjuge do descendente presuntivo herdeiro legitimário.
2. Se a doação tiver sido feita a ambos os cônjuges, fica sujeita a colação apenas a parte do que for presuntivo herdeiro.
3. A doação não se considera feita a ambos os cônjuges só porque entre eles vigora o regime da comunhão geral.
1. A colação faz-se pela imputação do valor da doação ou da importância das despesas na quota hereditária, ou pela restituição dos próprios bens doados, se houver acordo de todos os herdeiros.
2. Se não houver na herança bens suficientes para igualar todos os herdeiros, nem por isso são reduzidas as doações, salvo se houver inoficiosidade.
1. Na determinação do valor dos bens doados atender-se-á, sem prejuízo do disposto no artigo 1956.º, ao estado dos bens à data da abertura da sucessão.
2. Se tiverem sido doados bens que o donatário consumiu, alienou ou onerou, ou que pereceram por sua culpa, atende-se ao valor que esses bens tinham imediatamente antes da ocorrência desses factos.
3. Os valores encontrados nos termos dos números anteriores, as doações em dinheiro, bem como os encargos em dinheiro que as oneraram e foram cumpridos pelo donatário, são actualizados nos termos do artigo 544.º até à data da avaliação dos bens para efeitos de partilha.
1. Está sujeito a colação tudo quanto o falecido tiver despendido gratuitamente em proveito dos descendentes e do cônjuge sobrevivo.
2. Exceptuam-se, na medida em que se harmonizem com os usos e com a condição social e económica do falecido:
a) As doações de diminuto valor económico;
b) As despesas com alimentos dos descendentes e cônjuge e com a contribuição para os encargos da vida familiar;
c) As despesas com o casamento, estabelecimento e colocação dos descendentes.
3. Contudo, das liberalidades entre cônjuges, casados num regime de comunhão, que hajam sido efectuadas com bens do património próprio do cônjuge falecido a favor do património comum, ou vice-versa, só é computada metade do valor.
4. Estando os cônjuges casados no regime da participação nos adquiridos, será igualmente computada apenas metade do valor das liberalidades efectuadas com bens excluídos do património em participação a favor do património em participação, ou com bens do património em participação a favor do património excluído da participação.
5. Não estão sujeitas a colação as liberalidades efectuadas com bens do património em participação do cônjuge disponente a favor do património em participação do cônjuge sobrevivo.
6. Para efeitos dos n.os 3 a 5, atende-se ao regime de bens vigente à data em que foi efectuada a liberalidade.
Os frutos da coisa doada sujeita a colação, percebidos desde a abertura da sucessão, devem ser conferidos.
Não é objecto de colação a coisa doada que tiver perecido em vida do autor da sucessão por facto não imputável ao donatário.
1. A colação pode ser dispensada pelo doador no acto da doação ou posteriormente.
2. Se a doação tiver sido acompanhada de alguma formalidade externa, só pela mesma forma, ou por testamento, pode ser dispensada a colação.
3. A colação presume-se dispensada nas doações manuais e nas doações remuneratórias.
1. Não havendo lugar à colação, a doação é imputada na quota disponível.
2. Se, porém, não houver lugar à colação pelo facto de o donatário repudiar a herança, a doação é imputada na quota indisponível.
3. No caso de doação efectuada a descendentes, o repúdio só determina a imputação na quota indisponível se o donatário não tiver descendentes que o representem, ou se estes não puderem ou não quiserem aceitar a herança.
O donatário é equiparado, quanto a benfeitorias, ao possuidor de boa fé, sendo-lhe aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1198.º e seguintes.
O donatário responde pelas deteriorações que culposamente tenha causado nos bens doados.
1. Sendo a doação de bens comuns feita por ambos os cônjuges a favor dos descendentes, confere-se metade por morte de cada um deles.
2. O valor de cada uma das metades é o que ela tiver de acordo com os critérios fixados no artigo 1950.º
Feita a partilha, cada um dos herdeiros é considerado, desde a abertura da herança, sucessor único dos bens que lhe foram atribuídos, sem prejuízo do disposto quanto a frutos.
1. Finda a partilha, são entregues a cada um dos co-herdeiros os documentos relativos aos bens que lhe couberem.
2. Os documentos relativos aos bens atribuídos a dois ou mais herdeiros são entregues ao que neles tiver maior parte, com obrigação de os apresentar aos outros interessados, nos termos gerais.
3. Os documentos relativos a toda a herança ficam em poder do co-herdeiro que os interessados escolherem, ou que o tribunal nomear na falta de acordo, com igual obrigação de os apresentar aos outros interessados.
A partilha extrajudicial só é impugnável nos casos em que o sejam os contratos.
A omissão de bens da herança não determina a nulidade da partilha, mas apenas a partilha adicional dos bens omitidos.
1. Se tiver recaído sobre bens não pertencentes à herança, a partilha é nula nessa parte, sendo-lhe aplicável, com as necessárias adaptações e sem prejuízo do disposto no número seguinte, o preceituado acerca da venda de bens alheios.
2. Aquele a quem sejam atribuídos os bens alheios é indemnizado pelos co-herdeiros na proporção dos respectivos quinhões hereditários; se, porém, algum dos co-herdeiros estiver insolvente, respondem os demais pela sua parte, na mesma proporção.
A alienação de herança ou de quinhão hereditário está sujeita às disposições reguladoras do negócio jurídico que lhe der causa, salvo o preceituado nos artigos seguintes.
1. Todo o benefício resultante da caducidade de um legado, encargo ou fideicomisso se presume transmitido com a herança ou quota hereditária.
2. A parte hereditária devolvida ao alienante, depois da alienação, em consequência de fideicomisso ou do direito de acrescer, presume-se excluída da disposição.
3. Presumem-se igualmente excluídos da alienação os diplomas e correspondência do falecido, bem como as recordações de família de diminuto valor económico.
1. A alienação de herança ou de quinhão hereditário é feita por escritura pública, se existirem bens cuja alienação deva ser feita por essa forma.
2. Fora do caso previsto no número anterior, a alienação deve constar de documento particular.
O que aliena uma herança ou quinhão hereditário sem especificação de bens só responde pela alienação de coisa alheia se não vier a ser reconhecido como herdeiro.
O adquirente de herança ou de quinhão hereditário sucede nos encargos respectivos; mas o alienante responde solidariamente por esses encargos, salvo o direito de haver do adquirente o reembolso total do que assim houver despendido.
1. O alienante por título oneroso que tiver disposto de bens da herança é obrigado a entregar o respectivo valor ao adquirente.
2. O adquirente a título oneroso ou gratuito é obrigado a reembolsar o alienante do que este tiver despendido na satisfação dos encargos da herança e a pagar-lhe o que a herança lhe dever.
3. As disposições dos números anteriores são supletivas.
1. Quando seja vendido ou dado em cumprimento a estranhos um quinhão hereditário, os co-herdeiros gozam do direito de preferência nos termos em que este direito assiste aos comproprietários.
2. O prazo, porém, para o exercício do direito é de 2 meses a contar da comunicação para a preferência.
Se o falecido não tiver disposto válida e eficazmente, no todo ou em parte, dos bens de que podia dispor para depois da morte, são chamados à sucessão desses bens os seus herdeiros legítimos.
São herdeiros legítimos o cônjuge, os parentes, o unido de facto e o território de Macau, pela ordem e segundo as regras constantes do presente título.
