Versão Chinesa

Decreto-Lei n.º 101/99/M

de 13 de Dezembro

Em conformidade com a Declaração Conjunta do Governo da República Portuguesa e do Governo da República Popular da China sobre a Questão de Macau, o Decreto-Lei n.º 455/91, de 31 de Dezembro, atribuiu estatuto oficial à língua chinesa em Macau.

O referido diploma deu início a um longo processo de aprofundamento e alargamento da utilização conjunta das línguas portuguesa e chinesa, de que o presente diploma constitui o passo normativo que consagra, de forma estável e inequívoca, a existência do ordenamento jurídico e o funcionamento da Administração e das instituições judiciárias de Macau em ambas as línguas.

Visa-se, desta forma, dar satisfação aos compromissos assumidos, não só na Declaração Conjunta, mas ainda a outros resultantes de instrumentos de direito internacional relevantes em matéria de direitos fundamentais e aplicáveis em Macau.

Assim, o presente diploma consagra as línguas portuguesa e chinesa como línguas oficiais de Macau, bem como o princípio da sua igual dignidade, alicerçando a disciplina que, nos domínios legislativo, administrativo e judiciário, prevê e assegura a coexistência e o uso de ambas em condições de plena igualdade, e, ao mesmo tempo, garante expressamente a liberdade individual em matéria de expressão linguística.

Nestes termos;

Ouvido o Conselho Consultivo;

O Governador decreta, nos termos do n.º 1 do artigo 13.º do Estatuto Orgânico de Macau, para valer como lei no território de Macau, o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposição geral

Artigo 1.º

(Línguas oficiais)

1. As línguas chinesa e portuguesa são as línguas oficiais de Macau.

2. As línguas oficiais têm igual dignidade e são ambas meio de expressão válido de quaisquer actos jurídicos.

3. O disposto nos números anteriores não prejudica a liberdade de escolha, por cada indivíduo, da sua própria língua e o direito de a utilizar na sua esfera pessoal e familiar, bem como de a aprender e ensinar.

4. A Administração deve promover o ensino das línguas oficiais, bem como a sua correcta utilização.

CAPÍTULO II

Estatuto das línguas oficiais

SECÇÃO I

Domínio legislativo

Artigo 2.º

(Apresentação de projectos e propostas de leis)

Os projectos e propostas de leis devem ser submetidos à Assembleia Legislativa redigidos numa das línguas oficiais, acompanhados da respectiva tradução na outra língua oficial.

Artigo 3.º

(Promulgação, assinatura e ordem de publicação)

A promulgação, assinatura e ordem de publicação das leis e regulamentos administrativos podem ser exaradas em qualquer das versões, sem prejuízo da validação da versão não assinada, considerando-se ambas, para efeitos de publicação, como documentos autênticos.

Artigo 4.º

(Publicação)

1. As leis e os regulamentos administrativos são publicados em ambas as línguas oficiais.

2. Exceptua-se do disposto no número anterior a publicação, total ou parcial, de lei ou regulamento administrativo que, pela natureza linguística ou ortográfica do conteúdo, seja insusceptível de expressão na outra língua oficial.

3. Sem prejudicar a eficácia imediata da lei ou regulamento administrativo e em caso de comprovada e fundamentada urgência, a Assembleia Legislativa, em actos da sua competência, e o Governador, nas demais situações e mediante despacho, podem determinar que a publicação seja feita inicialmente apenas numa das línguas oficiais.

4. Nos casos previstos no número anterior a publicação da versão na outra língua oficial é feita no prazo máximo de 90 dias.

5. Em casos devidamente justificados, pode ainda ser determinada a publicação no Boletim Oficial de Macau de acto normativo noutra língua para além das oficiais.

6. Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, a falta de publicidade de uma lei ou regulamento administrativo nas duas línguas oficiais, implica a sua ineficácia jurídica.

Artigo 5.º

(Interpretação dos actos normativos)

1. O acto normativo é unitário e qualquer das suas versões nas duas línguas oficiais faz fé pública, presumindo-se que têm o mesmo sentido e alcance.

2. A interpretação dos actos referidos no número anterior pode ser feita, nos termos gerais de direito, com recurso a qualquer das suas versões.

3. No caso de se verificarem divergências de sentido entre as versões de um acto normativo, adopta-se um sentido admitido por ambas, tendo em conta as regras normais de interpretação da lei ou, não sendo tal possível, aquele sentido que melhor se coadune com os objectivos prosseguidos pelo acto.

