Consulte também: Regulamento Administrativo n.º 20/2015 Artigo 40.º, 2. (Consideram-se feitas ao Arquivo de Macau as referências ao Arquivo Histórico constantes do Decreto-Lei n.º 73/89/M, de 31 de Outubro, e de demais legislação em vigor.)
A conservação de documentos e processos nos serviços públicos encontrava-se, genericamente, regulada pelo artigo 496.º do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46 982, de 27 de Abril de 1966, o qual determinava que decorridos dez anos sob a data do último documento dos processos, ou antes disso, quando se presumisse que já não viriam a ser movimentados, se deveria fazer a sua remessa ao Arquivo Geral de cada província, devidamente relacionados e com a indicação nas respectivas fichas de arquivo dos serviços de ‘processo findo’, com data e número de relação com que tinham sido enviados ao Arquivo Geral.
Após a revogação daquele diploma pelo Decreto-Lei n.º 35/88/M, de 9 de Maio, deixou de existir um prazo de conservação de documentos genericamente aplicável, apenas tendo subsistido a obrigação de transferência, após 5 anos, para o Arquivo Histórico de Macau como Arquivo Geral do Território, dos documentos publicados em Boletim Oficial, nos termos do artigo 39.º do Decreto-Lei n.º 42/85/M, de 18 de Maio.
Com efeito, o Decreto-Lei n.º 39/82/M, de 21 de Agosto, que veio introduzir a microfilmagem de documentos nos serviços, determinou que a definição dos prazos de conservação se faria, caso a caso, por portaria e mediante proposta do dirigente de cada serviço e que, após a microfilmagem, os serviços ficariam autorizados a proceder à destruição dos documentos, desde que estes não se revestissem de interesse histórico ou ocorresse outro motivo atendível.
Deste enquadramento legal, pode concluir-se que o regime arquivístico em vigor no Território não foi estruturado globalmente, não existindo, por isso, critérios e prazos uniformes por espécies documentais, nem se acautelando devidamente a documentação de interesse histórico a preservar através da incorporação no Arquivo Histórico de Macau, muito embora as várias portarias sobre conservação e eliminação de documentos sejam sujeitas a parecer dos Serviços de Administração e Função Pública, nos termos estipulados pela lei orgânica deste serviço e daí resulte alguma viabilidade de uniformização.
As considerações expostas mostram ser urgente estabelecer as bases gerais do regime arquivístico do território de Macau, através do qual se caracterizem e tipifiquem os documentos com vista a definir os que devem ser permanente ou temporariamente conservados e a estabelecer prazos adequados de conservação, para aqueles que, tendo vida limitada, devam ser eliminados.
Como objectivos, este diploma visa, pois, a um tempo, a sistematização dos documentos atendendo ao seu interesse e utilidade temporal, levando em consideração os espaços de arrumação disponíveis, e a constituição de um património arquivístico histórico, memória dos factos, parte integrante do património cultural.
O presente decreto-lei cria ainda o Conselho Geral de Arquivos, órgão de consulta do Governador, ao qual incumbirá contribuir para a definição da política arquivística do Território e dar parecer sobre questões regulamentares e científicas ligadas aos arquivos.
Nestes termos;
Ouvido o Conselho Consultivo;
O Governador de Macau decreta, nos termos do n.º 1 do artigo 13.º do Estatuto Orgânico de Macau, para valer como lei no território de Macau, o seguinte:
O presente diploma estabelece as bases gerais do regime arquivístico do território de Macau.
O regime arquivístico estabelecido pelo presente diploma visa servir a actividade dos órgãos de Governo e da Administração Pública do Território, salvaguardar situações jurídicas e contribuir para o progresso dos conhecimentos científicos, históricos e culturais.
