Versão Chinesa

Decreto-Lei n.º 52/93/M

de 20 de Setembro

A locação financeira constitui um eficaz meio de financiamento do investimento que, a par de reconhecidas vantagens para os utilizadores, confere à instituição financiadora uma segurança acrescida, resultante do facto de manter a propriedade do bem locado durante o período de vida do contrato.

Nesse sentido, e tendo presente a linha de evolução dos modernos sistemas bancários, o Regime Jurídico do Sistema Financeiro veio conferir aos bancos a possibilidade de efectuarem operações de locação financeira. A par disso, prevê-se no mesmo diploma uma nova categoria de instituições exclusivamente vocacionadas para a referida actividade que, dadas as características do Território e o elenco de operações passivas que lhes são permitidas, integram igualmente a categoria de instituições de crédito.

Importa agora estabelecer algumas normas especiais na definição do regime jurídico geral desta técnica contratual, bem como introduzir algumas normas prudenciais visando a protecção da solvabilidade das instituições de crédito que a pratiquem e que melhor traduzam o carácter essencialmente creditício da operação.

Nestes termos;

Ouvido o Conselho Consultivo;

O Encarregado do Governo decreta, nos termos do n.º 1 do artigo 13.º do Estatuto Orgânico de Macau, para valer como lei no território de Macau, o seguinte:

CAPÍTULO I

Princípios gerais

Artigo 1.º

(Noção)

Locação financeira é o contrato pelo qual uma instituição de crédito se obriga a proporcionar a outrem, contra retribuição, o gozo temporário de uma coisa, adquirida ao próprio locatário ou a terceiro de acordo com as suas instruções, ou construída por indicação do mesmo locatário, e que este pode comprar, total ou parcialmente, findo o prazo, mediante o pagamento de um preço determinado ou determinável, nos termos do próprio contrato.

Artigo 2.º

(Objecto)

1. A locação financeira de coisas móveis respeita sempre a bens de equipamento ou a bens de consumo duradouro.

2. A locação financeira de coisas imóveis tem por objecto exclusivo bens imóveis afectados ou a afectar ao investimento produtivo ou destinados a habitação.

Artigo 3.º

(Limites à autonomia das partes)

1. A Autoridade Monetária e Cambial de Macau pode, por aviso, estabelecer normas sobre a determinação dos montantes das rendas, da entrada inicial e dos valores residuais atribuídos aos bens locados, bem como definir as condições e critérios da sua eventual revisão, a periodicidade convencionada para o pagamento das rendas e os prazos por que serão efectuados os contratos.

2. Nenhuma instituição pode adquirir bens destinados a locação financeira antes de concluído o contrato com o locatário, salvo se dispuser de garantia devidamente formalizada ou seguro que cubram os riscos de uma eventual não celebração.

CAPÍTULO II

Celebração e vigência do contrato

Artigo 4.º

(Proposta)

Os interessados na celebração de contratos de locação financeira devem apresentar à instituição de crédito locadora uma proposta com a indicação do fornecedor, da coisa a adquirir, devidamente caracterizada, dos prazos de entrega e demais cláusulas do contrato.

Artigo 5.º

(Forma)

A locação financeira de coisas imóveis deve ser celebrada por escritura pública e a de móveis deve constar de documento particular, se outra forma mais solene não for convencionada.

Artigo 6.º

(Publicidade)

1. A locação financeira de coisas imóveis ou móveis registáveis fica sujeita a inscrição na competente conservatória do registo.

2. Nas coisas móveis não sujeitas a registo, deve ser colocada placa ou aviso visível, indicativo do direito de propriedade da instituição locadora.

Artigo 7.º

(Renda e preço de aquisição)

1. O total das rendas previstas no contrato de locação financeira deve permitir a amortização do bem locado, deduzido o valor residual, e cobrir os restantes encargos e a margem de lucro da instituição locadora.

2. Se, por força de incumprimento de prazos ou de quaisquer outras cláusulas contratuais por parte do fornecedor, ou ainda de funcionamento defeituoso ou de rendimento inferior ao previsto dos equipamentos locados, se verificar, nos termos da lei civil, uma redução do preço das coisas fornecidas, deve a renda a pagar pelo locatário ser proporcionalmente reduzida.