1. A ordem por que são chamados os herdeiros é a seguinte:
a) Cônjuge e descendentes;
b) Cônjuge e ascendentes;
c) Unido de facto;
d) Irmãos e seus descendentes;
e) Outros colaterais até ao quarto grau;
f) Território de Macau.
2. O cônjuge sobrevivo integra a primeira classe de sucessíveis, salvo se o autor da sucessão falecer sem descendentes e deixar ascendentes, caso em que integra a segunda classe.
3. O cônjuge não é chamado à herança, se à data da morte do autor da sucessão se encontrava dele divorciado, por sentença transitada ou que venha a transitar em julgado ou por decisão definitiva ou que venha a sê-lo, ou ainda por sentença que venha a ser proferida posteriormente àquela data, nos termos do n.º 3 do artigo 1640.º
Os herdeiros de cada uma das classes de sucessíveis preferem aos das classes imediatas.
Dentro de cada classe os parentes de grau mais próximo preferem aos de grau mais afastado.
Os parentes de cada classe sucedem por cabeça ou em partes iguais, salvas as excepções previstas neste Código.
1. Se os sucessíveis da mesma classe chamados simultaneamente à herança não puderem ou não quiserem aceitar, são chamados os imediatos sucessores.
2. Se, porém, apenas algum ou alguns dos sucessíveis não puderem ou não quiserem aceitar, a sua parte acresce à dos outros sucessíveis da mesma classe que com eles concorram à herança, sem prejuízo do disposto no artigo 1983.º
O disposto nos três artigos anteriores não prejudica o direito de representação, nos casos em que este tem lugar.
1. A partilha entre o cônjuge e os filhos faz-se por cabeça, dividindo-se a herança em tantas partes quantos forem os herdeiros.
2. Se o autor da sucessão não deixar cônjuge sobrevivo, a herança divide-se pelos filhos nos termos do número anterior.
Os descendentes dos filhos que não puderem ou não quiserem aceitar a herança são chamados à sucessão nos termos do artigo 1880.º
Na falta de descendentes sucede o cônjuge, sem prejuízo do disposto no capítulo seguinte.
1. Se não houver descendentes e o autor da sucessão deixar cônjuge e ascendentes, ao cônjuge pertencem duas terças partes e aos ascendentes uma terça parte da herança.
2. Na falta de cônjuge, os ascendentes são chamados à totalidade da herança.
3. A partilha entre ascendentes, nos casos previstos nos números anteriores, faz-se segundo as regras dos artigos 1975.º e 1976.º
Se algum ou alguns dos ascendentes não puderem ou não quiserem aceitar, no caso previsto no n.º 1 do artigo anterior, a sua parte acresce à dos outros ascendentes que concorram à sucessão; se estes não existirem, acresce à do cônjuge sobrevivo.
Na falta de descendentes e ascendentes, o cônjuge é chamado à totalidade da herança.
Na falta do cônjuge, descendentes e ascendentes, é chamado à sucessão quem à data da morte do autor da sucessão se encontrasse a viver com ele em união de facto há pelo menos 4 anos.
Na falta do cônjuge, descendentes, ascendentes e unido de facto, são chamados à sucessão os irmãos e, representativamente, os descendentes destes.
Concorrendo à sucessão irmãos germanos e irmãos consanguíneos ou uterinos, o quinhão de cada um dos irmãos germanos, ou dos descendentes que o representem, é igual ao dobro do quinhão de cada um dos outros.
Na falta de herdeiros das classes anteriores, são chamados à sucessão os restantes colaterais até ao quarto grau, preferindo sempre os mais próximos.
A partilha faz-se por cabeça, mesmo que algum dos chamados à sucessão seja duplamente parente do falecido.
Na falta de cônjuge, de todos os parentes sucessíveis e do unido de facto, é chamado à herança o território de Macau.
O território de Macau tem, relativamente à herança, os mesmos direitos e obrigações de qualquer outro herdeiro.
A aquisição da herança pelo território de Macau, como sucessor legítimo, opera-se de direito, sem necessidade de aceitação, não podendo o Território repudiá-la.
Reconhecida judicialmente a inexistência de outros sucessíveis legítimos, a herança é declarada vaga para o território de Macau nos termos das leis de processo.
Entende-se por legítima a porção de bens de que o testador não pode dispor, por ser legalmente destinada aos herdeiros legitimários.
São herdeiros legitimários o cônjuge, sem prejuízo da renúncia em convenção matrimonial nos termos do artigo 1571.º e do n.º 3 do artigo 1578.º, os descendentes e os ascendentes, pela ordem e segundo as regras estabelecidas para a sucessão legítima.
A legítima do cônjuge, se não concorrer com descendentes nem ascendentes, é de um terço da herança.
1. A legítima do cônjuge e dos filhos, em caso de concurso, é de metade da herança.
2. Não havendo cônjuge sobrevivo, a legítima dos filhos é de um terço ou metade da herança, conforme exista um só filho ou existam dois ou mais.
Os descendentes do segundo grau e seguintes têm direito à legítima que caberia ao seu ascendente, sendo a parte de cada um fixada nos termos prescritos para a sucessão legítima.
1. A legítima do cônjuge e dos ascendentes, em caso de concurso, é de metade da herança.
2. Se o autor da sucessão não deixar descendentes nem cônjuge sobrevivo, a legítima dos ascendentes é de um terço ou de um quarto da herança, conforme forem chamados os pais ou os ascendentes do segundo grau e seguintes.
1. Para o cálculo da legítima, deve atender-se ao valor dos bens existentes no património do autor da sucessão à data da sua morte, ao valor dos bens doados, às despesas sujeitas a colação e às dívidas da herança.
2. Não é atendido para o cálculo da legítima o valor dos bens que, nos termos do artigo 1953.º, não são objecto de colação.
1. O testador não pode impor encargos sobre a legítima, nem designar os bens que a devem preencher, contra a vontade do herdeiro.
2. Se, porém, o testador deixar usufruto ou constituir pensão vitalícia que atinja a legítima, podem os herdeiros legitimários cumprir o legado ou entregar ao legatário tão-somente a quota disponível.
1. Pode o autor da sucessão deixar um legado ao herdeiro legitimário em substituição da legítima.
2. A aceitação do legado implica a perda do direito à legítima, assim como a aceitação da legítima envolve a perda do direito ao legado.
3. Se o herdeiro, notificado nos termos do n.º 1 do artigo 1887.º, nada declarar, tem-se por aceite o legado.
4. O legado deixado em substituição da legítima é imputado na quota indisponível do autor da sucessão; mas, se exceder o valor da legítima do herdeiro, é imputado, pelo excesso, na quota disponível.
1. O autor da sucessão pode em testamento, com expressa declaração da causa, deserdar o herdeiro legitimário, privando-o da legítima, quando se verifique alguma das seguintes ocorrências:
a) Ter sido o sucessível condenado por algum crime doloso cometido contra a pessoa, bens ou honra do autor da sucessão, ou do seu cônjuge ou unido de facto, ou de algum descendente ou ascendente, desde que ao crime corresponda pena superior a 6 meses de prisão;
b) Ter sido o sucessível condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas pessoas;
c) Ter o sucessível, sem justa causa, recusado ao autor da sucessão ou ao seu cônjuge os devidos alimentos;
d) Ter o sucessível provocado dolosa e injustificadamente grave prejuízo ao património ou à pessoa do autor da sucessão ou ter por outro modo violado gravemente os seus deveres para com o falecido.