SECÇÃO II

Domínio administrativo

Artigo 6.º

(Relações entre Administração e administrados)

1. Todos têm o direito de se dirigir numa das línguas oficiais, oralmente ou por escrito, a qualquer órgão da Administração, bem como às entidades concessionárias no exercício de poderes de autoridade, e a receber resposta na língua oficial da sua opção.

2. O procedimento administrativo é conduzido, nos termos da lei aplicável, na língua do interessado ou na língua por si escolhida mediante acto de vontade expresso, quando oficiais.

3. A passagem de certidão de acto notarial ou registal ou de documento constante de arquivo público ou de processo administrativo é acompanhada de tradução emanada da entidade certificante quando a língua do acto ou documento, sendo oficial, não seja a língua de opção do interessado e sem encargos adicionais para este.

4. O disposto nos números anteriores aplica-se à actividade de natureza administrativa desenvolvida no âmbito dos tribunais.

Artigo 7.º

(Documentação)

Todos os impressos, formulários ou documentos análogos facultados pela Administração devem ter redacção nas duas línguas oficiais.

SECÇÃO III

Domínio judiciário

Artigo 8.º

(Acesso à justiça)

1. Todos têm o direito de se dirigir numa das línguas oficiais, oralmente ou por escrito, a qualquer tribunal ou órgão judicial e de, nele, compreenderem os actos processuais e aí serem compreendidos.

2. Não podem ser rejeitadas quaisquer peças processuais ou documentos análogos em razão da língua, quando redigidos numa das línguas oficiais.

Artigo 9.º

(Actos processuais)

1. A determinação da língua dos actos processuais, feita nos termos da lei aplicável, tem em conta o direito de escolha das partes e o superior interesse da realização da justiça.

2. Os actos processuais orais devem ser praticados na língua oficial comum dos participantes, sendo assegurada a tradução quando tal língua não exista.

CAPÍTULO III

Disposições finais e transitórias

Artigo 10.º

(Valor da versão em língua chinesa)

1. As versões em língua chinesa de actos normativos publicadas no Boletim Oficial de Macau após a oficialização desta língua são autênticas e têm plena força legal.

2. As versões em língua chinesa de actos normativos publicadas ao tempo da oficialização desta língua podem ser objecto de declaração de autenticidade efectuada, caso a caso e após parecer do Gabinete para a Tradução Jurídica, por:

a) Acto da Assembleia Legislativa, nas versões da sua competência;

b) Despacho do Governador, nas demais situações.

3. A autenticidade pode ser conferida a versão diferente da publicada no Boletim Oficial, devendo a nova versão ser objecto de publicação.

Artigo 11.º

(Alteração de actos normativos sem versão em língua chinesa)

A introdução de alterações em actos normativos publicados sem versão em língua chinesa implica a publicação integral do acto nas duas línguas oficiais.

Artigo 12.º

(Publicação de diplomas legais nos termos do artigo 69.º do Estatuto Orgânico de Macau)

Constituem excepção ao disposto no n.º 6 do artigo 4.º as publicações efectuadas nos termos do artigo 69.° do Estatuto Orgânico de Macau.

Artigo 13.º

(Revogações)

1. É revogada toda a legislação que contrarie o disposto no presente diploma, nomeadamente:

a) Diploma Legislativo n.º 272, de 10 de Dezembro de 1932;

b) Portaria n.º 5 861, de 18 de Agosto de 1956;

c) Decreto-Lei n.º 87/88/M, de 12 de Setembro;

d) Decreto-Lei n.º 11/89/M, de 20 de Fevereiro.

2. Deixam de ter aplicação em Macau:

a) O Decreto-Lei n.º 29 773, de 22 de Julho de 1939, publicado no Boletim Oficial n.º 36, de 9 de Setembro de 1939;

b) O n.º 2 do artigo 68.º do Decreto-Lei n.º 48 871, de 19 de Fevereiro de 1969, tornado extensivo a Macau pela Portaria n.º 555/71, de 12 de Outubro, ambos publicados no Boletim Oficial n.° 44, de 30 de Outubro de 1971.

Artigo 14.º

(Entrada em vigor)

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Aprovado em 7 de Dezembro de 1999.

Publique-se.

O Governador, Vasco Rocha Vieira.