Arquivo é o conjunto dos documentos, sob qualquer forma e suporte material, produzidos e recebidos por organismos públicos ou privados ou por pessoas singulares ou colectivas, no exercício da sua actividade, e que se enquadrem nos objectivos referidos no artigo 2.º
1. Os arquivos, quanto à natureza da entidade a que pertencem, classificam-se em:
a) Arquivos públicos, todos os que pertencem aos órgãos de Governo próprio do Território e aos serviços da Administração Pública, incluindo os personalizados, bem como aos municípios, às empresas públicas e às pessoas colectivas de utilidade pública administrativa;
b) Arquivos privados de interesse público, os pertencentes a particulares que venham a ser classificados, nos termos do artigo 15.º
2. Quanto à sua finalidade, os arquivos públicos classificam-se em:
a) Arquivos correntes ou administrativos, aqueles cuja documentação se considera de uso frequente para a entidade que a produziu ou recebeu;
b) Arquivos intermédios, aqueles cuja documentação perdeu interesse corrente para a entidade que a produziu ou recebeu, conservando interesse potencial para a gestão;
c) Arquivos definitivos ou históricos, aqueles cuja documentação, já sem interesse para a gestão, respeita a factos cuja memória deve ser preservada, designadamente pelo seu valor histórico.
Os arquivos públicos regem-se pelos princípios estabelecidos nos artigos seguintes e pela legislação complementar que venha a ser publicada.
O processo de caracterização dos documentos produzidos ou conservados em serviços públicos desenvolve-se pelas fases de selecção e de conservação ou de eliminação.
A selecção é o processo que permite determinar os documentos que devem ser conservados ou que devem ser eliminados.
1. A conservação temporária de documentos consiste na sua manutenção, por parte dos serviços ou instituições a que pertencem, durante prazos mínimos de tempo.
2. Nos casos de transferência dos documentos para suportes de cópia, serão aplicados a estes os prazos de conservação previstos para os originais.
A eliminação de documentos consiste na sua destruição, uma vez decorridos os prazos de conservação ou após a sua transferência para suportes de cópia legalmente previstos.
1. Os documentos de conservação permanente não podem ser eliminados, devendo:
a) Ser conservados nos serviços ou instituições a que pertencem sempre que tenham interesse para os mesmos;
b) Ser incorporados no Arquivo Histórico, de acordo com as competências que lhe são conferidas pelo artigo 13.º, a título de arquivos definitivos, e nos termos do artigo seguinte.
2. Nos casos referidos na alínea b), podem os serviços ou instituições a que os documentos pertencem proceder à sua transferência para suportes de cópia sempre que o julguem necessário.
1. A incorporação consiste na transferência de documentos, quer a título definitivo, quer a título de depósito, dos serviços ou instituições de origem para o Arquivo Histórico.
2. É obrigatória a incorporação no Arquivo Histórico da documentação de todos os serviços públicos, salvo nos casos em que, por força de disposição legal, deva a mesma ser obrigatoriamente mantida e conservada nas instituições ou serviços a que pertença.
3. Devem ainda dar entrada no Arquivo Histórico:
a) Os originais dos documentos oficiais publicados no Boletim Oficial, nos termos do disposto no artigo 39.º do Decreto-Lei n.º 42/85/M, de 18 de Maio;
b) As fontes documentais da Assembleia Legislativa;
c) As fontes documentais dos tribunais;
d) As fontes documentais dos serviços públicos personalizados;
e) As fontes documentais dos municípios;
f) As fontes documentais das pessoas colectivas de utilidade pública administrativa;
g) As fontes documentais das empresas públicas.
4. A incorporação da documentação referida na alínea c) do n.º 3, bem como a dos cartórios notariais e das conservatórias de registos é feita de acordo com a legislação em vigor nas respectivas instituições e serviços, observado ainda o preceituado na parte final do n.º 2.
1. Os critérios de selecção, os prazos de conservação dos documentos e o seu destino final são fixados por portaria, sob proposta:
a) Do Conselho a que se refere o artigo 19.º, para a documentação de apoio à gestão e a referente às actividades de carácter administrativo de natureza comum;
b) Da instituição ou serviço relativamente à documentação produzida no âmbito das atribuições e actividades específicas respectivas.