2. O deserdado é equiparado ao indigno para todos os efeitos legais.
A acção de impugnação da deserdação, com fundamento na inexistência da causa invocada, caduca ao fim de 2 anos a contar da abertura do testamento.
Dizem-se inoficiosas as liberalidades, entre vivos ou por morte, que ofendam a legítima dos herdeiros legitimários.
As liberalidades inoficiosas são redutíveis, a requerimento dos herdeiros legitimários ou dos seus sucessores, em tanto quanto for necessário para que a legítima seja preenchida.
Não é permitida em vida do autor da sucessão a renúncia ao direito de reduzir as liberalidades.
A redução abrange em primeiro lugar as disposições testamentárias a título de herança, em segundo lugar os legados, e por último as liberalidades que hajam sido feitas em vida do autor da sucessão.
1. Se bastar a redução das disposições testamentárias, deve ser feita proporcionalmente, tanto no caso de deixas a título de herança como a título de legado.
2. No caso, porém, de o testador ter declarado que determinadas disposições devem produzir efeito de preferência a outras, as primeiras só são reduzidas se o valor integral das restantes não for suficiente para o preenchimento da legítima.
3. Gozam de igual preferência as deixas remuneratórias.
1. Se for necessário recorrer às liberalidades feitas em vida, começa-se pela última, no todo ou em parte; se isso não bastar, passa-se à imediata; e assim sucessivamente.
2. Havendo diversas liberalidades feitas no mesmo acto ou na mesma data, a redução será feita entre elas rateadamente, salvo se alguma delas for remuneratória, porque a essa é aplicável o disposto no n.º 3 do artigo anterior.
1. Quando os bens legados ou doados são divisíveis, a redução faz-se separando deles a parte necessária para preencher a legítima.
2. Sendo os bens indivisíveis, se a importância da redução exceder metade do valor dos bens, estes pertencem integralmente ao herdeiro legitimário, e o legatário ou donatário haverá o resto em dinheiro; no caso contrário, os bens pertencem integralmente ao legatário ou donatário, tendo este de pagar em dinheiro ao herdeiro legitimário a importância da redução.
3. A reposição de aquilo que se despendeu gratuitamente a favor dos herdeiros legitimários, em consequência da redução, é feita igualmente em dinheiro.
Se os bens doados tiverem perecido por qualquer causa ou tiverem sido alienados ou onerados, o donatário ou, nos limites do património líquido em que houverem sucedido ao donatário, os sucessores deste são responsáveis pelo preenchimento da legítima em dinheiro, até ao valor desses bens.
Nos casos previstos no artigo anterior e no n.º 3 do artigo 2011.º, a insolvência daqueles que, segundo a ordem estabelecida, devem suportar o encargo da redução não determina a responsabilidade dos outros.
O donatário é considerado, quanto a frutos e benfeitorias, possuidor de boa fé até à data do pedido de redução.
A acção de redução de liberalidades inoficiosas caduca dentro de 2 anos, a contar da aceitação da herança pelo herdeiro legitimário.
1. Diz-se testamento o acto unilateral e revogável pelo qual uma pessoa dispõe, para depois da morte, de todos os seus bens ou de parte deles.
2. As disposições de carácter não patrimonial que a lei permite inserir no testamento são válidas se fizerem parte de um acto revestido de forma testamentária, ainda que nele não figurem disposições de carácter patrimonial.
É nulo o testamento em que o testador não tenha exprimido completa e claramente a sua vontade, mas apenas por sinais, interjeições ou palavras desconexas ou isoladas, em resposta a perguntas que lhe fossem feitas.
Salvo o disposto quanto à convenção matrimonial, não podem testar no mesmo acto duas ou mais pessoas, quer em proveito recíproco, quer em favor de terceiro.
1. O testamento é um acto pessoal, insusceptível de ser feito por meio de representante ou de ficar dependente do arbítrio de outrem, quer pelo que toca à instituição de herdeiros ou nomeação de legatários, quer pelo que respeita ao objecto da herança ou do legado, quer pelo que pertence ao cumprimento ou não cumprimento das suas disposições.
2. O testador pode, todavia, cometer a terceiro:
a) A repartição da herança ou do legado, quando institua ou nomeie uma generalidade de pessoas;
b) A nomeação do legatário de entre pessoas por aquele determinadas.
3. Nos casos previstos no número antecedente, qualquer interessado tem a faculdade de requerer ao tribunal a fixação de um prazo para a repartição da herança ou do legado ou nomeação do legatário, sob a cominação, no primeiro caso, de a repartição pertencer à pessoa designada para o efeito pelo tribunal e, no segundo, de a distribuição do legado ser feita por igual pelas pessoas que o testador tenha determinado.
1. O testador pode deixar a escolha da coisa legada à justa apreciação do onerado, do legatário ou de terceiro, desde que indique o fim do legado e o género ou espécie em que ele se contém.
2. É aplicável a este caso, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 3 do artigo anterior.
É nula a disposição que dependa de instruções ou recomendações feitas a outrem secretamente, ou se reporte a documentos não autênticos, ou não escritos e assinados pelo testador com data anterior à data do testamento ou contemporânea desta.
É igualmente nula a disposição feita a favor de pessoa incerta que por algum modo se não possa tornar certa.
É nula a disposição testamentária, quando da interpretação do testamento resulte que foi essencialmente determinada por um fim contrário à lei ou à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes.
1. Na interpretação das disposições testamentárias deve observar-se o que parecer mais ajustado com a vontade do testador, conforme o contexto do testamento.
2. É admitida prova complementar, mas não surtirá qualquer efeito a vontade do testador que não tenha no contexto um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expressa.
Podem testar todos os indivíduos que a lei não declare incapazes de o fazer.
São incapazes de testar:
a) Os menores não emancipados;
b) Os interditos por anomalia psíquica.
O testamento feito por incapaz é nulo.
A capacidade do testador determina-se pela data do testamento.
1. É nula a disposição feita por interdito ou inabilitado, a favor do seu tutor, curador ou administrador legal de bens, ainda que estejam aprovadas as respectivas contas.
2. É igualmente nula a disposição a favor do protutor, se este, na data em que o testamento foi feito, substituía qualquer das pessoas designadas no número anterior.
3. É, porém, válida a disposição a favor das mesmas pessoas, quando se trate de descendentes, ascendentes, colaterais até ao terceiro grau, cônjuge ou unido de facto do testador.
1. É nula a disposição a favor do médico ou enfermeiro que tratar o testador, ou do ministro de culto que lhe prestar assistência espiritual, se o testamento for feito durante a doença e o seu autor vier a falecer dela.
2. A nulidade estabelecida no número anterior não abrange:
a) Os legados remuneratórios de serviços recebidos pelo doente;
b) As disposições a favor das pessoas designadas no n.º 3 do artigo anterior.
É nula a disposição a favor do notário ou entidade com funções notariais que lavrou o testamento público ou aprovou o testamento cerrado, ou a favor da pessoa que escreveu este, ou das testemunhas, abonadores ou intérpretes que intervieram no testamento ou na sua aprovação.
1. São nulas as disposições referidas nos artigos anteriores, ainda que feitas por meio de interposta pessoa.
2. Consideram-se interpostas pessoas as designadas no n.º 2 do artigo 573.º
É anulável o testamento feito por quem se encontrava incapacitado de entender o sentido da sua declaração ou não tinha o livre exercício da sua vontade por qualquer causa, ainda que transitória.