3. O preço de aquisição a pagar pelo locatário, no fim do contrato, deve corresponder ao valor residual do bem locado.

4. O valor residual do bem locado não pode exceder 10% do preço de aquisição e das inerentes despesas suportadas pela instituição locadora.

Artigo 8.º

(Duração)

1. A locação financeira de coisas móveis não pode ser celebrada por prazo inferior a um ano e a de imóveis por prazo inferior a cinco anos.

2. O prazo de locação financeira de coisas móveis não pode exceder o período presumível de utilização económica do bem.

3. Em qualquer caso, o contrato de locação financeira não pode ter duração superior a vinte anos, considerando-se reduzida a este limite quando se estipule prazo superior.

Artigo 9.º

(Vigência)

1. O contrato de locação financeira produz efeitos a partir da data da sua celebração.

2. As partes podem, no entanto, condicionar o início da sua vigência à efectiva aquisição das coisas locadas, ou a quaisquer outros factos.

Artigo 10.º

(Transmissão do direito do locador)

O contrato de locação financeira subsiste, para todos os efeitos, nas transmissões do direito da instituição locadora, ocupando a instituição adquirente a mesma posição da sua antecessora.

Artigo 11.º

(Transmissão do direito do locatário)

1. O direito do locatário financeiro pode ser transmitido no caso de trespasse do estabelecimento comercial ou industrial e, a título de sucessão legal ou testamentária, quando se mantenha a actividade profissional prosseguida pelo falecido.

2. A instituição locadora pode opor-se à transmissão do direito, desde que o novo locatário não ofereça garantias bastantes do cumprimento das suas obrigações.

Artigo 12.º

(Novo contrato)

Findo o prazo do contrato, quando o locatário não queira exercer a opção de compra, podem as partes celebrar nova locação financeira.

CAPÍTULO III

Posição jurídica do locador

Artigo 13.º

(Princípio geral)

A instituição locadora pode usar, em relação à coisa locada, de todas as faculdades inerentes ao seu direito, observadas que sejam as restrições impostas pelo exercício do direito do locatário.

Artigo 14.º

(Faculdades do locador em relação à coisa)

1. Em relação à coisa locada, pode a instituição locadora, em especial:

a) Defender a sua integridade, nos termos gerais de direito;

b) Examiná-la, sem prejuízo da actividade normal do locatário;

c) Fazer suas, sem compensação, as peças ou outros elementos acessórios, incorporados na coisa pelo locatário.

2. Os direitos reais da instituição locadora são oponíveis ao representante da massa falida e aos credores do locatário, incluindo àqueles que estejam munidos de título executivo.

Artigo 15.º

(Deveres em relação ao locatário)

Em relação ao locatário, está a instituição locadora, em especial, adstrita a:

a) Entregar a coisa nos termos e condições acordados;

b) Proporcionar-lhe o gozo dela pelo prazo do contrato;

c) Vender-lha pelo montante do valor residual, caso aquele queira, findo o contrato.

Artigo 16.º

(Vícios de coisa locada)

A instituição locadora não responde pelos vícios da coisa locada ou pela sua inadequação face aos fins do contrato, salvo se tiver agido com inobservância dos princípios da boa fé.

CAPÍTULO IV

Posição jurídica do locatário

Artigo 17.º

(Princípio geral)

O locatário pode gozar a coisa locada no respeito pelos seus fins específicos e dentro dos limites impostos pela lei e pelo contrato.

Artigo 18.º

(Faculdades do locatário em relação à coisa)

Em relação à coisa locada, pode o locatário, em especial:

a) Usá-la e fruí-la, respeitando os fins do contrato, na observância das normas aplicáveis e de acordo com as instruções ou recomendações do fornecedor;

b) Defender a sua integridade e o seu gozo, nos termos do seu direito;

c) Usar, quando disso seja caso, das acções possessórias, mesmo contra a locadora;

d) Transmitir ou onerar, com autorização expressa da locadora, total ou parcialmente, o seu direito;

e) Adquirir a coisa locada, findo o contrato, nos termos inicialmente estipulados.

