Versão Chinesa

Decreto-Lei n.º 40/90/M

de 23 de Julho

O desenvolvimento industrial de Macau encontra-se perante o desafio da elevada competição nos mercados internacionais, o que o faz reclamar soluções a curto prazo que possibilitem a modernização do parque e a diversificação e qualidade dos produtos.

Um dos instrumentos, que noutros países se tem revelado mais eficaz na promoção do investimento e no apoio à inovação tecnológica, tem sido o capital de risco que consiste, essencialmente, na aplicação temporária de fundos na aquisição de uma parte, em geral minoritária, do capital social de uma empresa, com o objectivo de a rentabilizar, ao ponto de, após um período de tempo mais ou menos longo e pela venda da referida participação social, obter o retorno do capital investido e um lucro adicional suficientemente compensador.

De entre outras soluções possíveis para o enquadramento dos operadores em capital de risco, aquela que se tem mostrado mais ajustada tem sido a forma societária. Com efeito, exigindo a gestão do risco uma vasta gama de conhecimentos, é a vulgar sociedade comercial o ente jurídico apropriado para unir os possuidores de capital a profissionais das mais diversas origens e formações, para todos se empenharem, como um só, no objectivo da rentabilização dos meios financeiros aplicados.

Assim, considerando o importante papel que as sociedades de capital de risco podem desempenhar na renovação do sistema industrial do Território, cria-se, com o presente decreto-lei, o quadro propício à sua implementação e desenvolvimento, que será acompanhado de um regime auxiliar de incentivos a estabelecer em diploma legal próprio.

Nestes termos;

Obtido o parecer da Autoridade Monetária e Cambial de Macau;

Ouvido o Conselho Consultivo;

O Governador de Macau decreta, nos termos do n.º 1 do artigo 13.º do Estatuto Orgânico de Macau, para valer como lei no território de Macau, o seguinte:

Artigo 1.º

(Âmbito)

O presente diploma regulamenta a constituição, o funcionamento e a actividade das sociedades de capital de risco no território de Macau.

Artigo 2.º

(Noção)

Entende-se por actividade de capital de risco a aplicação de fundos na aquisição de partes do capital social de empresas, com o objectivo de promover a rentabilização destas e obter, com a posterior venda das participações sociais, o retorno dos fundos aplicados e um lucro adicional.

Artigo 3.º

(Objecto)

1. As sociedades de capital de risco, abreviadamente designadas por SCR, têm por objecto principal o apoio e a promoção do investimento e da inovação tecnológica em empresas através da participação temporária no respectivo capital social.

2. Considera-se, para efeitos do presente diploma, como equivalente à participação no capital social, a titularidade de quaisquer títulos de crédito convertíveis em capital social e a realização de prestações suplementares de capital.

3. Constitui objecto acessório das SCR a prestação de assistência na gestão financeira, técnica, administrativa e comercial das empresas em cujo capital social participem.

4. Além das operações previstas no presente diploma, as SCR podem executar quaisquer outras que não lhes sejam expressamente vedadas pela lei e que lhes sejam autorizadas por despacho do Governador.

Artigo 4.º

(Tipo de sociedade e capital social)

1. As SCR deverão constituir-se sob a forma de sociedade anónima, com um capital social mínimo de vinte milhões ($ 20 000 000,00) de patacas, o qual, no momento do início da actividade, se deverá mostrar realizado em dinheiro em, pelo menos, 20% do seu total.

2. A sua constituição não está sujeita a autorização especial, mas os seus estatutos, bem como as respectivas alterações, devem ser previamente aprovados pela Autoridade Monetária e Cambial de Macau, adiante designada pela sigla AMCM.