2. Nas situações previstas na alínea b) do número anterior, as propostas serão submetidas a parecer dos Serviços de Administração e Função Pública e do Arquivo Histórico, os quais deverão pronunciar-se no prazo de um mês.
1. Ao Arquivo Histórico, como arquivo geral, compete:
a) Constituir um inventário da documentação de interesse histórico do território de Macau;
b) Realizar a incorporação de fundos arquivísticos, quer a título definitivo, quer a título de depósito;
c) Emitir parecer sobre questões relacionadas com a documentação de interesse histórico do território de Macau;
d) Propor o exercício do direito de preferência, nos termos legais, e bem assim o empréstimo de documentos e a permuta de reproduções dos mesmos;
e) Exercer o direito de reivindicação sobre documentos, núcleos ou fundos arquivísticos desviados dos seus depósitos, qualquer que seja a sua natureza, o lugar onde se encontrem e a época a que se refiram;
f) Promover a recuperação de documentos pertencentes à Administração Pública;
g) Verificar o interesse histórico dos documentos pertencentes a organismos privados e a particulares e propor a sua classificação nos termos legais, recorrendo, sempre que necessário, a pareceres de peritos.
2. O Arquivo Histórico deposita o seu arquivo de segurança no Arquivo Histórico Ultramarino, mediante protocolo a estabelecer.
O regime dos arquivos privados de interesse público é o que consta dos artigos 15.º a 17.º
1. Os documentos, propriedade de particulares, que se revistam de interesse histórico podem ser classificados por portaria do Governador, sob proposta do Arquivo Histórico, ouvido o Conselho Geral de Arquivos, precedendo prévia notificação e audiência do respectivo proprietário.
2. A classificação de documentos, propriedade de particulares, não implica a tradição dos mesmos para o Território.
1. Os efeitos da classificação acompanham os bens classificados, ainda que mudem de proprietário.
2. Sempre que o proprietário se proponha alienar documentos classificados deve:
a) Notificar o Arquivo Histórico e indicar as condições da venda, para efeitos de exercício do direito de preferência pela Administração;
b) Dar conhecimento ao futuro adquirente do estatuto dos documentos.
É proibida a destruição de arquivos privados classificados.
1. É permitido o acesso aos arquivos públicos para consulta de documentos decorridos 30 anos sobre a sua produção.
2. Sem prejuízo do disposto em legislação especial, o acesso aos documentos a seguir indicados faz-se nos termos das alíneas seguintes:
a) Os documentos de carácter militar e os relacionados com a política externa são dados a consulta volvidos 50 anos a partir da data da sua produção;
b) Os documentos que contenham informação do foro médico são dados a consulta volvidos 130 anos a partir da data da conclusão do processo;
c) Os processos individuais, os processos judiciais, os documentos de registo civil e os que contenham informações recolhidas através de inquérito ou recenseamento são dados a consulta volvidos 100 anos a partir da data do seu termo.
1. É criado, como órgão consultivo do Governador, o Conselho Geral de Arquivos ao qual compete contribuir para a definição das políticas arquivísticas do Território, cabendo-lhe designadamente:
a) Propor os critérios de selecção, os prazos de conservação e o destino final da documentação a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo 12.º;
b) Dar parecer sobre todas as questões regulamentares e científicas respeitantes aos arquivos que lhe sejam submetidas ou sobre as quais entenda dever pronunciar-se.
2. O Conselho Geral de Arquivos é composto por:
a) Um presidente designado pelo Governador;
b) Um representante da Assembleia Legislativa;
c) Um representante do Serviço de Administração e Função Pública;
d) Um representante do Gabinete dos Assuntos de Justiça;
e) Um representante da Direcção dos Serviços de Finanças;
f) O director do Arquivo Histórico.
3. O Conselho poderá, por proposta do seu presidente, integrar representantes de outras instituições ou serviços sempre que as questões a tratar assim o exijam.