Artigo 19.º

(Relações entre o fornecedor e o locatário)

O locatário pode exercer contra o fornecedor ou o empreiteiro, quando disso seja caso, todos os direitos relativos à coisa locada.

Artigo 20.º

(Deveres específicos do locatário)

O locatário está, em especial, adstrito a:

a) Pagar pontualmente as rendas acordadas;

b) Não mover as coisas locadas para sítio diferente do contratualmente previsto, salvo autorização da instituição locadora;

c) Suportar, desde o início da vigência do contrato, todos os encargos da coisa locada, nomeadamente as despesas de transporte e respectivo seguro, montagem, instalação, reparação e manutenção;

d) Avisar imediatamente a instituição locadora sempre que tenha conhecimento de vícios da coisa ou saiba que a ameaça algum perigo ou que terceiros se arrogam direitos sobre ela, quando a instituição locadora o ignore;

e) Permitir o exame da coisa pela instituição locadora ou seu representante;

f) Efectuar o seguro da coisa locada por forma a abranger a sua perda ou deterioração e a responsabilidade civil emergente de danos por ela provocados;

g) Restituir a coisa locada em bom estado, salvas as deteriorações inerentes a uma utilização normal, findo o contrato, quando não opte pela sua aquisição, suportando todas as despesas necessárias para a devolução à instituição locadora, incluindo as do seguro, se indispensável.

Artigo 21.º

(Risco)

Na vigência do contrato, o risco de perecimento ou deterioração da coisa corre por conta do locatário.

CAPÍTULO V

Resolução do contrato e garantias

Artigo 22.º

(Resolução)

1. Sem prejuízo do direito a indemnização nos termos gerais, o locatário não tem direito à resolução do contrato de locação financeira.

2. A instituição locadora pode resolver o contrato com fundamento no incumprimento das obrigações que assistam ao locatário e ainda nos casos seguintes:

a) Dissolução ou liquidação da sociedade locatária;

b) Verificação de qualquer dos fundamentos de declaração de falência ou insolvência do locatário;

c) Cessação da actividade económica ou profissional, por parte do locatário, salvo nos casos previstos no n.º 1 do artigo 11.º

Artigo 23.º

(Incumprimento do locatário)

1. Constituindo-se o locatário em mora, a instituição locadora tem o direito de exigir, além das rendas em atraso, juros de mora nos termos aplicáveis às operações de crédito bancário.

2. No caso de resolução do contrato por incumprimento do locatário, pode a instituição locadora:

a) Exigir, além das rendas vencidas e não pagas, quando previsto no contrato, o pagamento antecipado do valor da totalidade das rendas futuras, acrescido do valor residual, revertendo o direito de propriedade para o locatário;

b) Ou reaver o equipamento e exigir uma indemnização que a coloque na situação em que se encontraria se o locatário tivesse cumprido pontualmente o contrato de locação.

Artigo 24.º

(Garantias)

Podem ser constituídas a favor da instituição locadora quaisquer garantias, pessoais ou reais, dos créditos de rendas e de outros encargos ou eventuais indemnizações devidas pelo locatário.

Artigo 25.º

(Rendas em caução)

O montante das rendas exigidas a título de caução não pode ser superior a um semestre, devendo, nesse caso, ser acordado e efectivado no início da vigência do contrato.

Artigo 26.º

(Operações anteriores ao contrato)

Quando, antes de celebrado um contrato de locação financeira, qualquer interessado tenha procedido à encomenda de equipamento com vista a contrato futuro, entende-se que actua por sua conta e risco, não podendo a instituição locadora ser, de algum modo, responsabilizada por prejuízos eventuais decorrentes da não conclusão do contrato, a menos que tenha agido contra as regras da boa fé.

CAPÍTULO VI

Disposição final

Artigo 27.º

(Entrada em vigor)

O presente diploma entra em vigor em 1 de Janeiro de 1994.

Aprovado em 16 de Setembro de 1993.

Publique-se.

O Encarregado do Governo, Vítor Rodrigues Pessoa.