É anulável a disposição feita aparentemente a favor de pessoa designada no testamento, mas que, na realidade, e por acordo com essa pessoa, vise a beneficiar outra.
É também anulável a disposição testamentária determinada por erro, dolo ou coacção.
O erro, de facto ou de direito, que recaia sobre o motivo da disposição testamentária só é causa de anulação quando resultar do próprio testamento que o testador não teria feito a disposição se conhecesse a falsidade do motivo.
Se o testador tiver indicado erroneamente a pessoa do herdeiro ou do legatário, ou os bens que são objecto da disposição, mas da interpretação do testamento for possível concluir a que pessoa ou bens ele pretendia referir-se, a disposição vale relativamente a esta pessoa ou a estes bens.
As formas comuns do testamento são o testamento público e o testamento cerrado.
É público o testamento escrito por notário nos termos da lei do notariado.
1. O testamento diz-se cerrado, quando é escrito e assinado pelo testador ou por outra pessoa a seu rogo, ou escrito por outra pessoa a rogo do testador e por este assinado.
2. O testador só pode deixar de assinar o testamento cerrado quando não saiba ou não possa fazê-lo, ficando consignada no instrumento de aprovação a razão por que o não assina.
3. A pessoa que assina o testamento deve rubricar as folhas que não contenham a sua assinatura.
4. O testamento cerrado deve ser aprovado por notário, nos termos da lei do notariado.
5. A violação do disposto nos números anteriores importa nulidade do testamento.
A data da aprovação do testamento cerrado é havida como data do testamento para todos os efeitos legais.
Os que não sabem ou não podem ler são inábeis para dispor em testamento cerrado.
1. O testador pode conservar o testamento cerrado em seu poder, cometê-lo à guarda de terceiro ou depositá-lo em qualquer cartório notarial competente.
2. A pessoa que tiver em seu poder o testamento é obrigada a apresentá-lo a um notário competente, dentro de 5 dias contados desde o conhecimento do falecimento do testador; se o não fizer, incorre em responsabilidade pelos danos a que der causa, sem prejuízo da sanção especial da alínea d) do artigo 1874.º
Qualquer pessoa pode fazer testamento a bordo de navio, em viagem por mar, nos termos declarados nos artigos seguintes.
1. O testador declara a sua vontade na presença do comandante do navio e de duas testemunhas.
2. Se o próprio comandante quiser fazer o seu testamento, toma o seu lugar quem deva substituí-lo no exercício das suas funções de comandante.
3. O testamento, depois de escrito, datado e lido em voz alta pelo comandante, é assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo mesmo comandante; se o testador e as testemunhas não puderem assinar, deve declarar-se no testamento o motivo por que não o fazem.
1. Se o testador souber e puder escrever, pode fazer o testamento por seu próprio punho.
2. Escrito e assinado o testamento pelo testador, este apresenta-o ao comandante, na presença de duas testemunhas, declarando que exprime a sua última vontade; o comandante, sem o ler, escreve no testamento a declaração datada de que lhe foi apresentado, sendo essa declaração assinada tanto pelas testemunhas como pelo comandante.
3. Se o testador o solicitar, o comandante, ainda na presença das testemunhas, sela o testamento, exarando na face exterior da folha que servir de invólucro uma nota com a designação da pessoa a quem pertence o testamento ali contido.
4. É aplicável a esta espécie de testamento o que fica disposto no n.º 2 do artigo antecedente.
O testamento marítimo é feito em duplicado, registado no diário de navegação e guardado entre os documentos de bordo.
1. Se o navio entrar em algum porto no exterior de Macau onde exista autoridade consular que represente Macau, deve o comandante entregar a essa autoridade um dos exemplares do testamento e cópia do registo feito no diário de navegação.
2. Aportando o navio ao território de Macau, deve o comandante depositar num cartório notarial competente o outro exemplar do testamento, ou fazer o depósito de ambos, se nenhum foi depositado nos termos do número anterior, além de cópia do registo.
3. Em qualquer dos casos declarados no presente artigo, o comandante cobrará recibo e averbá-lo-á no diário de navegação, à margem do registo do testamento.
Falecendo o testador antes de findar a causa que o impedia de testar nas formas comuns, será a sua morte anunciada no Boletim Oficial de Macau, a diligência do notário, com designação do cartório notarial onde o testamento se encontra depositado.
O disposto nos artigos 2044.º a 2049.º é aplicável, com as necessárias adaptações, ao testamento feito em viagem a bordo de aeronave.
1. Se qualquer pessoa estiver inibida de socorrer-se das formas comuns de testamento, por se encontrar em lugar onde grasse epidemia ou por outro motivo de calamidade pública, pode testar perante algum notário, juiz ou ministro de culto, com observância das formalidades prescritas nos artigos 2045.º ou 2046.º
2. O testamento deve ser depositado, logo que seja possível, num cartório notarial de Macau competente.
1. Não pode ser testemunha, abonador ou intérprete em qualquer dos testamentos regulados na presente Secção quem está impedido de o ser nos documentos autênticos extra-oficiais.
2. É extensivo aos mesmos testamentos, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 2031.º
1. O testamento celebrado por alguma das formas especiais previstas na presente secção fica sem efeito decorridos 2 meses sobre a cessação da causa que impedia o testador de testar segundo as formas comuns.
2. Se no decurso deste prazo o testador for colocado de novo em circunstâncias impeditivas, o prazo é interrompido, devendo começar a contar-se por inteiro a partir da cessação das novas circunstâncias.
3. A entidade perante quem for feito o testamento deve esclarecer o testador acerca do disposto no n.º 1, fazendo menção do facto no próprio testamento; a falta de cumprimento deste preceito não determina a nulidade do acto.
O testamento feito no exterior por residente habitual de Macau com observância da lei exterior competente só produz efeitos em Macau se tiver sido observada forma solene na sua feitura ou aprovação.
1. É válida a disposição com o fim de venerar a memória do falecido ou fim similar, quando o testador designe os bens que devem ser utilizados para esse fim, ou quando seja possível determinar a quantia necessária para tal efeito.
2. A disposição referida no número anterior constitui encargo que recai sobre o herdeiro ou o legatário.
1. A disposição a favor dos familiares do testador ou de terceiro, sem designação de quais sejam, considera-se feita a favor dos que seriam chamados por lei à sucessão, na data da morte do testador, sendo a herança ou legado distribuído segundo as regras da sucessão legítima.
2. De igual forma se procede, se forem designados como sucessores os herdeiros legítimos do testador ou de terceiro, ou certa categoria de parentes.
Se o testador designar certos sucessores individualmente e outros colectivamente, são estes havidos por individualmente designados.
Se o testador chamar à sucessão certa pessoa e seus filhos, entende-se que são todos designados simultaneamente, nos termos do artigo anterior, e não sucessivamente.
O testador pode sujeitar a instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário a condição suspensiva ou resolutiva, com as limitações dos artigos seguintes.
1. A condição física ou legalmente impossível considera-se não escrita e não prejudica o herdeiro ou legatário, salvo declaração do testador em contrário.
2. A condição contrária à lei ou à ordem pública, ou ofensiva dos bons costumes, tem-se igualmente por não escrita, ainda que o testador haja declarado o contrário, salvo o disposto no artigo 2023.º
É nula a disposição feita sob condição de que o herdeiro ou legatário faça igualmente em seu testamento alguma disposição a favor do testador ou de outrem.