4. O Conselho Geral de Arquivos reúne em sessão ordinária no princípio de cada semestre e, em sessão extraordinária, sempre que o presidente ou a maioria dos membros o requeira ou, no caso da apreciação da proposta a que se refere a alínea a) do n.º 1, o Serviço de Administração e Função Pública o solicite.
1. É vedado aos serviços ou instituições produtores de documentos destruí-los enquanto não estiverem publicadas as portarias a que se refere o artigo 12.º
2. Os serviços ou instituições relativamente aos quais foram já publicadas portarias fixando prazos para conservação de documentos ficam obrigados a enviar ao Arquivo Histórico, nos quinze dias posteriores à data da entrada em vigor deste diploma, uma lista com os tipos de documentos a eliminar, de acordo com essas portarias, com vista à apreciação, nos trinta dias seguintes, do seu eventual interesse histórico.
Os documentos de interesse histórico pertencentes a entidades públicas e que delas tenham sido abusivamente retirados não podem ser alienados nem adquiridos por prescrição.
1. Dos documentos com prazos de conservação definidos nos termos do artigo 8.º poderão ser feitas transferências para suportes de informação que representem imagens fiéis dos originais, designadamente por recurso a técnicas de microfilmagem.
2. A autorização para a microfilmagem poderá constar das portarias referidas no artigo 12.º ou de outro instrumento legal específico.
3. As operações de transferência de suportes poderão realizar-se a partir de originais em papel ou directamente a partir de suporte informático.
As operações de microfilmagem ficam sujeitas às seguintes formalidades:
a) Indicação do responsável pelas operações, através de despacho interno ou na portaria a que se refere o artigo 12.º;
b) Microfilmagem em duas bobinas de filme, sendo pelo menos uma de filme de qualidade arquivística, a conservar invioladas, sem cortes nem emendas, em arquivo de segurança de microformas em instalações diferenciadas, e de acordo com os requisitos de ambiente indicados em normas nacionais ou internacionais;
c) Inclusão de uma primeira imagem reproduzindo um termo de abertura contendo a descrição das espécies filmadas, e de uma última imagem reproduzindo um termo de encerramento contendo as assinaturas dos operadores e do responsável pelas operações, numa declaração de que as imagens contidas no filme são reproduções totais e exactas dos originais;
d) A partir da bobina original e por decisão do responsável pelo serviço ou instituição a que pertencem os filmes, poderão ser obtidas duplicações parciais ou totais para a constituição de suportes micrográficos mais adequados ao funcionamento corrente;
e) A conservação das microformas deverá ser feita em ficheiros adequados evidenciando as referências de acesso;
f) Será conservado um livro de registo das microformas, o qual possuirá termo de abertura e de encerramento.
As fotocópias e as ampliações obtidas a partir do microfilme têm a força probatória dos originais, desde que sejam autenticadas com a assinatura do responsável designado, nos termos da alínea a) do artigo anterior.
1. A falta de cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 16.º constitui infracção punível com multa de 5 000 a 10 000 patacas.
2. A falta de cumprimento do disposto no artigo 17.º constitui infracção punível com multa de 10 000 a 30 000 patacas.
3. As sanções estabelecidas neste artigo são graduadas e aplicadas pelo Instituto Cultural de Macau.
1. A iniciativa da proposta a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo 19.º pertence ao representante do Serviço de Administração e Função Pública, no Conselho Geral de Arquivos, a qual deve ser apresentada no prazo de 3 meses a contar da data da entrada em vigor deste diploma.
2. Ultrapassado o prazo fixado no número anterior, a iniciativa defere-se a qualquer dos outros membros do Conselho Geral de Arquivos.
É revogado o Decreto-Lei n.º 39/82/M, de 21 de Agosto.
O presente diploma produz efeitos a partir da data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 63/89/M, de 25 de Setembro.
Aprovado em 30 de Setembro de 1989.
Publique-se.
O Governador, Carlos Montez Melancia.