3. Com a apresentação do projecto dos estatutos à AMCM, deverão ser juntos os seguintes elementos:

a) Memória descritiva da actividade a desenvolver pela sociedade, explicitando as linhas gerais previstas para a sua actuação e demonstrando o respectivo interesse para a economia do Território;

b) Fotocópia notarial do acto de constituição;

c) Lista actualizada dos sócios ou accionistas e respectivas participações no capital social;

d) Relativamente a cada um dos administradores, gerentes, directores ou mandatários com poderes de gerência, certificado do registo criminal emitido há menos de noventa dias, ou declaração do próprio, com a assinatura reconhecida por notário, atestando, por sua honra, da não existência de factos inibidores mencionados no artigo 22.º

4. Os elementos referidos na alínea d) do número anterior deverão ainda ser entregues sempre que se verifique a entrada ao serviço da SCR de novos administradores, gerentes, directores ou mandatários com poderes de gerência.

5. Tratando-se de alteração aos estatutos, o respectivo projecto de modificação será acompanhado de memória justificativa.

6. Com o requerimento inicial deverá ser entregue a identificação dos auditores externos. Deverá ainda ser comunicada a identificação dos novos auditores sempre que se verifique a substituição dos anteriores.

Artigo 5.º

(Sede e representação no exterior)

1. As SCR constituídas localmente têm a sede no território de Macau, onde deverão exercer a sua actividade.

2. O exercício da actividade principal no exterior ou o estabelecimento de formas de representação externa dependem de autorização do Governador a conceder por despacho.

Artigo 6.º

(Representação nos órgãos sociais de empresas)

As SCR podem, por si ou mediante representação, integrar os órgãos sociais das empresas em que participem.

Artigo 7.º

(Operações activas)

No desenvolvimento da sua actividade, podem as SCR efectuar as seguintes operações activas:

a) Adquirir, a título originário ou derivado, onerar ou alienar quaisquer participações no capital de empresas;

b) Subscrever títulos convertíveis em acções emitidos por empresas com sede no Território;

c) Promover, em benefício das empresas em que participem e com o objectivo de melhorar a situação económica das mesmas, a obtenção, no exterior do Território, de crédito a médio ou longo prazos;

d) Promover a colocação, no Território ou no exterior, de acções, obrigações e outros títulos de dívida negociáveis, emitidos pelas empresas em que participem e, bem assim, intervir, por qualquer outro modo, na preparação ou na colocação de tais títulos;

e) Participar na reestruturação financeira de empresas, através da aquisição de créditos, nomeadamente por cessão ou sub-rogação, aos quais corresponda a emissão de títulos ou participações no capital das mesmas empresas, ou de obrigações convertíveis em acções.

Artigo 8.º

(Outras operações activas)

1. Com vista a manter recursos, as SCR poderão ainda:

a) Constituir depósitos em instituições de crédito locais ou no exterior;

b) Adquirir títulos da dívida pública do Território;

c) Adquirir acções, obrigações ou certificados de depósito emitidos pelas instituições de crédito monetárias autorizadas a operar no Território;

d) Realizar outras operações não proibidas por lei nem reservadas a outras instituições.

2. Até ao limite de um terço do seu activo bruto total, as SCR poderão adquirir e alienar obrigações e outros títulos de dívida negociáveis emitidos por entidades de direito público ou privado do Território, ou do exterior quando cotados em bolsas de valores.

Artigo 9.º

(Limite mínimo e prazo para aplicações do activo)

1. No prazo de três anos contados a partir da data da sua constituição, as SCR deverão ter um mínimo equivalente a dois terços do seu activo bruto total aplicado em participações de capital social.

2. Sempre que, por qualquer motivo, a soma das participações no capital social de empresas baixar do limite referido no número anterior, a SCR deverá restabelecê-lo no prazo de um ano.

3. O não cumprimento do disposto nos números anteriores, se bem que não dê lugar à aplicação de outras sanções, impedirá, contudo, o acesso a quaisquer benefícios ou incentivos concedidos pelo Território.

Artigo 10.º

(Limites para participações)

1. As participações das SCR em empresas não podem exceder:

a) Em cada caso, a terça parte do seu capital social e reservas;

b) Na sua totalidade, três vezes o seu capital social e reservas.

2. Em cada momento, pelo menos 75% das participações das SCR noutras empresas não poderão ter estado na sua titularidade, seguida ou interpoladamente, por um período superior a dez anos.