Consideram-se contrárias à lei a condição de residir ou não residir em certo prédio ou local, de conviver ou não conviver com certa pessoa, de não fazer testamento, de não transmitir a determinada pessoa os bens deixados ou de os não partilhar ou dividir, de não requerer inventário, de adoptar ou deixar de adoptar determinada profissão, de se tornar ou não se tornar ministro de culto e as cláusulas semelhantes.
1. É também contrária à lei a condição de que o herdeiro ou legatário celebre ou deixe de celebrar casamento.
2. É, todavia, válida a deixa de usufruto, uso, habitação, pensão ou outra prestação contínua ou periódica para produzir efeito enquanto durar o estado de solteiro, viúvo ou divorciado do legatário.
Se a herança ou legado for deixado sob condição de o herdeiro ou legatário não dar certa coisa ou não praticar certo acto por tempo indeterminado, a disposição considera-se feita sob condição resolutiva, a não ser que o contrário resulte do testamento.
O testador pode impor ao legatário a obrigação de dar preferência a certa pessoa na venda da coisa legada ou na realização de outro contrato, nos termos prescritos para os pactos de preferência.
1. Em caso de disposição testamentária sujeita a condição resolutiva, o tribunal pode impor ao herdeiro ou legatário a obrigação de prestar caução no interesse daqueles a favor de quem a herança ou o legado será deferido no caso de a condição se verificar.
2. Do mesmo modo, em caso de legado dependente de condição suspensiva ou termo inicial, o tribunal pode impor àquele que deva satisfazer o legado a obrigação de prestar caução no interesse do legatário.
3. O testador pode dispensar a prestação de caução em qualquer dos casos previstos nos números anteriores.
1. Se o herdeiro for instituído sob condição suspensiva, é posta a herança em administração, até que a condição se cumpra ou haja a certeza de que não pode cumprir-se.
2. Também é posta em administração a herança ou legado, durante a pendência da condição ou do termo, se não prestar caução aquele a quem for exigida nos termos do artigo anterior.
1. No caso de herança sob condição suspensiva, a administração pertence ao próprio herdeiro condicional e, se ele a não aceitar, ao seu substituto; se não existir substituto, ou este também a não aceitar, a administração pertence ao co-herdeiro ou co-herdeiros incondicionais, quando entre eles e o co-herdeiro condicional houver direito de acrescer, e, na sua falta, ao herdeiro legítimo presumido.
2. Não sendo prestada a caução prevista no artigo 2066.º, a administração da herança ou legado compete àquele em cujo interesse a caução devia ser prestada.
3. Contudo, em qualquer dos casos previstos no presente artigo, o tribunal pode providenciar de outro modo, se ocorrer justo motivo.
Sem prejuízo do disposto nos artigos anteriores, os administradores da herança ou legado estão sujeitos às regras aplicáveis ao instituto da curadoria regulado nos artigos 89.º e seguintes, com as necessárias adaptações.
1. O disposto nos artigos 2067.º a 2069.º é aplicável à herança deixada a nascituro não concebido, filho de pessoa viva; mas a esta pessoa ou, se ela for incapaz, ao seu representante legal pertence a representação do nascituro em tudo o que não seja inerente à administração da herança ou do legado.
2. Se o herdeiro ou legatário estiver concebido, a administração da herança ou do legado compete a quem administraria os seus bens se ele já tivesse nascido.
As disposições dos artigos antecedentes não prejudicam os poderes de administração do cabeça-de-casal.
1. Os efeitos do preenchimento da condição retrotraem-se à data da morte do testador, considerando-se não escritas as declarações testamentárias em contrário.
2. É aplicável quanto ao regime da retroactividade o disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 270.º
1. O testador pode sujeitar a nomeação do legatário a termo inicial; mas este apenas suspende a execução da disposição, não impedindo que o nomeado adquira direito ao legado.
2. A declaração de termo inicial na instituição de herdeiro, e bem assim a declaração de termo final tanto na instituição de herdeiro como na nomeação de legatário, têm-se por não escritas, excepto, quanto a esta nomeação, se a disposição versar sobre direito temporário.
Tanto a instituição de herdeiro como a nomeação de legatário podem ser sujeitas a encargos.
É aplicável aos encargos impossíveis, contrários à lei ou à ordem pública, ou ofensivos dos bons costumes, o disposto no artigo 2060.º
O tribunal, quando o considere justificado e o testador não tenha disposto coisa diversa, pode impor ao herdeiro ou legatário onerado pelos encargos a obrigação de prestar caução.
No caso de o herdeiro ou legatário não satisfazer os encargos, a qualquer interessado é lícito exigir o seu cumprimento.
1. Qualquer interessado pode também pedir a resolução da disposição testamentária pelo não cumprimento do encargo, se o testador assim houver determinado, ou se for lícito concluir do testamento que a disposição não teria sido mantida sem o cumprimento do encargo.
2. Sendo resolvida a disposição, o encargo deve ser cumprido, nas mesmas condições, pelo beneficiário da resolução, salvo se outra coisa resultar do testamento ou da natureza da disposição.
3. O direito de resolução caduca passados 5 anos sobre a mora no cumprimento do encargo e, em qualquer caso, decorridos 15 anos sobre a abertura da sucessão.
É extensivo aos legados, no que lhes for aplicável, e com as necessárias adaptações, o disposto sobre aceitação e repúdio da herança.
1. O legatário não pode aceitar um legado em parte e repudiá-lo noutra parte; mas pode aceitar um legado e repudiar outro, contanto que este último não seja onerado por encargos impostos pelo testador.
2. O herdeiro que seja ao mesmo tempo legatário tem a faculdade de aceitar a herança e repudiar o legado, ou de aceitar o legado e repudiar a herança, mas também só no caso de a deixa repudiada não estar sujeita a encargos.
1. É nulo o legado de coisa pertencente ao sucessor onerado com o encargo ou a terceiro, salvo se do testamento se depreender que o testador sabia que lhe não pertencia a coisa legada.
2. Neste último caso, o sucessor que tenha aceitado a disposição feita em seu benefício é obrigado a adquirir a coisa e a transmiti-la ao legatário ou a proporcionar-lhe por outro modo a sua aquisição, ou, não sendo isso possível, a pagar-lhe o valor dela; e é igualmente obrigado a transmitir-lhe a coisa, se ela lhe pertencer.
3. Se a coisa legada, que não pertencia ao testador no momento da feitura do testamento, se tiver depois tornado sua por qualquer título, tem efeito a disposição relativa a ela, como se ao tempo do testamento pertencesse ao testador.
4. Se o legado recair sobre coisa de algum dos co-herdeiros, são os outros obrigados a satisfazer-lhe, em dinheiro ou em bens da herança, a parte que lhes toca no valor dela, proporcionalmente aos seus quinhões hereditários, salvo diversa declaração do testador.
1. Se o testador legar uma coisa que não lhe pertença por inteiro, o legado vale apenas em relação à parte que lhe pertencer, salvo se do testamento resultar que o testador sabia não lhe pertencer a totalidade da coisa, pois, nesse caso, deve observar-se, quanto ao restante, o preceituado no artigo anterior.
2. As regras do número anterior não prejudicam o disposto no artigo 1553.º quanto à deixa de coisa certa e determinada do património comum dos cônjuges.
É válido o legado de coisa indeterminada de certo género, ainda que nenhuma coisa deste género se encontrasse no património do testador à data do testamento e nenhuma aí se encontre à data da sua morte, salvo se o testador fizer a declaração prevista no artigo seguinte.
1. Se o testador legar coisa determinada, ou coisa indeterminada de certo género, com a declaração de que aquela coisa ou este género existe no seu património, mas assim não suceder ao tempo da sua morte, é nulo o legado.
2. Se a coisa ou género mencionado na disposição se encontrar no património do testador ao tempo da sua morte, mas não na quantidade legada, haverá o legatário o que existir.
O legado de coisa existente em lugar determinado só pode ter efeito até onde chegue a quantidade que aí se achar à data da abertura da sucessão, excepto se a coisa, habitualmente guardada nesse lugar, tiver sido de lá removida, no todo ou em parte, a título transitório.
1. É nulo o legado de coisa que à data do testamento pertencia ao próprio legatário, se também lhe pertencer à data da abertura da sucessão.
2. O legado é, porém, válido, se à data da abertura da sucessão a coisa pertencia ao testador; e também o é, se a esse tempo pertencia ao sucessor onerado com o legado ou a terceiro, e do testamento resultar que a deixa foi feita na previsão deste facto.
3. É aplicável, neste último caso, o disposto nos n.os 2 e 4 do artigo 2081.º
1. Se depois da feitura do testamento o legatário adquirir do testador, por título oneroso ou gratuito, a coisa que tiver sido objecto do legado, este não produz efeito.
2. O legado também não produz efeito se, após o testamento, o legatário adquirir a coisa, por título gratuito, do sucessor onerado ou de terceiro; se a adquirir por título oneroso, pode pedir o que houver desembolsado, quando do testamento resulte que o testador sabia não lhe pertencer a coisa legada.
A deixa de usufruto, na falta de indicação em contrário, considera-se feita vitaliciamente; se o beneficiário for uma pessoa colectiva, terá a duração de 30 anos.
1. Se o testador legar certa coisa ou certa soma como por ele devida ao legatário, é válido o legado, ainda que a soma ou coisa não fosse realmente devida, salvo sendo o legatário incapaz de a haver por sucessão.
2. O legado fica, todavia, sem efeito, se o testador, sendo devedor ao tempo da feitura do testamento, cumprir a obrigação posteriormente.
O legado feito a favor de um credor, mas sem que o testador refira a sua dívida, não se considera destinado a satisfazer essa dívida.
1. O legado de um crédito só produz efeito em relação à parte que subsista ao tempo da morte do testador.
2. O herdeiro satisfará a disposição entregando ao legatário os títulos respeitantes ao crédito.
Se o testador legar a totalidade dos seus créditos, deve entender-se, em caso de dúvida, que o legado só compreende os créditos em dinheiro, excluídos os depósitos bancários e os títulos ao portador ou nominativos.
Sendo legado o recheio de uma casa ou o dinheiro nela existente, não se entende, no silêncio do testador, que são também legados os créditos, ainda que na casa se encontrem os documentos respectivos.
O legado a favor de um dos co-herdeiros, e a cargo de toda a herança, vale por inteiro, e não como legado por conta da quota desse herdeiro.
1. Na falta de disposição em contrário, o cumprimento do legado incumbe aos herdeiros.
2. O testador pode, todavia, impor o cumprimento só a algum ou alguns dos herdeiros, ou a algum ou alguns dos legatários.
3. Os herdeiros ou legatários sobre quem recaia o encargo ficam a ele sujeitos em proporção dos respectivos quinhões hereditários ou dos respectivos legados, se o testador não tiver estabelecido proporção diversa.
1. Quando o legado for de coisa indeterminada pertencente a certo género, cabe a escolha dela a quem deva prestá-la, excepto se o testador tiver atribuído a escolha ao próprio legatário ou a terceiro.
2. No silêncio do testador, a escolha recairá sobre coisas existentes na herança, salvo se não se encontrar nenhuma do género considerado e o legado for válido, nos termos do artigo 2083.º; o legatário pode escolher a coisa melhor, a não ser que a escolha verse sobre coisas não existentes na herança.
3. As regras dos artigos 394.º e 535.º são aplicáveis, com as necessárias adaptações, ao legado de coisa genérica, quando não estejam em oposição com o disposto nos números antecedentes.
Os legados alternativos estão sujeitos ao regime, devidamente adaptado, das obrigações alternativas.
Tanto no legado de coisa genérica como no legado alternativo, se a escolha pertencer ao sucessor onerado ou ao legatário, e um ou outro falecer sem a ter efectuado, transmite-se esse direito aos seus herdeiros.
1. Na falta de declaração do testador sobre a extensão do legado, entende-se que ele abrange as benfeitorias e partes componentes e integrantes.
2. O legado de prédio rústico ou urbano, ou do conjunto de prédios rústicos ou urbanos que constituam uma unidade económica, abrange, no silêncio do testador, as construções nele feitas, anteriores ou posteriores ao testamento, e bem assim as aquisições posteriores que se tenham integrado na mesma unidade, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 2145.°
Na falta de declaração do testador sobre a entrega do legado, esta deve ser feita no lugar em que a coisa legada se encontrava ao tempo da morte do testador e no prazo de 1 ano a contar dessa data, salvo se por facto não imputável ao onerado se tornar impossível o cumprimento dentro desse prazo; se, porém, o legado consistir em dinheiro ou em coisa genérica que não exista na herança, a entrega deve ser feita no lugar onde se abrir a sucessão, dentro do mesmo prazo.
Não havendo declaração do testador sobre os frutos da coisa legada, o legatário tem direito aos frutos desde a morte do testador, com excepção dos percebidos adiantadamente pelo autor da sucessão; se, todavia, o legado consistir em dinheiro ou em coisa não pertencente à herança, os frutos só são devidos a partir da mora de quem deva satisfazê-lo.
1. Se a coisa legada estiver onerada com alguma servidão ou outro encargo que lhe seja inerente, passa com o mesmo encargo ao legatário.
2. Havendo prestações atrasadas, serão pagas por conta da herança; e por conta dela serão pagas ainda as dívidas asseguradas por hipoteca ou outra garantia real constituída sobre a coisa legada.
1. Se o testador legar qualquer prestação periódica, o primeiro período corre desde a sua morte, tendo o legatário direito a toda a prestação respeitante a cada período, ainda que faleça no seu decurso.
2. O disposto no número anterior é aplicável ao legado de alimentos, mesmo que estes só venham a ser fixados depois da morte do testador.
3. O legado só é exigível no termo do período correspondente, salvo se for a título de alimentos, pois, nesse caso, é devido a partir do início de cada período.
O legado deixado a um menor para quando atingir a maioridade não pode por ele ser exigido antes desse tempo, ainda que seja emancipado.
As despesas feitas com o cumprimento do legado ficam a cargo de quem deva satisfazê-lo.
1. O legatário responde pelo cumprimento dos legados e dos outros encargos que lhe sejam impostos, mas só dentro dos limites do valor da coisa legada.
2. Se o legatário com encargo não receber todo o legado, é o encargo reduzido proporcionalmente e, se a coisa legada for reivindicada por terceiro, pode o legatário reaver o que houver pago.
Se a herança for toda distribuída em legados, são os encargos dela suportados por todos os legatários em proporção dos seus legados, excepto se o testador houver disposto outra coisa.
Se os bens da herança não chegarem para cobrir os legados, são estes pagos rateadamente; exceptuam-se os legados remuneratórios, os quais são considerados como dívida da herança.