3. As participações que excedam 50% do capital social das empresas participadas não poderão ser superiores, na sua totalidade, a metade das suas participações totais aplicadas em operações de capital de risco.

4. As participações sociais detidas pelas SCR não poderão ser alienadas antes de decorridos três anos contados da data da respectiva aquisição, salvo em processo de liquidação da própria SCR.

Artigo 11.º

(Prestação de outros serviços)

No âmbito do seu objecto acessório, as SCR poderão prestar, nomeadamente, os seguintes tipos de serviços:

a) A realização de estudos técnico-económicos de viabilidade das empresas ou de novos projectos de investimento em que participem, bem como das condições e modalidades do respectivo financiamento;

b) A execução de estudos ou projectos visando a reorganização, concentração ou qualquer outra forma de racionalização da actividade das empresas em que participem, incluindo a promoção de mercados, a melhoria dos processos de produção e a introdução de novas tecnologias.

Artigo 12.º

(Fundos consignados)

Com vista à realização das operações activas que podem legalmente efectuar, as SCR poderão ser incumbidas da gestão de fundos consignados a operações de capital de risco, de acordo com a legislação que vier a regular a constituição dos mesmos.

Artigo 13.º

(Recursos alheios)

Para complemento do respectivo capital social e reservas, podem as SCR obter os seguintes recursos alheios:

a) Financiamentos até 50% do montante do capital social realizado, acrescido das reservas apuradas através do último balanço aprovado, a obter no Território ou no exterior, por prazo não inferior a dois anos, junto de instituições de crédito ou de outras instituições financeiras, nomeadamente através de títulos de dívida emitidos pela própria SCR;

b) Financiamento por emissão de obrigações;

c) Outros recursos mobilizáveis ao abrigo de contratos de associação ou participação.

Artigo 14.º

(Operações vedadas)

São vedadas às SCR as seguintes operações:

a) A recepção de depósitos em numerário, a guarda e transferência de valores por conta de terceiros e a concessão de crédito ou a prestação de garantias sob qualquer forma ou modalidade;

b) A aquisição de quaisquer valores mobiliários ou imobiliários por conta e ordem de terceiros, à excepção das empresas participadas pela própria SCR;

c) A gestão de carteiras de títulos de terceiros, à excepção das empresas participadas pela própria SCR;

d) A aquisição de acções próprias;

e) O recurso ao mercado monetário interbancário;

f) A aquisição de bilhetes monetários da AMCM, ou o financiamento directo junto desta entidade;

g) O exercício directo de qualquer actividade industrial, comercial ou agrícola;

h) A participação no capital social de quaisquer instituições de crédito monetárias ou não monetárias que detenham partes do capital social da própria SCR, bem como em sociedades cujo objecto compreenda a actividade de mediação sobre bens imóveis, a realização de empréstimos com garantia hipotecária ou a compra e venda, exploração ou administração de bens imóveis;

i) A aquisição ou posse de bens imóveis, para além dos necessários às suas instalações próprias, salvo quando lhes advenham por efeito da cessão de bens, dação em cumprimento, arrematação ou qualquer outro meio legal de cumprimento de obrigações ou destinado a assegurar esse cumprimento, devendo, em tais casos, proceder à respectiva alienação no prazo de dois anos, renovável mediante autorização do Governador a conceder por despacho.

Artigo 15.º

(Operações vedadas às empresas participadas)

À empresa em cujo capital participe uma SCR é vedado, sob pena de nulidade, adquirir acções ou obrigações da SCR participante.

Artigo 16.º

(Reserva geral)

1. As SCR devem constituir reserva geral.

2. A reserva geral é formada com base na afectação obrigatória de 10% dos lucros apurados em cada exercício, até ao limite de 50% do capital social.

Artigo 17.º

(Acesso à actividade)

1. Só as SCR constituídas e matriculadas no território de Macau podem nele exercer a actividade de capital de risco.

2. O exercício da actividade depende de comunicação prévia à AMCM.

3. A intervenção em operações de capital de risco, no Território, por entidades não residentes, ainda que a título esporádico, só pode ser feita através de uma SCR localmente constituída.