O legatário pode reivindicar de terceiro a coisa legada, contanto que esta seja certa e determinada.
1. O testador pode substituir outra pessoa ao herdeiro instituído para o caso de este não poder ou não querer aceitar a herança: é o que se chama substituição directa.
2. Se o testador previr só um destes casos, entende-se ter querido abranger o outro, salvo declaração em contrário.
Podem substituir-se várias pessoas a uma só, ou uma só a várias.
1. O testador pode determinar que os co-herdeiros se substituam reciprocamente.
2. Em tais casos, se os co-herdeiros tiverem sido instituídos em partes desiguais, deve respeitar-se, no silêncio do testador, a mesma proporção na substituição.
3. Mas, se à substituição não forem chamados todos os restantes instituídos, ou o for outra pessoa além deles, e nada se declarar sobre a proporção respectiva, o quinhão vago é repartido em partes iguais pelos substitutos.
Os substitutos sucedem nos direitos e obrigações em que sucederiam os substituídos, excepto se outra for a vontade do testador.
1. O disposto na presente subsecção é aplicável aos legados.
2. Quanto aos legatários nomeados em relação ao mesmo objecto, seja ou não conjunta a nomeação, a substituição recíproca considera-se feita, no silêncio do testador, na mesma proporção em que foi feita a nomeação.
Diz-se substituição fideicomissária, ou fideicomisso, a disposição pela qual o testador impõe ao herdeiro instituído o encargo de conservar a herança, para que ela reverta, por sua morte, a favor de outrem; o herdeiro gravado com o encargo chama-se fiduciário, e fideicomissário o beneficiário da substituição.
Pode haver um só ou vários fiduciários, assim como um ou vários fideicomissários.
São nulas as substituições fideicomissárias em mais de um grau, ainda que a reversão da herança para o fideicomissário esteja subordinada a um acontecimento futuro e incerto.
A nulidade da substituição fideicomissária não envolve a nulidade da instituição ou da substituição anterior; apenas se tem por não escrita a cláusula fideicomissária, salvo se o contrário resultar do testamento.
1. O fiduciário tem o gozo e a administração dos bens sujeitos ao fideicomisso.
2. São extensivas ao fiduciário, no que não for incompatível com a natureza do fideicomisso, as disposições legais relativas ao usufruto.
3. O caso julgado constituído em acção relativa aos bens sujeitos ao fideicomisso não é oponível ao fideicomissário se ele não interveio nela.
1. Em caso de evidente necessidade ou utilidade para os bens da substituição, pode o tribunal autorizar, com as devidas cautelas, a alienação ou oneração dos bens sujeitos ao fideicomisso.
2. Nas mesmas condições, pode o tribunal autorizar a alienação ou oneração em caso de evidente necessidade ou utilidade para o fiduciário, contanto que os interesses do fideicomissário não sejam afectados.
Os credores pessoais do fiduciário não têm o direito de se pagar pelos bens sujeitos ao fideicomisso, mas tão-somente pelos seus frutos.
1. A herança devolve-se ao fideicomissário no momento da morte do fiduciário.
2. Se o fideicomissário não puder ou não quiser aceitar a herança, fica sem efeito a substituição, e a titularidade dos bens hereditários considera-se adquirida definitivamente pelo fiduciário desde a morte do testador.
3. Não podendo ou não querendo o fiduciário aceitar a herança, a substituição, no silêncio do testamento, converte-se de fideicomissária em directa, dando-se a devolução da herança a favor do fideicomissário, com efeito desde o óbito do testador.
O fideicomissário não pode aceitar ou repudiar a herança, nem dispor dos bens respectivos, mesmo por título oneroso, antes de ela lhe ser devolvida.
1. São havidas como fideicomissárias:
a) As disposições pelas quais o testador proíba o herdeiro de dispor dos bens hereditários, seja por acto entre vivos, seja por acto de última vontade;
b) As disposições pelas quais o testador chame alguém ao que restar da herança por morte do herdeiro;
c) As disposições pelas quais o testador chame alguém aos bens deixados a uma pessoa colectiva, para o caso de esta se extinguir.
2. No caso previsto na alínea a) do número anterior, são havidos como fideicomissários os herdeiros legítimos do fiduciário.
3. Aos fideicomissos previstos neste artigo são aplicáveis as disposições dos artigos antecedentes; mas, nos casos das alíneas b) e c) do n.º 1, o fiduciário pode dispor dos bens por acto entre vivos, independentemente de autorização judicial, se obtiver o consentimento do fideicomissário.
O disposto na presente subsecção é aplicável aos legados.
1. O progenitor que não estiver inibido total ou parcialmente do poder paternal tem a faculdade de substituir aos filhos os herdeiros ou legatários que bem lhe aprouver, para o caso de os mesmos filhos falecerem antes de se tornarem maiores ou emancipados: é o que se chama substituição pupilar.
2. A substituição fica sem efeito logo que o substituído se torne maior ou emancipado, ou se falecer deixando herdeiros legitimários.
1. A disposição do artigo anterior é aplicável, sem distinção de idade, ao caso de o filho ser incapaz de testar em consequência de interdição por anomalia psíquica: é o que se chama substituição quase-pupilar.
2. A substituição quase-pupilar fica sem efeito logo que seja levantada a interdição, ou se o substituído falecer deixando herdeiros legitimários.
A substituição pupilar é havida para todos os efeitos como quase-pupilar, se o menor for declarado interdito por anomalia psíquica.
As substituições pupilar e quase-pupilar só podem abranger os bens que o substituído haja adquirido por via do testador, embora a título de legítima.
1. Se dois ou mais herdeiros forem instituídos em partes iguais na totalidade ou numa quota dos bens, seja ou não conjunta a instituição, e algum deles não puder ou não quiser aceitar a herança, acrescerá a sua parte à dos outros herdeiros instituídos na totalidade ou na quota.
2. Se forem desiguais as quotas dos herdeiros, a parte do que não pôde ou não quis aceitar é dividida pelos outros, respeitando-se a proporção entre eles.
3. Se o herdeiro que não puder ou não quiser aceitar a herança houver sido instituído conjuntamente com outros herdeiros, a sua parte acrescerá à destes de preferência à dos herdeiros instituídos separadamente, salvo se se provar que outra teria sido a vontade do testador, se tivesse previsto as circunstâncias em que a herança é deferida.
4. O direito de acrescer só se verifica a favor dos herdeiros cuja instituição for efectuada no mesmo testamento, salvo se se provar que outra teria sido a vontade do testador, se tivesse previsto as circunstâncias em que a herança é deferida.
5. Com excepção do disposto nos n.os 3 e 4, e sem prejuízo do disposto no artigo 2133.º, é improcedente qualquer prova de vontade hipotética do testador contrária ao direito de acrescer ou aos termos em que este vem regulado.
1. Há direito de acrescer entre os legatários que tenham sido nomeados em relação ao mesmo objecto, seja ou não conjunta a nomeação.
2. É aplicável, neste caso, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo anterior.
Não havendo direito de acrescer entre os legatários, o objecto do legado é atribuído ao herdeiro ou legatário onerado com o encargo do seu cumprimento, salvo se esse objecto estiver genericamente compreendido noutro legado.
Não há lugar ao direito de acrescer, se o testador tiver disposto outra coisa, se o legado tiver natureza puramente pessoal ou se houver direito de representação.
É aplicável ao direito de acrescer entre usufrutuários o disposto nos artigos 1376.º e 2131.º
A aquisição da parte acrescida dá-se por força da lei, sem necessidade de aceitação do beneficiário, que não pode repudiar separadamente essa parte, excepto quando sobre ela recaiam encargos especiais impostos pelo testador; neste caso, sendo objecto de repúdio, a porção acrescida reverte para a pessoa ou pessoas a favor de quem os encargos hajam sido constituídos.
Os herdeiros ou legatários que houverem o acrescido sucedem nos mesmos direitos e obrigações, de natureza não puramente pessoal, que caberiam àquele que não pôde ou não quis receber a deixa.
1. A acção de nulidade do testamento ou de disposição testamentária caduca ao fim de 10 anos, a contar da data em que o interessado teve conhecimento do testamento e da causa da nulidade.
2. Sendo anulável o testamento ou a disposição, a acção caduca ao fim de 2 anos a contar da data em que o interessado teve conhecimento do testamento e da causa da anulabilidade.
3. São aplicáveis, nestes casos, as regras da suspensão e interrupção da prescrição.
Não pode prevalecer-se da nulidade ou anulabilidade do testamento ou da disposição testamentária aquele que a tiver confirmado.
O testador não pode proibir que seja impugnado o seu testamento nos casos em que haja nulidade ou anulabilidade.
1. O testador não pode renunciar à faculdade de revogar, no todo ou em parte, o seu testamento.
2. Tem-se por não escrita qualquer cláusula que contrarie a faculdade de revogação.
A revogação expressa do testamento só pode fazer-se declarando o testador, noutro testamento ou em escritura pública, que revoga no todo ou em parte o testamento anterior.
1. O testamento posterior que não revogue expressamente o anterior revogá-lo-á apenas na parte em que for com ele incompatível.
2. Se aparecerem dois testamentos da mesma data, sem que seja possível determinar qual foi o posterior, e implicarem contradição, têm-se por não escritas em ambos as disposições contraditórias.
1. A revogação expressa ou tácita produz o seu efeito, ainda que o testamento revogatório seja por sua vez revogado.
2. O testamento anterior recobra, todavia, a sua força, se o testador, revogando o posterior, declarar ser sua vontade que revivam as disposições do primeiro.
1. Se o testamento cerrado aparecer dilacerado ou feito em pedaços, considera-se revogado, excepto quando se prove que o facto foi praticado por pessoa diversa do testador, ou que este não teve intenção de o revogar ou se encontrava privado do uso da razão.
2. Presume-se que o facto foi praticado por pessoa diversa do testador, se o testamento não se encontrava no espólio deste à data da sua morte.
3. A simples obliteração ou cancelamento do testamento, no todo ou em parte, ainda que com ressalva e assinatura, não é havida como revogação, desde que possa ler-se a primitiva disposição.
1. A alienação total ou parcial da coisa legada implica revogação correlativa do legado; a revogação surte o seu efeito, ainda que a alienação seja anulada por fundamento diverso da falta ou vícios da vontade do alheador, ou ainda que este readquira por outro modo a propriedade da coisa.
2. Implica, igualmente, revogação do legado a transformação da coisa em outra, com diferente forma e denominação ou diversa natureza, quando a transformação seja feita pelo testador.
3. É, porém, admissível a prova de que o testador, ao alienar ou transformar a coisa, não quis revogar o legado.
As disposições testamentárias, quer se trate da instituição de herdeiro, quer da nomeação de legatário, caducam, além de outros casos:
a) Se o instituído ou nomeado falecer antes do testador, salvo havendo representação sucessória;
b) Se a instituição ou nomeação estiver dependente de condição suspensiva e o sucessor falecer antes de a condição se verificar;
c) Se o instituído ou nomeado se tornar incapaz de adquirir a herança ou o legado;
d) Se o chamado à sucessão era cônjuge do testador e à data da morte deste se encontravam divorciados ou o casamento tinha sido anulado, por sentença transitada ou que venha a transitar em julgado ou, no caso do divórcio, por decisão definitiva ou que venha a sê-lo, ou ainda por sentença de divórcio ou anulação do casamento que venha a ser proferida posteriormente àquela data;
e) Se o chamado à sucessão repudiar a herança ou o legado, salvo havendo representação sucessória.
O testador pode nomear uma ou mais pessoas que fiquem encarregadas de vigiar o cumprimento do seu testamento ou de o executar, no todo ou em parte: é o que se chama testamentaria.
1. Só pode ser nomeado testamenteiro o que tiver plena capacidade jurídica.
2. A nomeação tanto pode recair sobre um herdeiro ou legatário, como pode recair sobre pessoa estranha à herança.
O nomeado pode aceitar ou recusar a testamentaria.
1. A aceitação da testamentaria pode ser expressa ou tácita.
2. A testamentaria não pode ser aceite sob condição, nem a termo, nem só em parte.
A recusa da testamentaria faz-se por meio de declaração perante notário.
O testamenteiro tem as atribuições que o testador lhe conferir, dentro dos limites da lei.
Se o testador não especificar as atribuições do testamenteiro, competirá a este:
a) Cuidar do funeral do testador e pagar as despesas havidas com este, bem como com as cerimónias religiosas que o acompanhem, conforme o que for estabelecido no testamento ou, se nada se estabelecer, consoante os usos locais;
b) Vigiar a execução das disposições testamentárias e sustentar, se for necessário, a sua validade em juízo;
c) Exercer as funções de cabeça-de-casal, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 1918.º
O testador pode encarregar o testamenteiro do cumprimento dos legados e dos demais encargos da herança, quando este seja cabeça-de-casal e não haja lugar a inventário obrigatório.
Para efeitos do disposto no artigo anterior, pode o testamenteiro ser autorizado pelo testador a vender quaisquer bens da herança, móveis ou imóveis, ou os que forem designados no testamento.
1. Sendo vários os testamenteiros, consideram-se todos nomeados conjuntamente, salvo se outra coisa tiver sido disposta pelo testador.
2. Caducando por qualquer causa a testamentaria em relação a algum dos nomeados, continuam os restantes no exercício das respectivas funções.
3. Sendo os testamenteiros nomeados sucessivamente, cada um deles só é chamado a aceitar ou recusar o cargo na falta do anterior.
O nomeado que aceitou a testamentaria só pode ser dela escusado nos casos previstos no n.º 1 do artigo 1923.°
1. O testamenteiro pode ser judicialmente removido, a requerimento de qualquer interessado, se não cumprir com prudência e zelo os deveres do seu cargo ou mostrar incompetência no seu desempenho.
2. Se forem vários os testamenteiros nomeados conjuntamente e não houver acordo entre eles sobre o exercício da testamentaria, podem ser removidos todos, ou apenas algum ou alguns deles.
1. O testamenteiro é obrigado a prestar contas anualmente.
2. Em caso de culpa, responde o testamenteiro perante os herdeiros e legatários pelos danos a que der causa.
1. O cargo de testamenteiro é gratuito, excepto se for prevista pelo testador alguma retribuição.
2. O testamenteiro não tem direito à retribuição assinada, ainda que atribuída sob a forma de legado, se não aceitar a testamentaria ou for dela removido; se a testamentaria caducar por qualquer outra causa, cabe-lhe apenas uma parte da retribuição proporcional ao tempo em que exerceu as funções.
A testamentaria não é transmissível, em vida ou por morte, nem é delegável, mas o testamenteiro pode servir-se de auxiliares na execução do cargo, nos mesmos termos em que o procurador o pode fazer.