Artigo 18.º

(Contabilidade)

1. As SCR deverão possuir escrita devidamente organizada em termos de legislação e princípios da técnica contabilística em vigor no Território, que permita a verificação e o controlo das operações realizadas e dos valores activos e passivos que, em qualquer momento, integrem o balanço representativo do seu património.

2. Na escrituração da contabilidade referida no número anterior, deverá ser usada língua oficial do Território ou, no caso de utilização de língua não oficial, deverá ser produzida retroversão sempre que tal seja solicitado pela AMCM.

3. As contas anuais serão obrigatoriamente auditadas por sociedades de auditores registadas no Território.

Artigo 19.º

(Valorimetria)

A AMCM poderá estabelecer, por aviso a publicar no Boletim Oficial, os critérios de valorimetria dos valores activos e passivos, bem como a política de amortização dos bens do activo imobilizado, a observar pelas SCR.

Artigo 20.º

(Remessa de elementos informativos)

As SCR ficam obrigadas a remeter à AMCM, dentro do prazo que lhes for fixado, os elementos contabilísticos, estatísticos e, em geral, todos os elementos informativos que aquela entidade lhes solicite.

Artigo 21.º

(Gerência)

A gerência deverá ser confiada a pessoa ou pessoas com residência permanente em Macau, e com poderes para tratar e resolver definitivamente todos os assuntos que digam respeito ao exercício da respectiva actividade no Território.

Artigo 22.º

(Inibições)

Os responsáveis pela falência de empresas singulares ou colectivas e bem assim, os condenados por furto, roubo, burla ou abuso de confiança, ficam inibidos de exercer as actividades previstas no presente diploma e de desempenhar nas SCR funções de gerência ou integrar os respectivos órgãos sociais.

Artigo 23.º*

(Natureza)

As SCR são instituições de crédito não monetárias.

* Revogado - Consulte também: Decreto-lei n.º 32/93/M

Artigo 24.º*

(Regime)

As SCR regem-se pelo presente diploma e, subsidiariamente, pelo disposto nos títulos I, II e IV do Regime Jurídico do Sistema Financeiro, com as necessárias adaptações.

* Alterado - Consulte também: Decreto-lei n.º 32/93/M

Artigo 25.º

(Supervisão)

1. A actividade das SCR está sujeita à supervisão da AMCM.

2. No exercício da competência referida no número anterior poderá a AMCM, através de pessoas devidamente credenciadas, fiscalizar em qualquer momento, com ou sem aviso prévio, as transacções, livros, contas e demais registos ou documentos, bem como verificar as existências de quaisquer classes de valores.

3. A fiscalização pode ser feita nos próprios estabelecimentos devendo as pessoas ou entidades a ela sujeitas facultar instalações adequadas e todos os documentos para o efeito necessários.

4. No exercício das suas funções de supervisão, a AMCM poderá emitir instruções técnicas e regulamentares, sob a forma de circular ou, quando a importância do assunto o justifique, de aviso a publicar no Boletim Oficial.

Artigo 26.º

(Publicidade dos despachos)

Os despachos do Governador previstos neste diploma não carecem de qualquer forma especial de publicação.

Artigo 27.º

(Taxa de fiscalização)

1. As SCR ficam sujeitas a uma taxa de fiscalização anual de um por mil sobre o capital social, com o limite máximo de cinquenta mil ($ 50 000,00) patacas.

2. A taxa de fiscalização constitui receita da AMCM, que procederá à sua cobrança, devendo o respectivo pagamento ser efectuado durante o mês de Fevereiro do ano seguinte àquele a que se refere.

3. No primeiro ano da sua actividade, bem como no ano em que a mesma terminar, a taxa a pagar será proporcional ao número de meses em que aquela tiver sido exercida. No caso de cessação de actividade, a taxa proporcional deverá ser liquidada e paga antes da data em que se verificar o encerramento.

Artigo 28.º

(Entrada em vigor)

Este diploma entra em vigor um mês após a sua publicação.

Aprovado em 17 de Julho de 1990.

Publique-se.

O Governador, Carlos Montez Melancia.